Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
589/21.0GAEPS.G1
Relator: ANTÓNIO TEIXEIRA
Descritores: CONFISSÃO INTEGRAL E SEM RESERVAS
ARREPENDIMENTO
CONTRADIÇÃO INSANÁVEL ENTRE A FUNDAMENTAÇÃO E A DECISÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/26/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I – O vício a que alude o artº 410º, nº 2, al. b), do Código de Processo Penal traduz-se no facto de se afirmar e de se negar, ao mesmo tempo, uma coisa ou a emissão de duas proposições contraditórias que não podem ser simultaneamente verdadeiras e falsas, entendendo-se como proposições contraditórias as que tendo o mesmo sujeito e o mesmo atributo diferem na quantidade ou na qualidade.
II – Para tais fins, constitui contradição apenas e só aquela que, como expressamente se postula, se apresente como insanável, irredutível, que não possa ser ultrapassada com recurso à decisão recorrida no seu todo, por si só ou com o auxílio das regras de experiência.
III - Só existe, pois, contradição insanável da fundamentação quando, de acordo com um raciocínio lógico, seja de concluir que essa fundamentação justifica uma decisão precisamente oposta ou quando, segundo o mesmo tipo de raciocínio, se possa concluir que a decisão não fica esclarecida de forma suficiente, dada a colisão entre os fundamentos invocados.
IV - A verificação do arrependimento de um arguido não constitui efeito automático da existência de confissão integral e sem reservas, bem podendo dizer-se que, não raras vezes, em situações em que a prova da culpabilidade é manifesta (como sucede nos casos de flagrante delito), a asserção da sua verificação apenas significa mera "estratégia de defesa", nem sempre correspondendo à interiorização da censurabilidade do ilícito criminal praticado e do sério propósito revelado pelo agente de que, no futuro, não reiterará a conduta criminosa.
V - Na situação em apreço, não configura qualquer contradição, nos termos do citado artº 410º, nº 2, al. b), do Código de Processo Penal, a circunstância de o tribunal a quo ter dado como assente que o arguido “confessou integralmente e sem reservas a prática dos factos” e de, em sede de fundamentação, ter referido que o mesmo “não assumiu espontaneamente qualquer arrependimento”.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

1. No âmbito do Processo Especial Sumário nº 589/21.0GAEPS, do Juízo de Competência Genérica de Esposende, Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, foi submetido a julgamento o arguido:
P. J., casado, filho de M. J. e de N. R., natural de Moçambique, nascido a - de Janeiro de 1971, residente na Travessa …, Esposende.
1.1. E, nessa sequência, em 25/11/2021 foi proferida a sentença que consta de fls. 55/61, depositada no dia 26/11/2021, da qual se extrai o seguinte dispositivo (transcrição (1)):

“Pelo exposto, decide-se julgar procedente a acusação pública e, em consequência:

a) Condenar o arguido P. J. pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292º, nº 1 do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão.
b) Condena-se o arguido na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 20 (vinte) meses.
c) Condenar o arguido nas custas da acção penal, com taxa de justiça que se fixa em 2 UC´S, nos termos do disposto nos artigos 513º, nº 1, do Código de Processo Penal e 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais e tabela III em anexo, ficando a taxa de justiça devida reduzida a metade, mercê da confissão integral e sem reservas.
(...)”.
*
2. Inconformado com tal decisão, dela veio o arguido interpor o presente recurso, que consta de fls. 73 / 83 vº, cuja motivação é rematada pelas seguintes conclusões e petitório (transcrição):

“I. A sentença recorrida não valorizou os aspetos positivos que abonam a favor do arguido.
II. A sentença recorrida enferma de erro notório e contradição insanável, ao dar como provado que o arguido “confessou integralmente e sem reservas a prática dos factos”, para posteriormente, em manifesta contradição, referir que o arguido “não assumiu espontaneamente qualquer arrependimento”.
III. É entendimento da jurisprudência que a confissão integral e sem reservas configura, salvo atos demonstrativos de perceção contrária, manifesto arrependimento.
IV. O Arguido demonstrou arrependimento ao confessar integralmente e sem reservas os factos pelos quais estava acusado.
V. Tal confissão constitui verdadeiro ato demonstrativo de arrependimento e assunção da responsabilidade pelo ato ilícito praticado e possui a virtualidade de fazer diminuir de forma acentuada, a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
VI. A sentença recorrida enferma em erro notório na apreciação da prova, pois deveria ter considerado como provado que o arguido demonstrou arrependimento e postura crítica em relação à sua conduta.
VII. Tal circunstância atenuante, abonatória a favor do arguido, teria influência decisiva na determinação do tipo de pena aplicar e da sua concreta medida.
VIII. A sentença recorrida deveria ser no sentido de aplicar ao arguido pena de multa, em substituição de pena privativa de liberdade.
IX. A pena não privativa da liberdade é sempre aconselhável e, no caso concreto, está apta a satisfazer as necessidades de prevenção geral e especial, tendo em conta as circunstâncias atenuantes a favor do arguido.
X. O grau de alcoolémia apresentado pelo arguido não é excessivamente elevado, o comportamento do arguido não pôs em perigo terceiros, muito menos esteve envolvido em acidente de viação.
XI. O arguido revelou arrependimento pela sua conduta.
XII. Este arrependimento não foi relevado, inexplicavelmente, pelo juiz “a quo”, com claro prejuízo consequencial, sem razões objetivas e subjetivas para tal.
XIII. O arguido demonstrou uma conduta exemplar, social e profissional, sendo um dos grandes suportes financeiros do agregado familiar, sendo de concluir que a simples pena de multa realiza de forma adequada e suficiente as finalidades de punição.
XIV. A pena de prisão aplicada ao Arguido é manifestamente exagerada e desajustada.
XV. Deve proceder-se à substituição da pena de prisão aplicada para pena de multa e à redução da sanção acessória de inibição para conduzir para um período que não exceda 12 meses.
XVI. Em alternativa, deve proceder-se à redução da pena de prisão para um período que não exceda 3 (três) meses, suspensa na sua execução por igual período, sendo esta sanção apta a satisfazer de forma suficiente as necessidades de prevenção geral e especial.
XVII. A sentença recorrida não teve em consideração a culpa do agente e as circunstâncias que pudessem depor favor do agente, nos termos do artº 71º, do Código Penal.
XVIII. A sentença à quo, ao não considerar o arrependimento manifestado pelo Arguido/Recorrente, exclui tal circunstância favorável ao Arguido na determinação do tipo e medida da pena.
XIX. Os 8 meses de prisão impostos ao arguido situam-se muito próximo do limite máximo de 12 meses, pelo que são exagerados, tendo em consideração as circunstâncias atenuantes que a seu favor devem depor.
XX. A pena a aplicar ao arguido deverá ser suspensa na sua execução.
XXI. A simples censura e ameaça da prisão são suficientes para prevenir a ocorrência de novos crimes praticados pelo arguido.
XXII. Estão verificados os pressupostos elencados no artº. 50º. do Código Penal, para que o Arguido possa beneficiar da suspensão da execução da pena de prisão.
XXIII. Além disso, o Arguido celebrou recentemente contrato de trabalho e a privação da sua liberdade ou a impossibilidade de conduzir terão como consequência o fim da relação laboral.
XXIV. O grau de ilicitude, no presente caso, sempre deverá ser considerado moderado, atenta a taxa de álcool, a hora e local onde o arguido conduzia o seu veículo, fazendo-o perto da sua área de residência, em via onde o tráfego rodoviário era diminuto, muito perto da meia-noite de um dia de Outono, sem colocar terceiros em perigo.
XXV. A determinação da pena acessória terá por base os mesmos critérios que serviram de base à determinação da pena principal e, neste contexto, importará referi que o critério principal será o da prevenção geral, com vista a impedir que o Arguido/Recorrente possa continuar a conduzir sob efeito de álcool, finalidade que se alcançará pela aplicação de sanção acessória situada nos 12 meses.
XXVI. No que toca á suspensão da execução da pena principal, estão verificados os pressupostos formais e materiais: pena inferior a 3 anos de prisão e a verificação, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do caso, de um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do arguido no futuro.
XXVII. O arguido, ao confessar os factos integralmente e sem reservas, revelou arrependimento e postura crítica em relação à sua conduta, de onde se conclui pelo aludido prognóstico favorável em relação a comportamentos futuros.
XXVIII. A isso há a acrescentar o facto de o arguido se encontrar familiar, social e profissionalmente inserido.
XXIX. Tais circunstâncias estão aptas a aconselhar a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao Arguido.
XXX. A pena de prisão aplicada ao Arguido/Recorrente deverá ser reduzida para o máximo de 3 meses, suspensa na sua execução.
XXXI. A pena acessória deverá ser reduzida para o período de 12 (doze) meses de inibição de conduzir.
XXXII. Deverá a sentença recorrida ser substituída por outra que condene o Arguido/Recorrente pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292º, nº 1 do Código Penal, na pena de 3 (três) meses de prisão; na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 12 (doze) meses; e que suspenda a execução da pena de prisão pelo mesmo período de 3 (três meses).

