Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1/22.8T8VNF-B.G1
Relator: PEDRO MAURÍCIO
Descritores: EMBARGOS À INSOLVÊNCIA
ADMISSIBILIDADE DOS EMBARGOS
CERTIDÃO DE CITAÇÃO - DOCUMENTO AUTÊNTICO
EXTEMPORANEIDADE DOS EMBARGOS
NULIDADE DA CITAÇÃO DA INSOLVENTE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/09/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - A apreciação pelo Tribunal da Relação da decisão de facto impugnada não visa um novo julgamento da causa, mas sim uma reapreciação do julgamento proferido pelo Tribunal de 1ª Instância com vista a corrigir eventuais erros de julgamento.
II - No âmbito dessa apreciação, ao Tribunal da Relação incumbe formar a seu próprio juízo probatório sobre cada um dos factos julgados em primeira instância e que são objeto de impugnação, tendo para o efeito amplo poder inquisitório sobre a prova produzida que imponha decisão diversa, podendo socorrer-se, mesmo oficiosamente, de todos os meios de prova constantes do processo, não estando adstrito quer aos meios de prova que foram indicados pelas partes quer aos indicados pelo Tribunal de 1ª Instância.
III - Apesar de não conter norma legal igual à que constava do art. 646º/4 do anterior C.P.Civil, e ter sido uma opção legislativa maior liberdade na descrição da matéria de facto, por força do disposto no art. 607º/3 e 4 C.P.Civil de 2013, na fundamentação de facto da sentença apenas devem constar os factos julgados provados e não provados, dela devendo ser expurgados todos os que constituem matéria susceptível de ser qualificada como questão de direito, conceito que engloba os juízos de valor ou conclusivos.
IV - Os factos conclusivos não podem integrar a matéria de facto quando estão diretamente relacionados com o thema decidendum, impedem a perceção da realidade concreta, e/ou ditam por si mesmo a solução jurídica do caso, normalmente através da formulação de um juízo de valor.
V - Saber se um concreto facto integra um conceito de direito ou assume feição conclusiva ou valorativa constitui uma questão de direito.
VI - Quando o recurso tem por objecto saber se um determinado facto julgado provado pelo Tribunal de 1ª Instância contém ou não matéria conclusiva, ao abrigo dos seus poderes decisórios previstos no art. 662º do C.P.Civil de 2013, pode o Tribunal de Recurso, caso conclua afirmativamente, eliminá-lo do elenco dos factos provados.
VIII – Como decorre do disposto no art. 162º/1 da Lei nº154/2015, de 14/09 (Estatuto da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução), “O agente de execução é o auxiliar da justiça que, na prossecução do interesse público, exerce poderes de autoridade pública no cumprimento das diligências que realiza nos processos de execução, nas notificações, nas citações, nas apreensões, nas vendas e nas publicações no âmbito de processos judiciais, ou em atos de natureza similar que, ainda que não tenham natureza judicial, a estes podem ser equiparados ou ser dos mesmos instrutórios”.
IX – A certidão de citação elaborada pela agente de execução, porque foi emitida no âmbito da sua competência e da sua actividade de exercício de poderes de autoridade pública, tem a natureza de documento autêntico nos termos do disposto no art. 363º/1 e 2 do C.Civil.
X - Da conjugação dos arts. 40º e 42º decorre que o C.I.R.E. consagra um sistema de duplo mecanismo processual para reagir (impugnar) contra a sentença de declaração de insolvência: o meio processual de «embargos» que serve exclusivamente para alegar factos novos ou indicar novos meios de prova, ou seja, factos e/ou meios de prova que não tenham sido considerados pelo Tribunal na sentença e sejam susceptíveis de colocar em causa os fundamentos que sustentaram a declaração da insolvência (nº2 do referido art. 40º); e o meio processual de «recurso» que se destina exclusivamente a discutir de razões de direito por se entender que existe uma inadequação da decisão por má aplicação da lei à factualidade provada, ou seja, quando em face dos elementos apurados se entender que não podia ser declarada a existência de uma situação de insolvência (nº1 do referido art. 42º).
XI - Atento o teor da alínea a) do nº1 do referido art. 40º, o legislador estabeleceu uma condição de admissibilidade dos embargos à sentença de insolvência por parte do insolvente que «este se encontre em situação de revelia absoluta por não ter sido citado pessoalmente».
Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES,
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1. RELATÓRIO
1.1. Da Decisão Impugnada

EMP01..., Lda, declarada insolvente nos autos principais (proc. nº1/22....), veio deduzir oposição de embargos nos termos do art. 40º do C.I.R.E., contra a Requerente do processo de insolvência, EMP02..., Lda, pedindo que «seja declara a inexistência de citação da Requerida, e, caso assim não se entenda, deverá ser declarada a nulidade da citação, com as devidas consequências legais».
Fundamentou a sua pretensão, essencialmente, no seguinte: «quando o agente de execução opta por citação com hora certa, é pressuposto que o citando reside na morada onde a citação é feita, e que o mesmo tem conhecimento efetivo e a certeza da mesma; não consta da certidão de citação elaborada pela Agente de Execução que algum dos representantes legais da Requerida reside naquela morada, antes consta apenas da comunicação que fez ao processo, e que, naturalmente, não se encontra assinada por qualquer testemunha; a Agente de Execução não confirmou, como se lhe impunha, que o representante legal residia no pretenso local, pelo que a citação com hora certa nunca poderia ter ocorrido; também teria que constar da certidão de citação a advertência feita à pessoa que a Agente de Execução encontrou no local relativamente a todas as consequências da não transmissão da comunicação ao citando, mas a certidão não tem qualquer informação, pelo que se encontra incumprido mais um requisito legal; é patente que a Agente de Execução não efetuou qualquer advertência, pelo que terá que se considerar que a citação pessoal padece de nulidade; da análise da plataforma CITIUS, resulta que, após a junção da certidão datada de 23.03.2022, não foi junta aos autos nova certidão da deslocação da Agente de Execução à referida morada para efetuar citação; a citação pessoal putativamente efetuada é uma nula por preterição das formalidades prescritas no CPC; a citação pessoal que foi feita não cumpriu as formalidades essenciais do ato, bem como a transmissão de determinada informação, que não sucedeu, o que leva a que haja falta de citação; a falta de citação teve como consequência imediata a não apresentação de defesa da Requerida, que naturalmente sempre se defenderia, e bem assim a declaração de insolvência da mesma, o que tem consequências muito graves para a sociedade, nomeadamente no que respeita aos diversos negócios que se encontram em fase de negociação, nos quais terá um impacto destrutivo; os factos apresentados pela Requerente não correspondem à verdade nem têm qualquer fundamento válido; a Requerente apenas formalmente é senhoria, a transmissão de propriedade do imóvel surgiu para encapotar um mútuo que foi celebrado entre a Requerida e a Requerente, tendo as partes simulado um contrato de compra e venda do imóvel pertença de um dos sócios-gerentes (AA), para posteriormente, efetuar a cobrança de rendas que permitisse efetuar o pagamento do negócio de mútuo celebrado; a Requerida é uma empresa saudável, que nunca teve qualquer pedido de insolvência, assim como nunca se apresentou a PER, tem uma tesouraria controlada que gere diariamente; nem o montante, nem as circunstâncias do incumprimento revelam a exigibilidade do alegado crédito, nem tampouco a impossibilidade do pagamento da putativa dívida, nem tal significa que haja incumprimento da generalidade das obrigações da Requerida».
A Requerente/Embargada contestou, pugnando por «os Embargos serem julgados improcedentes e a Insolvente condenada como litigante de má fé».
Fundamentou a sua defesa, essencialmente, no seguinte: «os Embargos foram deduzidos fora do prazo previsto no art. 40º do CIRE, nem foram alegados factos e requeridos meios de prova que não tenham sido tidos em consideração pelo tribunal e possam afastar os fundamentos da declaração de insolvência; realizaram-se inúmeras diligências para citação da Insolvente e dos seus legais representantes nas moradas da sede e domicílios constantes dos registos e das bases de dados e que se não foram recebidas foi por culpa dos citandos; em 23/03/2022 foi realizada a citação com hora certa, através de nota afixada à porta, na Rua ..., ..., ..., morada da residência do gerente BB e retirada da base de dados da Segurança Social; tem de se considerar que a Insolvente e os seus representantes legais foram notificados da Sentença após os éditos; mesmo não tendo havido um acto de citação com contacto pessoal da Insolvente ou dos seus representantes legais, a verdade é que nos Embargos é referido que houve um contacto com o Administrador de Insolvência, apesar de não ser indicada uma data; tem que se considerar que, pelo menos, nesse contacto os representantes legais tiveram conhecimento da Sentença de declaração de insolvência; no requerimento apresentado em 22/06/2022, o Administrador de Insolvência refere já ter conseguido contactar os representantes legais da Insolvente; é manifesto que quando os Embargos foram apresentados, já tinha sido há muito ultrapassado o prazo legal de 5 dias para o efeito; na altura em que foi requerida a Insolvência, a Insolvente devia à ora Embargada rendas vencidas e penalizações no valor de € 143.393,75, pelo período de Outubro de 2019 a Dezembro de 2021, o que a Embargante não negou; a Embargante nem sequer impugnou os factos alegados pela ora Embargante acerca da situação financeira daquela, especialmente os valores; as consultas efectuadas comprovaram que a referida morada era onde residia o legal representante, sendo que a Insolvente nem alega que o legal representante não residia nessa morada; inexistiu qualquer simulação; tendo a Insolvente cumprido durante mais de três anos, pontualmente, o contrato de arrendamento, a invocação de existência de simulação do mesmo face ao pedido da EMP02... em consequência do seu incumprimento constitui evidente abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium; mesmo que o contrato de arrendamento fosse nulo, a Insolvente teria que entregar à Embargada o valor correspondente às rendas que não pagou; ainda que se tivesse tratado de um mútuo, a Insolvente teria que restituir “outro tanto do mesmo género e qualidade” à Embargada, ou seja, o imóvel teria que ser restituído a esta e simultaneamente serem pagas todas as rendas respeitantes ao período em que o mesmo esteve a ser utilizado pela Insolvente; a Insolvente veio deduzir uma pretensão cuja falta de fundamento é por demais por si conhecida, para o efeito alterou a verdade dos factos e, em geral, fez do processo um uso manifestamente reprovável, chegando a imputar à ora Embargada responsabilidades pela "falsa citação"».
Realizada a audiência final, foi proferida sentença com o seguinte decisório:
“Pelo exposto,
a) Declaro extemporâneos os embargos à insolvência apresentados.
b) Absolvo a insolvente aqui embargante do pedido de condenação por litigância de má fé (…)”.
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1.2. Do Recurso da Embargante

