Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
182/15.7GEGMR.G1
Relator: MANUELA PAUPÉRIO
Descritores: CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE ÁLCOOL
PROVA DA TAXA DE ÁLCOOL NO SANGUE
IRRELEVÂNCIA DA CONFISSÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/02/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I) A prova da concreta TAS com que o arguido exerce a condução, como prova cientifica que é, não pode ser objeto de confissão.
II) Por isso, não assume qualquer relevo para este efeito, a circunstância do arguido/recorrente admitir que conduzia veículo automóvel, depois de ter ingerido bebidas alcoólicas
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I) Relatório

Foi o arguido António P. julgado na Secção Criminal da Instância Local de Guimarães, Comarca de Braga e condenado pela autoria de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de 5,50€, ou seja na multa de 495,00€ e na pena acessória de inibição de conduzir veículos motorizados pelo prazo de 3 meses e 15 dias. Inconformado com esta decisão dela veio interpor recurso, nos termos que constam de folhas 46 a 52 dos autos, que ora aqui se dão por reproduzidos concluindo pela forma seguinte: (transcrição)

« 1. O arguido foi condenado pela prática, em autoria material de um crime de condução em estado de embriaguez simples p. e p. pelo art° 292° n° 1 do Código Penal e na pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados pelo período de três meses e quinze dias.

2. Quanto á matéria de facto que ora se impugna, discorda o arguido da factualidade dada como provada, nomeadamente a confissão do arguido.

3. O arguido apenas ingeriu duas cervejas no dia da detenção.

4. Aquando a confissão do arguido, depoimento gravado em CD, no programa “habilus Media Studio” e cuja gravação teve o seu inicio às 11:48,51 e fim às 11:58,06 do dia 21/04/2015, apenas confessou que tinha ingerido duas cervejas,

5. Disse ainda, que derivado aos problemas económicos que vive atualmente, foi obrigado a ser medicado, nomeadamente a tomar antidepressivos.

6. Como prova desses factos o tribunal “a quo” baseou-se única e exclusivamente no depoimento do arguido e na confissão que em nada, confirma a taxa de alcoolemia constante nos autos.

7. O agregado familiar do arguido é composto por três pessoas, mulher e dois filhos menores.

8. O arguido é feirante, tendo como rendimento, somente o lucro dos artigos que vende nas feiras.

9. Ficando com o seu título de condução apreendido, não tem como sustentar a sua família.

10. O arguido é de etnia cigana, ou seja, sem a sua carta de condução, ninguém lhe dá trabalho e dessa forma, não sabe como a sua família vai sobreviver, pois o único rendimento que aufere é o realiza nas feiras.

11. Os factos dados como provados, retirados da prova produzida em audiência e julgamento, não se nos afiguram correctos, parecendo-nos por demais evidente que todo o edifício da prova parece assentar em pilares muito frágeis.

12. O arguido é primário neste tipo de crime, e considerando os escassos factos provados sobre as concretas circunstâncias da prática do crime, deverão pender a favor do arguido, outra pena que não seja a proibição de conduzir veículos motorizados, pois assim, poderá trabalhar e sustentar a sua família.

13. foi assim violado o art.° 71º do Código Penal.»

A este recurso respondeu o Ministério Público junto do tribunal recorrido pugnando pela manutenção do decidido.

Neste tribunal da Relação o Digno Procurador Geral Adjunto no douto parecer que emitiu e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, concluindo pela integral improcedência do recurso.

Cumprido o preceituado no artigo 417º do Código de Processo Penal nada veio a ser acrescentado no processo.

Colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos a conferência.
Nada obsta ao conhecimento do mérito.

II ) Conhecendo

São as conclusões de recurso que limitam e balizam as questões a decidir, sem prejuízo de outras cujo conhecimento oficioso nos incumba.
Começa por dizer o recorrente que discorda da matéria provada, porque refere não ter confessado os factos e não ter assim aceite a taxa de álcool com a qual estaria a exercer a condução.
Ora esta conclusão comporta em si um calamitoso erro; a prova da taxa de álcool com que foi detetado no exercício da condução não resulta da confissão do arguido. Nem o poderia ser em circunstância nenhuma. Não se pode confessar o que não se está em condições de saber. Para se provar a taxa de álcool no sangue é preciso fazer, em aparelho próprio, devidamente aprovado e calibrado o teste de pesquisa de álcool no ar expirado depois, deduzir ao valor assim registado, o valor do erro máximo admissível, só então se encontra a TAS e é esta que se encontra provada com base no documento que se encontra junto a folhas 16 dos autos.
Mas argumentar que não houve confissão dos factos só pode ser lapso do recorrente, porque se excluiu evidentemente qualquer intuito enganador, quando basta iniciar a audição da gravação de julgamento para se ouvir, claramente dito pelo arguido que tinha vindo a Guimarães aos anos de uma prima e que lá tinha ingerido duas ou três cervejas e dois copos de champanhe …. Depois, responder de modo inequívoco à pergunta formulada pelo senhor juiz a quo sobre se queria confessar os factos e ouvir o arguido responder que sim e ainda à pergunta se o fazia de livre vontade, sem que ninguém a tal confissão o ter obrigado e ouvir o arguido responder afirmativamente. Desta feita, nada mais a este propósito nos cumpre, sendo manifesta a desconformidade entre o que aqui em recurso se alega e o que na verdade se passou. Assim a matéria de facto encontra-se devidamente fixada, não merecendo a este propósito a decisão recorrida qualquer reparo.
Como, desde já adiantamos, igualmente não o merece a concretização da pena acessória de proibição de conduzir, pena que o recorrente igualmente contesta.
Concordamos integralmente com o que consta do douto parecer do Ministério Público que pela sua proficiência quase torna desnecessários aduzir mais argumentos.
No entanto sempre se dirá a este propósito o seguinte:
De acordo com o disposto no artigo 69º nº 1 e alínea a) do Código Penal, à punição pela prática de crime de condução em estado de embriaguez acresce a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos.
Enquanto a pena principal visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, esta pena acessória, para além de corresponder também a exigências de prevenção geral, visa primordialmente prevenir a perigosidade do agente. Embora não esteja sujeita, na sua duração, a qualquer correspondência com a pena principal, a determinação da sua medida concreta também se rege de acordo com o estabelecido no art. 71º, devendo, pois, ser fixada em função da culpa do agente e das exigências de prevenção geral e especial.
Esta pena acessória foi concretizada em medida muito próxima do mínimo legal; foram, portanto, devidamente sopesadas todas as circunstâncias que podem revestir caráter atenuativo.
Revela-se adequada à culpa do arguido que conduzia com uma taxa de álcool no sangue superior àquela que é legalmente, satisfazendo ainda as exigências que com a sua aplicação se visam alcançar.
Tudo dito para se concluir portanto que a decisão recorrida não merece qualquer censura.

II) Decisão

Acordam os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido António P., confirmando integralmente a decisão recorrida.

Fixa-se 3 UCs de taxa de justiça

(elaborado pela relatora e revisto por ambas as subscritoras)


2 de novembro de 2015
Maria Manuela Paupério
Maria Isabel Cerqueira