Termos em que, nos melhores de direito e sempre com o mui douto suprimento de V.as Ex.as, sem prejuízo de outras conclusões que resultem das alegações supra e que aqui se consideram reproduzidas para todos os efeitos legais, deve ser revogada a decisão proferida e da qual se recorre, aplicando-se uma outra, nos termos contidos nas alegações e conclusões do presente recurso, como é de JUSTIÇA.”.
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3. Na 1ª instância o Ministério Público respondeu ao recurso, nos termos constantes de fls. 89/90, pugnando pela sua improcedência, e pela manutenção da decisão RECORIDDA.
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4. O Exmo. Procurador-Geral Ajunto junto deste tribunal da Relação emitiu o douto parecer que consta de fls. 95 / 98 Vº, pronunciando-se, também, pela improcedência do recurso, adiantando pertinentes considerações jurídicas acerca das questões controvertidas.
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5. Cumprido o disposto no Artº 417º, nº 2, do C.P.Penal (2), não foi apresentada qualquer resposta.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

1. Como se sabe, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente dos vícios indicados no Artº 410º, nº 2, do C.P.Penal.

Assim sendo, no caso vertente, da leitura e análise das conclusões apresentadas pelo recorrente, são as seguintes as questões que importa dirimir:

- Do erro notório na apreciação da prova e da contradição insanável;
- Da natureza e da medida da pena principal, bem como da excessibilidade da pena acessória de proibição de conduzir; e
- Da (não) suspensão da execução da pena de prisão.
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2. Mas, para uma melhor compreensão das questões colocadas e uma visão exacta do que está em causa, vejamos, antes de mais, quais os factos que o Tribunal a quo deu como provados e não provados, e bem assim a fundamentação acerca de tal factualidade.