Inconformada com a sentença, a Embargante interpôs recurso de apelação, pedindo que «a sentença proferida seja alterada no que respeita à matéria de facto e fundamentação de facto, conforme requerido, bem como ser revertida a fundamentação de direito apresentada para a consideração da extemporaneidade da apresentação de embargos», e formulando as seguintes conclusões no final das respectivas alegações:
«A. Em virtude da sentença proferida, que considerou os embargos totalmente improcedentes por extemporâneos, vem a ora Recorrente apresentar alegações de recurso, por discordar in totum da valoração feita pelo Tribunal a quo, bem como da fundamentação de direito e de facto utilizada, vez que foi feita prova que foi totalmente desvalorada, ou valorada erroneamente.
B. Essencialmente, o Tribunal a quo considerou os embargos totalmente extemporâneos, ignorando por completo a nulidade de citação, quando na realidade foi feita prova do momento em que o gerente da sociedade tomou conhecimento e, portanto, do momento a partir do qual podia ter reagido à declaração de insolvência.
C. A manutenção da sentença proferida tem como consequência a aceitação da declaração da insolvência de uma sociedade comercial sem qualquer contestação, por falta de citação e, ainda, sem qualquer contestação/oposição após sentença de declaração, porque foi alvo de uma aparente e deficiente citação para apresentação de recurso ou de embargos.
D. Erradamente, o Tribunal entendeu que foi feita prova bastante quanto à putativa citação do legal representante. No entanto a Recorrente não se conforma com a valoração da prova que foi feita, pelo que considera que a matéria dada como provada no facto 1) deverá ser considerada como não provada.
E. Quanto aos factos considerados como não provados, é entendimento da Recorrente que também existe erro de valoração da prova, concretamente quanto aos factos A e C, pelo que
todos deverão ser considerados como provados.
F. No que respeita ao facto 1 considerado como provado considera que resultou da prova produzida que não foi feita qualquer citação válida na residência do Sr. BB, porquanto, não só ressalta dos documentos juntos aos autos que a Agente de Execução não
sabe quem ia citar, como também resulta que a estória que a própria relatou, quando prestou depoimento, não tem qualquer sentido.
G. Tal verifica-se pelo documento junto aos autos, bem como pela análise de depoimento da
Agente de Execução, porquanto em sede de audiência de julgamento manteve precisamente o mesmo discurso, repetidamente até ter sido alertada quanto ao nome, momento a partir do qual referiu que se tratou de um lapso. No entanto, afirmou que sabia ter ido procurar o Sr. BB e não o Sr. CC, pese embora todos os indícios estejam no sentido oposto.
H. Após as evidências a que se assistiu é manifesto que a Sra. Agente de Execução não sabe
bem quem foi citar, mas depois do que já tinha afirmado não teve outra alternativa que não
fosse dizer que sabe perfeitamente que estava à procura do Sr. BB.
I. No entanto, a prova feita demonstra que, em março de 2022, procurou o Sr. CC, e mais de nove meses depois continua a considerar que citou o Sr. CC, mas pretende fazer crer que foi citar um BB, tal como demonstrado nas transcrições supra.
J. Ademais, resulta claro que, não só que a Agente de Execução não sabe quem foi citar, como também que não consegue explicar de forma minimamente racional o procedimento pelo qual optou das duas vezes em que, alegadamente, se deslocou à morada do gerente da Recorrente.
K. Aliás, as transcrições supra demonstram de forma clarividente que a Sra. Agente de Execução não sabe porque agiu daquela forma, mas o facto é que é visível que a sucessão de acontecimentos conforme reportou não faz qualquer sentido.
L. Repare-se que, alegadamente, terá falado com a sogra do representante legal da Recorrente, assim como foi com ela a casa do próprio, mas decidiu deixar o aviso na porta de entrada do prédio, em vez de deixar na porta do apartamento do legal representante da
Recorrente, mesmo sabendo qual era a porta do seu apartamento.
M. Como se tal não fosse grave o suficiente, no dia seguinte volta a repetir a proeza e voltou a deixar a citação na porta de entrada do prédio, em vez de deixar na porta de entrada do
apartamento do Sr. BB.
N. Naturalmente, não conseguiu explicar qual é que terá sido o raciocínio feito para ter atuado como atuou e, o melhor que conseguiu dizer, é que faz sempre da mesma forma.
O. Pelo que é incompreensível a valoração que foi feita, porquanto existe claramente uma citação que foi elaborada de forma incorreta, uma vez que não se pode considerar que a citação feita na porta do prédio do citando é um meio idóneo para o efeito, principalmente
quando a Agente de Execução sabe qual é a porta do apartamento, portanto tinha a obrigação de fazer mais e melhor no estrito cumprimento dos deveres a que se encontra adstrita.
P. Em face do exposto, não se consegue perceber como é que o Tribunal considerou a citação válida, o que se torna ainda mais incompreensível quando o representante legal da Recorrente prestou depoimento tendo esclarecido que não vive com a namorada, que esta não tem chave de sua casa e a mãe da namorada também não.
Q. Por outro lado, o representante legal da Recorrente afirmou que em nenhum momento visualizou na porta do seu prédio qualquer comunicação, muito menos dirigida a si.
R. E, ainda, esclareceu o Tribunal que os vizinhos o conhecem e não o avisaram de ter sido afixado qualquer notificação dirigida a si, pelo que é incompreensível que a conjugação de depoimentos prestados tenha resultado no facto 1 considerado como facto provado.
S. As transcrições supra demonstram que a versão apontada pela Agente de Execução, para além de ilógica é manifestamente contraditória com a do gerente da Recorrente, porquanto seria impossível a Agente de Execução ter estado com a mãe da namorada do representante
legal, muito menos dentro de casa dele.
T. Repare-se que, a Recorrente apenas tomou conhecimento da existência dos presentes autos através do Administrador de Insolvência, em junho, ou seja, após o decretamento da insolvência pelo Tribunal, e na sequência de uma tentativa de contacto do Administrador de Insolvência, que prontamente foi devolvida, o que significa que os gerentes da Recorrente não são de impossível contacto.
U. Naturalmente, se o gerente da Recorrente devolveu o contacto ao Sr. Administrador de Insolvência também o devolveria à Agente de Execução se tivesse tomado conhecimento da
sua visita.
V. Outro aspeto relevante, mas que não foi valorado pelo Tribunal a quo relaciona-se com o facto de não consta da certidão de citação, elaborada pela Agente de Execução e junta aos autos, a verificação de que o gerente da Recorrente tenha morada no local, antes consta apenas da comunicação que fez ao processo.
W. Ou seja, as testemunhas que alegadamente assistiram a todas as diligências tomadas pela Agente de Execução não assinaram qualquer auto com indicação da verificação da morada, o que, por si só, devia ser valorado pelo Tribunal.
X. O mesmo sucede com a informação de ter encontrado no local a “sogra” do representante legal da Recorrente e, consequentemente, da informação que alegadamente lhe deram.
Y. Assim, conclui-se que o Tribunal a quo não valorou todos os elementos probatórios e, portanto, deles não retirou a conclusão que se impunha: a citação não cumpriu os trâmites
legais, logo terá que ser repetida, no mínimo.
Z. É indiscutível que terá surgido a dúvida sobre a idoneidade da citação efetuada e, perante uma dúvida diretamente relacionada com um direito de defesa, parece não ser de tomar qualquer decisão que coloque esse mesmo direito em causa, principalmente quando se trata
de um direito com consagração constitucional.
AA. As imprecisões são inúmeras, no entanto não foram valoradas, pois tendo sido evidenciariam a contraditoriedade de informação prestada, inclusivamente, através da Agente de Execução.
BB. Repare-se que, a Embargada, ora Recorrida, em momento algum arrolou as testemunhas que assinaram o auto junto aos presentes autos, no entanto a questão crucial que aqui se colocou é a validade da citação.
CC. Citação que terá sido feita por edital, alegadamente na porta de um prédio onde a Agente de Execução entrou com a alegada “sogra” do representante legal CC. Ora, nem existe a sogra, nem nenhum representante legal com o nome de CC!
DD. Evidentemente, se o conhecimento da porta do apartamento do gerente existia, a Agente de Execução fez tábua rasa do mesmo, tendo procedido à citação da forma mais fácil e leviana possível, porquanto nem uma fotografia à citação que alegadamente colocou na porta do prédio tirou e juntou ao processo. Ou seja, é por demais evidente que o gerente nem sequer pode confirmar se o putativo local onde a referida foi deixada corresponde ao prédio dele.
EE. Em face do exposto, é manifesto que a realização da citação não ocorreu de forma correta e em cumprimento das exigências legais, motivo pelo qual se considera que houve uma errada valoração da prova, porquanto só isso justifica que o facto 1 tenha sido inserido no rol de factos considerados provados.
FF. Quanto aos factos constantes do elenco de factos considerados não provados atente-se no facto A considerado como não provado e que a Recorrente considera ter resultado prova
suficiente para que conste da lista de factos provados.
GG. Aliás, decorre da confusão, das contraditoriedades e da falta de clareza do depoimento da Agente de Execução que a atitude e os atos praticados (ou a falta deles!) perpassam qualquer comportamento típico/usual e responsável na realização de citações editais.
HH. Parece evidente que a Agente de Execução nem sequer sabia quem ia citar, conforme resulta do depoimento prestado, pelo que seria difícil assumir que verificou que aquela morada correspondia à do gerente da Recorrente.
II. Por outro lado, é indício de que nada do que foi relatado com a putativa sogra do gerente da sociedade corresponde à verdade, quando a Agente de Execução, sem qualquer explicação plausível, coloca o aviso de contacto e a citação na porta do prédio, quando alegadamente subiu e entrou em casa do representante legal.
JJ. Sendo que, a lamentável explicação para ter colocado os documentos na porta do prédio e não na porta de casa foi que considerou um sítio visível, como se houvesse um local onde os referidos documentos tivessem mais visibilidade para o gerente do que a sua porta de casa.
KK. Dúvidas não podem subsistir quanto às incertezas da Agente de Execução e à atitude pouco profissional que tomou, que permite a existência de dúvidas sobre a versão apresentada, que foi tudo menos credível e demonstrou que a Agente de Execução, não só não sabe quem ia citar, como é dúbio que o tenha feito seja de que forma for e, ainda que se possa conceder na versão apresentada, é patente que a citação terá que ser alvo de repetição, pois a citação edital é um instrumento que não se pode banalizar.
LL. Ademais, recorrendo a uma citação nestes moldes, que configura a última alternativa/opção pelas características que tem, é essencial que todos os trâmites sejam tratados e que a Agente de Execução atue com o zelo e a diligência que são necessários e exigíveis mediante as referidas circunstâncias, motivo pelo qual o facto A deverá transitar para o elenco de factos provados.
MM. Quanto ao facto C considerado como não provado resulta das transcrições feitas supra, que correspondem à declaração de parte do legal representante que o mesmo apenas teve conhecimento da declaração de insolvência através do Administrador de Insolvência, que deixou um cartão na caixa de correio do gerente da sociedade, o que terá ocorrido em junho de 2022.
NN. Ora, se o representante legal da sociedade não tomou conhecimento da citação edital que alegadamente foi realizada não poderia ter tomado conhecimento por outro meio que não o Administrador de Insolvência.
OO. Repare-se que, esta conclusão é consequência direta da transferência do facto 1 considerado como provado para o elenco de factos considerados como não provados, conforme requerido
PP. Em face do exposto, será de concluir que, também este facto, foi erradamente considerado pelo Tribunal a quo, em virtude da desconsideração da prova produzida, pelo que deverá transitar para o rol dos factos considerados como provados.
QQ. Quanto à fundamentação de facto da sentença será de fazer uma nota sobre a valoração do depoimento da testemunha DD, porquanto será de esclarecer que o depoimento
prestado não poderá ser valorado da forma como o Tribunal a quo considerou, porquanto não se poderá ignorar que a título de esclarecimentos na contra instância clarificou, muito a custo, conforme se verificou pelo tom de voz e pela expressão corporal, que o Administrador da EMP03... - empresa para a qual trabalha - é o dono da Embargada/Recorrida, motivo pelo qual será de valorar o seu depoimento cum granu salis, porquanto o sucesso da ação significará uma vantagem do seu superior hierárquico.
RR. Repare-se que tal informação não foi apresentada ao Tribunal na identificação, nomeadamente quando inquirido sobre o conhecimento das entidades envolvidas.
SS. Ou seja, depois da forma como decorreu o depoimento e do modo como se percebeu esta
ligação, não se poderá considerar uma verdade de “La Palice”, como foi.
TT. Quanto à fundamentação de direito é essencial esclarecer que, ao contrário do que consta da sentença proferida o valor relativo à multa de 1º dia foi pago, conforme resulta inequívoco do comprovativo de pagamento.
UU. Em face da informação apresentada, terá que se excluir a motivação de falta de pagamento para a consideração da extemporaneidade dos embargos apresentados, por não
corresponder à realidade.
VV. No entanto, também no que tange a esta questão será de considerar que o Tribunal a quo voltou a andar mal, uma vez que não poderia ser este o motivo pelo qual se considerariam os embargos extemporâneos.
WW. No formulário preenchido na apresentação de embargos foi indicada a referência do
documento único de cobrança, pelo que não constando do sistema, era obrigação do Tribunal notificar o Recorrente para apresentação de comprovativo de pagamento ou pagamento da multa com a respetiva sanção associada, o que não ocorreu.
XX. Assim, será de considerar que o Tribunal não cumpriu com os deveres que lhe são impostos, nomeadamente pela aplicação do art. 139º, nº 6 do CPC, motivo pelo qual não se
compreende a questão levantada e, muito menos a fundamentação apresentada.
YY. Assim, e conforme referido supra, é inquestionável que este argumento respeitante à fundamentação de direito seja revertido, porquanto configura um frontal desrespeito pelo constante na legislação em vigor”.
A Embargada apresentou contra-alegações, pugnando pela «improcedência do recurso».
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.
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2. OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A DECIDIR

Por força do disposto nos arts. 635º/2 e 4 e 639º/1 e 2 do C.P.Civil de 2013, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas (as conclusões limitam a esfera de actuação do Tribunal), a não ser que se tratem de matérias sejam de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, ou que sejam relativas à qualificação jurídica dos factos (cfr. art. 608º/2, in fine, aplicável ex vi do art. 663º, nº2, in fine, e 5º/3, todos do C.P.Civil de 2013).
Mas o objecto de recurso é também delimitado pela circunstância do Tribunal ad quem não poder conhecer de questões novas (isto é, questão que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismo destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis”[1] (pela sua própria natureza, os recursos destinam-se à reapreciação de decisões judiciais prévias e à consequente alteração e/ou revogação, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida[2]).
Neste “quadro legal” e atentas as conclusões do recurso de apelação interposto pela Executada/Embargada, são 5 (cinco) as questões a apreciar por este Tribunal ad quem:
1) Se a sentença recorrida deve ser alterada no que concerne à matéria de facto nos termos indicados pela Embargante;
2) E se a sentença recorrida deve ser alterada quanto à extemporaneidade da dedução dos embargos e quanto à nulidade da citação da insolvente.
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3. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Na sentença ora impugnada, o Tribunal a quo considerou como provados os seguintes factos:
1- A 23-3-2022 foi realizada citação com hora certa através de nota afixada à porta na Rua ..., ..., ... ..., ..., residência do legal representante da insolvente, BB.
2- A sentença que declarou a insolvência da embargante foi proferida a 26-4-2022.
3- A 22-6-2022 o ilustre mandatário da embargante juntou requerimento aos autos em representação da insolvente.
4- Os presentes embargos foram interpostos a 28-6-2022.
5- No requerimento apresentado a 22-6-2022 o administrador de insolvência referiu já ter contactado os legais representantes da insolvente.
Na mesma sentença ora impugnada, o Tribunal a quo considerou como não provados os seguintes factos:
A- Que a agente de execução não confirmou que o representante legal da embargante vivia no local onde efetuou a citação.
B- Que a agente de execução não efetuou qualquer advertência.
C- O legal representante da embargante insolvente só teve conhecimento da sentença declaratória de insolvência no mês de junho de 2022.
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4. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
4.1. Da Alteração da Matéria de Facto

Sobre o recurso de impugnação na matéria de facto, prescreve o art. 640º/1 do C.P.Civil de 2013: “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
No que respeita à especificação dos meios probatórios, a alínea a) do nº2 do referido art. 640º, estatui que “Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”.
Têm sido suscitadas dúvidas sobre se sobre se os requisitos do ónus impugnatório previsto neste art. 640º/1 devem figurar apenas no corpo das alegações ou se também têm que integrar as próprias conclusões, sob pena do recurso ser rejeitado (cfr. art. 635º/2 e 639º/1 do C.P.Civil de 2013).

