Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
429/13.4GBPRG.G2
Relator: MÁRIO SILVA
Descritores: ARGUIDO ABSOLVIDO
CONTESTAÇÃO PEDIDO CÌVEL
TAXA DE JUSTIÇA
AUTOLIQUIDAÇÃO
NÃO DISPENSA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/13/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: TOTALMENTE IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
1 - Em processo penal, o arguido/demandado civil que conteste o pedido cível de indemnização contra si deduzido de montante superior a 20 UCs, fica dispensado da autoliquidação de taxa de justiça.

2 - Porém, mesmo que absolvido a final, está sujeito ao pagamento da taxa de justiça pela apresentação de tal contestação, da qual não está isento, em conformidade com o preceituado no art. 15º, nº 2, do RCP.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I - Relatório

1. Em processo comum (singular) com o nº 429/13.4GBPRG, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real – Juízo Local Criminal de Peso da Régua, foi proferido despacho, no dia 30/05/2019, do seguinte teor (transcrição):

“A. M., P. T. e M. B., demandados nos autos epigrafados, notificados pela secretaria judicial nos termos do disposto no art.º 15º, nº 2, do Regulamento das Custas Processuais, para procederem à autoliquidação da taxa de justiça devida pela contestação do pedido de indemnização apresentada nos presentes autos vieram apresentar reclamação da nota de liquidação apresentada, alegando que, como o pedido de indemnização foi julgado integralmente improcedente no caso em apreço, tendo as custas do mesmo ficado exclusivamente a cargo dos demandantes, não suportando os demandados o pagamento de quaisquer custas.
Terminam peticionando que se ordene a ineficácia da notificação documentada sob ref.ª 32107292 dos autos principais, por não haver lugar a autoliquidação de taxa de justiça devida pela apresentação de contestação ao pedido de indemnização civil em processo penal.
Foi elaborada cota pelo Sr. Escrivão, subscrita na íntegra pelo Ministério Público.
Cumpre decidir.
No caso dos autos, o demandante A. C. e O. S., deduziram o PIC a fls. 283. no valor de 530.000,00 contra o demandado A. M..
Os demandados A. M.; P. T. e M. B., contestaram o referido pedido a fls. 306.
Por sentença proferida nos autos de 29-11-2016, quanto ao PIC foram as partes remetidas para os meios comuns no que respeita a uma parte do pedido.
O artigo 4º, nº 1, alínea m), do RCP dispõe que «estão isentos de custas o demandante e o arguido demandado, no pedido de indemnização civil apresentado em processo penal, quando o respectivo valor seja inferior a 20 UC».
Por outro lado, o artigo 15.º, alínea c), do RCP estipula que «ficam dispensados do pagamento prévio da taxa de justiça os arguidos nos processos criminais ou nos habeas corpus e nos recursos que apresentem em quaisquer tribunais».

Ou seja, da conjugação daquelas duas disposições legais decorre que:

- Sempre que o pedido de indemnização cível deduzido em processo penal for igual ou superior a 20 UC haverá lugar ao pagamento de custas por parte de qualquer demandante ou demandado;
- Quando o pedido indemnizatório seja inferior a 20 UC, haverá lugar ao pagamento de custas por parte do demandado que não seja arguido;
- Havendo lugar ao pagamento de custas, apenas o arguido está dispensado de taxa de justiça.

Assim, e como decidiu o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12.10.2011 [proferido no processo nº 410/11.8TBGRD – A.C1, relator Jorge Jacob], “tratando-se de pedido de valor superior a 20UC, a taxa de justiça correspondente será fixada a final, dentro dos limites legais, sendo a correspondente responsabilidade determinada segundo as regras do processo civil, por expressa imposição o art. 523º do CPP, apenas podendo ser exigido o respectivo pagamento após o trânsito em julgado da decisão que a impuser”.
Face ao exposto, consideramos não assistir razão aos reclamantes, mantendo-se a nota de liquidação.
Notifique..”
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2 – Não se conformando com a decisão, os demandados A. M., P. T. e M. B. interpuseram recurso oferecendo as seguintes conclusões (transcrição):