2.1. O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos (transcrição):

“1. No dia - de outubro de 2021, cerca das 23h32m, o arguido conduziu na Avenida … o veículo ligeiro de passageiros de matrícula VX.
2. Na sequência de uma operação de fiscalização aleatória de trânsito, foi submetido ao exame de pesquisa ao álcool no sangue, pelo método de ar expirado, através do equipamento “Drager Alcotest 7110 MK III”, tendo apresentado uma taxa de álcool no sangue de 2,09 g/l, que deduzido o erro máximo admissível corresponde a uma taxa de álcool no sangue de, pelo menos 1,923 g/l.
3. O arguido cometeu os factos supra descritos de forma livre, voluntária e consciente, ciente de que havia ingerido bebidas alcoólicas, bem sabendo que não podia conduzir aquele veículo em tais condições.
4. Confessou integralmente e sem reservas a prática dos factos.
5. O arguido é casado.
6. Ganha o salário mínimo nacional.
7. Vive em casa própria, com a mulher, e filhos de 18 e de 16 anos, estudantes.
8. Paga prestações de créditos pessoais que totalizam 250 euros mensais
9. Concluiu o 12º ano, concluído o ano passado.
10. O teor do certificado de registo criminal de fls. 23 a 35, que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
11. O arguido é natural de Moçambique e oriundo de família de recursos socioeconómicos humildes, é o mais novo de cinco filhos e à data do nascimento a mãe era doméstica e o pai trabalhava na área da pecuária. Cresceu num ambiente de afetividade e apoio mútuo. Em 1976, aos 5 anos de idade, veio com os irmãos para Portugal na sequência da guerra do ultramar, tendo ficado a residir em casa de uma tia paterna no Concelho de .... O arguido efectuou o seu percurso escolar em escolas do ensino básico e secundário do Concelho de ..., e desistido da escola quando frequentava o 11º ano. Nessa altura frequentou um curso técnico desenhador de construções mecânicas, curso com caráter profissionalizante organizado pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional.
12. No ano transato concluiu o 12º ano de escolaridade através de um curso de Educação e Formação para Adultos (EFA) de dupla certificação (nível IV) de técnico de comunicação e serviço digital na X - Associação Comercial e Industrial do Concelho de ....
13. Aos 21 anos de idade iniciou atividade laboral como técnico desenhador de construções mecânicas tendo trabalho durante cerca de dez anos para empresas ligadas à produção de componentes metálicos na área da ortopedia, de peças de corte a lazer e da indústria automóvel no distrito do Porto. Depois esteve mais dez anos a trabalhar para uma empresa na área da fundição para a indústria automóvel no concelho da Maia. Por volta do ano de 2015, devido às despesas que tinha de deslocação do Concelho de ..., onde residia, para o concelho da Maia, optou por sair da empresa onde trabalhava e optou por ficar a trabalhar no Concelho de .... Esteve alguns meses a trabalhar como operador de máquinas para a Y – Condutores Elétricos, S. A., uma empresa de cablagens de alta tensão, empresa que não lhe renovou o contrato. Seguiram-se cerca de três anos de desemprego, e em 2018/2019 voltou a trabalhar para uma empresa de corte de laser em Vila do Conde, empresa que também não lhe renovou contrato, pelo que voltou a ficar novamente desempregado. Seguiu-se um período em que esteve a beneficiar de rendimento social de inserção e frequentou formação profissional.
14. P. J. contraiu matrimónio em 2000 e desse relacionamento tem duas filhas, atualmente com 16 e 18 anos de idade.
15. Em 2001, na sequência de herança que recebeu do progenitor, adquiriu a habitação onde tem vindo a residir até ao presente com o seu agregado familiar.
16. Há cerca de cinco meses começou a trabalhar como operário para a M. Reciclagem, uma empresa de recolha e transporte de resíduos industriais sediada em Esposende, tendo celebrado um contrato de trabalho por seis meses, auferindo o salário mínimo nacional. Aos sábados tem por hábito fazer alguns biscates, aproveitando os domingos para descansar e conviver com familiares e amigos. Para a economia do agregado também contribuiu o salário do cônjuge que trabalha como operária fabril numa empresa do setor têxtil e que aufere o mesmo montante salarial. Como despesas fixas mensais o arguido assinala 250,00 euros referentes a dois créditos pessoais que contraiu, e cerca de 165,00 euros com água, luz, gás e um pacote de telecomunicações, encontrando-se a devolver 30,00 euros por mês à segurança social devido ao recebimento indevido de um montante de subsídio de desemprego.
17. Relativamente ao consumo de bebidas alcoólicas, o arguido refere que apenas bebe maiores quantidades de bebidas alcoólicas socialmente, nomeadamente em contextos de convívio como festas e jantares com familiares e amigos, sinalizando consumos moderados às refeições. Perante os antecedentes criminais e nova acusação tende a expressar com desculpabilização assente em alegadas circunstâncias externas.”.
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2.2. Considerou inexistirem factos não provados.
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2.3. E motivou a essa decisão de facto nos seguintes moldes (transcrição):

“O Tribunal deu como assente a matéria de facto supra elencada com base na confissão integral e sem reservas do arguido.
O arguido não assumiu espontaneamente qualquer arrependimento.
Não revelou qualquer motivo atendível para a prática do acto de condução após ter ingerido bebidas alcoólicas, descrevendo, até, o acto de conduzir nas referidas condições como um impulso.
Teve-se em conta o talão de fls. 7, onde consta a TAS apresentada pelo arguido.
No que toca às condições socio-económicas, foram tomadas em consideração as próprias declarações do arguido, prestadas, nesta parte, de forma credível e sem que outra prova em contrário se haja produzido, e bem assim, o relatório social junto sob a referência 12221660.
No que concerne aos antecedentes criminais atendeu-se ao CRC junto a fls. 23 a 25.”.
*
3. Posto isto, passemos, então, à análise das concretas questões suscitadas pela arguida no seu recurso, as quais serão apreciadas segundo a sua precedência lógica.
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3.1. Do erro notório na apreciação da prova e da contradição insanável

Nos termos do disposto no Artº 428º os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito.
No que concerne à matéria de facto, a mesma pode ser sindicada por duas vias: no âmbito restrito, no que se convencionou chamar de “revista alargada”, mediante a arguição dos vícios decisórios previstos no Artº 410º, nº 2, ou por via da impugnação ampla a que se reporta o Artº 412º, nºs. 3, 4 e 6, caso em que a apreciação se alarga à análise do que se contém e pode extrair da prova produzida em audiência.
Na situação em apreço, como se viu, de acordo com as conclusões do recorrente, nesta vertente insurge-se este, em síntese, contra a sentença recorrida, sustentando que, ao dar como provado que o arguido “confessou integralmente e sem reservas a prática dos factos” e, posteriormente, ao referir que o arguido “não assumiu espontaneamente qualquer arrependimento”, enferma a mesma de erro notório na apreciação da prova e de contradição insanável.

Vejamos, pois.

Sob a epígrafe “Fundamentos do recurso”, prescreve o Artº 410º, do C.P.Penal:

“(...)
2 - Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
(...)
b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
c) Erro notório na apreciação da prova.
Como logo flui do transcrito preceito legal, neste âmbito dos vícios da decisão, não está em causa a possibilidade de se discutir a bondade do que se considerou provado ou não provado, a maior ou menor abundância de prova para sustentar um facto.
Com efeito, os vícios a que alude o Artº 410º, nº 2, pressupõem uma outra evidência na justa medida em que correspondem a deficiências na construção e estruturação da decisão e ou dos seus fundamentos, maxime na sua perspectiva interna (3), não sendo confundíveis nem com o erro na aplicação do direito aos factos, nem com a errada apreciação e valoração das provas ou a insuficiência destas para a decisão de facto proferida.
Em termos breves, tomemos em consideração cada um dos aludidos vícios, começando pelo erro notório na apreciação da prova.
O vício do erro notório na apreciação da prova ocorre quando se dá como provado algo que normalmente e/ou notoriamente está errado, que não pode ter acontecido, se retira de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável, ou quando usando um processo racional e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, ou quando, ainda, as provas revelam claramente um sentido e a decisão extraiu ilação contrária, impossível.
Trata-se, nas palavras do Exmo. Conselheiro Pereira Madeira (ibidem, pág. 1275), do erro evidente, escancarado, escandaloso, de que qualquer homem médio se dá conta.
Porém, na decorrência da norma ínsita no Artº 410º do C.P.Penal, não se olvide que o erro na apreciação da prova só é considerado notório quando, contra o que resulte de elementos que constem dos autos, cuja força probatória não haja sido infirmada, ou de dados de conhecimento generalizado, se emite um juízo sobre a verificação, ou não, de certa matéria de facto e se torne incontestável a existência de tal erro de julgamento sobre a prova produzida. Assim, “as regras da experiência comum, em princípio, só podem ser invocadas quando da sua aplicação resulte, sem equívocos, a existência do aludido vício” (cfr. Ac. S.T.J. de 10/07/1996, in CJAcSTJ, II, 229).
Outrossim, não se olvide que o erro notório na apreciação da prova não tem a ver com a eventual desconformidade/discordância entre a decisão de facto do julgador e aquela que teria sido proferida pelo próprio recorrente.
Ora, no caso vertente, é precisamente uma situação redutível à mera discordância que se entende verificada.
Porém, lida e analisada a fundamentação da sentença recorrida, designadamente no que tange aos factos provados e não provados, não se vislumbra que, dos seus próprios termos, se evidencie qualquer erro na apreciação da prova, e muito menos notório ou evidente, sendo certo que o arguido não logra concretizar uma qualquer falha consistente relativamente à factualidade dada como não provada que impusesse a existência do erro notório.
Tudo se resumindo, afinal, e como já se salientou, a uma mera divergência de análise da prova produzida por banda do recorrente, visando esta colocar em crise a convicção que o Tribunal recorrido formou perante as provas produzidas em audiência, e substituir essa convicção pela sua própria convicção.
Porém, e repetindo-nos, não podemos incluir no erro notório na apreciação da prova a sindicância que o recorrente possa pretender efectuar à forma como o tribunal recorrido valorou a matéria de facto produzida perante si em audiência, valoração que aquele tribunal é livre de fazer, de harmonia com o citado Artº 127º.
E, no caso vertente, o recorrente não optou por tal sindicância, por via da impugnação ampla, não tendo, aliás, cumprido o ónus de especificação a que alude o Artº 412º,nºs 3 e 4 do C.P.Penal.
Por tudo o exposto, não resultando do texto do acórdão recorrido (por si só ou conjugadamente com as regras da experiência comum), que o tribunal a quo tenha apreciado de forma visivelmente/notoriamente descabida a prova, improcede o invocado vício notório na apreciação da prova.
A respeito do vício a que alude a citada alínea b), do nº 2 - a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão - referem Manuel Simas Santos e Manuel Leal-Henriques, in “Código de Processo Penal Anotado”, II volume, 2ª edição, pág. 737, que “Por contradição, entende-se o facto de afirmar e de negar ao mesmo tempo uma coisa ou a emissão de duas proposições contraditórias que não podem ser simultaneamente verdadeiras e falsas, entendendo-se como proposições contraditórias as que tendo o mesmo sujeito e o mesmo atributo diferem na quantidade ou na qualidade.
Para os fins do preceito (al. b) do nº2) constitui contradição apenas e só aquela que, como expressamente se postula, se apresente como insanável, irredutível, que não possa ser ultrapassada com recurso à decisão recorrida no seu todo, por si só ou com o auxílio das regras de experiência.
Só existe, pois, contradição insanável da fundamentação quando, de acordo com um raciocínio lógico, seja de concluir que essa fundamentação justifica uma decisão precisamente oposta ou quando, segundo o mesmo tipo de raciocínio, se possa concluir que a decisão não fica esclarecida de forma suficiente, dada a colisão entre os fundamentos invocados.
As contradições insanáveis que a lei considera para efeitos de ser decretada a renovação da prova são somente as contradições internas, rectius intrínsecas da própria decisão considerada como peça autónoma.
Não são levadas em conta as eventuais contradições entre a decisão e o que do processo consta em outros locais, designadamente no inquérito ou na instrução.
Podem indicar-se vários exemplos de contradição insanável (…) v.g. quando se dá como provado que em determinado dia os arguidos se dirigiram à residência do ofendido, onde entraram e donde retiraram diversos valores e, logo depois, dá como não provado que os mesmos arguidos se tivessem dirigido e entrado na mesma residência”.
Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22/5/1996, proferido no âmbito do Proc. nº 96P306, relatado pelo Exmo. Conselheiro Andrade Saraiva, disponível in www.dgsi.pt, “Para se verificar contradição insanável de fundamentação, têm que constar do texto da decisão recorrida, sobre a mesma questão, posições antagónicas e inconciliáveis, como por exemplo dar o mesmo facto como provado e como não provado, em situações que não possam ser ultrapassadas pelo tribunal de recurso”.
Ora, no caso vertente, como se viu, sustenta o recorrente [é neste aspecto que incide a parte substancial da sua tese] que o tribunal a quo, ao dar como assente que o arguido “confessou integralmente e sem reservas a prática dos factos” mas que, posteriormente, em sede de fundamentação, ao referir que o arguido “não assumiu espontaneamente qualquer arrependimento”, incorreu em contradição entre a fundamentação e a decisão, sendo certo que é “É entendimento da jurisprudência que a confissão integral e sem reservas configura, salvo atos demonstrativos de perceção contrária, manifesto arrependimento.”.
Salvo o devido respeito, não lhe assiste razão.
Na verdade, como se extrai da respectiva acta da audiência de discussão e julgamento, cuja acta da 1ª sessão se encontra a fls. 46/ 47 Vº, constata-se que no âmbito das suas declarações “o arguido confessou integralmente e sem reservas os factos constantes da acusação”, o que fez livremente e fora de qualquer coacção.
Por isso, bem andou o Mmº Juiz a quo em ter dado como assente essa circunstância, já que, abstractamente considerada, a mesma seria susceptível de ser atendida na determinação concreta da pena.
Porém, como se colhe da respectiva fundamentação, o Mmº Juiz referiu expressamente não ter o arguido assumido espontaneamente qualquer arrependimento.
Ora, salvo o devido respeito, não existe aqui qualquer contradição.
Com efeito, como bem adverte o Exmo. PGA no seu douto parecer, nem sempre a confissão do arguido é sinónimo de arrependimento.
É que, como assertivamente se refere no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 15/02/2012, proferido no âmbito do Proc. nº 363/10.0PBCBR.C1, in www.dgsi.pt, “A confissão, enquanto atitude colaborante do arguido, pode traduzir-se ou não numa circunstância atenuante de carácter geral, influindo directamente na determinação da medida concreta da pena, ou relevando indirectamente, ao nível da valoração das exigências de prevenção especial, se no contexto em que for feita transmitir indicações positivas relativamente à atitude/personalidade do agente. O seu valor processual, em termos práticos, acaba por variar na razão directa da sua relevância, podendo assumir um vasto leque de graduações que vão da confissão extremamente relevante (a que permite ultrapassar acentuadas dúvidas ou ter como assentes factos para os quais não existe outra prova) à confissão absolutamente irrelevante (a título de exemplo, a confissão feita após concluída a produção da prova, quando todos os factos confessados se oferecem já como manifestamente provados; a confissão do óbvio, quando tiver havido prisão em flagrante delito), podendo ainda ser subjectivamente valorada na determinação da atitude interna do agente relativamente aos factos praticados e à interiorização da gravidade da sua conduta.”.
Consequentemente, a verificação do arrependimento de um arguido não constitui efeito automático da existência de confissão integral e sem reservas, bem podendo dizer-se que, não raras vezes, em situações em que a prova da culpabilidade é manifesta, a asserção da sua verificação apenas significa mera "estratégia de defesa", nem sempre correspondendo à interiorização da censurabilidade do ilícito criminal praticado e do sério propósito revelado pelo agente de que, no futuro, não reiterará a conduta criminosa.
E foi isso que sucedeu na situação em apreço
Pois, mau grado ter confessado integralmente e sem reservas os factos que lhe vinham imputados no libelo acusatório, como bem se assinala na fundamentação da sentença, e como tivemos a oportunidade de constar através da audição das suas declarações, não obstante não podermos contar com a imediação de que o Mmº Juiz a quo beneficiou, o certo é que o arguido “não revelou qualquer motivo atendível para a prática do acto de condução após ter ingerido bebidas alcoólicas, descrevendo, até, o acto de conduzir nas referidas condições como um impulso.”.
Persistindo, aliás, em desconsiderar a gravidade da sua conduta nesta sede recursória, quando defende, na conclusão X, que o “grau de alcoolémia apresentado (...) não é excessivamente elevado (...)”.