Tem vindo a constituir entendimento pacífico do Supremo Tribunal de Justiça que:
1) o Recorrente tem sempre que indicar os «concretos prontos de facto» que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
2) o Recorrente deve especificar, na motivação, os meios de prova, constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos, mas não sendo necessário que tal especificação também conste das conclusões;
3) relativamente aos «pontos de facto» cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em «prova gravada», para além da supra referida especificação dos meios de prova, o Recorrente está obrigado a indicar, com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos, mas não sendo necessário que tal indicação conste das conclusões;
4) e, na motivação, o Recorrente tem expressar a decisão, no seu entendimento, que deve ser proferida sobre os «concretos prontos de facto» que impugnou, tendo em atenção a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, o que se compreende em razão do reforço do ónus de alegação, com vista a evitar a interposição de recursos com conteúdo genérico ou inconsequente[3].
Neste sentido, entre outros, decidiu-se no Ac. do STJ de 29/10/2015[4]: “1. Face aos regimes processuais que têm vigorado quanto aos pressupostos do exercício do duplo grau de jurisdição sobre a matéria de facto, é possível distinguir um ónus primário ou fundamental de delimitação do objecto e de fundamentação concludente da impugnação - que tem subsistido sem alterações relevantes e consta actualmente do nº1 do art. 640º do CPC; e um ónus secundário - tendente, não propriamente a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado, no seu conteúdo prático, ao longo dos anos e das várias reformas - indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exacta das passagens da gravação relevantes (e que consta actualmente do art. 640º, nº2, al. a) do CPC). 2. Este ónus de indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando - apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exacta e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento - como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da acta, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento complemente tal indicação com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objecto do recurso”.
E entendeu-se no Ac. do STJ de 01/10/2015[5] que “I - No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe. II - Servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso. III - Não existe fundamento legal para rejeitar o recurso de apelação, na parte da impugnação da decisão da matéria de facto, numa situação em que, tendo sido identificados nas conclusões os pontos de facto impugnados, assim como as respostas alternativas propostas pelo recorrente, não foram, contudo, enunciados os fundamentos da impugnação nem indicados os meios probatórios que sustentam uma decisão diferente da que foi proferida pela 1.ª instância, requisitos estes que foram devidamente expostos na motivação. IV - Com efeito, o ónus a cargo do recorrente consagrado no art. 640º, do Novo CPC, não exige que as especificações referidas no seu nº1, constem todas das conclusões do recurso, mostrando-se cumprido desde que nas conclusões sejam identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação”[6]. Explica-se neste aresto que «as exigências que o legislador entendeu consagrar nesta matéria e que impõem ao Tribunal o dever de fundamentação e de motivação crítica da prova, no actual art. 607º, nº 4, do CPC, encontra o seu contraponto na igual exigência imposta à parte Recorrente, que pretenda impugnar a decisão de facto, do respectivo ónus de impugnação, devendo o Recorrente expor os argumentos que, extraídos de uma apreciação crítica dos meios de prova, determinem, em seu entender, um resultado diverso do decidido pelo Tribunal “a quo” (…) recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus: Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento; Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa; Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas. Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão (…)» (os sublinhados são nossos).
Neste âmbito mostra-se relevante o Ac. do STJ de 22/09/2015[7] que clarifica: “II – Na impugnação da decisão de facto, recai sobre o Recorrente “um especial ónus de alegação”, quer quanto à delimitação do objecto do recurso, quer no que respeita à respectiva fundamentação. III – Na delimitação do objecto do recurso, deve especificar os pontos de facto impugnados; na fundamentação, deve especificar os concretos meios probatórios que, na sua perspectiva, impunham decisão diversa da recorrida (art. 640.º, n.º 1, do NCPC) e, sendo caso disso (prova gravada), indicando com exactidão as passagens da gravação em que se funda (art. 640.º, n.º 2, al. a), do NCPC). IV – A inobservância do referido em III é sancionada com a rejeição imediata do recurso na parte afectada. V - Se essa cominação se afigura indiscutível relativamente aos requisitos previstos no n.º1, dada a sua indispensabilidade, já quanto ao requisito previsto no n.º2, al. a), justifica-se alguma maleabilidade, em função das especificidades do caso, da maior ou menor dificuldade que ofereça, com relevo, designadamente, para a extensão dos depoimentos e das matérias em discussão. VI - Se a falta de indicação exacta das passagens da gravação não dificulta, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório, nem o exame pelo tribunal, a rejeição do recurso, com este fundamento, afigura-se uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável”.
A análise do cumprimento destes ónus (exigências legais) deve ser realizada, como explica António Abrantes Geraldes[8], “à luz de um critério de rigor. Trata-se afinal, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo. Exigências que, afinal, devem ser o contraponto dos esforços que todos quantos, durante décadas, reclamaram a atenuação do princípio da oralidade pura e a atribuição à Relação de efetivos poderes de sindicância da decisão da matéria de facto como instrumento da realização da justiça”.
É um dado objectivo que, nas alegações de recurso, existe uma forte tendência para “combinar” e “misturar” a impugnação de facto com a impugnação de direito, sendo que muitas vezes são invocadas meras “opiniões” sobre o que foi dado como provado e/ou não provado, afirmando-se um entendimento distinto mas, mesmo assim, há conformação com uma parte da decisão que foi tomada, havendo efectiva impugnação relativamente a outra parte. Logo, e como resulta da alínea a) do nº1 do referido art. 640º, impõe-se que o recorrente, nas respetivas conclusões, indique concretamente quais são os pontos da matéria de facto que impugna e o que entende que deve ser dado como «assente» e/ou como «não assente», relevando e apresentando a sua pretensão de uma forma inequívoca e que permita separar a mera exposição da sua apreciação sobre a prova da pretensão fundamentada quanto à alteração da matéria de facto.
 O incumprimento de qualquer dos ónus supra indicados conduz à imediata rejeição da impugnação da decisão da matéria de facto (rejeição que será total ou parcial, consoante o incumprimento seja relativo a todo o âmbito da impugnação ou seja relativo apenas a uma parte da impugnação), não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões. Como resulta do disposto na alínea a) do nº1 do art. 652º do C.P.Civil de 2013, os poderes do relator, em matéria de convite ao aperfeiçoamento, estão inequivocamente limitados às situações previstas no nº3 do art. 639º do mesmo diploma legal, que não incluem incumprimento dos referidos ónus. Entre outros, refere-se aqui o Ac. do STJ de 25/03/2021[9], no qual se decidiu que “III - Omitindo o recorrente o cumprimento do ónus processual fixado na alínea a) e c) do nº 1 do art. 640º do CPCivil, impõe-se a imediata rejeição da impugnação da matéria de facto, não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões”[10].
Porém, a decisão da matéria de facto pode apresentar «patologias» que não correspondem verdadeiramente a erros de apreciação ou de julgamento, sendo que em tais «patologias» enquadra-se a deficiência da decisão de facto decorrente da falta de apreciação e de inclusão, na matéria de facto provada ou não provada, de algum (ou alguns) facto essencial (ou principal) da causa que tenha sido alegado pelas partes. Como decorre do disposto no nº1 do art. 5º do C.P.Civil de 2013, factos essenciais são aquelas que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas (e cujo ónus alegatório incumbe às partes). Obviamente, tal falta de pronúncia também pode reportar-se a factos instrumentais e/ou a factos «complementares e concretizadores» que resultem da instrução da causa [cfr. art. 5º/2a) e b) do C.P.Civil de 2013].
Explica-se no Ac. desta RG de 16/03/2023[11]: “Realidade diversa da impugnação da decisão de facto, que pressupõe um erro de julgamento, é a deficiência da decisão de facto, que está plasmada no art.º 662º n.º 2 alínea c) (…) Actualmente poderá afirmar-se que haverá deficiência quando o tribunal não se pronuncie sobre algum facto integrante dos temas da prova ou como refere Abrantes Geraldes (…) a decisão de facto será deficiente se houver «falta de pronúncia sobre factos essenciais ou complementares», «de modo que conjugadamente se mostre impedido o estabelecimento de uma plataforma sólida para a integração jurídica do caso»; será caso de ampliação da matéria de facto, quando tiver sido omitida dos temas da prova matéria de facto alegada pelas partes que se revele essencial para a resolução do litigio (...)”.
O vício formal de deficiência da decisão de facto, tal como os vícios formais de obscuridade e de contradição da mesma decisão de facto, estão expressamente previstos na alínea c) do nº2 do art. 662º do C.P.Civil de 2013: “2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente: (…) c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”.
Tais vícios recaem sobre o próprio enunciado do juízo probatório, não dizendo, portanto, respeito à respetiva motivação, devendo ter-se por deficiente “o enunciado linguístico que expresse um sentido incompleto do respetivo juízo probatório, nos seus próprios termos, não abrangendo naquele a factualidade ali relevante ou não cobrindo, de forma positiva ou negativa, todo o facto enunciado como provado”, devendo considerar-se como obscuro “o enunciado probatório vagos, ininteligível, equívoco ou imprecisos”, e devendo qualificar-se como contraditórios “os que exprimam sentidos reciprocamente excludentes”[12].
Detectado qualquer um destes vícios (patologias) da decisão de facto, como se explica no Ac. do STJ de 17/10/2019[13], “os poderes conferidos ao Tribunal da Relação como verdadeiro tribunal de instância - tendo em vista o cumprimento do desiderato de um segundo nível de jurisdição em matéria de facto em idênticas condições e sujeito às mesmas regras de direito probatório que vinculam o tribunal de 1ª instância -, conferem-lhe o dever, por um lado, de deles conhecer oficiosamente (independentemente, pois, da existência ou não de impulso da parte interessada) e, por outro, de os poder suprir imediatamente, desde que, naturalmente, constem do processo (ou da gravação) os elementos probatórios indispensáveis para esse suprimento (os sublinhados são nossos).
Com efeito, na apreciação e decisão do recurso, o Tribunal da Relação pode deparar-se com uma decisão de facto que se mostra deficiente e que exige a sua ampliação, “por terem sido desconsiderados nos temas de prova factos alegados pelas partes e essenciais para a resolução do litígio ou, ainda, como ora sucede, por terem sido desconsiderados na decisão factos que se revelem essenciais para a resolução do litígio, na medida em que assegurem um enquadramento ou fundamentação jurídica diverso do que foi suposto pelo Tribunal a quo. Trata-se de uma faculdade que nem sequer está dependente da iniciativa do recorrente, bastando que a Relação se confronte com uma omissão objectiva de factos relevantes”[14].
Do primeiro segmento normativo do art. 662º/2c) parece resultar que a deficiência da decisão de facto tem, como consequência, a anulação do julgamento (“A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente, anular a decisão proferida na 1ª instância”). Porém, como supra já se referiu e atendendo ao teor do segundo segmento normativo (“quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto”), dúvidas não existem de que o Tribunal da Relação, verificando a existência do vício da deficiência da decisão de facto (ou dos vícios da obscuridade ou da contradição), poderá/deverá supri-los a partir dos elementos que constam do processo e/ou da prova gravada.
Daqui resulta que a anulação do julgamento está, afinal, configurada como a última consequência do vício formal da deficiência da decisão de facto: “a anulação da decisão de 1ª instância apenas deve ser decretada se do processo não constarem todos os elementos probatórios relevantes. Ao invés, se estes estiverem acessíveis, a Relação deve proceder à sua apreciação e introduzir na decisão da matéria de facto as modificações que forem consideradas oportunas (…) deve ser sempre uma medida de último recurso, apenas legítima quando de outro modo não for possível superar a situação, por forma a fixar com segurança a matéria de facto provada e não provada, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, tendo em conta, além do mais, os efeitos negativos que essa anulação determina ao nível da celeridade e da eficácia”[15].
Importa ter presente que, no caso dos vícios de deficiência, obscuridade ou contradição da decisão de facto, o Tribunal da Relação actuará como Tribunal de substituição ou Tribunal de cassação consoante as circunstâncias concretas de cada caso (recurso): “Deparando-se a Relação com respostas que sejam de reputar deficientes, obscuras ou contraditórias, se a reapreciação dos meios de prova permitir sanar a deficiência, obscuridade ou a contradição, a Relação fá-lo-á sem necessidade de reenviar o processo ao tribunal recorrido, após o que prosseguirá com a apreciação das demais questões que o recurso suscite. No caso inverso, cabe-lhe assinalar as referidas nulidades, determinar a anulação (parcial) do julgamento e ordenar que o tribunal a quo as supere”[16], frisando-se que tais vícios, dada a sua natureza formal, só relevam quando obstem a qualquer pronunciamento de mérito sobre o juízo probatório dessa forma afetado[17].
A alteração oficiosa da matéria de facto pelo Tribunal da Relação com fundamento em deficiência, obscuridade ou contradição, quando constam dos autos todos os elementos de prova foi considerada conforme com a Constituição (ou seja, não está afectada do vício da inconstitucionalidade) pelo Ac. do TC de 08/07/2009[18]: embora tal aresto se tenha pronunciado sobre o art. 712º/1a) e 4 do C.P.Civil na versão anterior a 2013, o respectivo entendimento tem plena aplicabilidade ao disposto no art. 662º/2c) do C.P.Civil de 2013, porque este normativo é idêntico ao daquele antigo  art. 712º/1a) e 4.
Analisando as conclusões formuladas e motivação deduzida pela Embargante/Recorrente e tendo em consideração o entendimento supra exposto, que se acolhe e segue, temos que concluir que as alegações de recurso cumprem os respectivos requisitos formais (sendo que, nas conclusões, até se indicam os meios de prova e se faz a apreciação crítica dos mesmos, o que é desnecessário) sendo que o âmbito da impugnação de facto deduzida (em conformidade com o sustentando pela Embargante/Recorrente) restringe-se a: o facto provado nº1 deve ser considerado como facto não provado; e os factos não provados A) e C) devem ser dados como provados (mostra-se completamente errada a alegação produzida pela Embargada, em sede de contra-alegações, no sentido de que a «matéria de facto dada por provada não foi especificamente impugnada» já que o facto provado nº1 foi concretamente impugnado).
Sobre os termos em que a reapreciação da matéria de facto deve ser realizada, estatui o nº1 do art. 662º) do C.P.Civil de 2013, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se, quanto aos factos tidos como assentes (ou quanto aos os factos tidos como não provados, acrescentamos nós), a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Como refere Abrantes Geraldes[19], “Com a redacção do art. 662º pretendeu-se que ficasse claro que, sem embargo de correcção, mesmo a título oficioso, de determinadas patologias que afectam a decisão da matéria de facto (v.g. contradição) e também sem prejuízo do ónus de impugnação que recai sobre o recorrente e que está concretizado nos termos previstos no art. 640º, quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos, e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras da experiência… fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia… sem embargo, das modificações que podem ser oficiosamente operadas relativamente a determinados factos cuja decisão esteja eivada de erro de direito, por violação de regras imperativas, à Relação não é exigido, nem lhe é permitido que, de motu próprio, se confronte com a generalidade dos meios de prova que estão sujeitos a livre apreciação e que, ao abrigo desse princípio foram valorados pelo Tribunal de 1ª instância, para deles extrair, como se se tratasse de um novo julgamento, uma decisão inteiramente nova. Pelo contrário, as modificações a operar devem respeitar o que o recorrente, no exercício do seu direito de impugnação da decisão da matéria de facto, indicou nas respectivas alegações que circunscrevem o objecto de recurso(os sublinhados são nossos).
A decisão de facto consiste na apreciação que o Tribunal faz, em função da prova produzida, sobre os factos alegados pelas partes (ou oportuna e licitamente adquiridos no decurso da instrução) e que se mostrem relevantes para a resolução do litígio, pelo que tal decisão tem por objeto os juízos probatórios parcelares, positivos ou negativos, sobre cada um desses factos relevantes, embora com o alcance da respetiva fundamentação ou motivação. Neste quadro, no âmbito do recurso, a apreciação do erro de julgamento da decisão de facto está circunscrita aos pontos impugnados, mas em termos de latitude da investigação probatória, o Tribunal da Relação tem um amplo poder inquisitório sobre a prova produzida que imponha decisão diversa, como decorre do estatuído no referido art. 662º/1 do C.P.Civil de 2013, incluindo os mecanismos de renovação ou de produção dos novos meios de prova, nos exatos termos das alíneas a) e b) do nº2 do mesmo preceito, sem estar adstrito aos meios de prova que tiverem sido convocados pelas partes e nem sequer aos indicados pelo tribunal recorrido: “… como é hoje jurisprudência seguida por este Supremo Tribunal, a reapreciação da decisão de facto impugnada pelo tribunal de 2.ª instância não se limita à verificação da existência de erro notório por parte do tribunal a quo, mas implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, por parte do tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa”[20].
Em jeito de resumo e conclusão, traz-se aqui à colação o Ac. do STJ de 04/10/2018[21], que define bem o “quadro” em que funciona a reapreciação da matéria de facto pelo Tribunal da Relação: “I. A apreciação da decisão de facto impugnada pelo Tribunal da Relação não visa um novo julgamento da causa, mas, antes, uma reapreciação do julgamento proferido pelo Tribunal de 1ª Instância com vista a corrigir eventuais erros da decisão. II. No âmbito dessa apreciação, incumbe ao Tribunal da Relação formar a seu próprio juízo probatório sobre cada um dos factos julgados em primeira instância e objeto de impugnação, de acordo com as provas produzidas constantes dos autos e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir [cfr. nº 2, als. a) e b) do artigo 662º do CPC], à luz do critério da sua livre e prudente convicção, nos termos do artigo 607.º, n.º 5, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil. III. O Tribunal da Relação, tal como decorre do preceituado nos artigos 5º, nº2, alínea a), 640º, nº 2, alínea b) e 662º, nº1, todos do Código de Processo Civil, tem um amplo poder inquisitório sobre a prova produzida que imponha decisão diversa e não está adstrito aos meios de prova que tiverem sido convocados pelas partes nem aos indicados pelo Tribunal de 1ª Instância, apenas relevando o fator da imediação prevalecente em 1ª Instância quando o mesmo se traduza em razões objetivas. IV. Em sede de reapreciação da decisão de facto é conferido ao Tribunal da Relação o poder de se socorrer, mesmo oficiosamente, de todos os meios de prova constantes do processo bem como do uso a presunções judiciais, nos termos permitidos pelos artigos 349º e 351º, ambos do Código Civil” (os sublinhados são nossos).
Estatui o art. 607º/5 do C.P.Civil de 2013, que o “juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”, sendo que esta previsão resulta do disposto nos arts. 389º, 391º e 396º do C.Civil, respectivamente para a prova pericial, para a prova por inspecção e para a prova testemunhal. Porém, desta livre apreciação pelo juiz estão legalmente excluídos os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, aqueles que só possam ser provados por documentos ou aqueles que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes - cfr. 2ªparte do nº5 do referido art. 607º.
Toda a prova tem que ser apreciada segundo critérios de valoração racional e lógica do julgador, com recurso às regras da experiência e critérios de lógica: “(…) segundo o princípio da livre apreciação da prova o que torna provado um facto é a íntima convicção do juiz, gerada em face do material probatório trazido ao processo (bem como da conduta processual das partes) e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento dos homens; não a pura e simples observância de certas formas legalmente prescritas[22].
A prova idónea (suficiente) alicerça-se num juízo de certeza (jurídica) e não um juízo de certeza material (absoluto): a prova “não é uma operação lógica visando a certeza absoluta (a irrefragável exclusão da possibilidade de o facto não ter ocorrido ou ter ocorrido de modo diferente) (…) a demonstração da realidade de factos desta natureza, com a finalidade do seu tratamento jurídico, não pode visar um estado de certeza lógica, absoluta,… A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto[23].
O juiz está vinculado a identificar quais os concretos meios probatórios que serviram para formar a sua convicção e a indicar as razões pelas quais, relativamente ao mesmo facto, concede maior credibilidade a um meio probatório em detrimento de outro de sinal oposto, sendo que este é caminho que evita que a «livre apreciação da prova» se transforme numa «arbitrária apreciação da prova»: o “juiz [de 1ª Instância] explicará por que motivo deu mais crédito a uma testemunha do que a outra, por que motivo deu prevalência a um laudo pericial em detrimento de outro, por que motivo o depoimento de certa testemunha tecnicamente qualificada levou à desconsideração de um relatório pericial ou por que motivo não deu como provado certo facto apesar de o mesmo ser referido em vários depoimentos. E é ainda assim por referência a certo depoimento e a propósito do crédito que merece (ou não), o juiz aludirá ao modo como o depoente se comportou em audiência, como reagiu às questões colocadas, às hesitações que não teve (teve), a naturalidade e tranquilidade que teve (ou não)”[24].
É inquestionável que, uma vez que é perante si que toda a prova é produzida, é o juiz da 1ªinstância quem se encontra na posição mais favorável e privilegiada para proceder à sua valoração, nomeadamente no que concerne especificamente à prova testemunhal: atenta a respectiva imediação, o juiz da 1ªinstância está totalmente habilitado a detectar no comportamento das testemunhas todos os elementos relevantes para aferir da espontaneidade e credibilidade dos seus depoimentos, incluindo aqueles elementos que frequentemente não transparecem da gravação (esta constitui apenas um registo «áudio», e não um registo «vídeo», pelo que não pode transmitir todos os comportamentos da testemunha que respeitam directamente às suas reacções só observáveis através de imagem). Por conseguinte, a modificabilidade da matéria de facto só deverá ordenada quando, ao cumprir a supra referida incumbência de formar o seu próprio juízo probatório, o Tribunal da Relação conclua no sentido de que a prova produzida tem um sentido diverso e impõe uma decisão diferente da que foi proferida pelo Tribunal da 1ªInstância, ou seja, quando consiga alcançar um juízo certo e seguro de que existe erro de julgamento na matéria de facto[25].
Como explica Ana Luísa Geraldes[26], “Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte”.
Relativamente à interpretação do princípio da imediação, mostra-se relevante o entendimento explanado no Ac. do STJ (de fixação de jurisprudência) de 29/10/2008[27]: “Sem dúvida que a imediação torna possível, na apreciação das provas, a formação de um juízo insubstituível sobre a credibilidade da prova; das razões que se podem observar, no exame directo da prova, para acreditar, ou não acreditar, na mesma. Significa o exposto que a imediação é o meio pelo qual o tribunal realiza um acto de credibilização sustentada sobre determinados meios de prova em relação a outros. Exemplifica-se o exposto recorrendo ao caso do testemunho que parece mais digno de crédito do que um outro pela percepção directa imediata do seu relato e das circunstâncias em que o mesmo se desenrolou: - terá sido mais categórico, eventualmente mais seguro; terá recorrido menos vezes à aquiescência tácita de terceiro; ter-se-á expressado em termos mais correntes e mais próprios da sua condição social o que induziu o tribunal a pensar que o seu testemunho era mais fidedigno e menos passível de preparação prévia; suportou com maior à vontade o exercício do contraditório. Todas estas, que são razões que servem para acreditar em determinadas provas, e não acreditar noutras, sem dúvida que só são susceptíveis de ser apreciadas directamente pela pessoa que as avalia - o juiz de julgamento em primeira instância - e a possibilidade de admitir que tais circunstancias possam ser aferidas somente com recurso a um escrito - a denominada transcrição - produz uma evidente dificuldade pela ausência, ou diminuta qualidade de informação carreada para o tribunal, susceptível de o informar sobre as razões da atribuição de credibilidade” (os sublinhados são nossos).
Estritamente conexionada com a decisão de facto está o ditame legalmente consagrado no art. 607º/4 do C.P.Civil de 2013: o Tribunal só deve responder aos factos que julga provados e não provados, não envolvendo esta pronúncia aqueles pontos que contenham matéria conclusiva, irrelevante ou de direito.
Como se decidiu no Ac. do STJ de 28/09/2017[28], “Muito embora o art. 646.º, n.º 4, do anterior CPC tenha deixado de figurar expressamente na lei processual vigente, na medida em que, por imperativo do disposto no art. 607.º, n.º 4, do CPC, devem constar da fundamentação da sentença os factos julgados provados e não provados, deve expurgar-se da matéria de facto a matéria susceptível de ser qualificada como questão de direito, conceito que, como vem sendo pacificamente aceite, engloba, por analogia, os juízos de valor ou conclusivos(o sublinhado é nosso).
Mas o mesmo STJ, através do seu aresto de 22/03/2018[29], sustenta que a inexistência no C.P.Civil de 2013 de um preceito como o do art. 646º/4 do antigo C.P.Civil (que titulava de “não escrita” as respostas do coletivo sobre questões de direito) “não pode deixar de ter implicações no que concerne à atual metodologia no que concerne à descrição na sentença do que constitui «matéria de facto» e «matéria de direito»”No que concerne à decisão sobre a matéria de facto provada e não provada, não será indiferente nem o modo como as partes exerceram o seu ónus de alegação, nem a forma como o juiz, na audiência prévia ou em despacho autónomo, enunciou os temas da prova, tarefas relativamente às quais foram introduzidas no CPC importantes alterações que visaram quebrar rotinas instaladas e afastar os efeitos negativos a que conduziu a metodologia usualmente aplicada no âmbito do CPC de 1961… A matéria de facto provada deve ser descrita pelo juiz de forma mais fluente e harmoniosa do que aquela que resultava anteriormente da mera transcrição do resultado de respostas afirmativas, positivas, restritivas ou explicativas a factos sincopados que usualmente preenchiam os diversos pontos da base instrutória do CPC de 1961…”. Defende-se que, em face da modificação formal da produção de prova em audiência ter por objeto temas de prova e à opção da integração da decisão da matéria de facto no âmbito da própria sentença, “deve existir uma maior liberdade no que concerne à descrição da realidade litigada, a qual não deve ser imoderadamente perturbada por juízos lógico-formais em torno do que seja «matéria de direito» ou «matéria conclusiva» que apenas sirva para provocar um desajustamento entre a decisão final e a justiça material do caso... a patologia da sentença neste segmento apenas se verificará, em linhas gerais, quando seja abertamente assumida como «matéria de facto provada» pura e inequívoca matéria de direito…”[30].
Perante esta divergência no STJ, afigura-se-nos relevante o “caminho” indicado pelo Ac. da RG de 11/11/2021[31]: “Não obstante subscrevermos uma maior liberdade introduzida pelo legislador no novo (atual) Código de Processo Civil, entendemos que não constituem factos a considerar provados na sentença nos termos do disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil os que contenham apenas formulações absolutamente genéricas e conclusivas, não devendo também constituir «factos provados» para esse efeito as afirmações que «numa pura petição de princípio assimile a causa de pedir e o pedido»… De facto, se a opção legislativa tem subjacente a possibilidade de com maior maleabilidade se fazer o cruzamento entre a matéria de facto e a matéria de direito, tanto mais que agora ambos (decisão da matéria de facto e da matéria de direito) se agregam no mesmo momento, a elaboração da sentença, tal não pode significar que seja admissível a «assimilação entre o julgamento da matéria de facto e o da matéria de direito ou que seja possível, através de uma afirmação de pendor estritamente jurídico, superar os aspetos que dependem da decisão da matéria de facto»…” (os sublinhados são nossos).
Prosseguindo este “caminho” (e sabendo-se que a linha divisória entre a matéria de facto e a matéria de direito não é fixa, dependendo em larga medida dos termos em que a lide se apresenta), afigura-se-nos que os factos conclusivos não devem relevar (não podem integrar a matéria de facto) quando, porque estão diretamente relacionados com o thema decidendum, impedem ou dificultam de modo relevante a percepção da realidade concreta, seja ela externa ou interna, ditando simultaneamente a solução jurídica, normalmente através da formulação de um juízo de valor[32] e que é de acolher o ensinamento do Ac. da RP de 07/12/2018[33]: Acaso o objeto da ação esteja, total ou parcialmente, dependente do significado real das expressões técnico-jurídicas utilizadas, há que concluir que estamos perante matéria de direito e que tais expressões não devem ser submetidas a prova e não podem integrar a decisão sobre matéria de facto. Se, pelo contrário, o objeto da ação não girar em redor da resposta exata que se dê às afirmações feitas pela parte, as expressões utilizadas, sejam elas de significado jurídico, valorativas ou conclusivas, poderão ser integradas na matéria de facto, passível de apuramento através da produção dos meios de prova e de pronúncia final do tribunal que efetua o julgamento, embora com o significado vulgar e corrente e não com o sentido técnico-jurídico que possa colher-se nos textos legais” (o sublinhado é nosso)[34].
Frise-se que a questão de saber se um concreto facto integra um conceito de direito ou assume feição conclusiva ou valorativa constitui questão de direito, porquanto a sua apreciação não envolve um juízo sobre a idoneidade da prova produzida para a demonstração ou não desse facto enquanto realidade da vida ou sobre o acerto ou desacerto da decisão que o teve por provado ou não provado[35], e, por via disso, quando o recurso tem por objecto saber se um determinado facto julgado provado pelo tribunal contém ou não matéria conclusiva, ao abrigo dos seus poderes decisórios previstos no art. 662º do C.P.Civil de 2013, pode o Tribunal de Recurso, caso conclua afirmativamente, eliminá-lo do elenco dos factos provados[36]: como se refere no Ac. da RG de 30/09/2021[37], “Daí que a inclusão na fundamentação de facto constante da sentença de matéria de direito ou conclusiva configure uma deficiência da decisão, vício que é passível de ser conhecido, mesmo oficiosamente, pelo Tribunal da Relação, tal como decorre do artigo 662.º, n.º2, al. c), do CPC”.
Tecidas estas considerações jurídicas, cumpre proceder à reapreciação dos pontos de facto que foram concreta e validamente impugnados pela Embargante/Recorrente.
Como ponto prévio, deixa-se aqui expressamente consignado que foram integralmente ouvidos todos os depoimentos prestados pelas testemunhas e as declarações de parte prestadas pelos legais representantes da Embargada e da Embargante, e foi analisada toda a prova documental apresentada nos autos (nestes e nos autos principais).
Quanto ao facto provado nº1.
Relembra-se aqui o seu conteúdo: «A 23-3-2022 foi realizada citação com hora certa através de nota afixada à porta na Rua ..., ..., ... ..., ..., residência do legal representante da insolvente, BB».
