Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
20123/17.6T8LSB-C.G1
Relator: ANIZABEL SOUSA PEREIRA
Descritores: PROCESSO EXECUTIVO
DESPESAS JUDICIAIS
HONORÁRIOS DE ADVOGADO
CONTRATO DE MÚTUO
PROVA COMPLEMENTAR DO TÍTULO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/17/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I-A obrigação de custear as despesas judiciais e os honorários de advogado, estipulada no contrato de mútuo, constante de escritura pública, para o caso de incumprimento, quando o seu montante não se encontra fixado, carece de uma atividade de prova complementar liminar do título, à qual se refere o artigo 715.º, n.ºs 1 a 4, a ter lugar no início do processo, já que os indicados números têm alcance geral, aplicando-se designadamente a todos aqueles casos em que a certeza e a exigibilidade não resultam do título executivo, como é o caso.
II- Não tendo o exequente efetuado tal prova complementar liminar do título e se as despesas feitas com o processo executivo, incluindo as correspondentes a honorários pagos ao mandatário, conforme o Supremo Tribunal de Justiça recentemente decidiu em revista excecional, «apenas são passíveis de ser compensadas, a título de custas de parte, conforme previsto no Código de Processo Civil e no Regulamento das Custas Processuais», importa concluir que, ao contrário do entendimento preconizado na sentença recorrida, o contrato de mútuo dado à presente execução pelo Banco exequente, não preenche, por si só, sem necessidade de outras provas complementares, os requisitos de exequibilidade quanto às despesas peticionadas no requerimento executivo a respeito dos honorários de mandatário.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório ( que se transcreve):

G. C. e A. F. executados nos autos de execução e naqueles melhor identificados, vieram propor a presente oposição à execução comum, mediante o incidente de embargos de executado, que contra eles move a Caixa ..., Crl., peticionando, na parte que neste momento se encontra por decidir e atenta a definição do objecto do processo, (i) a restituição pela exequente do valor de € 11.728,51, ou, caso assim não se entenda, a restituição do valor de € 494,04, e (ii) a declaração que os executados não são responsáveis por qualquer quantia a título de honorários devidos ao mandatário da exequente. Alegam, para o efeito e em síntese, que pagaram quantias que não foram quantificadas e que, em consequência, pagaram, em excesso, e por conta da quantia exequenda, o valor de € 11.728,51. Por outro lado, não se encontrando concretizado/liquidado no título dado à execução o valor devido a título de honorários não pode tal valor ser exigido aos executados ou, pelo menos, não deve exceder tal valor o montante de € 3.600,00, montante que se encontra registado na descrição do prédio hipotecado para os efeitos em causa.
Regularmente citada, contestou a embargada alegando factos que, em seu entender, justificam a liquidação efectuada e divergindo do entendimento dos embargantes.
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Foi proferido despacho saneador, no qual foram fixados o objecto do litígio e os temas da prova.
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Realizado o julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“ Decisão:
Em face do exposto, julgo a oposição à execução comum mediante embargos intentada por G. C. e A. F. contra Caixa ..., Crl., improcedente, por não provada e, consequentemente, absolvo a embargada dos pedidos contra si deduzidos.
Custas pelos embargantes, sem prejuízo do decidido administrativamente quanto ao apoio judiciário.
Registe e notifique”.
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Inconformados com esta decisão, os executados/embargantes, dela interpuseram recurso e formularam, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem):

A. Apesar de uma Decisão que contraria TODA PROVA PRODUZIDA EM SEDE DE JULGAMENTO FINAL, os Autores não vão deixar de acreditar na Justiça, como um dos principais pilares da sociedade.
B. Da audição dos depoimentos prestado por TODAS AS TESTEMUNHAS, de TODAS AS PARTES, e da prova DOCUMENTAL, é lícito concluir que foram erradamente apreciados e valorados, pelo que ocorre notório erro de julgamento.
C. No presente Recurso, os Recorrentes, aqui exequentes almejam impugnar a alínea j), dada como provada. Do facto dado como provado na alínea j) da Fundamentação de Facto, constante da Sentença, ora objecto de recurso:
Em 09.06.2021, o valor em dívida pelos executados à exequente era de € 26.528,45, sendo € 18.876,31, a título de capital, e € 7.357,83, a título de juros de mora.
D. No TOTAL, os exequentes liquidaram a quantia de €125.733,73 ou caso não sej a considerado o valor da caução prestada pelos executados, deverá considerar-se o valor de €101.867,78. O valor da execução dos presentes autos, cifra-se no valor de € 90.139,27 (noventa mil cento e trinta e nove euros e vinte e sete cêntimos).
E. Art. 640°, n° 1, ai b): Meios probatórios que impunham decisão diversa:

DA PROVA DOCUMENTAL:

F. Resulta do teor do documento n° 1junto com os Embargos de Executado Supervenientes, que em 27/06/2019, os executados transferiram para a conta da Sr." Agente de Execução da exequente a quantia de €74.422,95 (quarenta e quatro mil quatrocentos e vinte e dois euros e noventa e cinco cêntimos).
G. Ademais, resulta do documento n" 2 junto com os Embargos de Executado Supervenientes, que desde 19/05/2016 até 05/09/2018 os executados têm vindo a efectuar pagamentos por conta da dívida exequenda, e transferiram para a exequente, a quantia total de €27.444,83 (vinte e sete mil quatrocentos e quarenta e quatro euros e oitenta e três cêntimos), através da conta n° 40273681257 nomeadamente: i. € 70,00 em 19/05/2016; ii. € 60,00 em 08/09/2016; iii. € 10.834,83 em 31110/2016; iv. € 750,00 em 01112/2016; v. € 1.000,00 em 23/12/2016; vi. € 1.000,00 em 29/05/2016; vii.f 700,00 em 02/0112017; viii. € 1.200,00 em 1110112017;
ix. € 1.000,00 em 16/03/2017; x. € 500,00 em 18/03/2017; xi. € 30,00 em 22/05/2017; xii.f 300,00 em 13/09/2017; xiii. € 10.000,00 em 05/09/2018.
H. Assim sendo, no total, os executados liquidaram a quantia de €101.867,78 (cento e um mil oitocentos e sessenta e sete euros e setenta e oito cêntimos), cfr. doe. n° 1 e 2 junto com os Embargos de Executado Supervenientes.
I. Resulta do documento n° 3 que o valor total de honorários de Advogado e Agente de Execução junto com os Embargos de Executado Supervenientes, datado de 22/03/201~ que o valor total de honorários e TODAS as despesas foram fixadas em €101.867,78 (cento e um mil oitocentos e sessenta e sete euros e setenta e oito cêntimos).
J. Vislumbra-se através do doe. n° 3, nomeadamente na secção "da responsabilidade dos executados"que o valor em dívida é de €101.867,78, e denota-se que em momento anterior à apresentação da nota final do Sr. Agente de Execução, os executados haviam liquidado já a quantia de €101.867,78.
K. Posteriormente, {no dia seguinte} - em 23/03/2019 a nota descriminativa dos executados foi rectificada pela Ex.ma Sr." Agente de Execução, por existir lapso da mesma, passando a constar como dívida exequenda da responsabilidade dos executados - aqui recorrentes -, o montante de € 101.373,70 (cento e um mil trezentos e setenta e três euros e setenta cêntimos), cfr. documento n° 4 junto com os Embargos Supervenientes.
L. Após a apresentação da conta final, denota-se que o valor devido pelos executados cifrava-se em € 101.373,70 (cento e um mil trezentos e setenta e três euros e setenta cêntimos). Na verdade, os recorrentes haviam transferido em excesso, a quantia de € 494,08 (quatrocentos e noventa e quatro euros e oito cêntimos), tendo em conta os valores liquidados melhor ido no doe. n° 1 e 2, supra mencionados junto com os Embargos Supervenientes.
M.A Sr. a Agente de Execução no decurso da audiência realizada, foi solicitada à Sr." Agente de Execução para apresentar uma nota descriminativa devidamente resctificada, pelo que a Sr. a Agente de Execução apresentou nos autos uma nota discriminativa em 14/06/2021 no montante de €112.SS0,07 (cento e doze mil quinhentos e cinquenta euros e sete cêntimos).
N. Ou seja, em 23/03/2019 a nota discriminativa apresentada pela Sr. Agente de Execução cifrava-se no montante de € 101.373,70 (cento e um mil trezentos e setenta e três euros e setenta cêntimos). E, em 14/06/2021 a nota discriminativa apresentava o valor de €112.550,07 (cento e doze mil quinhentos e cinquenta euros e sete cêntimos). Entre 23/03/2019 e 14/06/2021, o valor da dívida aumentou €11.176,36 (onze mil cento e setenta e seis euros e trinta e seis cêntimos), considerando que os exequentes haviam liquidado o valor total da dívida.
O. Poderemos vislumbrar na nota discriminativa - datada de 14/06/2021 ¬que os exequentes reclamam a quantia de €9.977,76 (nove mil novecentos e setenta e sete euros e setenta e seis cêntimos) a título de honorários do I. Mandatário.
P. Salvo melhor opinião, os executados, aqui Recorrentes não são responsáveis pelo pagamento dos honorários ao ilustre Mandatária dos executados. Não há lugar ao pagamento de honorários a Mandatário dos executados da parte contrária, pois que, entendimento contrário seria inconstitucional.
Q. Em boa verdade, seria totalmente incompreensível que ao mesmo tempo que estabeleceu um regime apertado - e submetido a juízos de equidade do julgador - para a reclamação de honorários em sede de indemnização por litigância de má fé, o legislador deixasse porta aberta para que qualquer parte em acção judicial reclamasse os honorários que muito bem lhe aprouvesse, fosse os da acção em que estivesse a litigar, fosse os de quaisquer outras acções, mesmo que na ausência de conduta censurável ou censurada da contraparte.
R. Por do título executivo não se encontrar determinado o valor, certo, líquido e exigível a título de honorários de mandatário, o mesmo é insuficiente para que os presentes autos possam prosseguir. Devendo, deste modo, ser impedido a exequibilidade do pedido de pagamento de honorários peticionado pelo I. Mandatária dos executados.
s. A exequente e executados contrataram que: "( ... ) A TERCEIRA interveniente A. F., constitui, a favor da CAIXA ..., hipoteca sobre o prédio urbano atrás identificado. ( ... ) e: a) Despesas, incluídas as com honorários de Mandatário dos executadoss ou outros mandatários feitas ou a fazer pela Caixa ..., para assegurar ou haver os seus créditos e o cumprimento das cláusulas do presente ato e respetivo documento complementar, g que para efeitos de registo se computam em três mil e seiscentos euros" (sublinhado e carregado nosso!)
T. Na realidade, tal montante contratado de € 3.600,00 (três mil e seiscentos euros) consignado na escritura de mútuo celebrado entre as partes, não foi peticionado no requerimento executivo!!!
u. O título executivo não prevê o pagamento de honorários certos, líquidos e exigíveis.
