Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6364/16.7T8VNF-A.G1
Relator: ANA CRISTINA DUARTE
Descritores: DECLARAÇÕES DE PARTE
CONTRATO DE SEGURO
MEDIADOR DE SEGURO
REPRESENTAÇÃO APARENTE
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL DA SEGURADORA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/13/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- As declarações de parte podem estribar a convicção do juiz de forma auto-suficiente, assumindo um valor probatório autónomo pois encontram-se em paridade face a outros meios de prova de livre apreciação, cabendo ao juiz expor os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, designadamente, conjugando-as com as demais provas, testemunhais, documentais ou outras.
II- Se o mediador de seguros, agindo em nome do segurador (apesar de não ter poderes de representação específicos para a celebração do contrato de seguro), não entregou ao segurador a proposta de seguro subscrita pelo segurado, deve o segurador ser responsabilizado pela atuação culposa do mediador, assim se protegendo o terceiro de boa-fé e a confiança deste na legitimidade do declarante. Estamos no domínio da chamada “representação aparente”.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

A. J., por apenso à execução que lhe move “Banco X, SA”, deduziu oposição por embargos de executado pedindo que a mesma seja julgada procedente e o executado absolvido do pedido e que a exequente seja condenada como litigante de má-fé, em indemnização não inferior a € 2.500,00 e em multa a determinar pelo tribunal.
Alega, para tanto, que na sequência do processo de divórcio litigioso que correu termos no extinto Tribunal Judicial da comarca de Barcelos, sob o nº3190/07.8TBBCL, do 1º Juízo Cível, e por apenso a este, foi instaurado processo de inventário para partilha de bens em casos especiais, tendo a casa de habitação do (extinto) casal – construída no lote dado de hipoteca e para garantia do empréstimo cujo incumprimento se alega no requerimento executivo –, sido adjudicada ao, aqui, embargante/executado, por acordo. Ainda por acordo, o, aqui, embargante/executado assumiu perante a executada M. A. – ex-cônjuge –, a responsabilidade pelo pagamento integral da dívida existente perante o embargado/exequente.
Para o efeito, em momento anterior, o aludido A. J. contactou o seu gestor (Sr. S.) junto do balcão de Barcelos do embargado/exequente, relatou a situação de divórcio e partilha e questionou se o identificado “X” aceitaria que assumisse integralmente tal dívida, que ascendia a cerca de €23.000,00 (vinte e três mil euros), tendo obtido uma resposta positiva.
Em Julho ou Agosto de 2011, aquando da sua vinda a Portugal, o embargante/executado dirigiu-se a esse balcão de Barcelos, onde assinou diversos documentos relativos à assunção da dívida integral perante o mencionado “X”. Também a executada M. A. assinou documentos que a desvinculavam do crédito bancário em causa, tendo deixado de fazer parte da conta bancária.
Foi então confrontado com uma proposta/contrato de seguro (a entidade seguradora era o “X Seguros”), denominado “Seguro de Vida Individual – Crédito à Habitação”, que se mostrava preenchido pelo aludido balcão de Barcelos, contendo a assinatura do representante do embargado/exequente. Esse documento foi assinado pelo embargante/executado no dia 04 de Agosto de 2011, sendo que nele figurava como único e exclusivo tomador – por força da desvinculação daquela M. A. –, indicando-se “GP ………05” no campo destinado aos “Dados do(s) Empréstimo(s) associado a este seguro de vida”. A partir de então, o embargante/executado passou a pagar integralmente a prestação bancária do crédito que ora se discute.
Sucede que na sequência de um acidente de trabalho ocorrido na Bélgica, que determinou a sua incapacidade permanente e absoluta para o trabalho, o embargante/executado entregou junto do identificado balcão de Barcelos do embargado/exequente, em data que não consegue precisar, a documentação necessária relativa ao sinistro a fim de ser participado junto da seguradora “X Seguros”. Nesse seguimento, no dia 28 de Maio de 2015, esta entidade comunicou ao embargante/executado que o sinistro havia sido aceite. No entanto, verificou que nesta comunicação indicava-se como capital seguro o valor de €6.046,66 (seis mil e quarenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos) – que foi pago –, o que correspondia a metade do valor em dívida ao embargado/exequente (que ascendia a €12.093,32 – doze mil e noventa e três euros e trinta e dois cêntimos).
Contactado o respectivo balcão de Barcelos, mais concretamente o aludido Sr. S., este transmitiu ao embargante/executado que a proposta de seguro que havia assinado em Agosto de 2011 tinha ficado esquecida no dossier, assumindo aquele, para o embargado/exequente, a total responsabilidade pelo sucedido. Aconselhou, porém, o embargante/executado a remeter uma carta onde expusesse a situação, o que o mencionado A. J. fez no dia 04 de Novembro de 2015, tendo, entretanto, sido confrontado com a execução dos autos principais.
Contestou a exequente aceitando que exonerou a executada do empréstimo peticionado nos autos e que só a executou por lapso, tendo já desistido da execução quanto à mesma.
No mais, impugna a versão dos factos apresentada na petição inicial de oposição à execução.
Afirma, para o efeito, que a mutuária M. A. não se deslocava ao balcão de Barcelos do embargado/exequente para assinar o documento necessário à sua desvinculação do crédito bancário em referência, o que só aconteceu em Novembro de 2012 e que esta morosidade teve implicações na entrada em vigor da apólice de seguro subscrita pelo embargante/executado para garantia do empréstimo a 100%, pois a alteração de seguros, em concreto, de seguro conjunto subscrito pela mutuária e pelo aludido A. J. para um seguro exclusivo deste último, apenas poderia ocorrer assim que aquela desvinculação se encontrasse formalizada.
Apesar dessa demora, o embargado/exequente, ainda assim, submeteu a proposta de seguro, tendo a mesma sido recusada pelo motivo já indicado – não se tinha operado a desvinculação da mencionada M. A..
Face à impossibilidade de formalizar a proposta de seguro subscrita pelo embargante/executado, o embargado/exequente informou-o da referida recusa e alertou-o para a necessidade de assinar nova apólice de seguro, o que não sucedeu. Deste modo, bem sabia o embargante/executado que a apólice de seguro para garantia do empréstimo a 100%, por si assinada a 04 de Agosto de 2011, não se encontrava em vigor. A falta de assinatura de uma nova apólice de seguro, que permitisse garantir a dívida na sua totalidade, era da exclusiva responsabilidade do identificado A. J..
A apólice de seguro associada ao crédito que se discute apenas tinha uma cobertura de 50% por mutuário relativamente ao valor em dívida, pelo que em conformidade, a seguradora liquidou metade do capital em dívida.
Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou procedentes os embargos e determinou a extinção da execução, tendo a embargada/exequente sido condenada como litigante de má-fé em multa de 8 UC’s e em indemnização a favor do embargante no valor de € 2.500,00.

A embargada/exequente interpôs recurso, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes
Conclusões:

I. Tem o presente recurso por objecto a alteração da matéria de facto e de direito da sentença proferida pelo douto Tribunal a quo a fls. do processo, a qual julgando totalmente procedente a oposição à execução, por embargos, deduzida pelo Executado/Embargante A. J., determina a extinção da execução instaurada pelo Exequente Embargado e condena o Exequente, ora Recorrente, como litigante de má-fé no pagamento de multa processual fixada em 8UC e no pagamento de uma indemnização ao Embargante/Executado A. J. fixada em € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros).
II. Peticionando o Recorrido a sua absolvição do pedido executivo e a condenação do Exequente como litigante de má-fé, alega em síntese não ser responsável pela dívida exequenda, a qual entende que não foi liquidada por exclusiva responsabilidade do Exequente uma vez que:
- Na sequência de processo por divórcio litigioso a casa de habitação do extinto casal foi adjudicada, por acordo, ao aqui Recorrido, assumindo este a responsabilidade pelo pagamento integral da dívida existente perante o Exequente/aqui Recorrente;
- Mais alega que terá contactado o seu gestor de conta, (Sr. S.) junto do Balcão de Barcelos do Exequente, e, em Julho ou Agosto de 2011, dirigindo-se a esse Balcão assinou diversos documentos relativos à assunção da dívida integral perante o Banco Exequente, o que terá também feito a mutuária M. A. com vista a desvincular-se do crédito bancário em causa;
- Que foi confrontado com uma proposta/contrato de seguro (a entidade seguradora era o “X Seguros”), denominado “Seguro de Vida Individual – Crédito à Habitação”, que foi preenchido no aludido Balcão de Barcelos, contendo a assinatura do representante do Embargado/exequente, documento que o Embargante diz ter assinado no dia 04 de Agosto de 2011, passando a figurar, no mesmo, como único e exclusivo tomador – por força da desvinculação daquela M. A.;
- E que, na sequência de um acidente de trabalho ocorrido na Bélgica, o qual determinou a sua incapacidade permanente e absoluta para o trabalho, o Embargante/Executado entregou junto do identificado balcão de Barcelos a documentação necessária com vista à participação do sinistro junto da Seguradora “X Seguros”, a qual tendo aceite o sinistro veio a pagar o capital seguro no montante de € 6.046,66, correspondente a metade do valor de capital em dívida;
- Tendo contactado o balcão de Barcelos, mais concretamente o aludido Sr. S., este transmitiu ao Embargante que a proposta de seguro que havia assinado em Agosto de 2011 tinha ficado esquecido no dossier, assumindo aquele, para o Embargado/Exequente, a total responsabilidade pelo sucedido, aconselhando-o a remeter uma carta onde expusesse a situação;
- Em finais de 2015 foi contactado por uma empresa de cobranças para efectuar o pagamento do valor em dívida para com o Embargado/Exequente e, após, foi confrontado com a execução dos autos principais por cuja quantia exequenda entende não ser responsável, mas sim o Banco ora Recorrente, motivo pelo qual peticionou a respectiva condenação como litigante de má-fé.
III. Na sua contestação, o ora Recorrente, desde logo, pugnou pela total improcedência do pedido, por entender, como entende, ser a dívida exequenda certa, líquida e exigível, porquanto:
- Concedeu ao Embargante e mutuária M. A. um empréstimo no montante de € 29.927,87, cujo reembolso de capital e juros remuneratórios se convencionou em prestações, acrescidas das despesas de cobrança e nas demais condições do contrato, concedido com a finalidade de construção de habitação própria e permanente;
- Accionada a apólice de seguro associada ao empréstimo peticionado, que apenas tinha uma cobertura de 50% por mutuário relativamente ao valor em dívida, a Seguradora liquidou metade do capital em dívida;
- Sendo a cobertura da apólice do empréstimo de apenas 50% e tendo o Executado/Embargante cessado o pagamento das prestações mensais em 22/07/2015, verificou-se o incumprimento contratual que justificou o recurso à acção executiva para cobrança do valor em dívida que, à data da instauração da execução, ascendia ao montante de € 6.394,47, dos quais € 5.730,18 corresponde a capital;
- Mais alegando que a alteração de seguros, de um seguro conjunto subscrito pela Mutuária e pelo Embargante para um seguro exclusivo do Embargante apenas poderia ocorrer assim que a desvinculação da mutuária se encontrasse formalizada, o que ocorreu tão só em novembro de 2012, sendo que foi a morosidade do processo de desvinculação da mutuária que impediu a formalização da referida apólice de seguro de vida para uma cobertura de 100%;
- Porque a mutuária não se deslocava à agência bancária do Banco X, S.A sita em Barcelos a fim de assinar o documento necessário à sua desvinculação do empréstimo peticionado, a apólice não pôde ser formalizada, tendo o aqui Recorrente disso informado o Embargante e alertado para a necessidade de assinar nova apólice de seguro o que, porém, não sucedeu, pelo que sabia o Embargante que a proposta de seguro assinada em 04.08.2011 não se encontrava em vigor,
- e o ónus da falta de diligência do o Embargante em prover pela assinatura de nova apólice através da Seguradora X Seguros, Companhia de Seguros de Vida, S.A ou em qualquer outra Seguradora, apenas ao Embargante pode ser imputado;
- Mais tendo o Apelante expressamente alegado que tendo o Embargante conhecimento da necessidade de assinatura de nova apólice, e tendo cessado os pagamentos ao Exequente, originando uma situação de incumprimento, viu-se o aqui Apelante foçado a recorrer aos meios legais para se ver ressarcido da quantia que lhe é devida, pelo que ao demandar o Embargante para cobrança da dívida e ao contestar os embargos não actua de má-fé.
IV. Veio a sentença em riste a decidir que “o aqui Embargado/Exequente responde perante a identificada entidade seguradora pelos danos da falta de entrega daquela proposta de seguro (…) cabe à Seguradora “X Seguros” proceder ao pagamento do crédito ora sob execução, sem prejuízo de o Embargado/exequente responder perante tal entidade devido à sua negligência em não fazer-lhe chegar a proposta de seguro de fls. 10-12 do presente apenso”, julgou totalmente procedente a oposição à execução por embargos e, em consequência, determinou a extinção da execução instaurada pelo Embargado/Exequente, determinou o levantamento da(s) penhora(s) efectuada(s) nos autos principais e condenou o aqui Apelante como litigante de má-fé no pagamento de uma multa processual que fixou em 8UC e no pagamento de uma indemnização ao Embargante/Executado que se fixa em € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), referindo quanto a tal propósito “que o Embargado/Exequente afirmou ter adoptado um determinado comportamento (envio dessa proposta à seguradora) que, na realidade, não empreendeu sendo que, pelo recurso à via judicial procurou o Embargado, aqui Apelante, locupletar-se com cerca de € 6.400,00, à custa do património do Embargante/Embargado”.
VI. O aqui Apelante não se conforma com a decisão proferida na sua globalidade, quer:
- no que concerne à matéria factual dada como provada e não provada, impondo-se a reapreciação da prova gravada em audiência de discussão e julgamento;
- no que respeita à decisão sobre a questão de mérito;
- quer quanto à decisão sobre a questão da litigância de má fé;
- e quanto à aplicação de direito,
pelo que o presente recurso terá por objecto a sentença in totum uma vez que, salvo o devido respeito por mais douto entendimento (que é muito!), mal andou o Mmo. Juiz a quo ao proferir a decisão recorrida.
VII. Está, pois, o Apelante convicto que Vossas Excelências, reapreciando a prova constante dos autos e subsumindo a mesma às normas legais aplicáveis, tudo no mais alto e ponderado critério, não deixarão de revogar a sentença recorrida e de a substituir por uma outra que julgue improcedente a oposição à execução mediante Embargos, determine o prosseguimento da execução dos autos principais nos seus normais termos e, consequentemente, absolva o Apelante do pedido de condenação em litigante de má-fé.

D) DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADA EM AUDIÊNCIA DE DISCUSSÃO E JULGAMENTO – DECISÃO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO

VIII. Entende o Recorrente que, atenta a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, conjugada com a documentação junta aos autos, com as regras da lógica e experiência e as regras de distribuição do ónus da prova, não poderia o Tribunal a quo ter dado como provada a factualidade constante dos pontos 13, 14, 15, 16, 21, 22, 23 e 30 dos factos provados nos termos em que o fez, bem como, pelo contrário, deveria ter dado como provada, ao contrário do que fez, a factualidade constante das alíneas a), b), c), e), f), g) e h) dos factos dados como não provados na sentença em crise.
IX. Ponto 13 dos Factos Provados – “Nessa ocasião, A. N., funcionário do embargado/exequente, que o embargante/executado identificava como sendo o seu gestor de conta, transmitiu a este último que seria necessário subscrever uma nova apólice de seguro, na medida em que estava a assumir integralmente a dívida quando, até aí, a sua responsabilidade era de 50%, uma vez que dos remanescentes 50% era responsável a mencionada M. A.”;
Ponto 14 dos Factos Provados – “Em virtude do referido em 13., esse A. N. apresentou, então, ao embargante/executado, um escrito particular, denominado ‘Seguro de Vida Individual – Crédito à Habitação – Proposta de Seguro’, para que o assinasse, sendo entidade seguradora a “X Seguros” (à data denominada “X Seguros, Companhia de Seguros de Vida, S. A.”) e
Ponto 15 dos Factos Provados – “O escrito referido em 14., quando foi apresentado ao embargante/executado, mostrava-se já preenchido, constando dele, além do mais, que a pessoa segura era aquele A. J. – divorciado –, sendo titular único, que se destinava a uma cobertura de 100% do capital seguro para a pessoa segura em caso de morte/invalidez absoluta e definitiva, e que o empréstimo que lhe estava associado tinha o número “..............05”.
X. Tal factualidade alegada pelo Embargante, em sede de petição inicial, mais precisamente nos respectivos artigos 17.º a 21.º foi dada como provada pelo douto Tribunal a quo com base nas declarações de parte do Embargante, articuladas com o Documento n.º 4 junto com a oposição à execução e com o depoimento prestado pelas Testemunha A. N. (que foi subdirector do Balcão do aqui Apelante sito na Avenida da …, em Barcelos), e a Testemunha J. C. (Director de Balcão do aqui Apelante sito na Avenida ..., em Barcelos).
XI. Porém, além de tal factualidade ter resultado impugnada pela aqui Recorrente na Contestação que ofereceu, a prova testemunhal produzida e a documental existente não permite que tal factualidade possa ser dada como provada, desde logo porquanto resultou demonstrado que A. N. não actuou como gestor do Embargante e nem lhe terá apresentado a proposta de seguro junta aos autos sob Doc. 4, e quanto ao demais (assinatura da proposta já preenchida) não produziu o Embargante prova alguma pelo que tal factualidade deveria ter sido julgada não provada.
XII. Resulta, desde logo, da Proposta de Seguro junta sob Doc. 4 que a mesma terá sido apresentada pela colaboradora da entidade bancária P. M., com o número .......99 e código, .....2, colaboradora que a Testemunha J. C. identificou como a possível gestora do cliente, aqui Recorrido, àquela data.
XIII. Acresce que, pela testemunha A. N., bancário reformado que exerceu funções de subdirector da agência bancária do Banco Apelante sita na Avenida, Barcelos, (com depoimento prestado na sessão de julgamento de dia 30.10.218 e gravado no registo de prova áudio suporte digital pelas 10.45.50, localização temporal no suporte áudio entre minutos 02:54 a 03:05) foi referido ter exercido funções de subdirector do Balcão, mais tendo referido a identificada testemunha, (localização temporal da gravação no suporte áudio entre minutos 3:38 a 4:24) e localização temporal da gravação no suporte áudio aos minutos 04:40 a 07:53), conhecer o Embargante e ter tido intervenção directa apenas no primeiro empréstimo que lhe foi concedido para construção da casa, mais referindo não ter tido intervenção aquando da assunção de dívida motivada pelo divórcio do Embargante, mais esclarecendo (localização temporal da gravação no suporte áudio entre minutos a 08:09 a 08:29) e aos minutos a 08:39 a 09:55 que pese embora falasse por diversas vezes com o Embargante, os respetivos assuntos seriam tratados pelo gestor respectivo.
XIV. Esta versão factual foi confirmada pelo depoimento da Testemunha J. C., que exerce funções de Gerente na agência bancária do Banco Apelante sita na Avenida, Barcelos, (com depoimento prestado na sessão de julgamento de dia 30.10.218 e gravado no registo de prova áudio suporte digital pelas 11:50:30, localização temporal no suporte áudio entre minutos a 15:23 a 18:26) quando pela mesma é referido que, o Embargante, atendendo à sua tipologia de cliente estaria afecto, segundo crê, à gestora de clientes P. M., mais confirmando que o Sr. S. (a testemunha A. N.) estando há mais de 25 anos no Balcão era normal os clientes dirigirem-se ao mesmo, contudo, e em conformidade com o instituído o normal era que o Sr. S., tal como a Testemunha, encaminhassem os clientes para os gestores respectivos.
XV. E foi também esta versão confirmada pelo depoimento da Testemunha L. B. que exerce funções de Gestor de Cliente na agência bancária do Banco Apelante sita na Avenida, Barcelos, (com depoimento prestado na sessão de julgamento de dia 30.10.218 e gravado no registo de prova áudio suporte digital pelas 11:32:38, localização temporal no suporte áudio entre minutos 01:12 a 02:14), minutos (03:01 a 03:10) e (06:21 a 07:22) que confirmou ter sido gestor do Embargante durante algum tempo, tendo-lhe precedido nessas funções a Colega P. M..
XVI. Já no que se refere à subscrição da apólice de seguro, afirmou a Testemunha A. N. (localização temporal da gravação no suporte áudio entre minutos 12:01 a 12:31) não ter tido intervenção na mesma.
XVI. Dos depoimentos prestados e ora transcritos e do teor e assinaturas da proposta de seguro junta sob DOc. 4 se extrai que não poderia o douto Tribunal a quo ter dado como provado que a Testemunha A. N. tenha transmitido ao Embargante a necessidade de subscrever uma nova apólice de seguro, que tenha sido a Testemunha A. N. a apresentar ao Embargante a proposta de seguro para que o assinasse, e nem que a referida proposta houvesse sido apresentada já preenchida ao Embargante, até porque a Colaboradora P. M. não foi ouvida na qualidade de Testemunha para poder confirmar tal versão do Embargante, e conforme resulta de tal proposta junta sob Doc. 4 aos autos, na respectiva Declaração de Saúde, constam respostas de carácter pessoal, como é designadamente o caso do peso e altura e informação clínica que não poderiam constar caso não tivessem as mesmas sido prestadas pelo Embargante à referida Colaboradora.
XVII. Ponto 16 dos Factos Provados – “O embargante/executado apôs a sua assinatura nesse escrito no dia 04 de Agosto de 2011, tendo o embargado/exequente, na qualidade de beneficiário, assumido a incumbência de remetê-lo à entidade seguradora juntamente com a demais documentação que o instruía.”, tal factualidade não poderia, também, ser dada como provada pelo douto Tribunal a quo, termos em que o foi, precisamente porque o aqui Apelante recebeu tal proposta na qualidade de mediador de seguros, e apenas e tão só nessa qualidade poderia ter assumido a incumbência de remetê-lo à entidade seguradora, mas não na qualidade de beneficiário.
XVIII. Acresce que tal incumbência de envio da proposta de seguro à seguradora estava dependente da formalização da exoneração da mutuária M. A., o que, com devido respeito, e que é muito resultou também demonstrado pelo depoimento da Testemunha J. C., com depoimento prestado na sessão de julgamento de dia 30.10.218 e gravado no registo de prova áudio suporte digital pelas 11:50:30, localização temporal no suporte áudio entre minutos 06:04 a 09:37) do seu depoimento.
XIX. Resultando, ainda, do texto da proposta de seguro, na respectiva página 12, que “O prazo desta proposta de seguro para a sua aceitação pela X Seguros de Vida, S.A., é de 6 meses a contar da data da sua subscrição pelo(s) proponente(s), sendo que tal proposta tem data de 4 de Agosto de 2011 e a desvinculação da mutuária apenas veio a ocorrer em novembro de 2012.
XX. Ponto 21 dos Factos Provados – “Nessa ocasião, o identificado A. N. referiu ao mencionado A. J. que o escrito referido em 14. não chegou a ser enviado para a seguradora “X Seguros” e que tinha ficado esquecido no dossier.”,
Ponto 22 dos Factos Provados – “Com efeito, esse escrito nunca foi recepcionado por esta seguradora, que, assim, nunca procedeu à análise do risco que o mesmo titula, em ordem a tomar uma decisão de (não) aceitação do seguro pretendido.” E
Ponto 23 dos Factos Provados – “Na mesma ocasião, aquele A. N., apesar de assumir total responsabilidade pelo sucedido em nome do embargado/exequente, aconselhou o embargante/executado A. J. a remeter uma carta ao aludido “X”, expondo a situação.”
XXI. Com excepção do ponto 22 dos factos provados, o Tribunal a quo dá como provada tal factualidade unicamente com base nas declarações de parte do Embargante e ignorando, por completo, os depoimentos prestados pelas testemunhas, sendo que nenhuma delas, nos depoimentos prestados, confirmou a versão dos factos carreada aos autos pelo Embargante, nem confirmou, tão pouco, que em momento algum tenha havido, por banda do Banco Apelante, e concretamente pelo Sr. Subdirector A. N., assunção de responsabilidade pela caducidade da proposta de seguro subscrita pelo Embargante em 04 de Agosto de 2011 e pelo seu não envio à Seguradora e sugestão de envio de missiva expondo a situação.
XXII. Isso mesmo resulta do depoimento da Testemunha J. C., com depoimento prestado na sessão de julgamento de dia 30.10.218 e gravado no registo de prova áudio suporte digital pelas 11:50:30, localização temporal no suporte áudio entre minutos 09:43 a 10:43) do seu depoimento.
XXIII. Mais tendo a testemunha, aos minutos 11:08 a 15:23 do seu depoimento, no que concerne à alegada assunção de responsabilidade pelo Banco quanto ao sucedido, confirmado que tal nunca ocorreu.
XXIV. Por outro lado, dos mesmos depoimentos que vêm sendo identificados e supra transcritos resulta que deveria, em consequência, o Tribunal a quo ter julgado como provada a factualidade das alíneas a), b), c), e), f), g) e h), por se entenderem suficientes para infirmar a versão factual carreada pelo Embargante aos autos.
XXV. De acordo com a motivação da sentença ora em riste, com base no mesmo acervo probatório, teve o Tribunal a quo por insuficiente a prova documental e ou testemunhal produzida para o convencer da veracidade, e como tal, julgar como provada a seguinte factualidade alegada pelo Banco, aqui Apelante:
a) que a identificada M. A. – ex-cônjuge do embargante/executado A. J. – não se deslocasse à agência de Barcelos do embargado/exequente para assinar o documento necessário à sua desvinculação do empréstimo a que respeita a escritura pública referida sob o nº2, dos factos provados;
b) que a morosidade daí resultante tivesse implicações na entrada em vigor da apólice de seguro subscrita pelo embargante/executado para garantia desse empréstimo a 100%, uma vez que estava dependente da formalização da desvinculação aludida em a);
c) que a desvinculação da aludida M. A. apenas viesse a ocorrer em Novembro de 2012;
e) que essa ‘Proposta de Seguro’ tivesse sido recusada em face da desvinculação tardia da mencionada M. A.;
f) que face à impossibilidade de formalizar tal ‘Proposta de Seguro’, o embargado/exequente informasse o embargante/executado da referida recusa;
g) que, nessa ocasião, o embargado/exequente alertasse o aludido A. J. para a necessidade de assinar nova apólice de seguro, o que este não fez;
h) que o embargante/executado bem soubesse que a apólice de seguro para garantia do empréstimo a 100%, por si assinada no dia 04 de Agosto de 2011, não se encontrava em vigor.
XVI. Não se conforma o Apelante com a resposta dada pelo Tribunal a quo à matéria de facto alegada, por entender que, em face da prova testemunhal e documental produzida a mesma teria, pois, de ser julgada provada o que, importaria a final decisão no sentido da improcedência dos Embargos deduzidos, uma vez demonstrada que foi, pelo Embargado, que a responsabilidade do Embargante na ausência de subscrição de nova apólice de Seguro que cobrisse a 100% o capital do empréstimo hipotecário celebrado apenas ao mesmo foi imputável.
XVII. Em concreto, porquanto todas as testemunhas ouvidas em audiência de discussão e julgamento confirmaram que decorreram meses até que M. A. – ex-cônjuge do embargante/executado A. J. – se deslocasse à agência de Barcelos do embargado/exequente para assinar o documento necessário à sua desvinculação do empréstimo.
XVIII. Nesse sentido o depoimento da Testemunha A. N. (com depoimento prestado na sessão de julgamento de dia 30.10.2018 e gravado no registo de prova áudio suporte digital pelas 10:45:5, localização temporal no suporte áudio entre minutos 18:15 a 19:00), o depoimento da testemunha L. B. (com depoimento prestado na sessão de julgamento de dia 30.10.2018 e gravado no registo de prova áudio suporte digital pelas 11:32:38, localização temporal no suporte áudio entre minutos 11:36 a 12:11) que confirmou a morosidade do processo de desvinculação do empréstimo da mutuária M. A., e o depoimento da Testemunha J. C. (com depoimento prestado na sessão de julgamento de dia 30.10.2018 e gravado no registo de prova áudio suporte digital pelas 11:50:30, localização temporal no suporte áudio entre minutos 02:46 a 10:43), que de forma assertiva e com conhecimento dos factos, não só atenta a sua posição hierárquica de Director de Balcão, mas também fruto do contacto directo que teve com o Embargante, referiu, com relevo para a prova da matéria constante das alíneas a) a h) dos factos que o Tribunal a quo erradamente deu como não provados, ter tido conhecimento dos assuntos relacionados com o Embargante, designadamente do processo de assunção de dívida, da subscrição de nova apólice e da dependência da mesma da formalização da exoneração da dívida da ex-esposa do Embargante, da caducidade da proposta de seguro face ao tempo decorrido até que a exoneração fosse formalizada, situação que atestou ser do conhecimento do Embargante o qual chegou a ter e manter um seguro autónomo, adicional e tradicional por saber que não tinha seguro a 100%
XIX. Mais tendo a testemunha J. C. no que concerne à alegada assunção de responsabilidade pelo Banco quanto ao sucedido, aos minutos 11:08 a 15:23, confirmado não ver como poderia o Banco ter assumido uma responsabilidade que apenas ao Embargante era imputável.
XXX. Sendo que este depoimento da Testemunha J. C. e, em concreto, quanto à formalização desta proposta de seguro autónomo – plano de protecção que foi recomendado ao Embargante que mantivesse, por não estar coberta 100% do capital do seu crédito hipotecário, resulta confirmado também pelas próprias declarações de parte do Embargante, que não obstante, afirmar não saber a que respeitava tal seguro, confirma o seu pedido de cancelamento junto da Testemunha.
XXXI. Com o respeito que é devido, mal andou o Tribunal a quo ao não julgar provada factualidade constante das alíneas a), b), c), e), f), g) e h) dos factos dados como não provados na sentença em crise, valorando as declarações de parte do Embargante em detrimento dos depoimentos que validamente foram prestados pelas Testemunhas e que supra se transcreveram.
XXXII. Não desconhece o Apelante que a prova testemunhal constitui um de outros meios probatórios geradores da convicção do julgador, os quais são apreciados livremente. O certo é que as declarações de parte prestadas pelo Embargante careciam de uma apreciação mais cuidada pelo douto Tribunal a quo, atento o interesse directo e inequívoco que possui o mesmo no desfecho da lide, sobretudo quando as declarações de parte prestadas pelo Embargante não se encontram, também elas, em plena e exacta conformidade com a versão que carreou aos autos na sua petição de Embargos o que, porém, não terá feito abalar, como se entende que deveria ter feito, a credibilidade excessiva que foi pelo douto Tribunal a quo atribuída a tais declarações.