Nos presentes autos de embargos à insolvência, peticiona-se que «seja declarada a inexistência de citação da Requerida, e, caso assim não se entenda, deverá ser declarada a nulidade da citação, com as devidas consequências legais» porque, alegadamente: «não houve a transmissão de determinada informação o que leva a que haja falta de citação; foram preteridas formalidades prescritas no CPC pelo que tem que se considerar nula; a Agente de Execução não confirmou que o representante legal residia no pretenso local; não foi realizada advertência à pessoa que a Agente de Execução encontrou no local relativamente a todas as consequências da não transmissão da comunicação ao citando; após a junção da certidão datada de 23.03.2022, não foi junta aos autos nova certidão da deslocação da Agente de Execução à referida morada para efetuar citação».
Considerando este objecto do litígio, é manifesto que na formulação do ponto de facto correspondente ao facto provado nº1, o Tribunal a quo integrou expressão que assume uma natureza totalmente jurídico-conclusiva, directamente relacionada com o thema decidendum: a expressão «foi realizada a citação» corresponde a uma parte essencial da controvérsia desta acção/embargos (que só deve ser apreciada e decidida no âmbito da questão de direito subjacente à impugnação da matéria de facto): a inexistência/falta de citação (art. 188º do C.P.Civil de 2013). Nesta parte, o objecto dos embargos está dependente do significado real desta expressão técnico-jurídica, ou seja, há que apurar e consignar na matéria de facto quais foram os concretos actos que foram praticados com vista à realização da citação (incluindo os documentos elaborados relativamente a esse actos e que foram juntos aos autos), e é a partir da realidade fáctica que (neste âmbito) ficar «demonstrada» e/ou «não demonstrada» que será extraída a conclusão jurídica sobre se ocorre (ou não) a falta de citação da Embargante. E mais se saliente que, caso se conclua negativamente (não há falta de citação), será com base na mesma realidade fática que, em seguida, será extraída outra conclusão jurídica, agora sobre a questão de terem sido ou não cumpridas as formalidades prescritas na lei para a realização da citação.
Portanto, a expressão em causa tem um conteúdo manifestamente conclusivo, encerrando mesmo um juízo de valor que representa a própria solução jurídica de uma das questões a decidir nestes embargos e, por via disso, não pode constar da decisão de facto (isto é, não pode constar quer dos factos provados, quer dos factos não provados), pelo que tem que ser eliminada da mesma, nomeadamente do ponto de facto em causa.
Por outro lado, verifica-se que, ainda na formulação deste ponto de facto, o Tribunal a quo inclui um segmento - «residência do legal representante da insolvente, BB» - que representa uma realidade (facto) distinta da que respeita exclusivamente aos actos que foram praticados com vista à realização da citação: se tal morada corresponde ou não à residência do legal representante no momento em que foram praticados tais actos, constitui, óbvia e necessariamente, um facto relevante para apreciação e decisão da questão da inexistência/falta de citação; porém, como configura uma realidade distinta da relativa a tais actos, deve ser retirada deste ponto de facto e deve ser incluída na decisão de facto mas como um outro ponto de facto, autónomo da matéria que consta do faco provado nº1 que respeita exclusivamente à citação.
Nestas circunstâncias, quanto ao facto provado nº1 determina-se a eliminação da expressão «foi realizada a citação» do seu conteúdo, remanescendo no seu âmbito a matéria relativa «A 23-3-2022 foi afixada nota de hora certa à porta na Rua ..., ..., ... ..., ...» e sendo retirada do sue âmbito, mas para ser incluída noutro ponto de facto autónomo, a matéria relativa à «residência do legal representante da insolvente, BB».
Na decisão recorrida, a indicação da fundamentação quanto à demonstração probatória de toda a factualidade provada foi realizada de uma forma global, isto é, sem uma indicação discriminada de qual o meio de prova (ou meios de prova) valorado para cada concreto ponto de facto provado (ou para um conjunto de pontos de facto não provados), o que pode dificultar a percepção e a determinação de qual foi a concreta razão relevante para fundamentar cada ponto de facto provado. Esta situação pode conduzir a que o Tribunal ad quem tenha necessidade de impor a remessa ao Tribunal a quo para que proceda à devida fundamentação da decisão sobre esse (ou esses) ponto de facto (cfr. art. 662º/2d) do C.P.Civil de 2013).
Em resultado desta “técnica” de motivação, o Tribunal a quo não “isolou” a concreta razão com base na qual formou o respectivo juízo no sentido de considerar como provada a matéria deste facto mas, ainda assim, conseguem-se alcançar quais foram essas razão:
“A matéria de facto provada resulta do teor dos documentos juntos pela embargante, conjugados com o depoimento da testemunha EE, agente de executou que efetuou a citação com hora certa do legal representante da insolvente, tendo descrito como se deslocou à residência do legal representante da insolvente, BB, deixou aviso de contacto e falou com a mãe da namorada daquele. Regressou às 20.00 horas ao local, não tendo aparecido ninguém. Deixou o aviso na porta porque quando encontrou a mãe da namorada a senhora pareceu-lhe um bocado nervosa, e mais tarde deixou a citação na porta do prédio. Este é o procedimento que segue sempre (…)
Ouvido o legal representante da insolvente em declarações de parte, declarou que vive sozinho, embora receba visitas da namorada, a quem por vezes dá a chave de casa. Mais declarou que a mãe da sua namorada vai a sua casa muito raramente e que não viu qualquer papel de citação na sua caixa de correio em março de 2022. Viaja muito por questões profissionais, ausentando-se por vezes por períodos de uma semana, mas não sabe precisar se estava a viajar na altura. Não chegou ao seu conhecimento que a agente de execução esteve na sua casa, mas obteve conhecimento da insolvência através do Dr FF, que deixou o cartão na sua caixa de correio. Quando viu o cartão ligou-lhe, terá sido em junho. Estas declarações do legal representante da insolvente não resultam muito credíveis tendo em conta que, mesmo que estivesse a viajar na data da citação, seria muito estranho não tomar conhecimento da declaração de insolvência logo que voltou, já que não se demora mais de uma semana em viagem, pela pessoa com quem a agente de execução contactou, que se terá identificado como mãe da namorada do citando. Nem que não tenha visto a nota de citação afixada à porta da entrada do prédio, mas já tenha visto o cartão do administrador de insolvência dentro da sua caixa de correio (…)”.
Frise-se que, nas suas alegações, a Embargante/recorrente jamais invoca que a decisão recorrida é omissa quanto à fundamentação (motivação) deste ponto de facto, o que significa que compreendeu suficientemente a convicção que o Tribunal a quo formou nesta matéria.
Assim sendo, e apesar da “técnica” utilizada não ser a mais recomendada, entende-se que, neste caso, não está verificada a situação prevista na alínea d) do referido art. 662º do C.P.Civil de 2013 («não estando devidamente fundamentada»), não havendo que determinar que o Tribunal a quo complete a decisão no que concerne à motivação do facto aqui em causa.
Embora misture muitas vezes a impugnação da decisão de facto com considerações que respeitam exclusivamente à questão de direito da falta de citação e/ou do não cumprimento de formalidades, no que exclusivamente respeita à impugnação deste ponto de faco, a Embargante/Recorrente defende, essencialmente, que «resultou da prova produzida que não foi feita qualquer citação válida na residência do Sr. BB, porquanto, não só ressalta dos documentos juntos aos autos que a Agente de Execução não sabe quem ia citar, como também resulta que a estória que a própria relatou, quando prestou depoimento, não tem qualquer sentido» e que «o representante legal da Recorrente prestou depoimento tendo esclarecido que não vive com a namorada, que esta não tem chave de sua casa e a mãe da namorada também não» [cfr. conclusões F) a EE)].
Analisando os fundamentos invocados (nas respectivas motivação e conclusões) para a impugnação desta matéria de facto e procedendo à reapreciação do julgamento proferido pelo Tribunal a quo sobre esta matéria factual, considerada toda a prova produzida à luz do critério da livre apreciação e de prudente convicção, este Tribunal ad quem jamais pode concluir que o Tribunal a quo cometeu algum erro grosseiro na apreciação da prova quanto a esta matéria, ainda que com base em fundamentação diversa da sufragada pelo Tribunal a quo.
É inquestionável que, nos autos principais, na data de 24/04/2022, a agente de execução juntou documento denominado «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO» (e que corresponde ao documento nº... junto com a petição/requerimento de embargos).
Quer a Embargante/Recorrente, quer o próprio Tribunal a quo, olvidaram que este documento/certidão de citação constitui um documento autêntico nos termos do disposto no art. 363º/1 e 2 do C.Civil (“1. Os documentos escritos podem ser autênticos ou particulares. 2. Autênticos são os documentos exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividade que lhe é atribuído, pelo notário ou outro oficial público provido de fé pública; todos os outros documentos são particulares”).
Como decorre do disposto no art. 162º/1 da Lei nº154/2015, de 14/09 (Estatuto da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução), “O agente de execução é o auxiliar da justiça que, na prossecução do interesse público, exerce poderes de autoridade pública no cumprimento das diligências que realiza nos processos de execução, nas notificações, nas citações, nas apreensões, nas vendas e nas publicações no âmbito de processos judiciais, ou em atos de natureza similar que, ainda que não tenham natureza judicial, a estes podem ser equiparados ou ser dos mesmos instrutórios” (os sublinhados são nossos).
Logo, a aludida «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO» elaborada pela agente de execução, porque foi emitida no âmbito da sua competência e da sua actividade de exercício de poderes de autoridade pública, tem a natureza de documento autêntico.
Neste sentido, pronunciou-se o Ac. da RP de 04/05/2022[38]:“I - A certidão de citação elaborada por agente de execução (auxiliar da justiça que, na prossecução do interesse público, exerce poderes de autoridade pública no cumprimento das diligências que realiza os processos judiciais, designadamente nas citações - art. 162º, nº 1, da Lei 154/2015, de 14/09), constitui documento autêntico, legalmente revestido de força probatória plena”.
E, por força do estatuído, no art. 371º/1 do C.Civil (“Os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora; os meros juízos pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do julgador”), tal documento/certidão tem força probatória plena no que respeita aos factos que neles são referidos «como praticados pela autoridade ou respectivo oficial público» (no caso, a agente de execução) e/ou «com base nas percepções da “entidade documentadora”» (no caso, a agente de execução).
Neste “quadro” e porque são actos praticados pelo agente de execução, a força probatória plena de que está dotada a «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO» comprova e atesta que:
- pelas 19 horas e 50 minutos do dia 23/03/2022, relativamente ao citando GG, a agente de execução afixou na morada «Rua ..., ..., ..., ..., ...» a nota de citação com a indicação de que o duplicado e os documentos anexos ficam à disposição do mesmo na secretaria judicial;
- tal acto de afixação foi testemunhado por duas testemunhas (HH e II);
- e pelas 11 horas e 30 minutos do dia 22/03/2022, a agente de execução deixou aviso com a indicação para citação/notificação com dia e hora certa, tendo ficado consignado que a diligência será realizada pelas 20 horas do dia 23/03/2022.
Esta força probatória plena desta «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO», tal como de qualquer documento autêntico, só pode ser ilidida com base na sua falsidade, conforme estatui o art. 372º/1 do C.Civil. Como explicam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, e Luís Filipe Pires de Sousa[39] (em anotação ao art. 232º do C.P.Civil de 2013), “A certidão emitida pela agente de execução, baseando-se na percepção pessoal dos factos em apreço, constitui um documento autêntico nos termos e para os efeitos do art. 371º do CC, cuja força probatória só pode ser ilidida com base na sua falsidade (art. 372º do CC)”.
Analisando o teor da petição/requerimento de embargos (e mesmo apesar de ter junto cópia de tal documento/certidão – cfr. documento nº...), a Embargante/Recorrente não deduziu, de forma concreta, qualquer incidente de falsidade nos termos do art. 446º do C.P.Civil de 2013, sendo certo que estava obrigada a fazê-lo naquele articulado e sendo certo que esse incidente de falsidade é o único meio legal idóneo para afastar a respectiva força probatória plena do mesmo, nomeadamente quanto à sua falsidade ideológica (os actos neles atestados pelo agente de execução e como tendo sido por si praticados, na realidade não se verificaram).
Deste modo, não tendo a Embargante/Recorrente arguido tempestivamente o respectivo incidente de falsidade, não se mostra ilidida a força probatória plena do documento autêntico «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO».  Sempre se frise que os meios de prova indicados pela Embargante/Recorrente para a impugnação deste ponto de facto («documentos juntos aos autos demonstram que a Agente de Execução não sabe quem ia citar», a «estória que ela relatou não tem qualquer sentido», e «o representante legal da Recorrente esclareceu que não vive com a namorada, que esta não tem chave de sua casa e a mãe da namorada também não») são totalmente insusceptíveis de comprovarem que a falsidade dos factos atestados naquela certidão: por um lado, o depoimento da testemunha EE (agente de execução) e as declarações de parte do legal representante da Embargada (BB) não constituem meios de prova com o mesmo valor probatório daquela certidão; por outro lado, independentemente da maior ou menor lógica do seu depoimento, em momento algum do mesmo a testemunha EE reconheceu não ter praticado algum dos actos que atestou na certidão; e, por fim, ao contrário do que a Embargante/Recorrente quer fazer crer, apesar de, no requerimento subscrito pela agente de execução (junto aos autos principais na data de 24/04/2022), e com o qual foi junta a certidão, constar o nome de «CC» e em vez de «BB», verifica-se que na certidão o nome do «citando» (legal representante daquela) está absolutamente correcto, não se verificando o alegado «desconhecimento da pessoa a citar».
Por conseguinte, com base na «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO», que constitui documento autêntico e tem força probatória plena, impõe-se necessária e legalmente que este Tribunal ad quem formule um juízo no sentido estar probatoriamente demonstrada a matéria que integra o facto provado nº1 (considerada nos termos supra assinalados, com a eliminação da expressão conclusiva-jurídica que continha e autonomização do facto relativa à residência do legal representante), mas devendo ser ampliada a sua matéria, nos termos do art. 662º/c) do C.P.Civil de 2013, por forma a abranger todo o conteúdo do documento uma vez que se revela essencial para a apreciação da questão das formalidades prescritas por lei que a Embargante/Recorrente alega não terem sido cumpridas na citação.
No que concerne ao segmento factual relativo à morada da residência do legal representante da Embargante/Recorrente, verifica-se que, em sede de petição/requerimento de embargos, aquela nunca negou que aquela residia na morada em que foi afixada aquela nota de citação, mas factor absolutamente relevante consistiu em, no âmbito das suas declarações de parte, o legal representante (BB) afirmou e reconheceu expressamente que residia na morada em causa («Rua ..., ..., ..., ..., ...») quer nessa data quer anteriormente (há mais de três anos). Ora, com base neste elemento probatório que configura uma confissão (e inexistindo qualquer outra prova produzida nos autos que abale tal confissão), com base no mesmo, impõe-se necessariamente que este Tribunal ad quem formule um juízo no sentido de também estar probatoriamente demonstrada esta matéria de facto (que integrava o facto provado nº1 mas, como supra se explicou, deve ser autonomizada num ponto de facto autónomo). Saliente-se, aliás, que embora tenha impugnado a demonstração probatória da totalidade da matéria que integra o facto provado nº1, quer na motivação, quer nas conclusões, a Embargante/Recorrente não produziu uma única alegação nem um único argumento no sentido de que a residência do legal representante não coincida com aquela morada.
Perante todas as circunstâncias supra elencadas, e procedendo à reapreciação do julgamento proferido pelo Tribunal a quo sobre esta matéria factual não se vislumbra que o Tribunal a quo cometeu algum erro grosseiro na apreciação da prova, já que inexistem elementos probatórios relevantes e credíveis que imponham um juízo probatório distinto do formado por aquele Tribunal, ainda que, como se disse, com base numa fundamentação que é diversa da consignada na decisão recorrida, este Tribunal ad quem gera uma convicção, segura e objectiva, no sentido de que está probatoriamente demonstrada toda a matéria aqui em causa, devendo a mesma ser ampliada  nos termos do art. 662º/c) do C.P.Civil de 2013 e pelas razões supra indicadas, pelo que se determina que:
- o facto provado nº1 passa a ter a seguinte redacção: Pelas 19 horas e 50 minutos do dia 23/03/2022, relativamente ao citando GG, a agente de execução afixou na morada «Rua ..., ..., ..., ..., ...» a nota de citação com a indicação de que o duplicado e os documentos anexos ficam à disposição do mesmo na secretaria judicial, tendo testemunhado este acto HH e II, sendo que pelas 11 horas e 30 minutos do dia 22/03/2022 a agente de execução havia deixado aviso com a indicação para citação/notificação com dia e hora certa, ficando consignado que a diligência seria realizada pelas 20 horas do dia 23/03/2022, e, na data de 24/04/2022, foi junto aos autos o documento denominado «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO» cujo teor de dá por integralmente reproduzido”;
- é aditado um facto provado nº6 com a seguinte redacção: “Nas datas de 22/03/2022 e de 23/03/2022, e desde data anterior, o legal representante da insolvente, BB, residia na morada referida em 1)”.
Quanto ao facto não provado A).
Na decisão recorrida, também a indicação da fundamentação atinente à não demonstração probatória de toda a factualidade não provada foi realizada de uma forma global, isto é, sem uma indicação discriminada de qual o meio de prova (ou meios de prova) valorado, desvalorado, insuficiente ou ausente (não produzido) para cada concreto ponto de facto não provado (ou para um conjunto de pontos de facto não provados), o que dificulta a percepção e a determinação de qual foi a concreta razão que foi relevante para fundamentar cada ponto de facto não provado. Trata-se de mais uma situação que pode conduzir a que o Tribunal ad quem tenha necessidade de impor a remessa ao Tribunal a quo para que proceda à devida fundamentação da decisão sobre esse (ou esses) ponto de facto (cfr. art. 662º/2d) do C.P.Civil de 2013).
Em resultado desta “técnica” de motivação, o Tribunal a quo não “isolou” a concreta razão com base na qual formou o respectivo juízo no sentido de considerar como não provado o facto da alínea A), mas, ainda assim, consegue-se alcançar tal razão: “(…) A matéria não provada resulta de não se ter produzido nenhuma prova digna de crédito a seu respeito”. Ou seja, considerou inexistir qualquer prova credível nesta matéria Assinale-se que igualmente aqui, nas suas alegações, a Embargante/Recorrente jamais invoca que a decisão recorrida é omissa quanto à fundamentação (motivação) deste ponto de facto, o que significa que compreendeu suficientemente a convicção que o Tribunal a quo formou nesta matéria e, assim sendo, igualmente se entende não está verificada a situação prevista na alínea d) do referido art. 662º do C.P.Civil de 2013 («não estando devidamente fundamentada»).
Embora volte a misturar a impugnação da decisão de facto com considerações que respeitam exclusivamente à questão de direito do não cumprimento de formalidades, no que exclusivamente respeita à impugnação deste ponto de facto, a Embargante/Recorrente defende, essencialmente, que «considera ter resultado prova suficiente para que conste da lista de factos provados», que «a Agente de Execução nem sequer sabia quem ia citar, conforme resulta do depoimento prestado, pelo que seria difícil assumir que verificou que aquela morada correspondia à do gerente da Recorrente», e que «é indício de que nada do que foi relatado com a putativa sogra do gerente da sociedade corresponde à verdade, quando a Agente de Execução, sem qualquer explicação plausível, coloca o aviso de contacto e a citação na porta do prédio, quando alegadamente subiu e entrou em casa do representante legal» [cfr. conclusões FF) a LL)].
Procedendo à reapreciação do julgamento proferido pelo Tribunal a quo sobre esta matéria factual, e considerada toda a prova produzida à luz do critério da livre apreciação e de prudente convicção, este Tribunal ad quem não vislumbra qualquer elemento probatório relevante e objectivo que permita concluir que o Tribunal a quo cometeu algum erro grosseiro na apreciação da prova quanto a esta matéria, ainda que se consigne aqui uma fundamentação necessariamente com maior amplitude.
Embora no documento denominado «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO» junto aos autos principais na data de 24/04/2022 (e que corresponde ao documento nº... junto com a petição/requerimento de embargos) nada conste sobre a agente de execução averiguou/confirmou se tal morada correspondia à residência do legal representante, tal omissão não implica, sem mais, uma conclusão no sentido de que não foi realizada tal averiguação/confirmação. Tal omissão significa apenas na certidão nada foi consignado sobre tal aspecto, o que poderá eventualmente ter relevância no âmbito da questão do cumprimento ou não das formalidades prescritas na lei, mas é insuficiente para atestar e comprovar que tal acto pura e simplesmente não existiu.
Acresce que no requerimento subscrito pela agente de execução e apresentado nos autos principais na data de 24/04/2022 (com o qual foi junta a aludida certidão), a agente de execução consignou expressamente que «confirmou com a sogra do legal representante da Embargante/Recorrente que era essa a residência do mesmo». Estamos, portanto, perante um elemento probatório que com um sentido contrário à realidade contida no facto em apreço (elemento probatório este que a Embargante/Recorrente omite nesta parte da impugnação).
Por outro lado, independentemente da maior ou menor lógica e/ou correção da sua actuação (nomeadamente, quanto ao local onde afixou a nota de citação), é inquestionável que, no seu depoimento, a testemunha EE explicou as circunstâncias em que «encontrou a “sogra” do legal representante da Embargante na entrada do prédio», em que «a referida pessoa lhe confirmou que o legal representante (BB) era namorado da filha e vivia naquela morada» (esclarecendo que a pessoa era mãe da namorada do mesmo, e não efectivamente a sua «sogra»), e em que «foi ao apartamento deste, em razão daquela ter dito que tinha deixado o telemóvel no apartamento, e que tendo subido as duas, aquela fez contactos telefónicos com a filha e com o próprio legal representante (BB)», e mais explicou que «embora aquela lhe tenha dito que lhe disse que o legal representante comunicara que iria no dia seguinte ao escritório da agente de execução, ficou desconfiada sobre se ele compareceria ou não no seu escritório e, por isso, deixou o aviso na porta do prédio», mais ainda explicando que «não deixou a nota com a referida pessoa em razão de ela estar muito nervosa». É isto que resulta do depoimento desta testemunha, apesar de, na transcrição constante das alegações de recurso, a Embargante/Recorrente ter omitido diversos segmentos do depoimento, nomeadamente o segmento em que a testemunha explicou aquela subida ao apartamento, aqueles contactos telefónicos com a filha e o legal representante e o que lhe foi transmitido pela mesma sobre a comunicação do legal representante no sentido de no dia seguinte ir ao seu escritório. Ora, ao contrário do que a Embargante/Recorrente pretende fazer crer, estas declarações não se revelam em si mesmas inverosímeis, não se vislumbra nas mesmas qualquer tipo de contradição e não é circunstância de a testemunha (agente de execução) «ter deixado o aviso na porta do prédio e não na porta do apartamento» que, por si só, permite descredibilizar todo o seu depoimento (e quanto ao alegado «desconhecimento de quem ia citar», já supra se explicou que não se verifica). Logo, trata-se de mais um elemento probatório com um sentido contrário à realidade contida no facto em apreço.
Por outro lado, ainda, embora o legal representante da Embargante (BB), em sede de declarações de parte, tenha negado que «a namorada ou a mãe desta vivam consigo e/ou tenham chave de sua casa» e que «a mãe da namorada o tenha contacto telefonicamente por causa da “visita” da agente de execução», certo é que o mesmo tem um interesse directo na decisão da causa o que condiciona a credibilidade destas suas declarações, credibilidade essa que se mostra mais afectada quando se limitou meramente a negar (sem mais explicações), quando não foi minimamente capaz de concretizar se à data das “visitas” da agente de execução estava ou não a viajar (refugiou-se num mero «devia estar»), e quando afirmou não ter nenhum cuidado específico para a recepção de correspondência, apesar de, alegadamente, estar constantemente a viajar, acrescendo que nem sequer foram arroladas como testemunhas a sua namorada e/ou a mãe da mesma. Logo, este tipo de «declarações meramente negatórias», sem qualquer tipo concretização e pormenorização, para mais acrescidas das identificadas incapacidades de explicação e omissão de apresentação de outros meios de prova, não assumem qualquer virtualidade de, por um lado, descredibilizar de forma integral o depoimento da testemunha EE e de, por outro lado, comprovarem que esta agente de execução não realizou qualquer acto de confirmação da morada em causa corresponder à residência do citando.
Por fim, não foi produzida qualquer outra prova sobre esta matéria (nem a outra testemunha inquirida, nem o legal representante da Embargada - em sede de declarações de parte -, se pronunciaram sobre esta realidade e nenhum dos restantes documentos apresentados nos autos tem relevância nesta matéria).
Assim sendo, para além da prova produzida indicar noutro sentido, atenta a ausência de produção de qualquer outra prova efectiva e relevante nesta matéria, então, no máximo, sempre permaneceria a dúvida sobre a realidade do facto aqui em causa, o que conduziria, obrigatória e legalmente, à resolução da questão da demonstração (ou não) probatória do facto contra a Embargante/Recorrente uma vez que o mesmo lhe aproveita (cfr. art. 414º do C.P.Civil de 2013).
Perante todas as circunstâncias supra elencadas, e inexistindo elementos probatórios relevantes e credíveis que imponham um juízo probatório distinto do formado pelo Tribunal a quo, pese embora com base numa fundamentação mais ampla, este Tribunal ad quem gera uma convicção, segura e objectiva, no sentido de que não está probatoriamente demonstrada a ocorrência da realidade fáctica contida na matéria do facto não provado A).
Quanto ao facto não provado C).
Embora também aqui o Tribunal a quo não tenha “isolado” a concreta razão com base na qual formou o respectivo juízo no sentido de considerar como não provado este facto, consegue-se alcançar foi a mesma razão que se transcreveu a propósito do facto não provado A) e ainda do seguinte: “(…) obteve conhecimento da insolvência através do Dr FF, que deixou o cartão na sua caixa de correio. Quando viu o cartão ligou-lhe, terá sido em junho. Estas declarações do legal representante da insolvente não resultam muito credíveis tendo em conta que, mesmo que estivesse a viajar na data da citação, seria muito estranho não tomar conhecimento da declaração de insolvência logo que voltou, já que não se demora mais de uma semana em viagem, pela pessoa com quem a agente de execução contactou, que se terá identificado como mãe da namorada do citando. Nem que não tenha visto a nota de citação afixada à porta da entrada do prédio, mas já tenha visto o cartão do administrador de insolvência dentro da sua caixa de correio (…)”. Também aqui a Embargante/Recorrente nada suscitou, nas suas alegações, quanto a uma omissão de fundamentação e, assim sendo, igualmente se entende não está verificada a situação prevista na alínea d) do referido art. 662º do C.P.Civil de 2013 («não estando devidamente fundamentada»).
Na impugnação, a Embargante/Recorrente defende, apenas, que «resulta das transcrições feitas supra, que correspondem à declaração de parte do legal representante que o mesmo apenas teve conhecimento da declaração de insolvência através do Administrador de Insolvência, que deixou um cartão na caixa de correio do gerente da sociedade, o que terá ocorrido em junho de 2022», que «o representante legal da sociedade não tomou conhecimento da citação edital que alegadamente foi realizada não poderia ter tomado conhecimento por outro meio que não o Administrador de Insolvência» e que «esta conclusão é consequência direta da transferência do facto 1 considerado como provado para o elenco de factos considerados como não provados, conforme requerido» [cfr. conclusões MM) e PP)].
Procedendo à reapreciação do julgamento proferido pelo Tribunal a quo sobre esta matéria factual, e considerada toda a prova produzida à luz do critério da livre apreciação e de prudente convicção, este Tribunal ad quem não vislumbra qualquer elemento probatório relevante e objectivo que permita concluir que o Tribunal a quo cometeu algum erro grosseiro na apreciação da prova quanto a esta matéria.
Em primeiro lugar, como supra se concluiu, a matéria que integra o faco provado nº1 (agora até com maior amplitude) permanece na factualidade provada, logo a consequência que a Embargante/Recorrente pretendia extrair está prejudicada porque não houve qualquer transição da mesma para a factualidade provada.
Em segundo lugar, atenta-se que, em sede de petição/requerimento de embargos, a Embargante/Recorrente omitiu, por completo, a data em que teve conhecimento da sentença da insolvência e jamais alegou que obteve esse conhecimento através de um cartão deixado na caixa do correio pelo administrador de insolvência, pelo que as declarações produzidas pelo legal representante da Embargante (BB), em sede declarações de parte, não merecem qualquer credibilidade por parte do Tribunal, mais se assinalando que, nem sequer no âmbito dessas declarações, este foi capaz precisar a data em que obteve esse conhecimento (refugiando-se num mero «foi em Junho», sem qualquer outra concretização).
Em terceiro lugar, a Embargante/Recorrente olvida que, para além de GG, tem outro legal representante: AA, como resulta das certidões permanentes da sociedade Embargante juntas nos autos principais, nas datas de 03/01/2022 e 11/03/2022. Ora como mais decorre dos autos principais, na data de 27/04/2022, a secção remeteu carta registada para notificação da sentença de insolvência ao legal representante AA, para a sua morada que consta da Base de Dados da Segurança Social e tal carta não veio devolvida (nem por não reclamada, nem por outro motivo qualquer), o que permite pressupor, com grande grau de probabilidade, que a mesma foi recebida pelo mesmo, daqui resultado um forte indício de que, em razão do conhecimento daquele outro legal representante, também o legal representante BB tomou conhecimento daquela sentença muito antes de Junho de 2022 (aliás, em sede de petição/requerimento de embargos, alude várias vezes aos «seus gerentes», o que atesta uma actuação conjunta).
Em quarto lugar, para além de não ter sido indicado qualquer outro meio de prova pela Embargante/Recorrente nas suas alegações, efectivamente não foi produzida qualquer outra prova relevante e credível sobre esta matéria.
Perante todas as circunstâncias supra elencadas, e inexistindo elementos probatórios relevantes e credíveis que imponham um juízo probatório distinto do formado pelo Tribunal a quo, pese embora com base numa fundamentação mais ampla, também este Tribunal ad quem gera uma convicção, segura e objectiva, no sentido de que não está probatoriamente demonstrada a ocorrência da realidade fáctica contida na matéria do facto não provado C).
Consequentemente, atentas as respostas supra alcançadas, conclui-se que improcede a pretensão recursória da Embargante/Recorrente relativa à impugnação da matéria de facto.
Mas por força da alteração determinada pelo Tribunal na apreciação de tal impugnação, A DECISÃO DE FACTO CONSTANTE DA PRESENTE SENTENÇA RECORRIDA, PASSA A CONTER AS SEGUINTES MODIFICAÇÕES:
- O FACTO PROVADO Nº1 PASSA A TER A SEGUINTE REDACÇÃO:Pelas 19 horas e 50 minutos do dia 23/03/2022, relativamente ao citando GG, a agente de execução afixou na morada «Rua ..., ..., ..., ..., ...» a nota de citação com a indicação de que o duplicado e os documentos anexos ficam à disposição do mesmo na secretaria judicial, tendo testemunhado este acto HH e II, sendo que pelas 11 horas e 30 minutos do dia 22/03/2022 a agente de execução havia deixado aviso com a indicação para citação/notificação com dia e hora certa, ficando consignado que a diligência seria realizada pelas 20 horas do dia 23/03/2022, e, na data de 24/04/2022, foi junto aos autos o documento denominado «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO» cujo teor de dá por integralmente reproduzido”;
- E É ADITADO UM FACTO PROVADO Nº6 COM A SEGUINTE REDACÇÃO: “Nas datas de 22/03/2022 e de 23/03/2022, e desde data anterior, o legal representante da insolvente, BB, residia na morada referida em 1)”.
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4.2. Da Extemporaneidade dos Embargos e Da Nulidade da Citação