Pelo que, não deverão os executados, aqui recorrentes proceder ao pagamento de honorários do Ilustre Mandatária dos executados, pois que, os mesmos não foram peticionados à luz do contrato de mútuo com hipoteca e fiança celebrado entre as partes, - vide pág. 4, cfr. documento n° 1 junto com o RE (requerimento executivo), e que aqui se dá por integralmente reproduzido:
v. Como poderá a exequente exigir a quantia de €9.977,76 (nove mil novecentos e setenta e sete euros e setenta e seis cêntimos) a título de honorários do I. Mandatário, quando foi contratualizado pelas partes através de Escritura de Mútuo com Hipoteca, a quantia de €3.600,OO (três mil e seiscentos euros) com as despesas com honorários de Mandatário dos executadoss, para assegurar ou haver os seus créditos e o incumprimento das cláusulas do contrato de mútuo celebrado entre as partes?
w. SUBSIDIARIAMENTE, e sem prejuízo, caso assim não se entenda, e só por mero dever de patrocínio se concede, Caso seja, o entendimento do Doutíssimo Tribunal ad quem que os executados serão obrigados a proceder ao pagamento de honorários do ilustre Mandatária dos executados, então, apenas os executados serão responsáveis no pagamento de € 3.600,00 (três mil e seiscentos euros), cfr. fora estipulado pelas partes - vide documento n° 1 do RE. Pelo que foi esse montante acordado entre as partes ¬cfr. art. 405° do Código Civil ["PP. DA LIBERDADE CONTRATUAL], e não outro, conforme vem a exequente peticionar, no montante de € 8.112,00, acrescido de IV A ¬€9.977,76 (nove mil novecentos e setenta e sete euros e setenta e seis cêntimos).
x. De evidenciar que quanto a este título de honorários, verificam -se várias e manifestas discrepâncias, no sentido em que foi apresentado no dia 25/03/2019 pela exequente, aqui recorrida, na nota final aos executados, do valor total em dívida, no montante de € 101.756,84 devido pelos executados, sendo que, em 25/03/2019, em despesas e serviços do I. Mandatário dos executados, foi fixada pela exequente, a quantia de €4.504,26, cfr. documento n° 6 junto com os Embargos de Executado Supervenientes, que se junta e se dá por integralmente reproduzido:
Y. SUBSIDIARIAMENTE, e sem prejuízo, caso assim não se entenda, e só por mero dever de patrocínio se concede, em 28/0612019, o Ilustre Mandatária dos executados, aqui recorrida, apresentou nota de honorários - JÁ POSTERIORMENTE DE SER APRESENTADO O REQUERIMENTO EXECUTIV03 - em que apresentou ~ nota discriminativa dos seus honorários, no montante de € 8.112,00, acrescido de IVA - €9.977,76.
z. De facto, a exequente apresentou três (3) valores DIFERENTES reclamados a título de honorários do I. Mandatária dos executados:
AA. €3.600,OO (três mil e seiscentos eurosl com as despesas com honorários de Mandatário dos executadoss, contratualizados entre as partes para assegurar ou haver os seus créditos e o incumprimento das cláusulas do contrato de mútuo celebrado entre as partes;
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3 Requerimento executivo foi apresentado a 12/0912017
BB. €4.504,26 (quatro mil quinhentos e quatro euros e vinte e seis cêntimos), em 25/03/2019;
CC. €9.977,76 (nove mil novecentos e setenta e sete euros e setenta e seis cêntimos), em 28/06/2019
DD. Tais quantias referentes a honorários não foram peticionadas no requerimento executivo!
EE. Reclamou a Sr." Agente de Execução a quantia de €4.738,23 (quatro mil setecentos e trinta e oito euros e vinte e três cêntimos), a título de custas de parte, derivado dos seus honorários e despesas, cfr. se vislumbra através da nota discriminativa apresentado aos executados, datado de 14/06/2021.
FF. Contudo, quanto aos honorários da Sr." Agente de Execução (Honorários + Despesas + IV A), entendem os executados, aqui recorrentes que o pagamento da quantia de € 4.738,23 não é devido, porquanto, os executados beneficiam de apoio judiciário, na modalidade de "Dispensa de taxa de justiça e de mais encargos com o processo" e "Atribuição de Agente de Execução".
GG. De acordo com os documentos datados de 02-08-2019, denota-se que os executados beneficiam de apoio judiciário na modalidade de "Dispensa de taxa de justiça e de mais encargos com o processo" e "Atribuição de Agente de Execução" .
HH. Neste prisma, trazemos à colação o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, proc. n" SOO/09.7TBSRT.l.C1, relator MARIA JOÃO AREIA, de 11-07-2020, disponível em www.dgsi.pt: O executado a quem foi concedido o apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e dos encargos do processo não terá de pagar custas, não lhe podendo ser cobradas as quantias devidas a título de honorários e despesas com o agente de execução - seja pela via do seu pagamento prioritário pelo produto dos bens penhorados (art. 54r CPC), seja por reclamação do exequente a título de custas de parte arte 721°) -, não devendo ser incluídas na liquidação da responsabilidade do executado no caso de pagamento voluntário da quantia exequenda (artigo 847°).
II. Não concordam os executados, aqui recorrentes, que sejam devedores da quantia de €26.528,45 (vinte e seis mil quinhentos e vinte e oito euros e quarenta e cinco cêntimos), à data de 09.06.2021 - VIDE AL. j) DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS da fundamentação douta sentença.
JJ. - Do facto dado como provado na alínea j) da Fundamentação de Facto, constante da Sentença, ora objecto de recurso: j) Em 09.06.2021, o valor em dívida pelos executados à exequente era de € 26.528,45, sendo € 18.876,31, a título de capital, e € 7.357,83,
a título de juros de mora.
KK. Peticiona-se aos Venerandos DESEMBARGADORES, que se dê como não provado a alínea j) da fundamentação de facto, nomeadamente: j) Em 09.06.2021, o valor em dívida pelos executados à exequente era de € 26.528,45, sendo € 18.876,31, a título de capital, e € 7.357,83, a título de juros de mora.
LL. Resulta do depoimento das testemunhas que, nomeadamente pela D. M. C., que labora nas instalações da exequente, que existiam valores entregues pelos executados à exequente, que foram para despesas de contencioso, taxas de justiça, provisões de Agente de Execução, honorários do I. mandatário da exequente.
