Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1856/08.4TABRG.G1
Relator: FERNANDO MONTERROSO
Descritores: HOMICÍDIO POR NEGLIGÊNCIA
OMISSÃO DE FACTOS RELEVANTES
PRONÚNCIA
MATÉRIA CONCLUSIVA
ABSOLVIÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/30/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO
Sumário: I) Há "questão de facto", quando se procura reconstituir uma situação concreta ou um evento do mundo real e há uma «questão de direito» quando se submete a tratamento jurídico a situação concreta reconstituída. Isto implica que o «facto» não pode incluir elementos que a priori contenham implicitamente a resolução da questão concreta de direito que há a decidir.
II) Afirmar que alguém não actuou como lhe era "exigível pelas boas práticas e pelas regras de cuidado"; que não fez "uma vigilância eficaz"; que "não realizou todos os procedimentos que a situação clínica obrigava"; que "revelou grave falta de cuidado"; ou que "violou as regras de cuidado, vigilância e zelo a que estava adstrito" é, não só, formular juízos de valor que pressupõem que o conhecimento duma situação fáctica que deve ser concretizada, mas, também, incluir nesse juízo a resposta da questão a decidir, limitando-lhe ou traçando-lhe o destino.
III) Assim, sendo a pronúncia totalmente omissa no que respeita à concreta facticidade relevante para o apuramento da responsabilidade delituosa do arguido na prática do crime de homicídio por negligência do artº 137º, nº 1 do Código Penal que lhe era imputado, é inevitável concluir pala sua absolvição.
IV) É que, se os factos relatados na pronúncia não integrarem a prática do crime imputado, por serem insuficientes, a inclusão na sentença de outros factos que, só por si ou conjugados com aqueles, integrassem o crime, equivaleria à condenação do arguido por factos que constituiriam uma alteração substancial dos descritos naquela peça.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
No ex-3º Juízo Criminal de Guimarães, em processo comum com intervenção do tribunal singular (Proc. 1856/08.4TABRG) foi proferida sentença que decidiu (transcreve-se):
Em face do exposto, julgo a acusação procedente, por provada, e em consequência, condeno o arguido Manuel S.:
1. Pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência p. e p. pelo art.º 137.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão;
2. Ao abrigo do disposto pelo art.º 50.º do Código Penal, decido suspender a execução da pena de prisão imposta ao arguido pelo período de 1 (um) ano
*
O arguido Manuel S. interpôs recurso desta sentença.
Impugna a decisão sobre a matéria de facto visando, alterada esta, a ser absolvido.
*
A magistrada do Ministério Público junto do tribunal recorrido e a assistente Maria A. pronunciaram-se pelo não provimento do recurso.
Nesta instância, a sra. procuradora-geral adjunta emitiu parecer no sentido do arguido ser absolvido.
Cumpriu-se o disposto no art. 417 nº 2 do CPP.
Colhidos os vistos, realizou-se a audiência.