Prescreve o art. 40º do C.I.R.E.:
“1. Podem opor embargos à sentença declaratória da insolvência: a) O devedor em situação de revelia absoluta, se não tiver sido pessoalmente citado; b) O cônjuge, os ascendentes ou descendentes e os afins em 1.º grau da linha recta da pessoa singular considerada insolvente, no caso de a declaração de insolvência se fundar na fuga do devedor relacionada com a sua falta de liquidez; c) O cônjuge, herdeiro, legatário ou representante do devedor, quando o falecimento tenha ocorrido antes de findo o prazo para a oposição por embargos que ao devedor fosse lícito deduzir, nos termos da alínea a); d) Qualquer credor que como tal se legitime; e) Os responsáveis legais pelas dívidas do insolvente; f) Os sócios, associados ou membros do devedor.
2 - Os embargos devem ser deduzidos dentro dos 5 dias subsequentes à notificação da sentença ao embargante ou ao fim da dilação aplicável, e apenas são admissíveis desde que o embargante alegue factos ou requeira meios de prova que não tenham sido tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da declaração de insolvência (…)”.
Por sua vez, estatui o art. 42º do C.I.R.E.:
1. É lícito às pessoas referidas no n.º 1 do artigo 40.º, alternativamente à dedução dos embargos ou cumulativamente com estes, interpor recurso da sentença de declaração de insolvência, quando entendam que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido proferida. 2 - Ao devedor é facultada a interposição de recurso mesmo quando a oposição de embargos lhe esteja vedada”.
Da conjugação destes dois preceitos decorre que o C.I.R.E. consagra um sistema de duplo mecanismo processual para reagir (impugnar) contra a sentença de declaração de insolvência: o meio processual de «embargos» que serve exclusivamente para alegar factos novos ou indicar novos meios de prova, ou seja, factos e/ou meios de prova que não tenham sido considerados pelo Tribunal na sentença e sejam susceptíveis de colocar em causa os fundamentos que sustentaram a declaração da insolvência (nº2 do referido art. 40º); e o meio processual de «recurso» que se destina exclusivamente a discutir de razões de direito por se entender que existe uma inadequação da decisão, por má aplicação da lei à factualidade provada, ou seja, quando em face dos elementos apurados se entender que não podia ser declarada a existência de uma situação de insolvência (nº1 do referido art. 42º).
Neste sentido se pronunciou, entre outros, o Ac. da RE de 30/11/2016[40]: “I. No actual sistema de impugnação da sentença declaratória da insolvência prevê o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas uma dupla via de reacção - os embargos e o recurso -, sendo que os legitimados são os mesmos. II. Os embargos são necessariamente fundados em razões de facto, pois, apenas são admissíveis desde que o embargante alegue factos ou requeira meios de prova que não tenham sido tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da declaração de insolvência. Em contrapartida, o recurso deve basear-se em fundamentos de direito, por inadequação da decisão à factualidade apurada por má aplicação da lei, ou seja, quando se entenda que face aos elementos apurados a decisão não devia ter sido proferida”.
Mas, embora a sua finalidade seja o afastamento dos fundamentos da declaração de insolvência mediante a alegação de factos ou o requerimento de meios de prova que não tenham sido tomados em consideração pelo Tribunal, atento o teor da alínea a) do nº1 do referido art. 40º, o legislador estabeleceu uma condição de admissibilidade dos embargos à sentença de insolvência por parte do insolvente: que «este se encontre em situação de revelia absoluta por não ter sido citado pessoalmente».
Efectivamente, resulta do regime legal estatuído naquela alínea a) do nº1 do art. 40º que o insolvente (embargante) tem que arguir a situação de revelia absoluta decorrente da falta total de citação no âmbito do processo de insolvência, arguição esta que se mostra indispensável para legitimar a esta oposição por embargos: sem alegar a situação de revelia absoluta por falta de citação, não pode opor-se à sentença declaratória da insolvência, já que tal revelia é um pressuposto (condição) para a dedução dos embargos.
Refere Luís Menezes Leitão[41] que o devedor pode interpor recurso da sentença que declarou a insolvência, mesmo quando a interposição de embargos lhe esteja vedada (cfr.  aludido art. 42º/2), mas sendo extremamente limitadas as possibilidades de o devedor (insolvente) apresentar embargos à sentença, as quais se resumem “(…) à existência de revelia absoluta, em caso de ausência de citação pessoal para a acção. Essa solução compreende-se, dado que, no caso de o devedor se ter apresentado à insolvência ou, tendo sido pessoalmente citado para a acção, não apresente oposição, confessará a sua situação de insolvência (art.ºs 28.º e 30.º, n.º 5), pelo que não fará sentido que posteriormente pudesse apresentar embargos”.
Por ser uma condição (pressuposto) da respectiva admissibilidade, afirma-se no Ac. da RE de 28/05/2015[42] que “A insolvente só poderá opor-se, por embargos, à sentença declaratória da sua insolvência se estiver em situação de revelia absoluta, não tendo sido pessoalmente citada (artigo 40º, n.º 1, alínea a), do CIRE)”.
Tal falta de citação pessoal no processo de insolvência inclui naturalmente os casos de falta de citação previstos nas alíneas do nº1 do art. 188º do C.P.Civil de 2013, mas também os casos de nulidade da citação previstos no nº1 do art. 191º do mesmo diploma legal.
Porém, a situação de revelia absoluta, por falta de citação pessoal, é apenas uma condição (pressuposto) da respectiva admissibilidade, sendo que, como resulta do nº2 do referido art. 40º, o fundamento legal dos embargos terá que ser preenchido pela alegação de factos e/ou o requerimento de meios de prova que sejam novos relativamente aos considerados pelo Tribunal na sentença e que sejam susceptíveis de afastar os fundamentos dessa sentença que sustentaram a declaração de insolvência.
Por isso, como muito bem se refere no Ac. da RP de 10/12/2019[43], “Perante a imperatividade do disposto no n.º 2 do artigo 40.º do CIRE, o objeto dos embargos não poderá reduzir-se à apreciação de uma questão processual - nulidade da citação - a qual constitui mero pressuposto da legitimidade ativa do insolvente”.
Ou seja, se o Tribunal concluir que a insolvente (embargante) foi pessoalmente citada no âmbito do processo de insolvência e que tal citação não padece de nulidade, então fica, de imediato, prejudicada a apreciação do fundamento (ou fundamentos) dos embargos, uma vez que não está verificada a condição (pressuposto) da respectiva admissibilidade: como se decidiu no Ac. da RE de 23/11/2017[44], “Tendo-se por demonstrado que a citação efectuada no processo principal de insolvência foi regular, não se verifica o pressuposto processual para vir a interessada deduzir ainda embargos à sentença declaratória da insolvência, atacando os pressupostos em que assentou essa declaração”.
No caso recurso em apreço, importa assinalar, desde já, que embora na sentença recorrida se tenha apenas apreciado a questão da tempestividade/extemporaneidade dos embargos (e, em face da conclusão obtida, considerou-se prejudicada a apreciação da questão da inexistência/nulidade da citação), uma vez que, em sede de recurso (e ainda que misturando tal questão com a questão a impugnação da decisão de facto), a Embargante/Recorrente suscita a questão da falta de citação e/ou da nulidade da citação (aliás, sustentada na pretendida alteração da decisão de facto), entendemos que deve ser, previamente, apreciada esta questão: por um lado, porque não só tal questão está conexionada com a condição (pressuposto) da admissibilidade dos embargos, mas também porque pode ter influência directa na questão da tempestividade ou não dos embargos (caso se conclua que existiu citação e válida); e, por outro lado, porque tal conhecimento sempre é admitido em face do disposto no art. 665º/2 do C.P.Civil de 2013, já que é uma das questões que é objecto de recurso e estão disponíveis todos os factos (elementos) necessários à sua apreciação.