XXXIII. Em sede das suas declarações prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento, veio o Embargante dar conta que, afinal e ao invés do alegado, em Janeiro de 2011 teria subscrito no Balcão do Banco Embargante, a documentação necessária à assunção de dívida e não em Julho/ Agosto de 2011, altura em que terá subscrito documentação com vista à contratação de um novo crédito, o que resulta das declarações de parte prestadas pelo Embargante prestadas na sessão de julgamento de dia 30.10.2018 e gravadas no registo de prova áudio suporte digital pelas 10:06:32, localização temporal no suporte áudio entre minutos 20:51 a 21:30.
XXXIV. Como resulta, também, das declarações de parte do Embargante que o mesmo não desconhecia, à data em que deixou de pagar as prestações convencionadas no âmbito do seu crédito à habitação – Julho de 2015, que continuava a pagar o mesmo seguro de “catorze euros e tal” contratado, conforme resulta suas declarações aos minutos 17:44 a 18:20.
XXXV. Entende, pois, o Recorrente, com o respeito que é devido que os depoimentos prestados e supra identificados, aliados à prova documental junta e também supra identificada, impunham que o Tribunal a quo tivesse julgado provada a factualidade constante dos alíneas a), b), c), e), f), g) e h) e, assim, provado que a caducidade da proposta de seguro subscrita pelo Embargante em 04 de Agosto de 2011 não é imputável ao Banco Embargado, e ora Apelante, porquanto a mesma se ficou a dever à tardia desvinculação da mutuária M. A., e porquanto sabia o Embargante da necessidade, porque alertado pelo Banco Embargado, da necessidade de assinar nova apólice, motivo pelo qual não desconhecia este que a apólice de seguro para garantia do empréstimo a 100%, por si assinada no dia 04 de Agosto de 2011 não se encontrava em vigor, o que não poderia deixar de determinar a improcedência dos Embargos à Execução, pelo que a reapreciação da matéria de facto, nos concretos pontos supra identificados implicará, pois, diferente resposta, pelo que é convicção do Recorrente que V.as Ex. as reapreciando a prova constante dos autos e subsumindo-a às normas legais, tudo no mais alto e ponderado critério, não deixarão de revogar a sentença recorrida, substituindo-a por outra que julgue improcedentes os Embargos absolva o Embargado do pedido de condenação em litigância de má-fé.
XXXVI. Mas, mesmo que não fosse dada diferente resposta à matéria de facto, nos termos supra referidos, o que apenas por mera hipótese académica se coloca, tomando por referência a factualidade carreada aos autos pelas partes nos articulados respectivos, a factualidade dada como provada pelo Tribunal não basta à subsunção jurídica que aquele faz na sentença prolatada, e com a qual, desde já, se adianta não concordar.
XXXVII. Por escritura pública celebrada em 22 de Fevereiro de 2000, o aqui Apelante celebrou com o Embargante A. J. e a sua, então, cônjuge, M. A. um contrato de mútuo com hipoteca, através do qual lhes concedeu, solidariamente e a prazo, financiamento no montante de € 29.927,87.
XXXVIII. Aquando da celebração do contrato de mútuo com hipoteca, ainda em garantia das responsabilidades assumidas nessa escritura pelos mutuários foi exigida a subscrição de uma apólice de seguro de vida, cobrindo o risco de falecimento ou de invalidez total e/ou permanente, cujo beneficiário seria o Banco, até ao limite do que, no momento de qualquer um desses acontecimentos, lhe estiver em dívida, pelo que foi celebrado pelos mutuários um contrato de seguro de Vida Crédito à Habitação que deu origem ao Certificado n.º 09/....90 com as com as coberturas de Morte e Invalidez Total e Permanente.
XXXIX. Tendo o mutuário/segurado A. J. sofrido acidente de trabalho do qual lhe terá resultado uma incapacidade/invalidez total e permanente, uma vez participado o sinistro e aceite o mesmo pela Seguradora, veio a mesma a pagar o capital seguro em dívida na proporção de 50% em conformidade com o seguro em vigor.
XL. Em novembro de 2012, o Banco Embargado concedeu, autorizando, a exoneração da mutuária M. A., tendo o Embargante A. J. passado a assumir, a título exclusivo, as responsabilidades decorrentes do contrato de mútuo com hipoteca celebrado por escritura pública de 22 de Fevereiro de 2000.
XLI. E, sendo a cobertura da apólice do empréstimo de apenas 50% e, tendo o mutuário cessado o pagamento das prestações mensais em 22/07/2015, como ele próprio o reconhece, verificou-se, pois o incumprimento contratual e o consequente vencimento de toda a dívida, o que motivou o recurso pelo Exequente à acção executiva para cobrança do seu crédito.
XLII. Porém, não é verdade que o Banco Apelante tenha intervindo na proposta de seguro subscrita a 4 de Agosto de 2011 e intitulada “Seguro de Vida Individual – Crédito à Habitação Proposta de Seguro” e que, na qualidade de beneficiário do mesmo, tenha assumido a incumbência de remetê-lo à entidade seguradora juntamente com a demais documentação que o instruía, tal como o refere o Tribunal a quo no ponto 16 dos factos provados.
XLIII. Apesar de o Banco Apelante ter intervindo no contrato de seguro em questão na veste de beneficiário, e, nestes autos, exequente, a sentença recorrida convoca factualidade em que o Apelante interveio, mas apenas e tão só como mediador da Seguradora.
XLIV. O Banco recebeu tal proposta de seguro na qualidade de mediador de seguros ligado, e tal como resulta dessa proposta de seguro, a mesma tinha prazo de validade para a aceitação pela Seguradora de seis meses, pelo que à data da exoneração da mutuária, novembro de 2012, não mais se mostrava válida.
XLV. Sem prejuízo, cumpre esclarecer que a proposta em causa que o Embargante subscreveu por forma a figurar como titular único e pessoa segura, destinando-se à cobertura de 100% do capital em dívida, (em lugar dos 50% como sucedia na apólice n.º 09/....90) retrata uma proposta de seguro individual e não um pedido de adesão a um seguro de grupo contributivo como erradamente a qualifica o Tribunal a quo, e implica diferente enquadramento jurídico daquele que foi, pelo mesmo, efectuado.
XLVI. Nos termos do disposto no artigo 76.º do DL n.º 72/2008, de 16 de Abril que instituiu o Regime Jurídico do Contrato de Seguro, “o contrato de seguro de grupo cobre riscos de um conjunto de pessoas ligadas ao tomador do seguro por um vínculo que não seja o de segurar.”, podendo este seguro de grupo assumir uma de duas modalidades, atento o disposto no artigo 77.º do supra citado Diploma Legal, contributivo ou não contributivo, consoante o(s) segurado(s) suportem, no todo ou em parte, respectivamente, o pagamento do montante correspondente ao prémio devido pelo tomador do seguro.
XLVII. No presente caso, a proposta de seguro subscrita pelo Embargante não corresponde a um seguro de grupo (que haja sido previamente acordado entre o Banco Apelante e a Seguradora), mas sim a uma proposta para formalização de um contrato de seguro individual conforme resulta bem identificado na proposta de subscrição do seguro que se não confunde, porém, com os Boletins de Adesão que são subscritos nos casos de seguro de grupo.
XLVIII. Figurando na proposta de seguro datada de 04 de Agosto de 2011:
• como Seguradora a X Seguros – Companhia de Seguros de Vida, S.A.,;
• como Tomador de Seguro: o Embargante A. J. e não o aqui Banco Apelante como sucederia se estivéssemos na presença de um seguro de grupo.;
• como pessoa segura: o Embargante A. J.;
• e como beneficiários o, quanto ao capital seguro, ou seja, o capital em dívida do empréstimo contraído pela pessoa segura, à data da ocorrência, o aqui Banco R., Banco X, S.A., com NIPC ………; o, quanto ao capital remanescente em dívida à data da ocorrência, os herdeiros legais, em conjunto, na proporção do respectivo título sucessório.
• com a cobertura de 100% do capital seguro para a pessoa Segura, mas
• com as coberturas de Morte e Invalidez Absoluta e Definitiva, salientando-se que divergem estas das coberturas de Morte e Invalidez Total e Permanente contratadas na apólice n.º 09/....90.
XLIX. Não cabia convocar no presente caso, como o fez o Tribunal a quo, o regime dos artigos do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, doravante RJCS, aplicáveis ao seguro de grupo, em especial o disposto no artigo 88.º, n.º 1 e n.º 4, pelo que mal andou o Tribunal a quo na subsunção jurídica que fez na sentença em crise ao responsabilizar o aqui Apelante perante Seguradora e a Seguradora perante o Segurado, pelos danos não demonstrados e resultantes da alegada falta de entrega daquela proposta de seguro, para o que sempre se afiguraria necessário que tivesse a Seguradora intervindo nos presentes autos, o que não sucedeu.
L. Com o respeito que é devido, e que é muito, o Tribunal a quo extravasa os seus poderes de cognição ao determinar que cabe à Seguradora “X Seguros” proceder ao pagamento do crédito ora sob execução o que, na ausência de intervenção da Seguradora nos presentes autos, tão só poderia resultar apreciado e julgado no âmbito de uma acção movida pelo Embargante contra a Seguradora, por apenas sobre a mesma poder recair a responsabilidade pelos actos do mediador, aqui Apelante, e sem prejuízo da responsabilidade deste, enquanto mediador, perante aquela.
LI. Com efeito, ainda que na presença de um Seguro de Vida em que o beneficiário do mesmo seja o Banco Apelante, o verdadeiro interessado no pagamento das importâncias seguras é o Cliente segurado, já que, sendo aceite o sinistro, fica aquele desonerado da obrigação de pagamento do mútuo associado ao respectivo contrato de seguro.
LII. Pelo que só na medida em que a Seguradora seja condenada a pagar o valor do capital em dívida à data da ocorrência do sinistro, teria o Banco Exequente de se considerar ressarcido na medida em que receber esse montante, mas só na medida em que receber esse montante da Seguradora.
LIII. E isto porque os valores devidos pelo Embargante são-no ao abrigo do incumprimento do contrato de mútuo com hipoteca que se manteve e manteria integralmente em vigor, não fosse o seu incumprimento definitivo, independentemente do contrato de seguro celebrado para respectiva garantia.
LIV. Sendo partes no contrato de seguro a Seguradora, no caso a X Seguros, e a pessoa segura – o mutuário –, a eventual mora daquela em assumir o sinistro ou o respectivo declínio sempre deixaria intacto o contrato de mútuo celebrado com o Banco Apelante com a consequente obrigação do mutuário, aqui Recorrido, continuar a ter de satisfazer perante o Banco R. as prestações do empréstimo de que continuou devedor.
LV. Assim, e tivesse a proposta de seguro subscrita em agosto de 2011 dado lugar à emissão da correspondente apólice pela Seguradora X Seguros, S.A. e a recusa da Seguradora em assumir o sinistro, ou o retardamento nessa assunção, sempre deixaria intacto o contrato de mútuo celebrado entre o Banco Apelante e o seu mutuário, no caso o aqui Recorrido, que continuaria consequentemente, obrigado a cumprir perante o Banco as obrigações dele decorrentes sem prejuízo, claro, do seu direito de exigir da Seguradora o pagamento do que teve de ir pagando de prestações ao Banco.
LVI. O Embargante alega não ser responsável pela quantia exequenda por entender que a mesma teria resultado liquidada, no que ao capital em dívida respeita, se o Banco Exequente, enquanto mediador, tivesse remetido à Seguradora a proposta que subscreveu em 2011 e o Tribunal a quo, assente num juízo de prognose que, no caso, não pode ter lugar, considera assistir-lhe razão.
LVII. Com o respeito que é devido, entente o aqui Apelante que tal consequência jurídica não pode ser extraída no âmbito, desde logo, da produção de prova realizada nos presentes autos.
LVIII. O contrato de seguro considera-se celebrado quando o segurador aceita a proposta do tomador do seguro ou do segurado, aceitação essa que no caso não teve lugar pela X Seguros.
LIX. Normalmente, o segurador confirma que aceitou a proposta através da emissão da apólice ou de um certificado de seguro afirmando-se a este propósito no preâmbulo do RJCS que: “Apesar de não ser exigida forma especial para a celebração do contrato, bastando o mero consenso, mantém-se a obrigatoriedade de redução a escrito da apólice, a qual como documento que titula o contrato celebrado entre o tomador do seguro e a seguradora, é integrada pelas condições gerais, especiais, se as houver, e particulares acordadas.
LX. Ainda que, por hipótese, na qual se não concede, a mera subscrição da proposta pelo Embargante junto do aqui Apelante, sem a respectiva entrega da mesma à Seguradora para análise, avaliação do risco e decisão de contratar, tivesse por efeito a atribuição de plena validade e eficácia do contrato a que se reporta aquela proposta, ainda assim, tal não seria suficiente para demonstrar que a quantia exequenda teria resultado liquidada pela Seguradora tal como aventado pelo Embargante e sustentado pelo Tribunal a quo.
LXI. Atente-se que a Seguradora X Seguros aceitou o sinistro participado pelo Embargado decorrente de uma Invalidez Total e Permanente originada por um acidente de trabalho tendo, em consequência, pago 50% do capital em dívida em conformidade com a apólice de seguro em vigor.
LXII. Estivesse em vigor, ou considerando-se celebrado o contrato de seguro em conformidade com a proposta de seguro individual subscrita pelo Embargante em 04 de Agosto de 2011, e apesar de a mesma contemplar a cobertura de 100% do capital seguro para a pessoa Segura, apenas operaria no caso do sinistro participado se enquadrar nas coberturas contratadas que, no caso, seriam Morte e Invalidez Absoluta e Definitiva da pessoa segura por doença ou acidente invalidez essa que, em conformidade com a informação junta pela Seguradora aos autos, página 26 da Informação Pré-Contratual, cláusula 2.3.3 “Para efeitos desta cobertura complementar, entende-se por Invalidez Absoluta e Definitiva a incapacidade total da Pessoa Segura para o exercício de qualquer actividade, necessitando do recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para os actos básicos da vida diária, incluindo necessariamente a dependência total de terceiros para a higiene e alimentação.
LXIII. O que significa que, não resulta no âmbito dos presentes autos, provado que houvesse obrigação da Seguradora em assumir o sinistro ao abrigo das coberturas supostamente contratadas no âmbito da proposta de seguro individual subscrita pelo Embargante, muito pelo contrário, considerando que, tendo inclusive o Embargante prestado declarações de parte se mostrou uma pessoa plenamente autónoma e capaz.
LXIV. O Banco Apelante, nestes autos, exequente, para o que aqui releva, não interveio no contrato de seguro em questão na veste de beneficiário mas apenas e tão só como mediador e em representação da Seguradora.
LXV. A divida exequenda mantém-se, não se encontra liquidada, e, como refere a sentença recorrida, a ser paga, sempre o teria de ser pela Seguradora, se demonstrada a operância, eficácia e validade do seguro proposto contratar e se verificada, por aquela, a cobertura do sinistro o que não pode ser julgado no âmbito dos presentes Embargos.
LXVI. É sobre a Seguradora que recai a responsabilidade pelos actos do aqui Apelado na qualidade de mediador, sendo que nos presentes autos o Apelante apenas intervém como Exequente e beneficiário irrevogável do seguro.
LXVII. Nesta conformidade, para ver a divida paga, sempre o Embargante teria de demandar a Seguradora numa acção instaurada com vista a obter o reconhecimento eventual da responsabilidade da seguradora pela dívida exequenda e, assim, por cobro à quantia exequenda peticionada nos presentes autos, o que nunca fez, motivo pelo qual o Embargante mantém a convicção de que legitimamente lançou mão da acção executiva para cobrança do seu crédito, sendo que no âmbito da mesma e em sede de Embargos, não pode ser apreciada nem julgada, a conduta do Apelante enquanto mediador de seguros mas tão só enquanto Exequente.
LXVII. Embora a ação executiva possa comportar excertos declarativos, como é o caso da oposição à execução – configurada como uma verdadeira ação declarativa, estruturalmente autónoma, embora ligada instrumental e funcionalmente à ação executiva – e apesar da estrutura declarativa da oposição, a sentença nela proferida não visa a condenação do executado ou a definição de direitos, conduzindo tão só, na sua procedência à extinção total ou parcial da execução, pelo que, havendo título executivo idóneo, como o reconhece o douto Tribunal a quo, sendo a quantia exequenda actual, certa, liquida e exigível - uma vez resultado provado o incumprimento pelo Embargante das prestações aprazadas -, sempre deveriam os embargos improceder.