MM. Ora, tais valores não são devidos, porquanto, os executados não são responsáveis pelo pagamento de tais valores, bem como, deverão ser abatidos os valores já entregues no capital e nos juros.
NN. Por outra banda, a Sr." Agente de Execução e D. M. C. - enquanto testemunhas - depuseram com contradição nos seus depoimentos, porquanto, a determinação do valor exacto em dívida não correspondia.
00. Mais informou a Sr." Agente de Execução que foi abatendo várias despesas a título de provisões, despesas e custas, contudo, como já referido, tais valores não são devidos. Os executados beneficiam de apoio judiciário.
PP. Ao contrário do decidido, não dispunha o Tribunal a quo, elementos probatórios para ter considerado como provado, e tal como fez, a factualidade vertida na alínea j) da fundamentação de facto, e que deveria ter dado como não provado, por ausência - clara - de prova concreta e segura que a sustente, o que traduz num claro erro de julgamento, assim requerendo a sua valoração "ex novo".
QQ. Revela-se manifestamente conclusivo e até indeterminado que o Tribunal a quotenha afirmado que "Em 09.06.2021~ o valarem dívida pelos executados à exequente era de €26.528,45, sendo €18.876,31~ a título de capital, e €7.35~83~ a título de juros de mora':
RR. - Assim, face à prova produzida em sede de discussão e julgamento,
o Tribunal a quo deveria ter JULGADO COMO NÃO PROVADO, a alínea j) dos factos dados como provados. E, ser dado como provado que os executados nada devem à exequente.
SS. Com TODO O DEVIDO RESPEITO PELOS TRIBUNAIS, entendem os Recorrentes que não são devidas as quantias referentes a Custas de parte por despesas reclamadas com agente de execução (€9.977,76), Custas de parte com despesas com agente de execução (€4.738,23), e outras despesas.
TT. Dá-se por integralmente reproduzido, tudo o alegado na Impugnação da Matéria de Facto - "PROVA DOCUMENTAL", para os devidos e efeitos legais, por economia processual.
UU. A quantia de €4.738,23, e os restantes adiantamentos realizados pelos executados, encontram-se incluída na a!. j) dos factos dados como provados.
VV. Durante todo o processo, a Sr." Agente de Execução foi recebendo
dinheiro por parte dos executados, "deslocando" parte do dinheiro para pagamento de custas do processo, honorários de agente de execução, honorários do I. mandatário da exequente, taxas de justiça, despesas da penhora, etc.
WW. Contudo, cfr. se vislumbra nos presentes autos, os executados beneficiam de apoio judiciário, na modalidade de "Dispensa de taxa de justiça e de mais encargos com o processo" e "Atribuição de Agente de Execução".
XX. Gozando a parte vencedora do direito a ser reembolsada, a título de custas de parte - dos valores de taxa de justiça e a título de encargos por si pagos, incluindo as despesas do agente de execução -, se a parte vencida gozar do beneficio de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, o reembolso das taxas de Justiça pagas pelo vencedor é suportado pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infraestruturas de Justiça, I.P. (n06 do artigo 26° do Regulamento das Custas Processuais).
YY. O entendimento de que, ao executado a quem foi concedido o apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e dos encargos do processo não terá de pagar custas, não lhe podendo ser cobradas as quantias devidas a título de honorários e despesas com o agente de execução - seja pela via do seu pagamento prioritário pelo produto dos bens penhorados (art. 541 ° CPC), seja por reclamação do exequente a título de custas de parte art. 721°), não devendo ser incluídas na liquidação da responsabilidade do executado no caso de pagamento voluntário da quantia exequenda (artigo 847°) -, corresponde atualmente à jurisprudência dominante.
ZZ. ln casu, deverá ser corrigida a conta final, bem como ser alterada a al. j) dos factos dados como provados na Douta Sentença, e ser dado como provado que os valores entregues pelos executados para adiantamento de despesas, custas de parte, honorários, deverão ser desconsiderados, e serem considerados somente como capital e juros, ou seja, devendo corrigir-se a liquidação nela se eliminando os valores cobrados a título de taxa de justiça e demais honorários e despesas do Agente de execução, e restantes despesas que haja sido liquidado.
AAA. A sentença violou os artigos 13° e 20° da CRP, que postulam a igualdade e a gratuidade do serviço público, bem como, o princípio da confiança, e o respeito e garantia da efetivação dos direitos fundamentais num Estado de Direito Democrático, bem como o art. 541 ° do CPC, entre outros.
BBB. A quantia de €9.977,76 (nove mil novecentos e setenta e sete euros e setenta e seis cêntimos) e os restantes adiantamentos realizados pelos executados, encontram-se incluída na aI. j) dos factos dados como provados.
ccc. Salvo melhor opinião, os executados, aqui Recorrentes não são responsáveis pelo pagamento dos honorários ao ilustre Mandatária dos executados. Não há lugar ao pagamento de honorários a Mandatário dos executados da parte contrária, pois que, entendimento contrário seria inconstitucional.
DDD. Por do título executivo não se encontrar determinado o valor, certo, líquido e exigível a título de honorários de mandatário, o mesmo é insuficiente para que os presentes autos possam prosseguir. Devendo, deste modo, ser impedido a exequibilidade do pedido de pagamento de honorários peticionado pelo I. Mandatária dos executados.
EEE. Os executados, aqui recorrentes, impugnam na íntegra o constante da nota final de honorários e despesas apresentada pelo Ilustre Mandatária dos executados, sob o documento n° 7, junto com os Embargos Supervenientes. Pelo que se impugna na íntegra o seu valor, pelo que, além de ser indevida, peca por excesso.
FFF. Foram violados os arts. 703º e ss. do CPC, e o art. 405º do Código Civil.
E, em consequência, deverá ser revogada a Sentença recorrida, julgando¬se procedentes os pedidos formulados.
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A embargada apresentou contra-alegações e pugnou pela manutenção da decisão recorrida.