*
I – Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos (transcrição):
1) No passado dia 1 de Setembro de 2008, Maria C., mãe da ora assistente, deu entrada na urgência do Centro Hospitalar do Alto Ave E.P.E., com falta de ar e dificuldades de locomoção, tendo vindo a ficar internada no piso 9, cama 49;
2) No dia 3 de Setembro de 2008, Maria C. sofreu uma queda no Centro Hospitalar do Alto Ave E.P.E cerca das 02H00, tendo sofrido traumatismo craniano, hematomas, do lado esquerdo e do lado direito da cabeça, e partido a perna esquerda;
3) A falecida Maria C. foi admitida no Hospital de S. Marcos no dia 03 de Setembro, chegando cerca das 6H00, onde foi operada, nesse mesmo dia, e onde permaneceu até ao dia 10 de Setembro de 2008;
4) Tendo falecido nesse dia (10 de Setembro de 2008) e tendo sido indicada como causa de morte "traumatismo craniano" devido a queda;
5) De acordo com a "Perícia Tanatológica - Relatório de Autópsia", a sua morte "(...) foi devida às lesões traumáticas meningoencefálicas atrás descritas", lesões essas que resultaram directa e necessariamente da queda que sofreu no Centro Hospitalar do Alto Ave, E.P.E.;
6) De acordo com os elementos médicos, também existentes naquele Centro Hospitalar, a falecida Maria C.tinha perda de força muscular com alterações de sensibilidade;
7) Tinha 86 anos de idade, com 73 kg, apresentava vários problemas de saúde, designadamente bronquite, diabetes do tipo II, antecedentes de HTA, insuficiência cardíaca, que lhe provocavam incapacidade de locomoção sem ser acompanhada, dificuldades respiratórias, entre outros;
8) No dia e hora em que Maria C.caiu, o enfermeiro responsável pela doente e que a acompanhou até à transferência foi o arguido Enfermeiro Manuel S.;
9) Na noite anterior à sua queda da cama tinham-lhe sido colocadas grades na cama;
10) As mesmas (grades) não foram colocadas na noite em que veio a cair da cama;
11) As grades não foram colocadas na noite em que veio a cair da cama e deveriam tê-lo sido, como era exigível pelas boas práticas e pelas regras de cuidado, por força do estado clínico, condição física e idade da idosa Maria C.;
12) Ora, o não ter sido accionada tal medida e o não ter sido feita uma vigilância eficaz, que impedissem a sua queda ou se levantar sozinha e sair da cama, foram causa directa e necessária à sua queda e consequentemente à sua morte;
13) À data em que ocorreram os factos estava implementado no Centro Hospitalar do Alto Ave E.P.E. o procedimento de Morse, protocolo para a avaliação de risco de queda e procedimentos a adoptar;
14) O arguido Manuel S., enfermeiro responsável pela falecida Maria A., embora o pudesse e devesse ter feito, bem sabendo que tal constituía sua obrigação funcional e legal, não realizou todos os procedimentos que a situação clínica obrigava a que fossem realizadas e não colocou as grades na cama e não a vigiou nos moldes adequados, o que, directa e necessariamente, conduziu à sua morte;
15) Ao actuar da forma supra descrita, o arguido Manuel S.revelou grave falta de cuidado, não observando, no exercício das suas funções, os procedimentos que lhe eram exigidos e que a situação clínica de Maria C.impunha;
16) O arguido Manuel S.podia e devia ter evitado a morte de Maria da Conceição, o que bem sabia, em resultado das suas funções, estar obrigado a fazer;
17) O arguido Manuel S., enfermeiro responsável pela falecida Maria C., violou as normas de cuidado, vigilância e zelo a que estava adstrito decorrentes do dever jurídico de garante que a sua qualidade de enfermeiro lhe impunha, não tendo praticado a conduta adequada a evitar o falecimento de Maria C.;
18) O resultado morte é objectivamente imputável à conduta omissiva do arguido, que não prestou à lesada os cuidados necessários e adequados a evitá-lo e que eram possíveis e exequíveis segundo as legis artis e os conhecimentos de que dispunha e a que estava obrigado e podia fazê-lo. Sendo que o resultado ocorrido, não se verificaria de modo normal e típico, se tivesse sido cumprido/observado esse dever, pois a acção devida era idónea a evitar o resultado, de acordo com as regras da experiência normais e as circunstâncias concretas conhecidas, e a omissão ocorrida é idónea a causar o resultado verificado;
19) O arguido agiu voluntária, livre e conscientemente, e não procedeu com o cuidado devido, a que em face do estado em que se encontrava a ofendida, estava obrigado e de que era capaz, não tendo contudo representado como possível que a mesma em virtude da sua conduta viesse a falecer;
20) O arguido é visto pelos seus pares, profissionais de saúde, como bom profissional, cumpridor e respeitador das suas obrigações profissionais, sempre tendo tido um bom relacionamento com os doentes;
21) A falecida Maria C., no dia 02 de Setembro de 2008, encontrava-se consciente, colaborante e apresentando 15 valores na escala de Glasgow e 19 valores na escala de Braden, obedecendo a instruções verbais;
22) No final do dia 02 de Setembro de 2008 o arguido levantou as grades da cama da doente, tendo esta dito que não queria as grades levantadas, preferindo que estivessem baixadas;
23) O arguido insistiu na vantagem de as grades estarem levantadas, tendo a doente insistido que não as queria levantadas, pelo que as baixou, informando então a doente que, caso necessitasse levantar-se o chamasse, utilizando a campainha.