DA CONDENAÇÃO COMO LITIGANTE DE MÁ-FÉ

LXVII. Dispõe o artigo 334.º do Código Civil “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.”
LXVIII. O Embargante requereu a condenação do Banco Embargado como litigante de má-fé alegando que a inexistência de seguro válido para garantia de 100% da dívida é da responsabilidade exclusiva do Banco Exequente, caso em que teria resultado paga a quantia exequenda e que, como tal, altera e omite factos de forma deliberada não ignorando a falta de fundamento da execução que moveu ao Embargado.
LXIX. O douto Tribunal a quo entendeu que o Banco Embargado actuou com dolo ao referir ter adoptado um determinado comportamento (envio da proposta à Seguradora) que, na realidade não empreendeu, mais entendendo que pretendeu o Banco Apelante locupletar-se à custa do património do Executado.
LXX. Não pode o Banco R. conformar-se com a acusação que lhe é feita no sentido de estar a adoptar um registo processual doloso, nem a de, pela presente execução, tentar locupletar-se à custa do património do Executado, sendo que entende que a sua posição vertida na Contestação não resulta in totum infirmada pela informação que a Seguradora prestou aos presentes autos com Ref.ª 10128926 e que a cobrança do crédito exequendo com recurso à acção executiva é legítima.
LXXI. No articulado da Contestação oferecida, o Banco ora Apelante afirmou que a alteração de seguros, de um seguro conjunto subscrito pela mutuária e pelo Embargante para um seguro exclusivo do Embargante apenas poderia ocorrer assim que a desvinculação da Mutuária de encontrasse formalizada e que foi a morosidade de tal processo de desvinculação por facto imputável à mutuária que levou a que tal desvinculação apenas tivesse ocorrido em novembro de 2012 e, assim, impossibilitou a formalização da proposta de seguro subscrita pelo Embargante em 04/08/2011.
LXXII. Em face da prova documental e testemunhal produzida, já supra transcrita e que ora se dá por integralmente reproduzida, entende o Banco Apelante ter logrado provar tal alegação.
LXXIII. Mas, ainda, que assim se não entendesse, o que por mera hipótese se coloca, não poderia o Embargado ser condenado como litigante de má-fé por ter a sua oposição decaído por mera fragilidade de prova e, sobretudo, por não ter resultado provada a sua má-fé.
LXXIV. O facto de o douto Tribunal entender que o Banco não logrou convencer, nem provar – o que se não aceita - que a morosidade na desvinculação da mutuária impediu a formalização da proposta de seguro, não quer significar que tal não tenha acontecido.
LXXV. Resulta da proposta de seguro subscrita pelo Embargante em 04 de Agosto de 2011 que mesma teria um prazo de 6 meses a contar da sua subscrição para poder ser aceite pela Seguradora e da prova testemunhal produzida que tal alteração só poderia ocorrer com a formalização da exoneração da mutuária e o facto de o Tribunal a quo ter entendido que o Banco não logrou demonstrar que tal desvinculação da mutuária ocorreu apenas em Novembro de 2012, não quer significar que tal não tenha acontecido.
LXXVI. Entendendo o Banco Apelante que a sindicada reapreciação da prova gravada terá como consequência a absolvição do Banco Apelante deste pedido, por dela não resultar demonstrada má-fé deste.
LXXVII. Sem prejuízo, e não obstante a informação prestada pela Seguradora de que tal proposta não lhe foi remetida para apreciação, crê o Embargante que a mesma não poderia ser apreciada pelo Tribunal a quo para aquilatar da conduta processual do Banco enquanto mediador de seguros no âmbito dos presentes autos em que o Banco actua como Exequente, porquanto a mesma apenas poderia ter lugar em sede de acção própria movida pelo Embargante contra a Seguradora com vista a obter o reconhecimento e a condenação daquela ao pagamento da quantia exequenda, fruto do contrato de seguro invocado.
LXXVIII. Com efeito, não foi o Banco Exequente e beneficiário do seguro quem assumiu a incumbência de remeter tal proposta à Seguradora, mas sim o Banco mediador de seguros ligado, pelo que a sua actuação nessa veste apenas poderá ser apreciada e julgada em sede própria, que não no âmbito dos presentes Embargos, onde nem tão pouco teve intervenção a Seguradora como parte no contrato de seguro invocado que é e sobre quem recai a responsabilidade da actuação do aqui Apelante enquanto mediador do seguro.
LXXIX. O Banco nunca pretendeu prestar informação falsa aos presentes autos, obstruir ou atrasar o processo.
LXXX. Recorreu à acção executiva por entender actuar no exercício legítimo de um direito, uma vez que é titular de um título executivo idóneo que titula um crédito do Apelante sobre o Embargante que se revela certo, líquido e exigível e por cuja não liquidação não se entende responsável nos termos em que vem alegado pelo Embargante e, sobretudo, porquanto se encontra convicto que, estivesse o apólice de seguro em vigor nos termos pretendidos contratar com cobertura de 100% de capital, e face às coberturas escolhidas – Morte e Invalidez Absoluta e Definitiva -, não teria a Seguradora aceite o sinistro por invalidez total e permanente participado pelo que, à data, resultaria superior o capital em dívida.
LXXXI. Sendo ainda de referir, por fim, que a responsabilização e condenação da uma parte processual como litigante de má-fé só deverá ocorrer quando se demonstre, de forma manifesta e inequívoca, que a mesma agiu, conscientemente, com dolo ou negligência grave, de forma manifestamente reprovável ou que deduziu pretensão, in casu, contestação, cuja falta de fundamento não devia ignorar, conduta essa que não foi adoptada pelo Apelante nos presentes autos devendo, pois, ser revogada a decisão que condenou o Banco X, S.A. como litigante de má-fé.
LXXXII. Motivo pelo qual, e nos demais de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogada a sentença proferida e substituída por uma outra sentença que julgue totalmente improcedentes os Embargos de Executado, determinando o prosseguimento da acção executiva nos seus normais termos e revogue a decisão que condenou o Apelante como litigante de má-fé.