Concordando-se inteiramente com o Exmo. PGA quando a esse propósito se interroga:
“É este o arrependimento que evidencia? Estamos perante uma taxa de álcool no sangue de 2,09 g/l que, deduzido o erro máximo admissível, corresponde a uma TAS de, pelo menos, 1,923 g/l, ou seja, muito superior ao patamar da ilicitude penal e muitíssimo superior (4 vezes mais!) ao da ilicitude contraordenacional.
Se o arguido entende que tal valor “não é excessivamente elevado”, então, está franqueado o caminho para reiterar a prática de comportamentos anormativos do mesmo jaez.”.
Neste circunstancialismo, cremos que bem andou o tribunal recorrido em não extrair da confissão do arguido qualquer arrependimento com valor atenuativo, já que tal confissão resultou, claramente, não de um sentido e sincero arrependimento, mas da expectativa de minorar as consequências penais da sua actuação.
Pelo que não se antolha qualquer contradição entre a decisão da matéria de facto e a fundamentação, nos aludidos segmentos, concluindo-se que o Tribunal a quo explicou de forma coerente, lógica e objectivável o percurso que traçou para dar aquele facto como provado e para não considerar o arrependimento pretendido pelo recorrente.
Improcede, pois, a invocação do referido vício.
*
3.2. Da escolha e medida da(s) pena(s)

Nesta vertente, e persistindo no argumento do “arrependimento”, sustenta o arguido que uma pena de multa realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, mormente os critérios de prevenção especial e geral. Acrescentando que, assim se não entendendo, dever-se-á reduzir a pena de prisão para um período que não exceda os três meses, suspensa na sua execução por igual período (cfr. conclusão XVI), ao passo que a sanção acessória de inibição de conduzir deverá situar-se nos doze meses.

Vejamos.

Com a decisão da matéria de facto definitivamente estabilizada, e não havendo dúvidas de que o arguido cometeu um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo Artº 292º, nº 1, do Código Penal, cujos elementos objectivos e subjectivos se mostram inteiramente preenchidos (nos moldes devidamente explicitados na sentença recorrida), importa atentar nos elementos evidenciados pelos autos para as finalidades visadas.
O aludido crime de condução de veículo em estado de embriaguez é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, bem como com a sanção acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos, nos termos do Artº 69º, nº 1, al. a), do mesmo diploma legal.
Como refere Paula Ribeiro de Faria, in “Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo II”, Coimbra Editora, 1999, págs. 1093/1094, os bens jurídicos que o legislador pretendeu proteger com esta incriminação são a vida, a integridade física e o património de outrem, a par da segurança da circulação rodoviária, ali se estabelecendo uma presunção fundada numa observação empírica de que o exercício da condução em estado de embriaguez é perigoso em si mesmo, tendo em vista os bens jurídicos penalmente tutelados.
Como regra, em sede da determinação da pena a aplicar, o Tribunal deve atender, num primeiro momento, à escolha da pena entre as penas principais enunciadas no tipo penal, sendo certo que, se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Artº 70º do Código Penal).
No caso vertente o Tribunal a quo afastou a preferência normativa pela pena pecuniária, optando por uma pena de prisão, por considerar que “o arguido, desde 2008, já foi condenado anteriormente pela prática anterior de cinco crimes de condução de veículo em estado de embriaguez (em 2008, 2010, 2013, 2015 e 2018, tendo-lhe sido aplicada pena de prisão suspensa nas condenações de 2013 e 2015, e pena de prisão a cumprir em regime de permanência na habitação na sentença proferida no âmbito do processo nº 659/18.GAEPS a 18-09-2018, transitada em julgado em 10-09-2019).”, e que “Este percurso criminoso do arguido, revela que o agente tem vindo reiteradamente a demonstrar desprezo por bens jurídicos penalmente tutelados, não tendo as penas que já lhe foram aplicadas sido eficazes para a conformação da sua personalidade no respeito pelos valores criminalmente relevantes.”.
Não deixamos de concordar com o raciocínio do Mmº Juiz a quo.

Efectivamente, resulta dos autos que o arguido se apresentou em Juízo com cinco condenações penais, a saber:

a) No âmbito do Proc. Sumário nº 133/08.5GTVCT, do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Esposende, por sentença de 05/05/2008, transitada em julgado em 24/08/2008, foi o arguido condenado na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 10,00, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 5 meses e 15 dias, pela prática, em 29/03/2008, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez;
b) No âmbito do Proc. Sumário nº 63/10.0GTVCT, do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Esposende, por sentença de 26/04/2010, transitada em julgado em 17/05/2010, foi o arguido condenado na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de € 10,00, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 8 meses, pela prática, em 27/03/2010, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez;
c) No âmbito do Proc. Sumário nº 243/13.7PAMAI, do 1º Juízo de Competência Criminal da Maia, por sentença de 09/04/2013, transitada em julgado em 09/05/2013, foi o arguido condenado na pena de 9 meses de prisão, cuja execução se suspendeu pelo período de 1 ano, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 1 ano, pela prática, em 07/04/2013, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez;
d) No âmbito do Proc. Sumário nº 114/15.2GTVCT, do Juízo Local Criminal de Viana do Castelo, Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, por sentença de 19/10/2015, transitada em julgado em 18/11/2015, foi o arguido condenado na pena de 8 meses de prisão, cuja execução se suspendeu pelo período de 1 ano (assente em plano de reinserção social a elaborar pela R.S., com a obrigação de o arguido se submeter a consulta para avaliação da sua dependência alcoólica e, se necessário, efectuar tratamento à mesma), e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 9 meses, pela prática, em 18/10/2015, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez; e
e) No âmbito do Proc. Sumário nº 659/18.2GAEPS, do Juízo de Competência Genérica de Esposende, Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, por sentença de 18/09/2018, transitada em julgado em 10/09/2019, foi o arguido condenado na pena de 5 meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação com vigilância electrónica, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 14 meses, pela prática, em 20/08/2018, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez.