24) O arguido é solteiro, não tem filhos e vive com os pais;
25) É enfermeiro no Centro Hospitalar do Alto Ave, Guimarães, encontrando-se de licença sem vencimento de longa duração desde 01/11/08;
26) Encontra-se em acção missionária em Angola, desde 20/11/08, não recebendo qualquer remuneração, sendo toas as suas despesas suportadas pela organização missionária (Conferência Episcopal de Angola e São Tomé), não tendo qualquer outro rendimento ou subsídio;
27) É licenciado em enfermagem e não tem antecedentes criminais.
*
Considerou-se não provado:
a) Que no dia em causa a falecida Maria C. caminhava durante o dia, sem ajuda e se movia na cama e na cadeira sem ajuda e tinha força muscular suficiente para se levantar completamente durante uma mudança de posição;
b) Que a falecida Maria C. não caiu da cama na noite de 02 de Setembro de 2008;
c) Que a queda da falecida Maria C .ocorreu quando esta se dirigia da cama para a cadeira-sanita e escorregou no percurso;
d) Que quando o arguido e outros colegas se aperceberam da queda e se deslocaram ao quaro, encontraram a falecida Maria C. caída no chão, mas já distante, afastada da sua cama;
e) Que a falecida Maria C. transmitiu ao arguido e restantes pessoas que ali se encontravam que se tinha levantado da cama para se dirigir à cadeira higiénica e que escorregou e caiu quando se encontrava de pé já fora da cama;
f) Que a falecida Maria C.disse ao arguido que não chamou porque não queria incomodar.

FUNDAMENTAÇÃO
Nestes autos determina-se a responsabilidade penal do arguido Manuel S. na morte de Maria C., ocorrida em consequência de ter caído duma cama no Centro Hospitalar do Alto Ave.
No momento da queda o arguido era o enfermeiro responsável pela Maria C.(facto provado nº 8).
A queda (e a consequente morte) seria imputável ao arguido por não ter colocado grades de proteção na cama.
*
O arguido impugna a decisão sobre a matéria de facto, mas suscita-se a questão prévia de saber se o despacho de pronúncia contém todos os factos necessários à sua condenação.
Como se sabe, é a acusação (ou, no caso destes autos, a «pronúncia», que lhe faz a vez) que fixa o objeto do processo, traçando os limites dentro dos quais se há-de desenvolver a atividade investigatória e cognitória do tribunal. Trata-se de uma decorrência do princípio do acusatório que, nos termos do art. 32 nº 5 da Constituição, estrutura o processo penal. A acusação deverá conter a «narração» de todos os factos que fundamentam a aplicação ao arguido da pena – art. 283 nº 3 al. b) do CPP.
A «narração» dos factos feita na acusação não deve deixar margem para dúvidas sobre os factos ou incidências processuais a que se refere.
Num processo muito mediático, o Tribunal Constitucional considerou que “é imperativo que a acusação e a pronúncia contenham a descrição, de forma clara e inequívoca, de todos os factos de que o arguido é acusado, sem imprecisões ou referências vagas”. Considerou também que as “exigências de clareza e narração sintética dos factos imputados ao arguido” não são compatíveis com “uma mera «simplificação» da acusação…” e que não é possível uma condenação assente em “factos apenas indireta e implicitamente referidos”. Outro entendimento violaria os princípios do acusatório e do contraditório – ponto nº 67 da fundamentação do ac. 674/99 do TC de 15-12-99, disponível no sítio da internet daquele tribunal.