Termos em que, e nos mais de direito, deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogada a sentença recorrida e substituída por outra sentença que, julgando improcedentes os Embargos à Execução determine o prosseguimento da acção executiva nos seus normais termos e revogue a condenação do aqui Apelante em litigância de má-fé.
Assim, crê-se, será feita inteira e sã Justiça.

O embargante/executado contra alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.

As questões a resolver prendem-se com a impugnação da decisão de facto, com a natureza do seguro contratado e a responsabilidade do mediador perante o tomador e a seguradora. Analisa-se, ainda a questão da litigância de má-fé.

II. FUNDAMENTAÇÃO

Na sentença foram considerados os seguintes factos:

Discutida a causa, com relevo para a decisão a proferir, resultou provada a seguinte matéria de facto:
1. No âmbito do processo de execução com o nº 6364/16.7T8VFN – de que os presentes autos constituem apenso –, instaurado no dia 10 de Outubro de 2016, o, aqui embargado/exequente “X” reclama do, aqui, embargante/executado A. J. o pagamento do valor global, a essa data, de €6.394,47 (seis mil, trezentos e noventa e quatro euros e quarenta e sete cêntimos), assim discriminado: [i] capital: €5.730,18 (cinco mil, setecentos e trinta euros e dezoito cêntimos); [ii] juros de mora desde 22 de Julho de 2015 até à data da instauração da execução (sem prejuízo dos vincendos), à taxa de 2,402%: €170,52 (cento e setenta euros e cinquenta e dois cêntimos); [iii] juros desde 22 de Agosto de 2015 até à data da instauração da execução (sem prejuízo dos vincendos), à taxa de 3%: €198,17 (cento e noventa e oito euros e dezassete cêntimos); [iv] imposto de selo: €14,70 (catorze euros e setenta cêntimos); e [v] seguros: €280,90 (duzentos e oitenta euros e noventa cêntimos).
2. Subjacente à dívida exequenda está uma escritura pública, denominada ‘Mútuo com Hipoteca’, realizada no dia 22 de Fevereiro de 2000, extraída do livro de notas para escrituras diversas nº …-D, de fls.66 a fls.69, do 2º Cartório Notarial de Barcelos, a cargo da Notária M. I..
3. Dessa escritura pública faz parte integrante o documento complementar a ela anexo.
4. Na escritura referida em 2. consta que compareceram, como primeiros outorgantes, o, aqui embargante/executado A. J. – e, à data, o cônjuge M. A. – e, como segundos outorgantes, A. N. e A. R., agindo na qualidade de procuradores e em representação do, aqui, embargado/exequente “X”.
5. Nessa escritura pública os primeiros e segundos outorgantes declararam, entre o mais:
(…)
1 – Que os primeiros outorgantes solicitaram ao Banco um empréstimo no montante de SEIS MILHÕES DE ESCUDOS [correspondente ao contravalor de €29.927,87] de que se confessaram solidariamente devedores, o qual nesta data lhes foi concedido pelo prazo global de vinte e cinco anos, ao abrigo do Regime de Crédito à Habitação Bonificado (…) destinando-se à construção da sua habitação própria permanente a implantar no lote de terreno, destinado a construção urbana, designado por lote número …, do respectivo alvará de loteamento, situado no lugar …, da mencionada freguesia de ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artº …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número …/... e nela inscrito a favor do primeiro outorgante marido nos termos da inscrição ..-um, ao qual foi atribuído o valor de dez mil contos, tendo neste acto recebido a quantia de dois mil e duzentos e vinte contos, e recebendo o remanescente em tranches, que lhes serão entregues após a verificação da pontual evolução das obras, que será efectuada nos termos do documento complementar.
2 – Que o prazo de utilização do presente empréstimo é de vinte e quatro meses improrrogável, a contar da data da celebração da presente escritura, durante o qual serão pagas prestações trimestrais de juros sobre o capital efectivamente utilizado.
3 – O capital emprestado será entregue através de depósitos a serem efectuados na conta Depósito à ordem número (…) do balcão de Barcelos da titularidade dos primeiros outorgantes e na qual serão debitadas as prestações do presente empréstimo.
4 – O empréstimo entrará em período de reembolso no final do trimestre seguinte em que for utilizado todo o capital, passando a ser cobradas prestações mensais e sucessivas de capital e juros.
5 – Sem prejuízo do disposto no documento complementar a quantia mutuada, durante os primeiros seis meses de duração do contrato, vencerá juros à taxa de três vírgula nove por cento sendo a Taxa anual efectiva (TAE) de três vírgula noventa e sete por cento.
Que, igualmente sem prejuízo do disposto no documento complementar, passado o referido período de seis meses, a quantia mutuada passará a vencer juros a uma taxa que será revista semestralmente, e que há-de resultar da média aritmética dos valores diários, exceptuados os últimos dois dias úteis, da taxa “Euribor” a seis meses do mês anterior à revisão, média essa à qual são acrescidos dois vírgula vinte e cinco pontos percentuais.
6 – Todavia, nos termos e para os efeitos do disposto na cláusula oitava do documento complementar, o “spread” aplicável nos períodos subsequentes de contagem de juros, após o primeiro período de contagem de juros de seis meses, será reduzido em zero vírgula trinta e cinco pontos percentuais.
7 – Que tendo em conta o Rendimento Anual Bruto corrigido do agregado familiar, os primeiros outorgantes beneficiam durante o primeiro ano de vida do empréstimo de uma bonificação de juros de quarenta e quatro por cento, a qual é suportada pelo Estado, nos termos do documento complementar.
8 – Que em caução e garantia do bom e pontual cumprimento do presente empréstimo, e bem assim dos juros devidos calculados às taxas contratadas, que para efeitos de registo se fixa em três vírgula novecentos e setenta por cento, acrescida em caso de mora e a título de cláusula penal de quatro pontos percentuais, das despesas judiciais e extrajudiciais que para efeitos de registo se computam em duzentos e quarenta mil escudos, incluindo as que resultarem da execução do presente contrato, designadamente a soma dos prémios de seguro e das licenças, taxas, contribuições e impostos, os primeiros outorgantes constituem, pela presente escritura, a favor do BANCO representado pelos segundos outorgantes, hipoteca sobre o imóvel e todas as construções, edificações, melhoramentos e benfeitorias que no mesmo venham a ser implantadas e/ou averbadas no registo predial.
9 – Que a referida hipoteca se encontra, provisoriamente e por natureza, registada a favor do Banco pela inscrição C-um, apresentação número …. de dezassete de Janeiro, findo.
(…) – o destacado é nosso.
6. No documento complementar que integra a escritura referida em 2. estipulou-se, além do mais, que:
(…)
Cláusula Décima Quarta:
UM: O mutuário obriga-se, nos termos e para efeitos do Artigo setecentos e dois do Código Civil, a ter o imóvel hipotecado, seguro contra os riscos de perda total ou parcial (de incêndio e outros danos), devendo a respectiva apólice mencionar a existência da hipoteca constituída através da escritura de que este documento faz parte integrante, para que, em caso de sinistro, o Banco seja o beneficiário da respectiva indemnização, até ao limite do que no momento do sinistro se lhe encontrar em dívida.
DOIS: O mutuário obriga-se, ainda, a subscrever uma apólice de seguro de vida, cobrindo o risco de falecimento ou de invalidez total e/ou permanente, cujo beneficiário será o Banco, até ao limite do que, no momento de qualquer um desses acontecimentos, se lhe estiver em dívida.
TRÊS: Os seguros referidos nos números precedentes devem ser válidos durante todo o período do empréstimo, cabendo ao mutuário pagar pontualmente os respectivos prémios.
(…) – o destacado é nosso.
7. A quantia mencionada naquela escritura pública foi efectivamente emprestada pelo embargado/exequente e entregue ao embargante/executado A. J. e, à data, ao seu cônjuge M. A., mediante crédito processado na Conta de Depósitos à Ordem de que eram titulares e que se encontrava domiciliada na agência do aludido “X”.
8. O embargante/executado e a sua, então, esposa, utilizaram em proveito próprio o valor resultante desse crédito, do qual se confessaram devedores.
9. A hipoteca prevista no ponto 8. da escritura referida em 2. encontra-se registada a título definitivo a favor do embargado/exequente pela inscrição Ap. 42, de 17 de Janeiro de 2000.
10. Na sequência da dissolução, por divórcio, do casamento entre o mencionado A. J. e aquela M. A., o embargante/executado – com a anuência do embargado/exequente – assumiu a responsabilidade pelo pagamento integral da dívida a que respeita tal escritura pública, ora sob execução.
11. Assim, em Julho ou Agosto de 2011, o embargante/executado, aquando da sua vinda a Portugal – uma vez que trabalhava e residia no estrangeiro, em concreto, na Bélgica –, dirigiu-se ao balcão de Barcelos do embargado/exequente e assinou diversos documentos relativos à assunção integral da dívida aqui em causa perante a entidade bancária.
12. Para o mesmo efeito, também a aludida M. A. procedeu à assinatura de documentos destinados a desvinculá-la dessa dívida.
13. Nessa ocasião, A. N., funcionário bancário do embargado/exequente, que o embargante/executado identificava como sendo o seu gestor de conta, transmitiu a este último que seria necessário subscrever uma nova apólice de seguro, na medida em que estava a assumir integralmente a dívida quando, até aí, a sua responsabilidade era de 50%, uma vez que dos remanescentes 50% era responsável a mencionada M. A..
14. Em virtude do referido em 13., esse A. N. apresentou, então, ao embargante/executado, um escrito particular, denominado ‘Seguro de Vida Individual – Crédito à Habitação – Proposta de Seguro’, para que o assinasse, sendo entidade seguradora a “X Seguros” (à data denominada “X Seguros, Companhia de Seguros de Vida, S. A.”).
15. O escrito referido em 14., quando foi apresentado ao embargante/executado, mostrava-se já preenchido, constando dele, além do mais, que a pessoa segura era aquele A. J. – divorciado –, sendo titular único, que se destinava a uma cobertura de 100% do capital seguro para a pessoa segura em caso de morte/invalidez absoluta e definitiva, e que o empréstimo que lhe estava associado tinha o número “..............05”.
16. O embargante/executado apôs a sua assinatura nesse escrito no dia 04 de Agosto de 2011, tendo o embargado/exequente, na qualidade de beneficiário, assumido a incumbência de remetê-lo à entidade seguradora juntamente com a demais documentação que o instruía.
17. A partir daí, o identificado A. J. passou a pagar integralmente a prestação bancária respeitante ao crédito que ora está em execução e a que respeita a escritura referida em 2.
18. Na sequência de um acidente de trabalho, ocorrido na Bélgica, em data que, em concreto, não foi possível apurar, mas sempre anterior a 12 de Setembro de 2013, que determinou a incapacidade permanente e absoluta para o trabalho do embargante/executado, este dirigiu-se àquele balcão de Barcelos do embargado/exequente “X” e procedeu à entrega da documentação necessária, atinente a esse sinistro, para que fosse participado junto da seguradora “X Seguros”, como, aliás, o foi.
19. Esta entidade, por sua vez, no dia 28 de Maio de 2015, remeteu uma carta ao embargante/executado A. J., comunicando-lhe que (…) após análise criteriosa de toda a documentação recepcionada, o presente sinistro foi aceite. Consequentemente, procedemos à respectiva liquidação como abaixo indicado:
Total Capital Seguro (à data de reconhecimento da Invalidez – 12.09.2013)
6.046,66€
Capital em dívida (a pagar ao Banco)
6.046,66€
20. Uma vez que, a essa data, por conta do empréstimo a que respeita a escritura pública referida em 2., o valor em dívida ascendia a €12.093,32 (doze mil e noventa e três euros e trinta e dois cêntimos), o embargante/executado contactou com o balcão de Barcelos do embargado/exequente tendo em vista descortinar a razão pela qual a seguradora apenas assumia 50% da responsabilidade.
21. Nessa ocasião, o identificado A. N. referiu ao mencionado A. J. que o escrito referido em 14. não chegou a ser enviado para a seguradora “X Seguros” e que tinha ficado esquecido no dossier.
22. Com efeito, esse escrito nunca foi recepcionado por esta seguradora, que, assim, nunca procedeu à análise do risco que o mesmo titula, em ordem a tomar uma decisão de (não) aceitação do seguro pretendido.
23. Na mesma ocasião, aquele A. N., apesar de assumir total responsabilidade pelo sucedido em nome do embargado/exequente, aconselhou o embargante/executado A. J. a remeter uma carta ao aludido “X”, expondo a situação.
24. No dia 02 de Novembro de 2015, o embargante/executado remeteu ao embargado/exequente “X” uma carta registada com aviso de recepção – desconhecendo-se, porém, se foi recepcionada –, subordinada ao assunto ‘Falta de seguro de crédito habitação. Responsabilidade do balcão/Banco’, comunicando, entre o mais, que: (…) Em 2010 alterei o meu estado civil para divorciado. Assumi integralmente a dívida que existia. Foi comunicado ao balcão de Barcelos todo o processo de partilhas e entregue toda a documentação solicitada. Em data que não consigo precisar, foi pela minha ex-mulher assinado o respectivo documento de assunção de dívida, passando a mesma a ser da minha única a exclusiva responsabilidade. Foi por mim assinado no balcão uma proposta de seguro de Vida de Crédito à Habitação ao que julgo no ano 2011, porquanto, segundo informação prestada no balcão, havia que assegurar o montante do crédito que ia por mim ser assumido. Foi por V/ aceite a desoneração da minha ex-mulher. No ano de 2014, tendo sido declarado incapacitado para o trabalho – invalidez total e permanente – dirigi-me ao balcão de Barcelos a fim de participar o sinistro e accionar o seguro, o que veio a acontecer. No entanto, para desagrado meu, a seguradora assumiu apenas metade do valor que se encontrava em dívida. Questionado o balcão e após terem solicitado informações à seguradora, foi transmitido que só metade do capital estava seguro. Questionei o balcão que me informou que a proposta de seguro por mim assinada “ficou esquecida no dossier”. Ora a falta de seguro deve-se a erro do banco, manifestamente, o que foi por diversas vezes assumido pelo balcão, que de resto, disseram estarem disponíveis para prestar toda a colaboração relativamente à informação que vier por V/ a ser solicitada. Fui pelo mesmo balcão aconselhado a redigir esta carta. Por a responsabilidade da ausência de seguro relativamente ao crédito por mim assumido é da inteira responsabilidade do balcão de Barcelos, venho solicitar que diligenciem, com a maior brevidade possível, pelo pagamento do capital em dívida e relativo ao crédito habitação (…).
25. O embargado/exequente não respondeu à missiva referida em 24.
26. Entretanto, em finais de 2015, o embargante/executado foi contactado por uma empresa de cobranças a respeito do crédito que ora se encontra a ser discutido.
27. Nessa altura, o mencionado A. J., através da sua mandatária, deu conhecimento (via email e contactos telefónicos) do que se passava como seu crédito, designadamente, da carta referida em 24., da qual continuava a aguardar resposta.
28. No dia 22 de Setembro de 2016, o embargado/exequente remeteu ao embargante/executado uma carta registada com aviso de recepção – desconhecendo-se, porém, se foi recepcionada –, subordinada ao assunto ‘Contrato de Empréstimo n.º .....2 …………..05 datado de 22 de Fevereiro de 2000’, comunicando-lhe, além do mais, que: (…) encontram-se vencidas e não pagas, as prestações do contrato de empréstimo, identificado em assunto, pelo que a dívida decorrente do mesmo ascende, na presente data, a Euros 6.385,49 (Seis Mil, Trezentos e Oitenta e Cinco euros e Quarenta e Nove cêntimos) correspondendo: Euros 5.730,18, a capital em dívida, Euros 374,41 a juros vencidos, Euros 0,00 a imposto de selo, Euros 280,90, a despesas e outros encargos. Pela presente vimos comunicar que, ao abrigo e nos termos da Cláusula “Mora e Incumprimento”, o Banco considera resolvido o referido contrato e, consequentemente, totalmente vencido e imediatamente exigível o empréstimo concedido, pelo que irá fazer valer, em sede própria, os direitos que legitimamente lhe assistem, caso no prazo de dez dia a contar da recepção ou da devolução desta comunicação, V. Exas. não regularizarem o valor em dívida atrás mencionado (…).