Ora, como se afigura evidente, estes antecedentes revelam bem a insensibilidade do arguido ao efeito admonitório das penas não detentivas, a até das detentivas.
Na verdade, as sucessivas penas que lhe foram anteriormente aplicadas, nas quais se incluem duas penas de multa, revelaram-se totalmente ineficazes para o dissuadir do cometimento de novo crime da mesma tipologia e natureza daqueles, o que evidencia fortes exigências de prevenção especial, cuja satisfação claramente não fica acautelada com a aplicação de mais uma pena de multa.
Foi, pois, acertada, a decisão do Tribunal a quo em optar por aplicar ao arguido pena de prisão pelo ilícito cometido, por forma a levá-lo a afastar-se da prática de novos crimes, e tendo em vista a sua ressocialização.
Improcede, pois, nesta parte, o recurso do arguido.
E quanto às penas concretas?
De acordo com o disposto no Artº 40º, nº 1, do Código Penal, a aplicação das penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
As finalidades das penas, na previsão, na aplicação e na execução, são assim na filosofia da lei penal vigente a protecção de bens jurídicos e a integração do agente do crime nos valores sociais afectados.
Na protecção de bens jurídicos está ínsita uma finalidade de prevenção de comportamentos danosos que afectem tais bens e valores (prevenção geral) como também a realização de finalidades preventivas que sejam aptas a impedir a prática pelo agente de futuros crimes (prevenção especial negativa).
As finalidades das penas na sua vertente de prevenção positiva geral e de integração ou prevenção especial de socialização conjugam-se na prossecução do objectivo comum de, por meio da prevenção de comportamentos danosos, proteger bens jurídicos comunitariamente valiosos cuja violação constitui crime.

No caso concreto, a finalidade de tutela e protecção de bens jurídicos há-de constituir o motivo fundamento da medida da pena, da tutela da confiança das expectativas da comunidade na validade das normas e especificamente na validade e integridade das normas e dos correspondentes valores concretamente afectados.
Por seu turno, a finalidade de reintegração do agente na sociedade há-de ser em cada caso prosseguida pela imposição de uma pena cuja espécie e medida, determinada por critérios derivados das exigências de prevenção especial, se mostre adequada e seja exigida pelas necessidades de ressocialização do agente, ou pela intensidade da advertência que se revele suficiente para realizar tais finalidades.
Nos limites da prevenção geral de integração e de prevenção especial de socialização deverá ser encontrada a medida concreta da pena, sempre de acordo com o princípio da culpa que, nos termos do Artº 40º, nº 2, do Código Penal, constitui limite inultrapassável da prevenção a realizar através da pena.
Há que referir, também, no que tange às penas acessórias, e seguindo a lição de Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português, As Consequências jurídicas do Crime”, 3ª Reimpressão, Coimbra Editora, 2011, págs. 93/97, que as mesmas desempenham uma função preventiva adjuvante da pena principal, com sentido e conteúdo não apenas de intimidação da generalidade, mas também de defesa contra a perigosidade individual.
Concordando-se também inteiramente com o mesmo Autor quando, nessa sua obra, a págs.165, assertivamente afirma: “... à proibição de conduzir deve também assinalar-se (e pedir-se) um efeito de prevenção geral de intimidação, que não terá em si nada de ilegítimo porque só pode funcionar dentro do limite da culpa (...). Por fim, mas não por último, deve esperar-se desta pena acessória que contribuía, em medida significativa, para a emenda cívica do condutor imprudente e leviano”.
E porque se trata de uma pena, ainda que acessória, deve o julgador, na sua graduação atender, também, ao estabelecido no artigo 71º, do Código Penal, tendo presente que a sua finalidade (ao contrário da pena principal que visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente) assenta na censura da perigosidade.
Estes os princípios básicos que devem nortear a determinação da medida da pena, sem esquecermos que esta deve ser sempre uma pena justa, ou seja uma pena que seja aceite e compreendida quer pelo arguido – a quem é em primeira linha dirigida – quer pela generalidade dos cidadãos – titulares originários do direito de punir.

A operação de determinação da(s) pena(s), dentro dos apontados limites, faz-se, segundo o Artº 71º, nº 1, do Código Penal, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção. Atendendo-se, conforme prescreve o nº 2 do mesmo preceito legal, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor ou contra o agente, nomeadamente:

- Ao grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente – al. a);
- À intensidade do dolo ou da negligência – al. b);
- Aos sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram- al. c);
- Às condições pessoais do agente e a sua situação económica – al. d);
- À conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime – al. e); e
- À falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena – al. f).