O recurso foi admitido por despacho de 10 de Janeiro de 2022, como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Questões a decidir.

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em saber:
1. da impugnação da matéria de facto.
2. da procedência dos embargos.
*
III. Fundamentação de facto.

Os factos que foram dados como provados na sentença sob recurso são os seguintes:

a) Nos autos principais, o banco exequente deu à execução os acordos, celebrados em 27 de Agosto de 2015, de acordo com o procedimento Casa Pronta, e em 25 de Dezembro de 2015, com as assinaturas autenticadas notarialmente, com, entre outros, os executados G. C. e A. F., e pelas partes apelidados, respectivamente, de mútuo com hipoteca e fiança e contrato de aditamento nos termos que melhor surgem explicitados nos textos cujas cópias constam de fls. 5v a 14 e 19 a 25 dos autos principais e cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzido;
b) Pelo primeiro acordo o banco exequente emprestou à executada ..., Limitada a quantia de € 90.000,00, nos termos que melhor surgem explicitados no texto cuja cópia consta de fls. 5v a 14 dos autos principais e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
c) Pelo dito acordo, a executada A. F. constituiu a favor da exequente uma hipoteca sobre o prédio urbano, composto de rés-do-chão, 1º e 2º andares, anexo e logradouro, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número …/19951109, da freguesia de …, concelho de Viana do Castelo, nos termos que melhor surgem explicitados no texto cuja cópia consta de fls. 5v a 14 dos autos principais e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
d) Entre outros, e nos termos do referido acordo, a hipoteca constituída destinou-se a garantir as despesas, incluídas as com honorários de advogados ou outros mandatários feitas ou a fazer pela exequente/embargada, para assegurar ou haver os seus créditos e o cumprimento das cláusulas do presente acto e respectivo documento complementar, e que para efeitos de registou se computaram em € 3.600,00, nos termos que melhor surgem explicitados no texto cuja cópia consta de fls. 5v a 14 dos autos principais e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
e) Nos termos da cláusula segunda do referido contrato de aditamento, foi “acordado e estabelecido, por conveniência e a solicitação da mutuária e perfeita concordância dos fiadores, o seguinte: (…) 1. Prorrogar o prazo do empréstimo por mais cento e vinte dias, passando o empréstimo a vigorar pelo prazo de duzentos e quarenta dias, pelo que o mesmo se vencerá no dia 23 de Abril de 2016;
f) Os executados depositaram na conta bancária à ordem aberta na exequente as seguintes quantias nas seguintes datas: (i) € 70,00 em 19.05.2016; (ii) € 60,00 em 08.09.2016; (iii) € 10.834,83 em 31.10.2016; (iv) € 750,00 em 01.12.2016; (v) € 1.000,00 em 23.12.2016; (vi) € 1.000,00 em 29.05.2016; (vii) € 700,00 em 02.01.2017; (viii) € 1.200,00 em 11.01.2017; (ix) € 1.000,00 em 16.03.2017; (x) € 500,00 em 18.03.2017; (xi) € 30,00 em 22.05.2017; (xii) € 300,00 em 13.09.2017; (xiii) € 10.000,00 em 05.09.2018;
g) A quantia de € 10.834,83, depositada no dia 31.10.2016, não foi utilizada para amortizar o valor em dívida do empréstimo em causa nos autos, sendo antes utilizada em outros gastos e despesas espelhados no extracto de fls. 11v a 13;
h) A quantia de € 10.000,00, depositada em 05.09.2018, foi imputada pela exequente pelo valor de € 6.528,47 no capital em dívida e juros de mora, pelo valor de 154,23 no seguro do imóvel e pelo valor de € 3.317,00 em despesas de contencioso (taxa de justiça, registo da penhora, provisão do agente de execução e provisão do mandatário);
i) Em 10.07.2019, a agente de execução transferiu para a exequente o valor de € 71.000,00 que foi imputado pela exequente no capital em dívida, pelo valor de € 56.651,19, e € 14.348,81, nos juros de mora;
j) Em 09.06.2021, o valor em dívida pelos executados à exequente era de € 26.528,45, sendo € 18.876,31, a título de capital, e € 7.357,83, a título de juros de mora.

2 – Factos não provados (com exclusão dos enunciados fácticos já provados por acordo, dos enunciados fácticos que apenas podem ser provados por documentos, dos enunciados de carácter conclusivo, dos enunciados fácticos irrelevantes e dos enunciados descritores de matéria de direito)
Da petição de embargos: artigos 4º, no sentido que as quantias aí referidas tenham sido entregues à exequente por conta da dívida exequenda, e 10º.
Da contestação: inexistem factos que necessitem de ser respondidos.
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IV. Do objecto do recurso.

Os recorrentes começaram por impugnar parte da matéria de facto.

Dispõe o artigo 640º do CPC, que:

1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) (…);
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”.

No caso dos autos, verifica-se que os apelantes indicam quais os factos que pretendem que sejam decididos de modo diverso, bem como os meios probatórios que na sua óptica o impõe(m), pelo que podemos concluir que cumpriram suficientemente o ónus estabelecido no citado artigo 640.º.
Assim, este presente Tribunal pode proceder à reapreciação da matéria de facto impugnada, uma vez que dispõe dos elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os factos em causa.
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Resulta das conclusões de recurso dos apelantes que estes não concordam com o facto dado como provado sob a al. J).