“1. No processo comum 429/13.4GBPRG, da Comarca de Vila Real, Juízo Local Criminal de Peso da Régua (extinto Juízo de Competência Genérica de Peso da Régua - Juiz 1), os demandantes A. C. e O. S., deduziram o PIC a fls. 283. no valor de 530.000,00 Eur, contra os demandados A. M., P. T. e M. B..
2. Os demandados contestaram o referido pedido a fls. 306 e após a realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença nos autos, de 29-11-2016, com o dispositivo que, com interesse, infra se transcreve:
(…)
g) Quanto ao pedido de indemnização civil:
a) Remeter as partes para os tribunais civis no que respeita à parte do pedido de indemnização civil dependente da prova da propriedade sobre os edifícios integrantes dos artigos matriciais 1500, 1501 e 1502.
b) Na parte restante, julgar improcedente o pedido de indemnização civil formulado por O. S. e A. C. e, em consequência, dele absolver os demandados.
h)Condenar o arguido A. M. no pagamento de custas criminais, nos termos do artigo 513.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, que se fixam em 5 UC, atento o número de sessões de julgamento e diligências probatórias desenvolvidas.
i)Condenar O. S. e A. C., na qualidade de demandantes civis, no pagamento das custas processuais relativas à parte do pedido de indemnização civil cujo mérito foi apreciado, que se fixa em 30%, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil, ex vi artigo 523.º do Código de Processo Penal.
3. O mandatário dos demandados foi notificado, nos termos do disposto no artº 15º, nº 2, do Regulamento das Custas Processuais (doravante RCP), para proceder à autoliquidação da taxa de justiça, devida pela contestação do PIC apresentada nos presentes autos, no montante apurado de 4.998,00 Eur, conforme guias emitidas.
4. Em 10-04-2018, os demandados reagiram, requerendo, de forma
fundamentada, que «o pagamento da autoliquidação de taxa de justiça devida pela dedução do pedido de indemnização civil fosse dado sem efeito, requerendo a sua anulação».
5. Por despacho de 28-05-2019, sob Ref.ª 1595398, decidiu-se que os demandados foram dispensados do prévio pagamento da taxa de justiça, sendo, por isso, agora exigível o seu pagamento nos termos notificados pela secretaria judicial.
6. Inconformados com esta decisão, dela vêm recorrer os demandados, requerendo a revogação da decisão do Tribunal a quo.
7. Isto porque os demandados não foram dispensados do pagamento prévio da taxa de justiça e, como tal, não há lugar à notificação prevista no n° 2 do artigo 15°, do RCP, por não se verificar o respetivo pressuposto legal.
8. Resulta aliás claro da respetiva sentença, no segmento condenatório relativo aos demandantes «O. S. e A. C., na qualidade de demandantes civis, o pagamento das custas processuais relativas à parte do PIC cujo mérito foi efetivamente apreciado (improcedendo), fixado em 30%, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do CPC, exviartigo523.ºdoCPP, remetendo o demais peticionado para os tribunais civis.»
9. À luz do número 5 do art. 8º/RCP, em que se prevê os restantes casos em que a taxa de justiça é paga a final, conjugando o estatuído nos artigos 6°, n° 1, 13°, n° 1, 14°, n° 1 e 8°, todos do RCP, conclui-se que a contestação do PIC apresentado nos autos não está sujeita ao prévio pagamento de taxa de justiça;
10. Razão pela qual a aludida taxa de justiça, que se integra no conceito de
custas, apenas é paga a final, nos precisos termos fixados na respetiva sentença.
11. Pelo que, a final, apenas devem ser contadas, as custas que resultam da decisão transitada em julgado, sendo que aí se condenou os demandantes nas custas processuais relativas à parte do pedido de indemnização civil cujo mérito foi apreciado.
12. Assim, como o pedido de indemnização foi julgado totalmente improcedente, tendo as custas civis ficado integralmente a cargo dos demandantes, os recorrentes não devem suportar, evidentemente, o pagamento de quaisquer custas com a contestação apresentada.
13. Ainda que assim não fosse, analisada a questão sob um outro prisma, o despacho recorrido não poderia prevalecer por contradizer decisão precedente, transitada em julgado, nos termos do preceituado no art.º 625.º n.º 1 do CPC.