No caso sub-judice há que atentar, desde logo, como aliás se sublinhou na sentença recorrida, ao elevado grau de ilicitude, pois ficou provado que o arguido, no dia - de Outubro de 2021, cerca das 23H32, conduziu na Avenida …, Esposende, o veículo ligeiro de passageiros de matrícula VX, apresentando uma taxa de álcool no sangue de 2,09 g/l, que deduzido o erro máximo admissível corresponde a uma taxa de álcool no sangue de, pelo menos 1,923 g/l, muito acima do valor que confere significado criminal à conduta.
Depois, há que salientar que a culpa do arguido se mostra muito elevada, a merecer grande censura ética jurídica, sendo que agiu com dolo intenso, na sua forma mais grave, o dolo directo. Não sendo despiciendo afirmar que o arguido denota uma personalidade mal conformada, indiferente a bens ou valores jurídicos por cujo respeito se pugna, por ser muito frequente a sua ofensa, o que densifica o dolo com que actuou.
No que concerne ao perigo inerente à conduta do recorrente o mesmo não ultrapassou o abstracto, já valorado no tipo legal.
Há que considerar, também, o relevante cadastro criminal patenteado pelo recorrente, a que já supra aludimos, com a agravante de as últimas três condenações terem sido punidas com penas detentivas, a antepenúltima e a penúltima com penas de prisão cuja execução se suspendeu, e a última com pena de prisão a cumprir em regime de permanência na habitação.
O que significa que, apesar das solenes advertências que ao arguido foram feitas nas aludidas anteriores decisões condenatórias, o mesmo insistiu em delinquir, mostrando uma personalidade distorcida, e que não acata as regras do bem viver em sociedade, e sobretudo evidenciando que falhou de forma fragrante o prognóstico, subjacente a todas aquelas decisões, de que o mesmo não voltaria a delinquir.
Tudo a evidenciar, pois, fortes exigências de prevenção especial.
Noutra perspectiva, cumpre referir que o arguido assumiu a prática dos factos que lhe vinham imputados, confessando-os integralmente e sem reservas. Confissão essa que, porém, para além de não significar qualquer arrependimento, como já se explicou, neste âmbito assume escassa ou nula relevância, dada a situação de fragrante delito em que foi detectado, quando foi interceptado pela autoridade policial no exercício da condução, sendo que o teste realizado não deixa dúvidas quanto à ingestão de bebidas alcoólicas e quanto ao grau de álcool que apresentava no sangue.
Outrossim, e em benefício do arguido, evidenciam-se as suas condições sócio-económicas, bem como a sua correcta inserção profissional.
Também o factor da prevenção geral não foi descurado na sentença recorrida.
Na realidade, são muito elevadas as necessidades de prevenção geral, pela frequência com que são praticados crimes de natureza rodoviária. Crimes esses que, tantas vezes, estão associados a graves acidentes de viação, que representam uma das maiores causas de morbidade e de mortalidade, especialmente entre os jovens, com gravíssimas consequências para os próprios, para terceiros, e para o conjunto da sociedade.
O que é atestado pelas negras estatísticas nacionais, que se podem analisar, por exemplo, no último Relatório Anual de Segurança Interna, reportado ao ano de 2020 (que pode ser consultado in https://www.portugal.gov.pt/download-ficheiros/ficheiro.aspx?v=%3d%3dBQAAAB%2bLCAAAAAAABAAzNDQ1NAUABR26oAUAAAA%3d), que nos dá conta que os dados relativos à criminalidade rodoviária continuam a registar um número significativo de participações, e que, de entre as tipologias que a integram, há um destaque para a incidência na “Condução de veículo com taxa de álcool de valor igual ou superior a 1,2g/l.
Ali se fazendo menção de que o crime de condução de veículo em estado de embriaguez com uma TAS igual ou superior a 1,2g/litro, apesar de ter registado um decréscimo de 18,8% relativamente ao ano anterior (número naturalmente influenciado pelos longos períodos de confinamento e de inactividade a que o nosso País esteve votado por força da pandemia da doença COVID-19), quanto a participações registadas, ainda ocupa o sétimo lugar no ranking dos crimes mais participados, com 13.693 casos.
Tudo isto para reforçar a ideia de que é elevadíssimo o nível de exigência em termos de prevenção geral.
Pelo que, ponderados todos os enunciados factos e considerações, em especial os atinentes à intensidade da culpa e, sobretudo, à necessidade das penas, mostra-se que só as penas (quer a principal, quer a acessória (4)) aplicadas pelo tribunal de 1ª instância conseguirão satisfazer as sentidas necessidades de afirmação dos bens jurídicos violados, bem como a de procurar que o arguido não volte a delinquir.
Afigurando-se-nos que as penas concretamente aplicadas, face às molduras aplicáveis, coincidem com o mínimo exigido pela tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias, pelo que a redução das mesmas não é sustentável, sob pena de se colocar em causa a crença da comunidade na validade das normas jurídicas violadas e, por essa via, os sentimentos de confiança e de segurança dos cidadãos nas instituições jurídico-penais.
Mas, como se viu, pretende também o arguido que a pena de prisão (de 3 meses, como preconiza), seja suspensa na sua execução por igual período.

Vejamos.
Prescreve o Artº 50º, nº 1, do Código Penal que “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que da simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Como resulta deste preceito legal, a suspensão da execução da pena de prisão depende da verificação de dois pressupostos: um formal, que exige que a pena aplicada não seja superior a 5 anos de prisão; e um pressuposto material.
A este propósito, ensina Figueiredo Dias, ibidem, págs. 341 e sgts.: “pressuposto material de aplicação do instituto é que o tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente. (...). Para formulação de um tal juízo – ao qual não pode bastar nunca a consideração ou só da personalidade, ou só das circunstâncias do facto – o tribunal atenderá especialmente às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto”.

Acrescentando, assertivamente, o mesmo Autor:

A finalidade político-criminal que a lei visa com o instituto da suspensão é clara e terminante: o afastamento do delinquente, no futuro, da prática de novos crimes e não qualquer «correcção», «melhora» ou - ainda menos - «metanóia» das concepções daquele sobre a vida e o mundo. É em suma, como se exprime Zipf, uma questão de «legalidade» e não de «moralidade» que aqui está em causa. Ou, como porventura será preferível dizer, decisivo é aqui o «conteúdo mínimo» da ideia de socialização, traduzida na «prevenção da reincidência».
Por isso, um prognóstico favorável fundante da suspensão não está excluído - embora se devam colocar-lhe exigências acrescidas - mesmo relativamente a agentes por convicção ou por decisão de consciência (...). Mas já o está decerto naqueles outros casos em que o comportamento posterior ao crime, mas anterior à condenação, conduziria obrigatoriamente, se ocorresse durante o período de suspensão, à revogação desta (...). Por outro lado, a existência de condenação ou condenações anteriores não é impeditiva a priori da concessão da suspensão; mas compreende-se que o prognóstico favorável se torne, nestes casos, bem mais difícil e questionável - mesmo que os crimes em causa sejam de diferente natureza - e se exija para a concessão uma particular fundamentação (...).” (sublinhado nosso)