Pois bem, na parte da narração dos factos, o despacho de pronúncia está eivado de conceitos de direito e expressões conclusivas.
Exemplificando:
Ponto nº 11 – “As grades não foram colocadas (…) como era exigível pelas boas práticas e pelas regras de cuidado”;
Ponto nº 12 – “O facto de (…) não ter sido feita uma vigilância eficaz (…) foi causa direta e necessária à sua queda…”;
Ponto 13 – “O arguido Manuel S.(…) não realizou todos os procedimentos que a situação clínica obrigava a que fossem realizados…”;
Ponto 14 – “…revelou grave falta de cuidado, não observando (…) os procedimentos que lhe eram exigidos…”;
Ponto 16 – “…violou a as normas de cuidado, vigilância e zelo a que estrava adstrito…”.
É certo que nem sempre é fácil distinguir as questões de facto das questões de direito.
Não sendo este o local para uma dilucidação exaustiva desta questão, sempre se dirá que há uma «questão de facto» quando se procura reconstituir uma situação concreta ou um evento do mundo real e há uma «questão de direito» quando se submete a tratamento jurídico a situação concreta reconstituída. Isto implica que o «facto» não pode incluir elementos que a priori contenham implicitamente a resolução da questão concreta de direito que há a decidir.
Só são “factos materiais as ocorrências da vida real, os eventos materiais e concretos, as mudanças operadas no mundo exterior, que podem ser conhecidas sem referência a qualquer critério fixado pela ordem jurídica” – Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, tomo III, pag. 80, em anotação ao art. 511.
Afirmar que alguém não atuou como lhe era “exigível pelas boas práticas e pelas regras de cuidado”; que não fez “uma vigilância eficaz”; que “não realizou todos os procedimentos que a situação clínica obrigava”; que “revelou grave falta de cuidado”; ou que “violou a as normas de cuidado, vigilância e zelo a que estrava adstrito” é, não só, formular juízos de valor que pressupõem o conhecimento duma situação fáctica que deve ser concretizada, mas, também, incluir nesse juízo a resposta da questão a decidir, limitando-lhe ou traçando-lhe o destino.
*
Como se sabe (é facto notório) há doentes relativamente aos quais devem ser colocadas grades na cama e outros para os quais tal colocação não é necessária.
Determinar que o caso da Maria C.impunha a colocação das grades é algo que tinha de resultar de factos concretos vertidos, primeiro, na pronúncia e, depois, considerados provados na sentença.
Vejamos:
Na sentença considerou-se provado que “à data em que ocorreram os factos estava implementado no Centro Hospitalar do Alto Ave E.P.E. o procedimento de Morse, protocolo para a avaliação de risco de queda e procedimentos a adotar” – facto nº 13.
Tal facto não constava da pronúncia.
A Escala de Morse (MFS) foi criada para avaliar a probabilidade do doente cair. A MFS é usada em cuidados agudos, tanto em hospitais como em unidades de internamento e tratamento prolongado de doentes.
Consiste em seis variáveis ou itens, que devem ser ponderados em cada caso, a saber:
1 - Historial de quedas; no internamento/urgência ou nos últimos 3 meses;
2 - Diagnóstico(s) secundário(s);
3 - Ajuda para caminhar Nenhuma/ajuda de enfermeiro/acamado/cadeira de rodas;
4 - Terapia intravenosa/cateter periférico com obturador/heparina;
5 - .Postura no andar e na transferência;
6 - Estado mental. Consciente das suas capacidades. Esquece-se das suas limitações.
A cada um dos “itens” é atribuída uma pontuação, determinando-se através da soma dos pontos obtidos “o nível de risco e as respetivas ações recomentadas” para o doente. O número de pontos resultantes da soma dos “itens” indica, para cada doente, se “não são necessárias quaisquer intervenções”; se são recomendadas “intervenções padrão de prevenção de quedas”; ou “intervenções de prevenção de alto risco”.