Provou-se, também, que:

29. Por força da execução dos autos principais, o embargante/executado viu ser-lhe penhorado o seu imóvel, melhor identificado na escritura pública referida em 2.
30. Além disso, teve de suportar despesas com deslocações, com custas do processo e honorários da sua Ilustre Mandatária.
31. Toda esta situação causou e causa grandes incómodos e preocupações ao embargante/executado.

Factos não provados

Não se provaram outros factos com relevo para a decisão da causa, designadamente:
a) que a identificada M. A. – ex-cônjuge do embargante/executado A. J. – não se deslocasse à agência de Barcelos do embargado/exequente para assinar o documento necessário à sua desvinculação do empréstimo a que respeita a escritura pública referida sob o nº 2, dos factos provados;
b) que a morosidade daí resultante tivesse implicações na entrada em vigor da apólice de seguro subscrita pelo embargante/executado para garantia desse empréstimo a 100%, uma vez que estava dependente da formalização da desvinculação aludida em a);
c) que a desvinculação da aludida M. A. apenas viesse a ocorrer em Novembro de 2012;
d) que o embargado/exequente, não obstante o referido em a), b) e c), submetesse à entidade seguradora “X Seguros” o escrito particular referido sob o nº14, dos factos provados, denominado ‘Seguro de Vida Individual – Crédito à Habitação – Proposta de Seguro’;
e) que essa ‘Proposta de Seguro’ tivesse sido recusada em face da desvinculação tardia da mencionada M. A.;
f) que face à impossibilidade de formalizar tal ‘Proposta de Seguro’, o embargado/exequente informasse o embargante/executado da referida recusa;
g) que, nessa ocasião, o embargado/exequente alertasse o aludido A. J. para a necessidade de assinar nova apólice de seguro, o que este não fez;
h) que o embargante/executado bem soubesse que a apólice de seguro para garantia do empréstimo a 100%, por si assinada no dia 04 de Agosto de 2011, não se encontrava em vigor;
i) quaisquer outros factos para além dos descritos em sede de factualidade provada, que com os mesmos estejam em contradição ou que revelem interesse para a decisão a proferir.