É a seguinte a redacção da al. J):
j) Em 09.06.2021, o valor em dívida pelos executados à exequente era de € 26.528,45, sendo € 18.876,31, a título de capital, e € 7.357,83, a título de juros de mora.”.
Pretendem os apelantes que tal facto seja eliminado e dado como não provado.
Para tal invocam que, no que a este concreto ponto respeita, no essencial, o que tem de ser atendido é ao que consta do título e requerimento executivo e não a qualquer prova que se viesse a produzir.
Mais invocam que não é possível dar-se como provado que é devido o referido valor porquanto não se descortina, sem mais, qual o valor a título de despesas e honorários com despesas de advogado, não se podendo bastar o Tribunal a quo com a mera alusão por parte de uma testemunha que os valores contidos naquele valor global compreendem as despesas tidas com o mandatário ( aludindo ao depoimento da agente de execução nos termos do qual frisou que o que está em discussão atualmente são apenas as despesas com honorários de mandatário), sem que tenha identificado, nem comprovado qualquer despesa.
Entendemos que lhe não lhes cabe razão.
Nem pelos fundamentos invocados, nem argumentando que o facto em causa espelha uma conclusão, a que se deveria chegar através de outros factos.
Em verdade, tal facto apenas poderia ter essa resposta atenta a prova produzida, nomeadamente conjugando a prova documental junta aos autos e prova testemunhal produzida em audiência de julgamento e que não foi infirmada por nenhum outro meio de prova, pois tal como ressuma da fundamentação do tribunal a quo, não estão em causa quaisquer valores referentes a despesas com honorários de mandatário judicial. Por outro lado, e se repararmos com atenção ressuma do documento de fls. 46 claramente a liquidação do capital em dívida e juros feita pela exequente, donde constam os valores seguintes e coincidentes com os valores dados como provados e confirmados pelas testemunhas M. C. e M. M.: capital: 18.876,31, juros mora: 7.357,83.
Por outro lado, e tal como realça a sentença “as testemunhas M. C. e M. M. souberam explicar o destino dos montantes depositados pelos executados e interpretar os documentos referidos, tendo, assim, respondido circunstanciada e objectivamente”, sendo certo que nenhuma das testemunhas se refere a valores pagos imputados a título de pagamento de honorários de advogado, mas sim valores pagos e imputados parte para pagamento do empréstimo e parte para pagamento dos encargos com o empréstimo.
Acresce que o depoimento da agente de execução quando a certa altura afirma que “o que está em causa é a discussão dos honorários do advogado”, é infirmado pelo requerimento da própria junto aos autos em 14-06-2021 ( posteriormente ao depoimento prestado em audiência), nos termos do qual faz uma liquidação e nota de honorários e consigna que não inclui o valor reclamado entretanto no processo principal a título de honorários de mandatário de exequente e tem em consideração nomeadamente os valores pagos pelos executados no decurso da execução à exequente e imputados e deduzidos no capital emprestado, conforme análise detalhada daquele documento ( cfr. quando se refere ao recebimentos de 6.528,47€ e 279,44€.).
Assim sendo, improcede a impugnação deduzida, uma vez que tem na sua base premissas que não se verificam in casu, como sejam os valores pedidos a título de honorários de mandatário e que não estão ali contemplados como valores em dívida.
Por tudo o exposto, improcede a impugnação de facto.
*
Vejamos finalmente se são de proceder os embargos, como pretendido pelos executados/embargantes.
Desde já, importa relembrar, que o título executivo constitui um pressuposto processual específico da execução. É ele que determina o fim e os limites da ação executiva (cfr. Lebre de Freitas, A Acção Executiva à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª Edição, pág. 43).
No entanto, para o efeito, o título executivo deve conter os requisitos necessários para, por si só, nos certificar da existência da obrigação e do direito correspondente – é o chamado princípio da suficiência do título executivo (cfr. Alberto dos Reis, in Processo de Execução, vol.I, 2ª ed., pág.174).
Os títulos executivos incorporam-se em documentos, que constituem, certificam ou provam, com base na aparência ou probabilidade, a existência da obrigação exequível, que a lei permite que sirva de base à execução, por lhe reconhecer um certo grau de certeza e de idoneidade da pretensão.
Na definição de Manuel de Andrade, citado por Amâncio Ferreira, in Curso de Processo de Execução, Almedina, 6ª ed., p. 19, o título executivo é “o documento de acto constitutivo ou certificativo de obrigações, a que a lei reconhece a eficácia de servir de base ao processo executivo (...)”.
A espécie da prestação e da execução que lhe corresponde, bem como o quantum da prestação (ou seja, a extensão e o conteúdo da obrigação do executado e, consequentemente, até onde pode ir a acção do exequente), são determinados pela análise do título executivo.
Assim, cabe ao tribunal interpretar e confrontar o requerimento executivo com o título executivo para aferir da conformidade entre os dois, considerando a necessária correspondência entre o concreto pedido da acção executiva e os limites traçados no título.
Importa desta forma, aferir da validade do título executivo, verificar se a obrigação se encontra vencida e se é exigível e líquida, confirmar se o título é dotado de força executiva e não carece de requisitos externos e, finalmente, aferir se não faltam pressupostos processuais imprescindíveis à regularidade da instância executiva.
No caso sub judicio, não havendo dúvida - nem para os embargantes/recorrentes -, de que o contrato de mútuo “dado” à execução constitui título executivo, a questão colocada nos autos circunscreve-se à de saber se ainda existem montantes peticionados a título de dívida exequenda em dívida pelo Exequente, e que decorram daquele título executivo e se o mesmo preenche os necessários requisitos para a sua exigibilidade.
Entendeu-se na sentença recorrida que “ da factualidade dada por provada resulta que inexiste qualquer quantia liquidada em excesso à exequente – circunstância factual que incumbia aos embargantes provar e que não o lograram fazer (cfr. artigo 342º, nºs. 1 e 2, do Código Civil). O que resulta daquela factualidade é precisamente o contrário: os executados ainda se encontram devedores, à data de 09.06.2021, da quantia de € 26.528,45, não se vislumbrando qualquer facto que ponha em causa a liquidação dos valores que se pretendem cobrar na execução nem qualquer imputação ilícita dos valores que foram sendo depositados na conta à ordem associada ao empréstimo contraído (cfr. Cláusula Sexta, nº 2, do Anexo I, do acordo descrito na alínea a), do ponto II.1., e artigo 785º, nº 1, do Código Civil).
Pelo que, nesta parte, os embargos improcedem.
Ora, nesta parte e não tendo ocorrido qualquer alteração à matéria de facto impugnada, nada há a alterar em termos de exigibilidade da dívida exequenda tout court.