E termina a sua lição, neste particular aspecto, dizendo:
“Apesar da conclusão do tribunal por um prognóstico favorável - à luz, consequentemente, de considerações exclusivas de prevenção especial de socialização -, a suspensão da execução da prisão não deverá ser decretada se a ela se opuserem «as necessidades de reprovação e prevenção do crime» (...). Já determinámos (...) que estão aqui em questão não quaisquer considerações de culpa, mas exclusivamente considerações de defesa do ordenamento jurídico. Só por estas exigências se limita - mas por elas se limita sempre - o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto ora em análise.”.
Há que referir, também, na esteira de Maia Gonçalves, in “Código de Processo Penal” Anotado e Comentado, 14ª edição, Almedina, 2001, pág. 191, que a suspensão da execução da pena de prisão não se traduz numa faculdade jurídica, consubstanciando, antes, um verdadeiro poder-dever, ou seja de um poder vinculado do julgador, que terá de decretar a medida em causa, na modalidade que se afigurar mais conveniente para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os apontados pressupostos.
Ora, na situação sub-judice, para afastar a aplicação do instituto jurídico em causa, da suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido, bem como a aplicação de outras penas substitutivas, o Mmº Juiz a quo expendeu as seguintes considerações:
“No caso concreto, entende-se que a simples ameaça de prisão não realiza de forma adequada as finalidades da punição.
Tal assim é em face do extenso passado criminal do arguido em crimes de natureza patrimonial, com as três últimas condenações em penas de prisão (com relevo para a decisão, apurou-se que o arguido, desde 2008, já foi condenado anteriormente pela prática anterior de cinco crimes de condução de veículo em estado de embriaguez (tendo-lhe sido aplicada pena de prisão suspensa nas condenações de 2013 e 2015, e pena de prisão a cumprir em regime de permanência na habitação na sentença proferida no âmbito do processo nº 659/18.GAEPS a 18-09-2018, transitada em julgado em 10-09-2019) e nunca conseguiu, apesar das oportunidades que lhe foram concedidas, mudar de vida e de ter um comportamento conforme ao direito.
A dita punição não se compadece com uma pena de substituição porque, absolutamente, nada permite sustentar o juízo de prognose social favorável de que o legislador faz depender a sua aplicação, não sendo bastantes para o alicerçar a confissão produzida em juízo, já que a dita confissão não surgiu - sequer - acompanhada de qualquer sentimento de pesar ou arrependimento atendíveis.
A ausência de eficácia dissuasória das condenações já sofridas pelo arguido, e a necessidade que existe de restaurar a confiança da comunidade na validade da norma jurídica violada impõem outrossim que se conclua que só a aplicação de uma pena de 6 (seis) meses de prisão efectiva é passível de satisfazer as exigências mínimas de prevenção que o caso reclama.
Quanto à personalidade por aquele revelada, evidenciada na cronologia dos antecedentes criminais – de 2008 até ao presente – a mesma revela um padrão de vida desconforme com as regras que regulam a vida em sociedade, está, de tal forma carecida de socialização, que as anteriores advertências de prisão não surtiram qualquer efeito, existindo, por isso, exigências de prevenção especial que reclamam a aplicação de pena de prisão efectiva.
Nestas circunstâncias e em face da sistemática violação da ordem jurídico penal pelo arguido, qualquer pena de substituição era um prémio ao arguido, um convite ao crime e uma inutilidade judicial, em face do fim que compete às penas: protecção dos bens jurídicos e reinserção social do arguido (artº 40º CP).
Pelo que não é de aplicar o instituto de suspensão da execução da pena de prisão, devendo o mesmo ser condenado no cumprimento efectivo da pena de prisão de 8 (oito) meses.
Por todos os motivos supra expostos, decorrentes das exigências de prevenção geral e sobretudo especial que no caso se reconhecem, são de afastar as penas de substituição – do art. 45º do Código Penal (multa de substituição), do art. 48º do Código Penal (prestação de trabalho a favor da comunidade).
(...)”.
Acompanhamos inteiramente estas considerações que levaram o tribunal recorrido à não suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido, e bem assim ao afastamento de qualquer uma das outras penas de substituição previstas na lei.
Na verdade, tendo essencialmente em consideração a personalidade revelada pelo arguido expressa nos factos, o elevado grau de ilicitude dos mesmos, a falta de arrependimento (demonstrativa de que não interiorizou o mal do crime), e ainda, os seus antecedentes criminais, não vemos como a suspensão da execução da pena, como medida de reflexos sobre o seu comportamento, possa no futuro evitar a repetição de comportamentos delituosos.
Neste quadro circunstancial, entendemos que só a pena de prisão efectiva poderá assegurar o efeito essencial de prevenção geral e satisfazer a necessidade de socialização do arguido, pelo que se mantém a sentença recorrida também nesta parte.
*
Em suma, tendo sido correctamente observados todos os critérios estabelecidos na lei, não se vislumbrando qualquer distorção na determinação da natureza e da medida das penas levada a cabo pelo tribunal recorrido, nem, consequentemente, violada qualquer uma das normas legais aplicáveis, nenhuma censura nos merece a sentença recorrida, que se confirma, improcedendo in totum o presente recurso.

III. DISPOSITIVO

Por tudo o exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido P. J., confirmando-se, consequentemente, a sentença recorrida.

Custas pelo arguido/recorrente, fixando-se em 4 UC a taxa de justiça (Artºs. 513º e 514º do C.P.Penal, 1º, 2º, 3º, 8º, nº 9, do Reg. Custas Processuais, e Tabela III anexa ao mesmo).

(Acórdão elaborado pelo relator, e por ele integralmente revisto, com recurso a meios informáticos, contendo as assinaturas electrónicas certificadas dos signatários - Artº 94º, nº 2, do C.P.Penal)
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Guimarães, 26 de Abril de 2022

António Teixeira (Juiz Desembargador Relator)
Paulo Correia Serafim (Juiz Desembargador Adjunto)
Fernando Chaves (Juiz Desembargador Presidente da Secção)


1. Todas as transcrições a seguir efectuadas estão em conformidade com o texto original, ressalvando-se a correcção de erros ou lapsos de escrita manifestos, da formatação do texto e da ortografia utilizada, da responsabilidade do relator.
2. Ao qual se reportam todas as disposições legais a seguir citadas, sem menção da respectiva origem.
3. Como impressivamente refere o Exmo. Conselheiro Pereira Madeira, in “Código de Processo Penal Comentado”, Almedina, 2016, 2ª Edição Revista, págs. 1272/1273 -, porque aqui se trata (na detecção dos vícios do Artº 410º, do C.P.Penal), essencialmente, de uma tarefa de direito, os tribunais superiores procedem oficiosamente a essa indagação de vícios na matéria de facto, provada e não provada, atendo-se imperativamente, apenas e só, ao teor do texto da decisão recorrida e, se necessário, também às regras da experiência comum, nunca a outro tipo de provas.
4. Recorde-se que, quanto a este aspecto, pelos crimes de condução em estado de embriaguez que constam do seu registo criminal, com as quais se apresentou em tribunal, o recorrente já sofreu penas acessórias de proibição de conduzir veículos motorizados que, com excepção da penúltima, têm vindo sucessivamente a recrudescer (5 meses e 15 dias; 8 meses; 12 meses; 9 meses; e 14 meses), circunstância esse que não o inibiu suficientemente de levar a cabo novo ilícito da mesma natureza, só agora questionando as consequências dessa sua conduta.