A apelante discorda da decisão de facto.
Entende que os pontos 13, 14, 15, 16, 21, 22, 23 e 30 dos factos provados deveriam transitar para os factos não provados e, ao invés, o tribunal deveria ter dado como provados os factos constantes das alíneas a), b), c), e), f), g) e h) dos factos não provados.
Estes factos prendem-se com o cerne da questão, que é a de saber se o exequente se “esqueceu” de enviar à seguradora a nova proposta de seguro subscrita pelo executado (na sequência do divórcio e assunção da responsabilidade total pelo pagamento do mútuo), ou se tal proposta nunca foi enviada (ou foi enviada, mas foi recusada) em virtude da ex-mulher do executado não ter assinado tempestivamente os documentos necessários à sua desvinculação do processo, do que teria sido dado conhecimento ao executado, não tendo este, posteriormente, assinado qualquer outra proposta que pudesse ser remetida à seguradora, para alteração dos termos do seguro.
Relativamente a esta questão foi ouvido o executado, em declarações de parte e as testemunhas A. N., J. C. e L. B. (estes últimos, funcionários do Banco)
O apelante dá muito relevo ao facto de ter ficado assente que a testemunha A. N. (bancário reformado, que foi subdirector da agência sita em Barcelos) não era o gestor de conta do executado. Pensamos que se trata de um facto irrelevante. Com efeito, era com esta testemunha que o executado, quando vinha a Portugal (normalmente, uma vez por ano), tratava de todos os assuntos, apesar de, formalmente, ele não ser o seu gestor de conta. Fazia-o, porque era o funcionário mais antigo e o único que ele conhecia bem, com quem tinha tratado do empréstimo para a casa. Isto mesmo ficou provado pelos depoimentos das testemunhas referidas, funcionários do Banco, pois todos aceitaram que o “Sr. A. J., quando entrava no Balcão, por conhecimento do Sr. S., dirigia-se a ele…” e mesmo a testemunha A. N., acabou por aceitar que, tendo tratado do primeiro empréstimo e porque o Sr. A. J. só vinha a Portugal uma vez por ano e “me conhecia só a mim, muitas vezes falava comigo…eu sempre fui uma pessoa que abarquei todas as áreas do Banco…”, apesar de referir que, depois, formalmente, encaminhava para a gestora de conta (que não foi indicada como testemunha). Esta testemunha tentou esconder o seu relacionamento com o executado ou tentou minimizá-lo, o que só se pode compreender com o receio de eventuais consequências para si, como responsável pelo sucedido. Veja-se que já não se lembra de pormenores relativos ao relacionamento com o executado e a assinatura da nova proposta de seguro, mas lembra-se perfeitamente do que terá acontecido com a ex-mulher do executado e que sustenta a versão do Banco, factos contemporâneos uns dos outros, o que retira completamente a credibilidade ao seu depoimento, que resulta muito ensaiado (o mesmo aconteceu, aliás, com a testemunha J. C.). Repare-se, também, que o teor de alguns emails juntos aos autos, demonstra, sem qualquer dúvida, que esta testemunha (A. N.) estava a par de todo o processo e de toda a documentação necessária, que ele próprio pedia ao executado, iniciando o texto por “Conforme combinado…”, tendo, inclusivamente, remetido email à advogada do executado, remetendo a dita proposta de seguro. Também se pode ver pela análise de outros emails da advogada para a empresa de cobranças, que o executado e a sua advogada estavam certos que “o Sr. S., do balcão de Barcelos, encontra-se disponível para colaborar, segundo me transmitiu…”, o que tudo corrobora a versão do embargante e torna inexplicáveis os esquecimentos da testemunha.
Por outro lado, relativamente à versão do Banco de que a ex-mulher do executado teria demorado muito a desvincular-se do empréstimo, todas as testemunhas do Banco foram hesitantes “não posso precisar (quanto tempo demorou)”, “esse pormenor não me recordo (se tinham o contacto da senhora para a chamar ao Banco)”, “não lhe consigo precisar (se o processo foi rapidamente resolvido)”, “não consigo precisar porquê, mas penso que foi um processo moroso”.
Daí que, ouvidos estes depoimentos, temos que concordar com a decisão recorrida, quando refere que: “As declarações do embargante/executado A. J. assumiram inequívoco relevo para o apuramento da factualidade sob discussão. O seu relato foi espontâneo, seguro, sincero e bastante credível. Esclareceu que devido ao divórcio com a identificada M. A. – que foi co-executada nos autos principais, até o embargado/exequente “X” desistir da execução –, decidiu assumir a totalidade da dívida respeitante ao crédito a que se reporta a escritura pública de ‘Mútuo com Hipoteca’, realizada no dia 22 de Fevereiro de 2000. Para esse efeito, tratou da documentação que era necessária com a testemunha A. N. – que tinha para si como sendo o seu gestor de conta e que era o seu interlocutor na agência de Barcelos do embargado/exequente –, onde se incluiu aquela destinada à alteração do seguro de vida/invalidez, tendo em vista a cobertura de 100% da dívida, assinando o que lhe foi apresentado, para que assim fosse dado o adequado encaminhamento. Devido a um acidente de trabalho, que o deixou incapacitado, o embargante/executado tratou de participar o sinistro junto da seguradora “X Seguros”, para que garantisse o pagamento do valor em dívida, respeitante ao crédito ora sob execução. Uma vez que esta entidade apenas se propôs efectuar o pagamento de metade – e não da totalidade como era expectável –, o embargante/executado procurou saber o motivo, tendo então abordado o mencionado A. N. que, estranhando o sucedido, acabou por descobrir que a documentação do seguro para cobertura de 100% – a cargo daquele A. J. – tinha ficado “um tempo na gaveta”. Nessa ocasião, este A. N. reconheceu que o lapso era da responsabilidade do embargado/exequente, dizendo ao embargante/executado “tu teve 100% de razão”, ao mesmo tempo que o aconselhou a remeter uma carta ao “X” explicando a situação, o que fez (cfr., a respeito, a carta de fls.14-15, do presente apenso).
O discurso do embargante/executado apresentou-se verdadeiro e dotado de humildade, nele não se descortinando nenhum aspecto que se revelasse mais tendencioso, nem que revestisse carácter artificial.
A sua postura em julgamento foi genuína, evidenciadora de que procurou tão-só o esclarecimento do tribunal acerca da factualidade que se aprecia.
Não se logrou descortinar que procurasse ampliar os factos sobre que depôs.
(…)
Poder-se-á argumentar – e é legítimo que se faça – que as declarações do mencionado A. J. devem ser apreciadas com bastante precaução, pois que sendo parte nos presentes autos tem um (declarado) interesse no desfecho do processo.
Não pode deixar de reconhecer-se que, verificado que seja algum tipo de interesse, directo ou indirecto, no desfecho de qualquer causa, devem as declarações de quem se encontre nessa indicada posição merecer especiais cautelas. Não significa, no entanto, que isso possa (ou deva) retirar-se, sem mais, ou seja, aprioristicamente, credibilidade aos relatos produzidos.
É que tudo depende, como é evidente, dos termos em que as declarações são prestadas.
E se o forem de forma devidamente circunstanciada e coerente, nenhuma razão de princípio pode determinar a não atendibilidade de qualquer meio de prova previsto na lei, seja ele qual for.
No caso de que nos ocupamos, as declarações do embargante/executado foram produzidas de forma que se nos afigurou honesta e de modo concordante com a possibilidade de ocorrência de factos da natureza daqueles que descreveu.
Acresce que tais declarações não se apresentam isoladas, pois que se encontram suportadas noutros elementos probatórios.
A par destas declarações, revestiu importância o documento junto com o articulado da oposição à execução sob o nº4, a fls.10-12, do presente apenso, denominado ‘Seguro de Vida Individual – Crédito à Habitação – Proposta de Seguro’.
Trata-se, portanto, da proposta de seguro destinada à cobertura de 100% do capital, decorrente da assunção, em exclusivo, pelo embargante/executado A. J., do crédito bancário que aqui se encontra a ser discutido.
Da observação deste documento é possível constatar que foi preenchido por alguém que não o aludido A. J. (a letra do desenho da sua assinatura é bem distinta da demais), o que consente que se conclua que, tal como afirmou, o preenchimento tenha sido assegurado pelo próprio embargado/exequente “X”.
Neste sentido milita também a seguinte indicação na parte inferior de fls.12-verso: “Preenchimento pela entidade bancária / mediador de seguros”.
Daqui se infere que o embargado/exequente, para além de beneficiário do seguro em questão, actuou também nas vestes de mediador (de seguros).
E nesta última qualidade compreende-se que, tal como referiu o embargante/executado, tenha assumido a responsabilidade de tratar de toda a documentação necessária à alteração do seguro, como também de encaminhá-la para a seguradora do grupo “X Seguros”.
Ainda na parte final de fls.12-verso, consta no campo ‘colaborador’ o nome de “P. M.”, do balcão “Barcelos Avenida”, com o nº “.......99” e o código “.....2”.
Como foi elucidado pelas testemunhas A. N., L. B. e J. C. – funcionários bancários do embargado/exequente –, a mencionada P. M. tratava-se de uma assistente comercial do aludido “X”, o que vem reforçar a nossa conclusão de que este último assumiu perante o embargante/executado o encargo de providenciar pelas démarches tendentes à alteração do contrato de seguro para titular único e cobertura de 100% do capital.
Por último, alcança-se de fls.10, mais concretamente do campo ‘Dados do(s) Empréstimo(s) associados a este seguro de vida’, que o crédito a que respeita a ‘Proposta de Seguro’ de fls.10-12, do presente apenso, corresponde ao financiamento sob discussão nos presentes autos, uma vez que o número de processo coincide com aquele identificado na carta elaborada pelo embargado/exequente e junta a fls.14-verso, dos autos principais.
Sem prejuízo do que ficou já sobredito, na formação da convicção do tribunal fez-se ainda apelo ao que ditam os juízos da experiência comum e da normalidade do acontecer, aplicáveis à matéria sob apreciação.
O tribunal também teve em consideração o depoimento da testemunha A. N. (que foi subdiretor do balcão do embargado/exequente sito na Avenida ..., em Barcelos), que, de forma esforçada e notória, procurou desresponsabilizar-se do sucedido.
Esta testemunha afirmou que, devido aos seus conhecimentos técnicos, aprestava-se a esclarecer os clientes, o que também aconteceu com o embargante/executado, mas que nunca foi o seu gestor de conta – não sabendo, porém, a quem em concreto estava atribuída essa função –, razão pela qual não lhe cabia gerir o dossier daquele A. J..
A testemunha L. B. (que foi gestor do embargante/executado cerca de 2 (dois)/3 (três) anos), também declinou essa responsabilidade, na medida em que limitava-se a tratar de “assuntos corriqueiros do dia-a-dia”.
Por esse motivo, a assunção, exclusivamente pelo aludido A. J., da dívida aqui em causa e a correspondente alteração do seguro, não foi tratada pela testemunha, que acrescentou que determinados assuntos eram directamente assumidos pelo mencionado A. N. – como terá sido este caso.
Por fim, a testemunha J. C. afastou, igualmente, a sua responsabilidade nesse processo, embora tenha chegado ao seu conhecimento atentas as funções que exerce como director do balcão de Barcelos do embargado/exequente.
Esta testemunha, apesar de referir que “eu não posso precisar quem é que atendia o Sr. A. J.”, reconheceu que “o Sr. S. era a pessoa com quem o Sr. A. J. falava frequentemente”.
Tendo em atenção os relatos das testemunhas supra identificadas, deles resulta que nenhuma se dignou reconhecer como tendo sido o principal responsável nas acções que tiveram como finalidade avocar para o embargante/executado A. J. o pagamento da totalidade do crédito que se encontra a ser executado, com a consequente alteração do seguro para titular único, com cobertura de 100% do capital.
E, neste âmbito, afigurou-se-nos fantasiosa a explicação avançada pela testemunha J. C. – que, repita-se, nunca tratou de nada directamente com o embargante/executado – no sentido de ter sido o identificado A. J. que quis desvincular-se do seguro de protecção autónoma, por não pretender pagá-lo, assim cancelando a correspondente apólice – como se o embargado/exequente pudesse aceitar serenamente uma tal decisão (!).
De todo o modo, a verdade é que nenhuma das testemunhas ouvidas confirmou o argumento que o mencionado “X” apresenta na sua contestação: a morosidade na desvinculação da aludida M. A. do crédito bancário sob discussão implicou que a seguradora “X Seguros” recusasse a proposta de seguro de fls.10-12, do presente apenso, que lhe foi submetida.
Aliás, nem esta seguradora sustenta tal argumento, uma vez que, como se alcança da informação que prestou e a que alude a referência nº …., do presente apenso: (…) cabe-nos esclarecer que esta proposta de seguro nunca foi recepcionada por nós, nem recebemos nenhuma indicação do Banco ou do proponente ao seguro, colocando qualquer questão sobre a não emissão de apólice. Como não foi recepcionada por nós, não existiu qualquer análise de risco nem decisão de aceitação do seguro”.
De tudo o que fica dito, resulta que, tal como no tribunal recorrido, entendemos que as declarações de parte do embargante, conjugadas com a prova documental e com as debilidades da prova testemunhal de sentido contrário, conduziram à fixação da matéria de facto, conforme à versão pelo mesmo trazida a juízo.
Não se olvida que a apreciação que o Tribunal efectue das declarações de parte, nomeadamente, quando as mesmas sejam favoráveis à própria versão da parte que depõe (no fundo, quando se limitem a confirmar o alegado pela parte na peça processual que apresentou), não pode deixar de ser efectuada com o máximo de cautelas.
As declarações de parte, uma vez que se limitam a referir factos que são favoráveis ao depoente, não servem, por si só, para comprovar os factos referidos, sendo necessário que existam meios de prova complementares que sustentem a convicção do juiz no sentido declarado – Acórdão da Relação de Guimarães de 14/09/2017, processo n.º 167447/09.1YIPRT.G1 (relatado pela Desembargadora, aqui adjunta, Alexandra Rolim Mendes), in www.dgsi.pt.
Estas declarações deverão ser apreciadas pelo tribunal (cfr. n.º 3 do art.º 466.º do C.P.C.), a par dos outros meios de prova de apreciação livre, competindo, no entanto, pela própria natureza das mesmas, um esforço mais aturado para apurar da sua credibilidade, sobretudo quando em confronto com outra prova de sentido contrário.
Foi, também esse o entendimento que se teve no Ac. da Relação do Porto de 20.11.2014 (www.dgsi.pt), onde se refere que “…a apreciação desta prova faz-se segundo as regras normais da formação da convicção do juiz. Ora, em relação a factos que são favoráveis à procedência da acção, o juiz não pode ficar convencido apenas com um depoimento desse mesmo depoente, interessado na procedência da acção, deponha ele como “testemunha” ou preste declarações como parte, se não houver um mínimo de corroboração de outras provas… Ou seja, é necessária a corroboração de algum outro elemento de prova. A prova dos factos favoráveis aos depoentes não se pode basear apenas na simples declaração dos mesmos…”.
Contudo, entendemos que as declarações de parte podem estribar a convicção do juiz de forma auto-suficiente, assumindo um valor probatório autónomo – neste sentido, veja-se o CPC Anotado de Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, vol. I, Almedina, pág. 532 – pois encontram-se em paridade face a outros meios de prova de livre apreciação, cabendo ao juiz expor os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção (artigo 607.º, n.ºs 4 e 5 do CPC), o interesse da parte na sorte do litígio não é, muitas vezes, substancialmente distinto do da testemunha (é o caso dos autos, em que as testemunhas, todas funcionários do Banco, provavelmente, recearam os efeitos deste julgamento em sede da responsabilidade que lhes pudesse ser assacada pelo exequente) e é a parte quem, em regra, tem melhor razão de ciência.
A este propósito, e sobre a forma como devem valorar-se as declarações de parte e como as mesmas podem contribuir para a formação da convicção do julgador, veja-se o Acórdão da Relação de Lisboa, de 26 de Abril de 2017 (processo nº18591/15.0T8SNT.L1-7, relator Luís Filipe Pires de Sousa acessível em www.dgsi.pt:
“Na valoração das declarações de partes, assumem especial acutilância os seguintes parâmetros: contextualização espontânea do relato, em termos temporais, espaciais e até emocionais; existência de corroborações periféricas; produção inestruturada; descrição de cadeias de interacções; reprodução de conversações; existência de correcções espontâneas; segurança/assertividade e fundamentação; vividez e espontaneidade das declarações; reacção da parte perante perguntas inesperadas; autenticidade”.

Em face do exposto, entendemos ser de manter a decisão de facto, tal como consta da sentença recorrida, improcedendo, nesta parte, a apelação.

Cumpre, agora, analisar a questão de direito.
Não há dúvida que o exequente deu à execução, como título executivo, uma escritura pública, denominada ‘Mútuo com Hipoteca’, realizada no dia 22 de Fevereiro de 2000, da qual faz parte integrante o documento complementar a ela anexo, e que reveste a qualidade de título executivo (artigo 703.º, n.º 1, alínea b) do CPC), importando a constituição ou reconhecimento de uma obrigação, por parte, além do mais, do embargante/executado. A quantia mencionada naquela escritura pública foi efectivamente emprestada pelo embargado/exequente e entregue ao embargante/executado A. J. e, à data, ao seu cônjuge M. A., mediante crédito processado na Conta de Depósitos à Ordem de que eram titulares e que se encontrava domiciliada na agência do aludido “X”, tendo estes utilizado em proveito próprio o valor resultante desse crédito, do qual se confessaram devedores.
Aquando da celebração deste contrato de mútuo, foi exigida a subscrição de uma apólice de seguro de vida, cobrindo o risco de falecimento ou invalidez total e/ou permanente, cujo beneficiário seria o Banco, até ao limite do que, no momento de qualquer um desses acontecimentos, lhe estiver em dívida. Tal seguro foi celebrado pelos mutuários (à data, o executado e a sua ex-mulher, na proporção de metade para cada um) e, quando o mutuário sofreu acidente de trabalho de que lhe resultou incapacidade permanente e absoluta para o trabalho, uma vez participado o sinistro e aceite o mesmo pela Seguradora, esta pagou o capital seguro em dívida, na proporção de 50%, em conformidade com o seguro em vigor.
Permaneceu, portanto, em dívida o valor remanescente, que o exequente tenta cobrar com esta execução.