Informação obtida em http://www.uc.pt/org/ceisuc/RIMAS/Lista/Instrumentos/MFS_PT_c.pdf
Pois bem, pretendendo a acusação estruturar a imputação da responsabilidade do arguido com base no desrespeito pelos procedimentos da Escala de Morse (MFS), teria de alegar:
- que tais procedimentos estavam implementados no Centro Hospitalar do Alto Ave E.P.E..
- concretizar qual a pontuação, em face dos elementos clínicos disponíveis, que cabia no caso da Maria C para cada um dos “itens” acima indicados; e
- através da soma dos pontos obtidos indicar o nível de risco e o padrão de prevenção exigidos.
A pronúncia é totalmente omissa relativamente a tais factos.
Só perante a conjugação de todos os fatores indicados haveria, então, que concluir se o arguido, ao não colocar as grades de proteção “violou (ou não) as normas de cuidado, vigilância e zelo a que estava adstrito”; se “não realizou todos os procedimentos que a situação clínica obrigava”; se lhe “era exigível pelas boas práticas e pelas regras de cuidado” comportamento diferente daquele que teve; etc..
Trata-se duma exigência imposta pela natureza acusatória que enforma o nosso processo penal e pela necessidade de se garantir um verdadeiro direito ao contraditório. Ninguém se consegue defender da imputação de que “não realizou todos os procedimentos que a situação clínica obrigava” se não lhe forem concretizados os factos em que se sustenta esse juízo Como se decidiu no acórdão desta Relação de Guimarães 23-9-2013 “a imprecisão da matéria de facto (…), designadamente quando a descrição se reduz a mera utilização de fórmulas vagas e genéricas, contende com o direito ao contraditório, constitucionalmente garantido e, nessa medida, ofende as garantias de defesa do arguido, sendo então insuscetível de fundamentar uma condenação penal” (recurso nº 490/10.3JABRG.G1, relator Lee Ferreira, disponível no ITIJ, onde se indica jurisprudência pertinente do STJ)..
No caso, só após a concretização dos factos o arguido estaria em condições de os contraditar, tentando demonstrar, por exemplo, que no Centro Hospitalar do Alto Ave E.P.E. não estava implementado o procedimento de Morse; ou que, em face dos elementos clínicos existentes, estava errada a pontuação atribuída pela acusação a cada um dos “itens”; ou que o valor global obtido através da soma dos “itens” ainda não recomendava a colocação das grades, segundo os critérios da Escala de Morse (MFS).
*
Sendo insuficiente a narração de factos constantes da pronúncia, é inevitável a absolvição.
Se os factos relatados na pronúncia não integrarem a prática do crime imputado, por serem insuficientes, a inclusão na sentença de outros factos que, só por si ou conjugados com aqueles, integrassem o crime, equivaleria à condenação do arguido por factos que constituiriam uma alteração substancial dos descritos naquela peça.
É que, se, de acordo com a definição do art. 1 al. f) do CPP, há alteração substancial dos factos descritos na acusação, quando a nova factualidade tem por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso, por maioria de razão também existirá, pelo menos, igual alteração substancial sempre que os descritos na acusação (ou na pronúncia quando a houver) não integrarem qualquer crime e os novos, só por si ou conjugados com aqueles, passem a integrá-lo.
É também uma decorrência do princípio do acusatório.
Deixa-se só mais uma nota:
Na verdade a sentença não acrescentou novos factos, para além dos que já constavam da pronúncia, indispensáveis à condenação. Apenas se consignou que o julgador não o podia fazer, para se fundamentar a decisão de não se ordenar o reenvio do processo para novo julgamento, para que fossem apurados os factos decisivos que não constam da pronúncia – cfr. art. 410 nº 2 al. a) do CPP.
Tem, pois, o arguido de ser absolvido.
DECISÃO
Os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães concedendo provimento ao recurso absolvem o arguido Manuel S..
Sem custas.