Agora vejamos a segunda questão: da admissibilidade e exigibilidade dos honorários do mandatário da exequente.

A sentença sustentou o seguinte:

“A segunda questão a resolver prende-se com a exigibilidade dos honorários ao mandatário da exequente.
No acordo dado à execução foi previsto pelas partes a responsabilidade dos executados pelas despesas judiciais ou extrajudiciais, bem como pelos honorários de advogados ou outros mandatários para assegurar ou haver os seus créditos. Consequentemente, tais valores a terem existido na forma de despesas ou honorários, fazem parte da quantia exequenda, sendo inequívoco que a pretensão de os cobrar se encontra fundamentada pelo título executivo em causa. Quanto ao montante concreto só poderá ser apurado no final da acção executiva1, não sendo o presente incidente a sede própria para a discussão e quantificação de tais valores.”.

Salvo o devido respeito não concordamos com esta posição assumida na sentença.
Vejamos.
Como já vimos, temos assim que, no que diz respeito ao capital, juros contratuais vencidos, juros moratórios vencidos, imposto de selo e comissões, a dívida é líquida.
E o montante da mesma resulta da conjugação dos documentos dados à execução com os factos dados como provados, de onde se extrai qual a data de início do contrato, o valor mutuado, o número de prestações anuais em que teria de ser amortizado o valor mutuado, a taxa de juros contratuais e a taxa de juros de mora e ainda que, em caso de incumprimento, o contrato prevê o vencimento, na totalidade, do capital mutuado e a taxa de juros de 6%, acrescida de 4%.
Temos assim que o cálculo da quantia exequenda foi efetuado com base no título executivo e que a obrigação exequenda se encontra determinada em relação à sua quantidade, pois que os valores em causa resultam das condições contratuais aceites pelas partes outorgantes e deriva do incumprimento do contrato por parte dos executados, o que ocasionou o surgimento de diversas penalidades como sejam o vencimento de juros contratuais, moratórios, comissões e imposto de selo.
O mesmo se não poderá dizer das despesas, onde se incluem honorários do mandatário.
Como nos ensina Amâncio Ferreira, in Curso de Processo de Execução, 13.ª Edição, Almedina, 2010, pág.118 e 119 “é ilíquida, para efeitos de execução, a obrigação cujo quantitativo não se encontra ainda determinado (…)”, dando como exemplo desta modalidade de iliquidez precisamente “a obrigação de custear as despesas judiciais e os honorários de advogado, estipulada no contrato de mútuo, constante de escritura pública, para o caso de incumprimento, quando o seu montante não se encontra fixado”.
Como é sabido, abrangendo os honorários em causa o trabalho prestado pelo advogado no processo de execução, só o termo deste permite tornar exigível e líquida a prestação, pelo que, também só no final da execução é possível exigir o pagamento e determinar o quantum dos honorários a quem houver de os pagar, no caso o avalista executado.
E para suprir esta dificuldade, na senda do que preconiza a recorrente, alguma jurisprudência ( como o Ac RP de 01.03.2011), sugeriu que a solução a prosseguir deverá passar por se proceder, por analogia de situações, de modo semelhante ao estabelecido no antigo art.º 457º, nº 2 ( atual 542º,nº2) , do Código de Processo Civil, para a liquidação de honorários a considerar dentro da indemnização por litigância de má fé.
Só que, salvo o muito e devido respeito, esta solução não resolve a questão de saber se o contrato junto poderá valer como título executivo para cobrança dos referidos honorários, quando aí se não refere (nem podia referir) o seu concreto valor.
Na realidade, trata-se da necessidade de prova complementar do título, porquanto, conforme ensina LEBRE DE FREITAS (1) «a certeza e a exigibilidade da obrigação exequenda têm de se verificar antes de serem ordenadas as providências executivas», pelo que, «quando a certeza e a exigibilidade, não resultando do título, tiverem resultado de diligências anteriores à propositura da ação executiva, há que provar no processo executivo que tal aconteceu».
No caso vertente- a comprovada realização de despesas - é necessária uma atividade de prova complementar liminar do título, à qual se refere o artigo 715.º, n.ºs 1 a 4, a ter lugar no início do processo, já que - como aduz o citado autor-, os indicados números têm alcance geral, aplicando-se designadamente a todos aqueles casos em que a certeza e a exigibilidade não resultam do título executivo.
Daí no Ac desta RG de 03-05-2018, in dgsi ( relator Jorge Teixeira) se ter feito consignar em sumário:
“I-Podendo as partes contratar que, em caso de cobrança coerciva do crédito, as despesas com o advogado da exequente ficam a cargo do devedor e do avalista executados, documentando esse acordo em cláusula do contrato pelo qual celebraram um mútuo, tal documento vale, em princípio, como título executivo também relativamente à obrigação de pagamento de honorários ali constituída.
II- Todavia, quando os honorários do advogado do exequente abrangem o trabalho por ele prestado no processo de execução, só no final da execução será possível exigir o pagamento e determinar o quantum dos honorários a quem houver de os pagar.
III- E assim sendo, nas condições e no âmbito de aplicação do art.º 703, do Código de Processo Civil, aquele documento contratual particular e não autenticado não vale como título executivo relativamente à cobrança de honorários, por o seu montante não estar determinado nem ser determinável.”
Ora, in casu, o exequente não apresentou tal prova complementar e a execução prosseguiu, tendo no momento próprio os executados arguido em sede de embargos a duplicação das despesas e impugnado que as contratuais fossem devidas a título de despesas judicias e de honorários, alegação que permite o conhecimento da exigibilidade da obrigação nesta parte, por não ter sido sanada a sua falta, na contestação apresentada pela exequente.
Assim, a) se os valores estimados no contrato incluem ambos os tipos de despesa e o exequente não indicou nem comprovou qualquer despesa extrajudicial em que tenha incorrido para o cumprimento do contrato; b) se as despesas prováveis com a execução estão incluídas no cálculo efetuado pela Senhora Agente de execução ; c) e se as despesas feitas com o processo executivo, incluindo a correspondente a honorários pagos ao mandatário, conforme o Supremo Tribunal de Justiça recentemente decidiu em revista excecional ( Cfr. o Acórdão do STJ de 15-01-2019, tirado em revista excecional no processo n.º 5792/15.0TBALM.L1.S2), «apenas são passíveis de ser compensadas, a título de custas de parte, conforme previsto no Código de Processo Civil e no Regulamento das Custas Processuais», importa concluir que, ao contrário do entendimento preconizado na sentença recorrida, o contrato de mútuo dado à presente execução pelo Banco exequente, não preenche, por si só, sem necessidade de outras provas complementares, os requisitos de exequibilidade quanto às despesas peticionadas no requerimento executivo a respeito dos honorários de mandatário.( vide neste sentido, num caso semelhante, o AC da RE de 28.03.2019, in dgsi).