Ora, da prova produzida ficou demonstrado que na sequência da dissolução, por divórcio, do casamento entre o embargante/executado A. J. e M. A., o primeiro – com a anuência do embargado/exequente “X” – assumiu a responsabilidade pelo pagamento integral da dívida, tendo ambos (primitivos mutuários) assinado diversos documentos de assunção integral da dívida e desvinculação da mesma, respetivamente, e o executado assinado um escrito particular, denominado ‘Seguro de Vida Individual – Crédito à Habitação – Proposta de Seguro’ que se destinava a uma cobertura de 100% do capital seguro para a pessoa segura (o próprio executado) em caso de morte/invalidez absoluta e definitiva (o empréstimo que lhe estava associado tinha o número “..............05”), tendo o embargado/exequente, na qualidade de beneficiário, assumido a incumbência de remetê-lo à entidade seguradora juntamente com a demais documentação que o instruía.
Já sabemos que esta proposta de seguro nunca chegou à Seguradora, tendo ficado esquecida no Banco.
A questão que se coloca é a de saber se, tendo o executado feito tudo o que podia e lhe foi solicitado pelo Banco, com a assinatura de todos os documentos necessários para a assunção integral da dívida e para a celebração de novo seguro que cobrisse 100% da sua responsabilidade, pode, agora, vir a ser responsabilizado pela parte não coberta pelo seguro inicialmente contratado (50%), quando a não celebração do novo seguro se ficou a dever à inércia do Banco, que, apesar de atuar como mediador, não enviou à Seguradora os documentos respetivos, que, assim, não teve deles conhecimento.
É sabido que, baseando-se a execução em documento exarado por notário, podem ser alegados como fundamento da execução, além dos constantes do artigo 729.º, quaisquer outros (factos impeditivos, extintivos ou modificativos do direito exequendo) que possam ser invocados como defesa no processo de declaração – artigo 731.º do CPC.
Na sentença recorrida considerou-se estarmos perante um seguro de grupo contributivo, pelo que, em face do disposto no artigo 88.º, n.ºs 1 e 4 do DL n.º 72/2008 de 16/04 (Regime Jurídico do Contrato de Seguro), concluiu-se que “a proposta de seguro de fls.10-12, do presente apenso, considera-se efectuada nos termos dela constantes, 30 (trinta) dias após a sua recepção pelo embargado/exequente “X” – contados do dia 04 de Agosto de 2011 –, actuando na qualidade de tomador do seguro/mediador de seguros com poderes de representação, na medida em que não houve qualquer notificação por parte do segurador (a seguradora “X Seguros”) ao proponente A. J., aqui, embargante/executado” e que o, aqui, “embargado/exequente responde perante a identificada entidade seguradora pelos danos resultantes da falta de entrega daquela proposta de seguro”.
Concluiu-se, assim, que cabe à seguradora “X Seguros” proceder ao pagamento do crédito ora sob execução, sem prejuízo de o embargado/exequente responder perante tal entidade devido à sua negligência em não fazer-lhe chegar a proposta de seguro de fls.10-12, do presente apenso.
Apenas como parêntesis, diga-se, desde já, que nunca neste processo de embargos de executado, se podia concluir pela responsabilidade de terceiro que nem sequer foi interveniente nos autos.
Independentemente desse facto, teremos que concordar com a apelante. Não estamos, aqui, perante um seguro de grupo contributivo.
Trata-se, como resulta do próprio cabeçalho do documento em causa, de um “Seguro de vida individual – Crédito à habitação – Proposta de seguro”. O tomador do seguro e pessoa segura é uma pessoa individual – o executado – a seguradora é “X Seguros, Companhia de Seguros Vida, SA” e o beneficiário é o “Banco X, SA”, que atua, também, como mediador. O seguro em causa é relativo a uma pessoa e não a um conjunto de pessoas ligadas entre si e ao tomador do seguro por um vínculo ou interesse comum (caso em que seria um seguro de grupo) – ver sobre esta distinção José Vasques, Contrato de Seguro, Coimbra Editora, 1999, pág. 48. O segurado é a pessoa cuja vida, saúde ou integridade física se segura e o tomador é a pessoa que no contrato de seguro se responsabiliza pelo pagamento dos prémios (frequentemente é o próprio segurado que assume o papel de tomador do seguro). Não há dúvida, portanto, quanto à natureza do seguro que se pretendia contratar – trata-se de um seguro individual e não de grupo.
A questão, como já vimos, é que a proposta de seguro subscrita pelo executado e entregue ao exequente, na qualidade de beneficiário/mediador, não chegou ao conhecimento da seguradora, não tendo, por isso, tal declaração negocial, adquirido eficácia – cfr. artigo 224.º, n.º 1 do Código Civil.

Vejamos melhor.

Nos termos do disposto no artigo 30.º, n.º 3 do DL n.º 72/2008, de 16 de Abril (Regime Jurídico do Contrato de Seguro):

“3 - O contrato de seguro que o mediador de seguros, agindo em nome do segurador, celebre sem poderes específicos para o efeito é eficaz em relação a este se tiverem existido razões ponderosas, objectivamente apreciadas, tendo em conta as circunstâncias do caso, que justifiquem a confiança do tomador do seguro de boa fé na legitimidade do mediador de seguros, desde que o segurador tenha igualmente contribuído para fundar a confiança do tomador do seguro”.
Trata-se de disposição que visa proteger o tomador do seguro de boa-fé relativamente a atos do mediador de seguros que não disponha de poderes de representação específicos para a celebração do contrato de seguro que, como já observámos, era o caso dos autos, em que o mediador estava obrigado a remeter os documentos à seguradora, a fim de que esta aceitasse os seus termos.
Estamos no domínio da chamada “representação aparente”, em que “apesar da inexistência de legitimidade representativa originária ou superveniente, é ressalvada a eficácia do contrato de seguro, para proteção do terceiro de boa-fé, quando a aparência criada justifica a confiança deste na legitimidade do declarante” – Pedro Romano Martinez e outros, Lei do Contrato de Seguro Anotada, Almedina, 2016, 3.ª edição, pág. 202.
No caso em que o mediador se apresenta perante o público como gerindo os interesses do segurador, dificilmente pode ser considerado como destituído de poder de representação, sendo que o resultado será o de considerar que o agente vincula o segurador.
Haverá que averiguar da existência de “razões ponderosas, objetivamente apreciadas, tendo em conta as circunstâncias do caso, que justifiquem a confiança do tomador do seguro na legitimidade representativa do mediador de seguros: trata-se da existência de condições logísticas, administrativas, documentais ou outras que sustentam a convicção do tomador em como o mediador de seguros disporá dos poderes representativos necessários à celebração do contrato; acresce a boa-fé do tomador do seguro e ter o segurador contribuído para fundar a confiança do tomador do seguro, porque, tendo facultado determinados meios materiais, documentais ou logísticos ao mediador, não diligenciou na prevenção da ocorrência de situações em que seja legítimo ao tomador presumir os poderes de representação do mediador” – autores e obra citada, pág. 203 e 204.
Exatamente, no nosso caso, tudo conduz e justifica essa confiança do tomador na atuação do mediador.
Veja-se que o executado foi informado, ao balcão do exequente e por este, que deveria subscrever novo contrato de seguro, tendo procedido nos exatos termos que lhe foram indicados pelo mediador, que foi o seu único interlocutor nesta questão, com quem, aliás, sempre tratava de todos os assuntos conexos com o seu mútuo. Assinou todos os documentos que lhe foram apresentados para o efeito. O facto de o Banco e a Seguradora terem o mesmo nome e de aquele estar na posse de todos os documentos necessários à elaboração do seguro, justificam a confiança do tomador do seguro na legitimidade representativa do mediador de seguros. Claramente, o tomador do seguro estava de boa-fé. Assinou todos os documentos, na convicção de que tudo tinha ficado tratado, como lhe havia sido indicado pelo próprio Banco/mediador de seguros.
Veja-se que, mesmo antes da entrada em vigor do RJCS e, particularmente, deste artigo 30.º e, porque a representação aparente corresponde a um regime comum, assente no princípio da boa-fé, já a jurisprudência seguia por esta via, responsabilizando o segurador por atuação culposa do mediador, de que é exemplo o Acórdão do STJ de 01/04/2014, processo n.º 4739/03.0TVLSB.L2.S1 (Paulo Sá), in www.dgsi.pt , sustentando-se num parecer do Professor Pedro Romano Martinez
Aí se pode ler: ‘“Como escreveu Baptista Machado, o princípio da confiança é um princípio ético-jurídico fundamentalíssimo e a ordem jurídica não pode deixar de tutelar a confiança legítima baseada na conduta de outrem. Por isso, «toda a conduta, todo o agir ou interagir comunicativo, além de carrear uma pretensão de verdade ou de autenticidade (de fidelidade à própria identidade pessoal) desperta nos outros expectativas quanto à futura conduta do agente» e «todo o agir comunicativo implica uma autovinculação (uma exigência de fidelidade à pretensão que lhe é inerente), na medida em que desperta nos outros determinadas expectativas quanto a uma conduta futura.» – (RLJ, 117/233)”
Do mesmo passo, se faz alusão a um caso em tudo idêntico àquele de que nos ocupamos: “No Acórdão da Relação de Coimbra de 14 de Dezembro de 2006 (CJ, ano XXXI, Tomo V, p.113), considerou-se o segurador responsável pelo dano de confiança por o seu colaborador (mediador de seguros não exclusivo) não ter entregado a proposta de seguro recebida de um cliente. Neste caso, apesar de o segurador não ter conferido poderes de representação ao mediador de seguros e de este, por isso, não poder contratar em nome daquele, tendo em conta os princípios da boa-fé e da tutela de terceiros, considerou-se o segurador responsável, porquanto o mediador se apresentava como seu representante (embora não o sendo), tendo nisso o tomador do seguro confiado”.
Assim, a questão de que nos ocupamos haverá de ser resolvida entre o Banco/exequente/mediador e a Seguradora, ficando o executado eximido de qualquer responsabilidade, motivo pelo qual, ainda que por diferentes razões, é de confirmar a sentença recorrida que julgou extinta a execução.

Quanto à litigância de má-fé, decidiu-se bem na sentença recorrida:

“No caso dos autos, o embargado/exequente “X”, no articulado da contestação, referiu que, apesar da morosidade na desvinculação da mutuária M. A. das obrigações resultantes da escritura pública que constitui o título executivo – celebrada no dia 22 de Fevereiro de 2000 –, que se verificou apenas em Novembro de 2012, ainda assim submeteu à seguradora “X Seguros” a proposta de seguro de fls.10-12, do presente apenso, datada de 04 de Agosto de 2011. No entanto, devido a essa demora, a entidade seguradora recusou tal proposta.
Sucede que, como se apurou, a proposta aqui em referência nunca foi submetida pelo embargado/exequente à apreciação da seguradora “X Seguros” (cfr. a informação prestada por esta entidade no dia 05 de Junho de 2020, a que respeita a referência nº10128926).
Deste modo, o embargado/exequente afirmou ter adoptado um determinado comportamento (envio dessa proposta à seguradora) que, na realidade, não empreendeu.
Faltou, pois, à verdade e fê-lo dolosamente, afirmando factos cuja inveracidade não poderia ignorar, por serem do seu conhecimento, já que neles teve indesmentível intervenção.
Como tal, impõe-se que seja condenado como litigante de má-fé no pagamento de uma multa processual e de uma indemnização à parte contrária”.
Não há dúvida que a exequente/embargada alterou conscientemente a verdade dos factos, deduzindo oposição cuja falta de fundamento não podia ignorar – cfr. artigo 542.º, n.º 2, alíneas a) e b) do CPC – razão pela qual foi bem condenada como litigante de má-fé.

Improcede, assim, totalmente, a apelação, sendo de confirmar a sentença recorrida, embora com diferente fundamentação jurídica.

III. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida, embora com diferente fundamentação.
Custas pela apelante.
***
Guimarães, 13 de maio de 2021

Ana Cristina Duarte
Alexandra Rolim Mendes
Maria Purificação Carvalho