Quanto à inexistência de citação e sua nulidade.  

A citação é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao processo para se defender (art. 219º/1 do C.P.Civil de 2013).
A citação constitui o meio processual privilegiado para concretizar um dos princípios basilares do processo civil que é o contraditório, pelo que assume especial relevo, e ainda mais quando se atenta nos efeitos jurídicos que é susceptível de desencadear na esfera jurídica do visado (réu).
Sobre a epígrafe «Quando se verifica a falta de citação», estabelece o art. 188º/1 do C.P.Civil de 2013: “Há falta de citação: a) Quando o ato tenha sido completamente omitido; b) Quando tenha havido erro de identidade do citado; c) Quando se tenha empregado indevidamente a citação edital; d) Quando se mostre que foi efetuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste, tratando-se de pessoa coletiva ou sociedade; e) Quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do ato, por facto que não lhe seja imputável”.
Explicam Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[45] que a lei distingue “duas modalidades de nulidade (lato sensu) da citação: a falta e nulidade (strito sensu). Só da primeira cuida este artigo, tratando da segunda o art. 191. Trata-se, no primeiro caso, da pura inexistência do ato (alínea a)) e de situações que, pela sua gravidade, lhe são equiparadas. A falta da citação usa ser classificada entre as nulidades principais (cf a epígrafe do art. 198) ou de primeiro grau, enquanto simples nulidades é qualificada como nulidade secundária ou de segundo grau (…)”.
E no que respeita à causa de falta de citação prevista na alínea e) do nº1 deste art. 188º, referem aqueles mesmos autores[46]: “A revisão do CPC de 1961 tratou de acautelar as situações em que o réu, sem culpa, se mantém no desconhecimento da propositura da ação, por o ato de citação ter sido praticado na pessoa de terceira (arts. 225-4,228-2 e 232-2-b) ou ter consistido na afixação da nota de citação (art.232-4). Esta necessidade de tutela do direito de defesa, que a garantia constitucional de acesso à justiça postula (…) tornou-se mais premente com a generalização da modalidade da citação postal e o alargamento do emprego da citação com hora certa, na senda da progressiva substituição, imposta pelas realidades da vida hodierna, da certeza do conhecimento da citação pela presunção desse conhecimento. Assim, concedem-se ao citando, não só a possibilidade de provar que a citação chegou ao seu conhecimento efetivo depois de passados cinco dias sobre aquele em que foi efetuada (arts. 225-4 e 245-1-a), mas também a de provar que dela não chegou a ter conhecimento antes do termo do prazo da defesa, por facto que não lhe seja imputável (…) A natureza recetícia do ato, constituindo a citação pressuposto necessário exercício do direito de defesa, justifica o tratamento do caso como falta de citação. A ausência, por exemplo, do citando durante todo o prazo para a contestação, sem contacto com a pessoa que tenha recebido a citação ou com pessoa que lhe comunicasse a afixação da nota de citação ou a receção da carta expedida nos termos do art. 233, pode por ele ser alegada e provada, sem prejuízo do tribunal dever usar de elevado grau de exigência a na verificação da inimputabilidade do desconhecimento ao citando (…) O requisito da inimputabilidade levará à não considerar procedente a arguição se, por exemplo o citando se tiver ausentado quando sabia, ou não devia desconhecer, estar eminente a citação, sem acautelar a comunicação da sua realização”.
No caso em apreço, como resulta do teor da petição/requerimento de embargos, começou a Embargante/Recorrente por alegar a inexistência da citação, sendo precisamente em razão disso que, em sede de recurso, veio impugnar a decisão de facto, pugnando pela não demonstração probatória da matéria contida no facto provado nº1 e pela sua transição para a factualidade não provada, sendo este o pressuposto/fundamento único para a alegada falta (inexistência) da citação do seu legal representante. 
Logo, tendo-se respondido negativamente quanto à impugnação da matéria de facto, mais concretamente que não se verificava qualquer erro de julgamento quanto ao facto não provado nº1 (cuja matéria até foi ampliada), é manifesto que esta pretensão ficou absoluta e definitivamente prejudicada.
Mas sempre se assinale que estando probatoriamente demonstrada que «Pelas 19 horas e 50 minutos do dia 23/03/2022, relativamente ao citando GG, a agente de execução afixou na morada «Rua ..., ..., ..., ..., ...» a nota de citação com a indicação de que o duplicado e os documentos anexos ficam à disposição do mesmo na secretaria judicial, tendo testemunhado este acto HH e II, sendo que pelas 11 horas e 30 minutos do dia 22/03/2022 a agente de execução havia deixado aviso com a indicação para citação/notificação com dia e hora certa, ficando consignado que a diligência seria realizada pelas 20 horas do dia 23/03/2022, e, na data de 24/04/2022, foi junto aos autos o documento denominado «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO» cujo teor de dá por integralmente reproduzido” (facto provado nº1, contendo a alteração e ampliação supra de determinada), é inquestionável que não ocorre a situação de omissão do acto prevista na alínea e) do nº1 deste art. 188º, acrescendo que:
- por um lado, não têm aplicação neste causa as causas de falta de citação previstas nas alíneas b) a d) do nº1 deste art. 188º (embora nas alegações, por vezes, a Embargante/Recorrente aluda a «citação edital» é óbvio que estamos perante um caso de citação com hora certa, e não de citação edital);
- e, por outro lado, também não se pode ter por preenchida a causa de falta de citação consagrada na alínea e) do nº1 deste art. 188º já que, em sede de petição/requerimento de embargos, a Embargante/Recorrente nunca alegou que «não chegou a ter conhecimento da citação por facto que não lhe seja imputável», nem nunca alegou qualquer factualidade com vista a demonstrar tal «desconhecimento por razão que não lhe é imputável», donde decorre que também jamais poderia ter provado, quer o desconhecimento, quer o requisito da inimputabilidade, sendo que os respectivos ónus de alegação e de prova lhe incumbiam exclusivamente.
Deste modo, impõe-se necessariamente concluir que não está verificada qualquer causa de falta (inexistência) de citação do legal representante da Embargada/Recorrente no âmbito do processo principal de insolvência, improcedendo este fundamento.
Relativamente à nulidade da citação, estatui o art. 191º do C.P.Civil de 2013 (na parte que aqui releva): “1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 188.º, é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei. (…) 4 - A arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado”.
Uma vez que, desde a revisão de 1995/96 do código processo civil, se alargou esta nulidade a todas as formalidades prescritas na lei, como assinalam Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[47], “Suprimida a distinção entre formalidades essenciais e formalidades não essenciais do ato de citação (…), passou a ser tão-só causa de nulidade a preterição de qualquer formalidade, no sentido amplo de requisito legal da eficácia do ato que ao seu autor cabe observar (…), abrangendo os elementos gerais, de conteúdo e de forma, exigidos pelo art. 227º e os específicos de cada modalidade de citação (…) A exigência de que a falta seja suscetível de prejudicar a defesa do citado constitui a garantia de o regime instituído ser utilizado para realizar o seu escopo (evitar a restrição ou supressão prática do direito de defesa) e não para finalidades puramente formais ou dilatórias”.
Decorre do disposto no art. 231º/1 do C.P.Civil de 2013 que, frustrando-se a sua realização por via postal, a citação é efetuada mediante contacto pessoal do agente de execução com o citando.
Para além de não ter sido questionado (nomeadamente, pela Embargante/Recorrente), no caso dos autos, a mera consulta dos autos principais permite comprovar que foram realizadas três tentativas de citação da Embargante/Recorrente por via postal (em 05/01/2022, para a própria sociedade, e em 25/02/2022, quer para o legal representante BB, quer para o legal representante AA), e que todas se frustraram (por motivo de «mudou-se», no caso da primeira, e por motivo de «não reclamado», no caso das outras duas), pelo que está preenchido o requisito legal para a realização da citação daquela através de agente de execução.