Dito de outro modo:
No caso dos autos, temos que tal montante se não mostra fixado.
Assim sendo, a exequente teria que especificar no requerimento inicial os valores que considerava compreendidos na prestação devida a título de despesas e concluir por um pedido líquido (artigo 716.º, n.º 1, do CPC, que corresponde parcialmente ao anterior art. 805º).
Ou seja, a especificação no requerimento inicial, em face da obrigação contratual assumida, devia espelhar a conta de despesas apresentada aos executados ou os comprovativos da sua realização, v.g. os extratos de conta que o evidenciassem ou mesmo da carta de interpelação extrajudicial para pagamento, com as quantias discriminadas.
Ora, a exequente não apresentou tal prova complementar.

Destarte, não tendo a exequente indicado ou comprovado qualquer despesa extrajudicial em que tenha incorrido para o cumprimento do contrato e se as despesas feitas com o processo executivo, incluindo a correspondente a honorários pagos ao mandatário, conforme o Supremo Tribunal de Justiça recentemente decidiu em revista excepcional, “apenas são passíveis de ser compensadas, a título de custas de parte, conforme previsto no Código de Processo Civil e no Regulamento das Custas Processuais» (Cfr. o Acórdão do STJ de 15-01-2019, tirado em revista excecional no processo n.º 5792/15.0TBALM.L1.S2), então a conclusão a que se chega é que, o contrato de mútuo dado à execução, não preenche, por si só e sem necessidade de outras provas complementares, os requisitos de exequibilidade quanto às despesas peticionadas no requerimento executivo.
E ainda que se entendesse que a exequente detinha título executivo para peticionar as referidas “despesas”, incumbia-lhe proceder pela forma estabelecida do art. 716°, nº 1 do CPC, especificando no requerimento executivo os valores que considerava compreendidos na prestação, para concluir por um pedido líquido, como acima se afirmou.
Não o tendo feito, mantém-se ilíquida a obrigação nessa parte.
Nestes termos, neste segmento, procede o recurso dos embargantes.
*
Apenas se consigna que não se apreciará a questão suscitada pelos apelantes a respeito de suportarem o pagamento das despesas prováveis com honorários do agente de execução quando beneficiam de apoio judiciário, porquanto para além de se tratar de questão nova, apenas abordada no recurso, quando os recursos apreciam decisões prolatadas, sempre se dirá que os apelantes olvidaram a regra atualmente prevista no art. 541º do Código de Processo Civil, onde se prevê que “as custas da execução, incluindo os honorários e despesas devidos ao agente de execução, apensos… saem precípuas do produto dos bens penhorados” (ou depositados).

VI. Decisão.

Perante o exposto, acordam os Juízes desta 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em:
- julgar parcialmente procedente a apelação dos executados/embargantes, em consequência do que se revoga parcialmente da sentença recorrida, julgando procedentes os deduzidos embargos à execução, quanto à quantia referente a despesas e honorários com mandatário e juros que sobre a mesma incidam, ficando o ressarcimento da exequente confinado ao restante capital e juros moratórios em dívida, conforme as taxas acordadas.

Custas da ação e da apelação por embargantes e embargada, na proporção dos respectivos decaimentos.
*
Guimarães, 17 de fevereiro de 2022
Assinado eletronicamente por:

Anizabel Sousa Pereira
Jorge dos Santos
Margarida Pinto Gomes


1 - In A ação executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 7.ª edição, Coimbra, 2017, págs. 112 e 113.