Pelo exposto e no mais que doutamente será suprido, deve conceder-se provimento a este recurso, revogando-se a decisão do Tribunal a quo e, em consequência, ordenar a revogação do despacho exarado em 28-05-2019, sob Ref.ª 1595398, determinando-se que fica sem efeito a notificação das custas efetuada aos demandados recorrentes, com o que esse Venerando Tribunal fará, uma vez mais, fará JUSTIÇA!”.
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3 – A Magistrada do Ministério Público na primeira instância respondeu ao recurso, analisando a situação em apreço e pugnando pela improcedência do mesmo e pela manutenção da decisão recorrida.
4 – Nesta instância, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto subscreveu a posição expressa pelo MP na primeira instância, concluindo que o recurso não merece provimento.
5 – No âmbito do disposto no art. 417º, nº 2, do CPP, não houve qualquer resposta.
6 – Colhidos os vistos, procedeu-se à realização da conferência, por o recurso aí dever ser julgado - artigo 419º, nº 3, al. c), do Código de Processo Penal.
* * *
II – Fundamentação

1 - O objeto do recurso define-se pelas conclusões extraídas pelos recorrentes da respetiva motivação - artº 412º, n1, do Código de Processo Penal e jurisprudência fixada pelo acórdão do Plenário da Secção Criminal do STJ nº 7/95, de 19/10, publicado no DR de 28/12/1995, série I-A -, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, como sejam as cominadas com a nulidade de sentença, com vícios da decisão e com nulidades não sanadas - artigos 379º e 410º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Penal (cfr. Acórdãos do STJ de 25/06/98, in BMJ nº 478, pág. 242; de 03/02/99, in BMJ nº 484, pág. 271; Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal”, vol. III, págs. 320 e ss; Simas Santos/Leal Henriques, “Recursos em Processo Penal”, Rei dos Livros, 3ª edição, pág. 48).
2 – A única questão suscitada pelos recorrentes é, em síntese, saber se os demandados/arguidos que contestaram pedido de indemnização cível de montante superior a 20 UCs, ainda que absolvidos a final, estão sujeitos ao pagamento da taxa de justiça pela apresentação de tal contestação e de cuja autoliquidação haviam sido dispensados. *
III - Apreciação do recurso

Como já se mencionou, são as questões sumariadas nas conclusões do recurso que fixam os limites do mesmo, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

Uma nota preliminar apenas para sublinhar que, apesar do despacho recorrido mencionar que os ora recorrentes “vieram apresentar reclamação da nota de liquidação (…)” e, mais adiante, “peticionando que se ordene a ineficácia da notificação (…), por não haver lugar a autoliquidação da taxa de justiça (…)”, como se alcança do próprio pedido formulado, não se trata de uma reclamação da conta, mas sim de uma impugnação da decisão proferida.

Ora, como já referia Salvador da Costa – in Código das Custas Judiciais Anotado e Comentado, Almedina 1997, nota 5 ao artigo 60º - “Importa distinguir entre o erro de contagem, que consubstancia um erro de cálculo, e o erro de julgamento em matéria de custas.
No primeiro caso pode reagir-se por meio de reclamação da conta, e no segundo através de reforma da decisão ou recurso”.
Na nota 6 ao mesmo artigo, acrescenta o citado autor: “A reclamação da conta não é o modo idóneo de reagir contra a decisão que condenou indevidamente a parte no pagamento de custas, mas sim o pedido de reforma ou o recurso”.
O que os recorrentes questionam não é qualquer erro de cálculo, mas sim saber se por eles é devido o pagamento de custas/taxa de justiça, ou seja, o erro de julgamento.
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Os recorrentes invocam, para sustentar a sua pretensão, que:

- a apresentação de contestação ao PIC não está sujeita a pagamento prévio de taxa de justiça;
- neste caso, a taxa de justiça apenas é devida a final e nos termos que forem fixados na sentença;
- na sentença foi decidido que as custas processuais relativas à parte do PIC efectivamente apreciada (houve remessa parcial para os tribunais comuns) ficavam a cargo dos demandantes.

Apreciando.

Preceitua o Regulamento das Custas Processuais (doravante, RCP), no que ao caso em apreço se afigura pertinente, que:

- artº 8º (Taxa de justiça em processo penal e contra-ordenacional):
“(…)
9 – Nos restantes casos a taxa de justiça é paga a final, sendo fixada pelo juiz tendo em vista a complexidade da causa, dentro dos limites fixados pela tabela III.
10 – Se o juiz não fixar a taxa de justiça nos termos do número anterior, considera-se a mesma fixada no dobro do seu limite mínimo.”
- artº 15º (Dispensa de pagamento prévio):
1 – Ficam dispensados do pagamento prévio da taxa de justiça:
(…)
d) O demandante e o arguido demandado, no pedido de indemnização civil apresentado em processo penal, quando o respectivo valor seja igual ou superior a 20 UC;
2 - As partes dispensadas do pagamento prévio de taxa de justiça, independentemente de condenação a final, devem ser notificadas, com a decisão que decida a causa principal, ainda que susceptível de recurso, para efectuar o seu pagamento no prazo de 10 dias.” (o sublinhado é nosso).
A tese seguida pelos recorrentes é a de que os casos de sujeição a autoliquidação de taxa de justiça em processo penal são os previstos no artigo 8º - e que esta norma apenas a estabelece para a constituição como assistente e para a abertura de instrução -, o qual também define que nos demais casos é paga a final, sendo fixada pelo juiz e, caso este o não faça, corresponde ao dobro do limite mínimo.
O que importa para dilucidar a questão é compatibilizar o regime previsto no artigo 8º com o do art. 15º, que dispensa o arguido demandado do prévio pagamento da taxa de justiça – nº 1, al. d) da última norma.
Sem se olvidar o disposto no nº 2 do art. 15º, que, expressamente, prevê a notificação, a final e independentemente de condenação, para efectuar o pagamento da taxa de justiça de que a parte havia sido dispensada.
Como refere o Ministério Público na resposta apresentada “A dispensa do pagamento prévio da taxa de justiça não desonera o sujeito processual beneficiário, da liquidação da taxa que for devida como contrapartida pela utilização e prestação do serviço judiciário, constituindo essa dispensa um mero adiamento do seu pagamento. É o que resulta expressamente do nº 2, do art.15º, do RCP, na redacção introduzida pela Lei nº 97/2012, de 13Fev. (…).
Este dispositivo legal demonstra a regra da não gratuitidade da actividade judiciária, justificando-se a realização da notificação aí prevista mesmo em relação à parte que obtenha vencimento na lide, de modo que o custo do processo seja suportado preferencialmente por quem dele beneficia em vez de ser suportado pela comunidade;
A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado, como prevê art.6, nº 1 do RCP, pago no momento em que é desencadeado o impulso processual, ou no momento previsto no art.15, nº 2, do RCP, nos casos de dispensa do prévio pagamento, em que há um diferimento desse pagamento.”.
Não se vislumbra outra forma de compatibilização das transcritas normas legais, que, aliás, foram já objecto de diversas decisões judiciais.
Assim, o Acórdão do TRL de 01/03/2016 (proc. 5398/12.5TDLSB-A.L1-5) “Ao abrigo deste diploma, no processo criminal só há lugar ao pagamento prévio de taxa de justiça nos casos previstos nos n.°s 1 e 2 do art.° 8.°. do RCP, sendo, nos restantes casos, paga a final, conforme dispunha o n.° 5 da mesma norma e dispõe actualmente o seu n.° 9, após as últimas alterações de que foi alvo.
Todavia, tal normativo refere-se, única e exclusivamente, à taxa de justiça criminal e contra-ordenacional – não sendo por acaso que o citado artigo 8.° do RCP tem por epígrafe “Taxa de justiça em processo penal e contra-ordenacional”, remetendo os seus n.°s 7 e 9 para a tabela III anexa -, não sendo aplicável à taxa de justiça relativa ao pedido cível enxertado no processo penal.
Quanto a esta, há no RCP normas específicas a tal respeito, dispondo em sentido diverso, como é o caso do art. 4.°, n.° 1, al. m) ou n), consoante se trate da redacção primitiva ou da actual (…) e do art. 15.º (…).
Para além de o art. 523.°, do CPP, determinar que “à responsabilidade por custas relativas ao pedido de indemnização civil são aplicáveis as normas do processo civil” evidenciando, claramente, que a intenção do legislador foi mandar aplicar, em matéria de custas relativas à acção cível enxertada, as mesmas regras que regem tal matéria nas acções cíveis, distintas, como sabemos, das que vigoram em matéria penal quanto a custas, tendo sido tomada em consideração a diferente natureza do objecto daquela acção e do processo criminal.
Ou seja, face à actual legislação, quando o pedido de indemnização é igual ou superior a 20 UC, não há isenção de custas, mas há dispensa do prévio pagamento da taxa de justiça para o demandante e para o arguido na posição de demandado.
Porém, nos identificados casos de dispensa do prévio pagamento da taxa de justiça, haverá lugar à aplicação do n.° 2 do art. 15.°, do Regulamento, norma que foi introduzida pela Lei n.° 7/2012, de 13/2 e que entraria em vigor 45 dias depois da publicação: ou seja, em 29/3/2012, antes da instauração do presente processo, sendo-lhe, por isso, aplicável.
Assim, logo que proferida decisão final, a notificação em causa deverá ter lugar, independentemente de ter havido ou não condenação, haver procedência total ou parcial do pedido, ser recorrível ou não a mesma decisão.”
É precisamente a situação em apreço no presente processo - instaurado (em Novembro de 2013) já na vigência do actual regime – à qual se adere.
Aliás, o STJ, chamado a resolver contradição de julgados nessa matéria, em Acórdão de Uniformização de Jurisprudência (nº 5/2016, publicado no DR nº 54/2016, Série I, de 2016/03/17), decidiu no mesmo sentido: “A parte dispensada do pagamento prévio da taxa de justiça devida pelo pedido de indemnização civil que, na vigência do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 34/2008, de 26.02, tenha sido deduzido no processo penal e que se encontrar pendente à data da entrada em vigor da Lei n.° 7/2012, de 13.02, deve, independentemente de condenação em custas, ser notificada, a final, para proceder, no prazo de dez dias, ao pagamento da taxa de justiça, nos termos do artigo 15.°, número 2, do referido Regulamento, na redacção dada pela citada Lei n.° 7/2012, de 13.02, aplicável por força do disposto no artigo 8.°, número 1, deste diploma”.