No que concerne à citação com hora certa realizada por agente de execução, dispõe o art. 232º do C.P.Civil de 2013 (na parte que aqui releva):
“1 - No caso referido no artigo anterior, se o agente de execução ou o funcionário judicial apurar que o citando reside ou trabalha efetivamente no local indicado, não podendo proceder à citação por não o encontrar, deve deixar nota com indicação de hora certa para a diligência na pessoa encontrada que estiver em melhores condições de a transmitir ao citando ou, quando tal for impossível, afixar o respetivo aviso no local mais indicado.
2 - No dia e hora designados: a) O agente de execução ou o funcionário faz a citação na pessoa do citando, se o encontrar; b) Não o encontrando, a citação é feita na pessoa capaz que esteja em melhores condições de a transmitir ao citando, incumbindo-a o agente de execução ou o funcionário de transmitir o ato ao destinatário e sendo a certidão assinada por quem recebeu a citação (…)
4 - Não sendo possível obter a colaboração de terceiros, a citação é feita mediante afixação, no local mais adequado e na presença de duas testemunhas, da nota de citação, com indicação dos elementos referidos no artigo 227.º, declarando-se que o duplicado e os documentos anexos ficam à disposição do citando na secretaria judicial.
5 - Constitui crime de desobediência a conduta de quem, tendo recebido a citação, não entregue logo que possível ao citando os elementos deixados pelo funcionário, do que será previamente advertido; tendo a citação sido efetuada em pessoa que não viva em economia comum com o citando, cessa a responsabilidade se entregar tais elementos a pessoa da casa, que deve transmiti-los ao citando.
6 - Considera-se pessoal a citação efetuada nos termos dos n.os 2 e 4”.

Na petição/requerimento de embargos, a Embargante/Recorrente alegou, para fundamentar a nulidade da citação, «não consta da certidão de citação elaborada pela Agente de Execução que algum dos representantes legais da Requerida reside naquela morada», que «a Agente de Execução não confirmou, como se lhe impunha, que o representante legal residia no pretenso local» e que «a Agente de Execução não efetuou qualquer advertência à pessoa que encontrou no local relativamente a todas as consequências da não transmissão da comunicação ao citando», mas em sede de recurso apenas invoca «o facto de não constar da certidão de citação, elaborada pela Agente de Execução e junta aos autos, a verificação de que o gerente da Recorrente tenha morada no local, antes consta apenas da comunicação que fez ao processo» [conclusão V)].
Mesmo considerando todas as alegações constantes daquela petição, perante a factualidade provada e a factualidade não provada, e atento o regime legal efectivamente aplicável, temos forçosamente que concluir que não assiste qualquer razão à Embargante/Recorrente.
Analisando o teor da «CERTIDÃO DE CITAÇÃO/NOTIFICAÇÃO» junta aos autos pela agente de execução (facto provado nº1, contendo a alteração e ampliação supra de determinada), verifica-se que efectivamente não consta da mesma qualquer consignação no sentido de que aquela averiguou e confirmou que o legal representante em causa (BB) residia na morada em causa, tal como não consta qualquer consignação da advertência a que alude o nº5 do referido art. 232º.
Começando precisamente pelo argumento/fundamento da falta desta «advertência», é absolutamente claro que a Embargante/Recorrente incorre num «enorme lapso»: com efeito, como resulta da matéria demonstrada no âmbito do facto provado nº1, incluindo o próprio teor daquela certidão, a citação com hora certa em análise não foi efectivada com a colaboração de terceiros e, por via disso, não foi deixada «nota com indicação de hora certa para a diligência na pessoa encontrada que estiver em melhores condições de a transmitir ao citando» nem a citação foi feita «na pessoa capaz que esteja em melhores condições de a transmitir ao citando», pelo que, naturalmente, jamais podia ter ocorrido tal advertência. Logo, a omissão de tal advertência naquela certidão e citação, no caso em apreço, não pode configurar nem configura qualquer preterição de formalidade prescrita na lei.
Já no que concerne à falta de consignação na certidão de citação da averiguação/confirmação da residência, não se vislumbra, perante a letra do preceito em causa (cfr. art. 232º/1), que seja uma formalidade imposta pela lei: na verdade, do conteúdo do normativo resulta a exigência do agente de execução «apurar que o citando reside ou trabalha efetivamente no local indicado», mas não resulta qualquer obrigação de consignar, de forma expressa, tal «apuramento» (averiguação/confirmação) na respectiva certidão de citação, sendo que o interprete não pode considerar o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso (cfr. art. 9º/2 do C.Civil). Portanto, o «apuramento» (averiguação/confirmação) da residência (ou local de trabalho) do citado constitui pressuposto da efectivação da citação com hora certa, mas o normativo em causa (nem qualquer outro) impõe, como formalidade legal, a certificação na certidão que é lavrada[48], pelo que pode o agente de execução comunicar que constatou tal residência no requerimento com que faz a junção aos autos da respectiva certidão ao processo judicial, o que, aliás, se verificou no caso dos autos (no requerimento subscrito pela agente de execução e junto aos autos principais na data de 24/04/2022, e com o qual foi junta a certidão, está expressamente consignado que «confirmou com a sogra a residência»). Aliás, a consignação/certificação na certidão só tem lógica e sentido quando se apure precisamente a realidade contrária, isto é, que o citando não reside na morada em causa, uma vez que, neste caso, é esse o motivo para não ser realizada a citação e ser elaborada uma certidão de «não citação». Assim sendo, não se nos afigura que tal consignação na certidão da citação configura uma formalidade legal da realização da citação com hora certa.
Acresce que, no caso em apreço, a Embargante/Recorrente nem sequer logrou demonstrar (tal como lhe incumbia exclusivamente) que «a agente de execução não confirmou que o representante legal da embargante vivia no local onde efetuou a citação» [cfr. facto não provado A)], ou seja, não alcançou comprovar probatoriamente que não estava preenchido o pressuposto legal da realização da citação com hora certa («apuramento da residência do citando»)
Mas, no caso em apreço, ficou efectivamente demonstrado que o legal representante da Embargada/Recorrente, que foi citado com hora certa, reside na morada em que se concretizou a citação, residência que se verificava, quer no tempo da citação, quer desde momento muito anterior (cfr. factos provados nºs. 1 e 6, resultantes das alterações supra determinadas relativamente à matéria de facto), pelo que está preenchido o pressuposto legal da realização da citação com hora certa exigido pelo nº1 do aludido art. 232º/1, tornando-se absolutamente desnecessário e irrelevante a sua consignação na respectiva certidão de citação, constituindo mesmo uma total incongruência estar a considerar como formalidade legal a sua certificação na respectiva certidão (o que o legislador pretende para se se excute a citação por este forma é que esteja confirmada a residência do citando, e não que tal esteja consignado na respectiva certidão).
   