Em suma, a decisão proferida, porque conforme ao regime legal vigente, não merece qualquer censura, improcedendo o recurso interposto.
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Contudo, uma questão existe que deve ser precisada.

A notificação das partes civis, para procederem ao pagamento da taxa de justiça de que tinham sido dispensadas, deveria ter sido efectuada logo após a decisão (sentença) proferida em primeira instância.
É o que estipula o art. 15º, nº 2, do RCP: “As partes dispensadas do pagamento prévio de taxa de justiça, independentemente de condenação a final, devem ser notificadas, com a decisão que decida a causa principal, ainda que susceptível de recurso, para efectuar o seu pagamento no prazo de 10 dias.” (sublinhado nosso).
Mas essa notificação só veio a ser realizada após a decisão do recurso então interposto da sentença (cfr. fls. 1055 dos autos), tendo dado origem ao requerimento de fls. 1062-vº e 1063, que mereceu o despacho recorrido de fls. 1073, ora posto em causa.
Nestes termos, a nota de liquidação de fls. 1076 (emitida posteriormente ao requerimento dos arguidos/demandados e ao despacho recorrido) deve ser tida como não elaborada, devendo proceder-se, após baixa do processo à primeira instância, à liquidação da taxa de justiça devida pelos demandados no momento da leitura da sentença em primeira instância, em conformidade com o disposto no art. 15º, nº 2, do RCP.
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Os recorrentes alegam ainda - conclusão nº 13 e em moldes idênticos aos constantes da motivação - que “o despacho proferido não poderia prevalecer por contradizer decisão precedente, transitada em julgado”, reportando-se à sentença final que condenou os demandantes civis “no pagamento das custas relativas à parte do pedido de indemnização civil cujo mérito foi apreciado”.
Todavia, não existe qualquer violação do caso julgado, ainda que formal.
Na verdade, uma coisa é o pagamento de taxa de justiça devida pelo impulso processual da parte – em razão da não gratuitidade da actividade judiciária e de molde a pôr a cargo de quem dela beneficia os respectivos custos -, outra bem diferente é a condenação pela sucumbência da pretensão formulada, em conformidade com o disposto no art. 523º do CPP (que remete para o regime do processo civil).
Assim, também nesta parte, o recurso improcede.
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IV – DISPOSITIVO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pelos demandados/arguidos A. M., P. T. e M. B., confirmando a decisão recorrida, com os esclarecimentos e o alcance supra referidos.
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Custas a cargo dos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça na quantia correspondente a 3 UC (três unidades de conta) – artigo 513º, nº 1, do CPP, artigo 8º, nº 9, do RCP e tabela anexa a este diploma legal.
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(Texto elaborado pelo relator e revisto por ambos os signatários – artigo 94º, nº 2, do Código de Processo Penal).
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Guimarães, 13 de Janeiro de 2020

(Mário Silva - Relator)
(Maria Teresa Coimbra - Adjunta)