Aliás, no sentido de que nem sequer é de exigir tal «apuramento» quando está provado nos autos a residência do citado na morada em causa, pronunciou-se o já aludido Ac. da RL de 26/04/2007[49] (embora se pronuncie sobre o art. 240º do C.P.Civil na versão anterior à de 2013, tal preceito era idêntico ao actual art. 232º, pelo que mantém inteira validade), o qual merece a nossa concordância: “I - Tendo-se dado por provado, no âmbito do incidente de nulidade da citação, que o citando residia efectivamente na morada constante dos autos, torna-se irrelevante a alusão de que esse facto deveria ter sido verificado previamente à realização dos procedimentos conducentes à citação com hora certa, pois que judiciariamente não interessa a ficção factual, antes sim, a realidade concreta, sendo que a alegação e prova terá de assentar nesta e não naquela. II - A certidão não teria (como não fez) de referir as razões que estão na base da afirmação – residência do réu – pois que essa peça processual mais não é do que um resumo atestante de determinada realidade, não se impondo, no caso, a descrição pormenorizada do que leva a determinada conclusão. III - Tendo ficado apurado que a residência do Réu era efectivamente aquela onde se realizaram as diligências inerentes à citação com hora certa, há que ter presente que tal circunstancialismo implica para a pessoa do citando determinados deveres inerentes a essa qualidade, designadamente, no mínimo, o cuidado de saber com regularidade que correspondência lhe é dirigida. Tendo o tribunal cumprido todo o ritualismo exigido por lei para a concretização da indicada citação com hora certa – inclusivamente tendo-lhe enviado para a morada a carta registada a que alude o art.º 241.º do CPC, o mesmo só não terá tido conhecimento do acto em causa (caso assim tenha sucedido) por incúria da sua parte”.
Acresce que, no caso dos presentes autos, como resulta da consulta dos autos principais, foi dado cumprimento ao disposto no art. 233º do C.P.Civil de 2013 (“Sempre que a citação se mostre efetuada em pessoa diversa do citando, em consequência do disposto no n.º 2 do artigo 228.º e na alínea b) do n.º 2 do artigo anterior, ou haja consistido na afixação da nota de citação nos termos do n.º 4 do artigo anterior, é ainda enviada, pelo agente de execução ou pela secretaria, no prazo de dois dias úteis, carta registada ao citando, comunicando-lhe: a) A data e o modo por que o ato se considera realizado; b) O prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta; c) O destino dado ao duplicado; e d) A identidade da pessoa em quem a citação foi realizada”), através de carta registada que, em 24/03/2002, a secção remeteu em nome do legal representante BB e precisamente para a morada em que reside (a qual, mais uma vez, como sucedeu com todas as outras, veio devolvida, em 18/04/2022, com a menção de «não reclamada»).
Deste modo, neste caso concreto, a falta de consignação do «apuramento» (averiguação/confirmação) da residência na respectiva certidão de citação, não pode configurar nem configura qualquer preterição de formalidade prescrita na lei.
Por conseguinte, também se impõe, de forma tão necessária quanto inequívoca, concluir que não se verifica qualquer não cumprimento de formalidade prescrita na lei na efectivação da citação do legal representante da Embargada/Recorrente no âmbito do processo principal de insolvência e, por via disso, não ocorre nenhuma causa de nulidade dessa citação, improcedendo igualmente este fundamento.
Atentas as conclusões supra alcançadas, uma vez que, no âmbito do processo principal de insolvência, a Embargante/Recorrente foi pessoal (por força do disposto no nº4 do referido art. 232º, a citação com hora certa considera-se pessoal) e validamente citada (não padece de qualquer nulidade), então mais se conclui que, nos embargos à sentença de insolvência aqui em apreciação, não está preenchida, a condição da sua admissibilidade prevista no art. 40º/1a) do C.I.R.E., isto é, não está comprovado que a insolvente (aqui Embargante/Recorrente) «se encontre em situação de revelia absoluta por não ter sido citada pessoalmente», donde decorre que está, imediata e definitivamente, prejudicada a apreciação do fundamento (ou fundamentos) dos embargos, não podendo os presentes autos prosseguir porque aquela carece do pressuposto que lhe carece legitimidade activa para os deduzir.
Embora se entenda que fica prejudicada a apreciação da questão da tempestividade/extemporaneidade dos embargos, sempre cumpre dizer o seguinte:
- embora não se siga a fundamentação da sentença recorrida, é de uma clarividência extrema que os mesmos foram deduzidos fora do prazo de 5 dias previsto no art. 40º/2 do C.I.R.E. uma vez que, tendo sido alegada a absoluta revelia no processo principal, certo é que, como anteriormente já se referiu, a Embargante/Recorrente nunca alegou nos autos (nomeadamente, em sede de petição/requerimento de embargos) a data concreta em que tomou conhecimento da existência do processo de insolvência e da respectiva sentença, pelo que jamais poderia demonstrar que deduziu os presente embargos de forma tempestiva, sendo que os respectivos ónus de alegação e prova lhe incumbiam em exclusivo [aliás, nem sequer logrou provar que «O legal representante da embargante insolvente só teve conhecimento da sentença declaratória de insolvência no mês de junho de 2022» - cfr. facto não provado C)];
- por outro lado, estando comprovado que a Embargante/Recorrente foi pessoal e validamente citada no processo principal, então a mesma considera-se também validamente notificada da sentença que declarou a insolvência através da carta registada que a secção remeteu, na data de 27/04/2022, para o seu legal representante BB e para a morada em que ocorreu a citação, carta essa que mais uma vez (tal como todas as outras) veio devolvida com a menção de «não reclamada», mas que por força do disposto no art. 249º/1 e 2 do C.P.Civil de 2013, produz efeitos e considera-se que a notificação se consumou no dia 02/05/2022; logo, tendo sido os embargos deduzidos apenas na data de 28/06/2022, há muito que estava integralmente decorrido o aludido prazo de 5 dias, não sendo sequer possível usar da faculdade prevista no art. 139º/5 e 6 do do C.P.Civil de 2013.

Nestes termos, ainda que com base em fundamentação diversa da consignada na sentença recorrida, sempre se teria que concluir que os presentes embargos à sentença de insolvência também nunca poderiam prosseguir em razão da extemporaneidade da sua dedução.
Consequentemente e sem necessidade de outras considerações, perante tudo o que supra se expôs e concluiu, a resposta à presente questão, que no âmbito do recurso incumbe a este Tribunal ad quem apreciar, é necessariamente no sentido de que os presentes embargos à insolvência não podem prosseguir, ainda que com base num primeiro fundamento diverso do considerado na sentença recorrida: falta do preenchimento da condição da sua admissibilidade prevista no art. 40º/1a) do C.I.R.E., por não estar comprovado que a insolvente (aqui Embargante/Recorrente) «se encontre em situação de revelia absoluta por não ter sido citada pessoalmente». Mas também se verifica que não podem prosseguir em razão da extemporaneidade da sua dedução declarada na sentença recorrida, ainda que com base numa fundamentação é diversa.
Por conseguinte, ainda assim, deverá improceder, na íntegra, o presente fundamento de recurso.
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4.3. Do Mérito do Recurso

Perante as respostas alcançadas na resolução das questões supra apreciadas, deverá julgar-se totalmente improcedente o recurso de apelação interposto pela Embargante/Recorrente, embora se deva declarar a verificação daquela falta de condição de admissibilidade e ser mantida a decisão recorrida no seu remanescente (embora passe a integrar a alteração da decisão de facto supra determinada e seja distinta a fundamentação da extemporaneidade dos embargos).
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4.4. Da Responsabilidade quanto a Custas

Improcedendo o recurso, uma vez que ficou vencida, deverá a Embargante/Recorrente suportar as custas do recurso (art. 527º/1 e 2 do C.P.Civil de 2013).
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5. DECISÃO

Face ao exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto pela Embargante/Recorrente, declarando-se verificada a falta da condição de admissibilidade prevista no art. 40º/1a) do C.I.R.E. («situação de revelia absoluta por falta de citação pessoal») e, em consequência, manter a sentença recorrida no seu remanescente (sem prejuízo de passar a integrar a alteração determinada quanto à decisão de facto e da extemporaneidade dos embargos se sustentar em fundamentação distinta).
Custas do recurso pela Embargante/Recorrente.
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Guimarães, 09 de Novembro de 2023.
(O presente acórdão é assinado electronicamente)
 
Relator - Pedro Manuel Quintas Ribeiro Maurício;
1ºAdjunto - José Carlos Pereira Duarte;
2ºAdjunto - Maria Gorete Roxo Pinto Baldaia de Morais.



[1]António Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 6ªedição actualizada, Almedina, p. 139.
[2]Ac. STJ de 07/07/2016, Juiz Conselheiro Gonçalves da Rocha, proc. nº156/12.0TTCSC.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[3]Cfr. Abrantes Geraldes, in obra referida, p. 196 e 197.
[4]Juiz Conselheiro Lopes do Rego, proc. nº233/09.4TBVNC.G1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[5]Juíza Conselheira Ana Luísa Geraldes, proc. nº824/11.3TTLRS.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[6]No mesmo sentido, entre outros, Acs. STJ de 31/05/2016, Juiz Conselheiro Garcia Calejo, proc. nº1572/12.2TBABT.E1.S1, de 19/02/2015, Juiz Conselheiro Tomé Gomes, proc. nº299/05.6TBMGD.P2.S1, e de 28/04/2016, Juiz Conselheiro Abrantes Geraldes, proc. nº1006/12.2TBPRD.P1.S1, disponíveis em http://www.dgsi.pt/jstj.
[7]Juiz Conselheiro Pinto de Almeida, proc. nº29/12.6TBFAF.G1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[8]In obra referida, p. 200.
[9]Juiz Conselheiro Bernardo Domingos, proc. nº756/14.3TBPTM.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[10]Ver também o mais recente Ac. STJ 02/02/2022, Juiz Conselheiro Fernando Augusto Samões, proc. nº1786/17.9T8PVZ.P1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[11]Juiz Desembargador José Carlos Pereira Duarte (1ºJuiz Adjunto na presente decisão), proc. nº5172/18.5T8BRG.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[12]Cfr. Ac. 12/05/2016, Juiz Conselheiro Tomé Gomes, proc. nº2325/12.3TVLSB.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[13]Juiz Conselheiro Bernardo Domingos, proc. nº3901/15.8T8AVR.P1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[14]António Abrantes Geraldes, in obra citada, p. 353. Sufragando este entendimento, veja-se o já citado Ac. STJ 17/10/2019, Juiz Conselheiro Bernardo Domingos, proc. nº3901/15.8T8AVR.P1.S1.
[15]António Abrantes Geraldes, in obra citada, p. 354. Novamente sufragando este entendimento, veja-se o já citado Ac. STJ 17/10/2019, Juiz Conselheiro Bernardo Domingos, proc. nº3901/15.8T8AVR.P1.S1.
[16]António Abrantes Geraldes, in obra citada, p. 357.
[17]Cfr. o já citado Ac. 12/05/2016, Juiz Conselheiro Tomé Gomes, proc. nº2325/12.3TVLSB.L1.S1.
[18]Publicado no DR, IIª Série, de 18/08/2009.
[19]In obra citada, p. 331, 332 e 338.
[20]Ac. STJ de 22/10/2015, Juiz Conselheiro Tomé Gomes, proc. nº212/06.3TBSBG.C2.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[21]Juíza Conselheira Rosa Tching, proc. nº588/12.3TBPVL.G2.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[22]Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, Reimpressão, 1993, p. 384.
[23]Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ªEdição, Revista e Actualizada, p. 435 a 436.
[24]P.J.Pimenta, in Processo Civil Declarativo, Almedina, 2014, p. 325.
[25]Neste sentido, o Ac. RG de 13/07/2021, Juíza Desembargadora Raquel Baptista Tavares, proc. nº3625/20.4T8VCT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[26]In Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Volume I, p. 609.
[27]Juiz Conselheiro Santos Cabral, proc. nº07P4822, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[28]Juíza Conselheira Fernanda Isabel Pereira, proc. nº809/10.7TBLMG.C1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[29]Juiz Conselheiro Abrantes Geraldes, proc. nº1568/09.1TBGDM.P1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[30]António Abrantes Geraldes, in obra referida, p. 351.
[31]Juíza Desembargadora Raquel Baptista Tavares, proc. nº671/20.1T8BGC.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[32]Cfr. Ac. do STJ de 23/09/2009, Juiz Conselheiro Bravo Serra, proc. nº238/06.7TTBGR.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[33]Juiz Desembargador Filipe Caroço, proc. nº338/17.8YRPRT, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.
[34]Este mesmo entendimento foi sufragado pelo Ac. da RG de 30/09/2021, Juiz Desembargador Paulo Reis, proc. nº899/19.7T8VCT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[35]O já referido Ac. do STJ de 28/09/2017, Juíza Conselheira Fernanda Isabel Pereira, proc. nº809/10.7TBLMG.C1.S1.
[36]Cfr. Ac. do STJ de 28/09/2017, Juíza Conselheira Fernanda Isabel Pereira, proc. nº659/12.6TVLSB.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[37]Juiz Desembargador Paulo Reis, proc. nº899/19.7T8VCT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[38]Juiz Desembargador João Ramos Lopes, proc. nº4366/20.8T8PRT-A.P1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.
[39]In Código de Processo Civil Anotado, Vol. I - Parte Geral e Processo de Declaração, Almedina, p. 299.
[40]Juiz Desembargador Francisco Xavier, proc. nº1545/12.5TBCTX-G.E1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtre.
[41]In Direito da Insolvência, 6ªedição, p.211.
[42]Juiz Desembargador Mata Ribeiro, proc. nº119/14.0T8STR-A.E1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtre.
[43]Juiz Desembargador Carlos Querido, proc. nº962/19.4T8AMT-A.P1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.
[44]Juiz Desembargador Canelas Brás, proc. n442/14.4TBVRS-A.E2, disponível em http://www.dgsi.pt/jtre.
[45]In Código de Processo Civil Anotado, Volume 1º, Artigos 1.º a 361.º, 4ªedição, Almedina, p. 385.
[46]In obra referida, p. 387 e 388.
[47]In obra referida, p. 392 e 394.
[48]Neste sentido pronunciou-se o Ac. RL 26/04/2007, Juiz Desembargador Sousa Pinto, proc. nº408/2007-2, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrl.
[49]Juiz Desembargador Sousa Pinto, proc. nº408/2007-2.