Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
678/17.6GBVVD.G1
Relator: JORGE BISPO
Descritores: CONDUÇÃO DE VEÍCULO ESTADO DE EMBRIAGUEZ
TESTE NO AR EXPIRADO
COLHEITA DE AMOSTRA DE SANGUE
VALIDADE DA PROVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/08/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I) A admissibilidade da colheita de amostra de sangue, para exame do estado de influenciado pelo álcool, não comporta, por si, um juízo de desconformidade constitucional, pois a Constituição autoriza, atendendo às finalidades em causa, e respeitadas as demais exigências constitucionais, a restrição dos direitos fundamentais à integridade pessoal, à reserva da vida privada ou à autodeterminação informativa.

II) Em casos como o dos autos, em que o estado físico do arguido, fruto do seu acentuado estado de embriaguez, evidenciado pelos comportamentos que assumiu no momento da fiscalização, não lhe permitia realizar o teste no ar expirado nem prestar ou recusar o seu consentimento à recolha de sangue, esta diligência de prova, destinada a quantificar a sua taxa de alcoolemia, apesar de contender com o direito à integridade pessoal e o direito à reserva da vida privada do examinando, não comporta um juízo de desconformidade constitucional.

III) Com efeito, a intervenção em análise é obrigatoriamente realizada em estabelecimento de saúde, com observância das leges artis médicas, envolve um grau de afetação da integridade corporal muito baixo, tem um alcance intrusivo reduzido e não envolve uma direta violação da vontade do examinando, mas sim uma impossibilidade de consideração da mesma - dada a circunstância de aquele não estar em condições de prestar ou recusar o consentimento - correspondendo, assim, a uma forma menos grave de interferência no direito à autodeterminação.

IV) Trata-se, pois, de uma restrição adequada, por corresponder ao meio idóneo à prossecução do objetivo de proteção dos direitos fundamentais em análise, necessária, por corresponder ao único meio, face ao caráter perecível da prova, que ainda permite a satisfação da pretensão punitiva do Estado, e proporcional, por ser equilibrada e correspondente à justa medida imposta pela proteção dos direitos que cumpre acautelar, constituindo, assim, um meio de obtenção de prova legal.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. RELATÓRIO

1. No processo especial, sob a forma abreviada, com o NUIPC 678/17.6GBVVD, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, no Juízo Local Criminal de Vila Verde, realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 08-02-2018, depositada na mesma data, a condenar o arguido, P. I., pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo art. 292º, n.º 1, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano, com sujeição a regime de prova, a incluir a obrigação de o arguido se submeter a tratamento ao alcoolismo, fiscalizada pela Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, bem como na sanção acessória de proibição de conduzir, prevista e punida pelo art. 69.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, pelo período de um ano e seis meses.
2. Inconformado com esta decisão, dela recorreu o arguido, concluindo a respetiva motivação nos seguintes termos (transcrição [1]):

«CONCLUSÕES:

1. Com o devido respeito, que é merecido, o Arguido não se pode conformar com a douta sentença proferida merecendo a mesma censura, pelo que, o Recurso versará sobre matéria de facto e direito.
2. Na verdade, não foi feita qualquer prova de que o arguido tenha praticado o crime pelo que foi condenado.

A - DA INADMISSIBILIDADE DA COLHEITA DE SANGUE

3. O arguido foi condenado pelo crime de condução de veículo em estado de embriaguez previsto e punido pelo artigo 292º do Código Penal.
4. O Tribunal baseou a sua convicção numa análise toxicológica de quantificação da taxa de álcool no sangue acusando uma T.A.S. de 3,45g/l, conforme consta do relatório pericial de fls. 12.
5. O arguido não prestou qualquer consentimento ou foi informado porque o transportaram ao Hospital de Braga. (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 1, início 09:35:21 e termo 09:55:26 passagem de 14:40 a 14:51), (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 1, início 09:35:21 e termo 09:55:26 passagem de 15:52 a 16:01), (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 2, início 09:55:26 e termo 10:07:38 passagem de 09:42 a 10:01).
6. Sem o consentimento do arguido a colheita de sangue realizada é uma prova proibida.
7. Destinando-se a colheita de sangue a outro fim que não o benefício clínico do doente, como foi o caso, para efeitos de apurar o grau de alcoolemia, deveria o arguido ter sido informado previamente desse fim, dando-lhe a possibilidade de poder recusar ou poder consentir nessa recolha.
8. A lei processual penal considera nulas as provas obtidas mediante tortura, coação, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, nos termos do artigo 126º nº 1 do Código de Processo Penal e 32º nº 8 da Constituição da República Portuguesa.
9. Sempre terá que concordar-se que a utilização do resultado do exame de recolha e análise de sangue como meio de prova para efeitos criminais, quaisquer que estes sejam, viola a integridade moral do arguido protegida expressamente nos artigos 25°, 32° nº 8 da Constituição da República Portuguesa e 126° nº1 do Código de Processo Penal.
10. O aceitar a admissibilidade da prova obtida através de recolha e análise de sangue a arguido consciente sem lhe ser dado conhecimento e sem a sua autorização, estar-se-ia a violar o princípio fundamental e estruturante da proibição de diligências conducentes à autoincriminação do Arguido e por arrasto ver-se-iam violados os princípios da dignidade da pessoa, o princípio da presunção da inocência e o princípio do contraditório, declarados e garantidos nos artigos 1°, 25°, 32° nºs l, 2, e 8 da Constituição da República Portuguesa e no artigo 126° do Código de Processo Penal in totum».
11. Estamos perante uma obtenção desleal do material biológico do arguido, e, nessa medida, ter sido omitido um procedimento essencial ao seu direito fundamental a um processo penal justo: o direito a saber que a recolha de sangue em causa era para efeitos de eventual responsabilização criminal e, assim, poder fazer valer o seu direito processual penal a não se autoincriminar.
12. E consequentemente, a concreta recolha de sangue ao arguido ora recorrente que serviu de base para apurar o seu grau de alcoolemia, constitui prova ilegal, inválida ou nula, que não pode produzir efeitos em juízo.
13. Pelo que deve ser revogada a decisão proferida nesta matéria, na douta sentença recorrida, e declarar-se a nulidade da referida prova.
14. Sem a admissão e validação da recolha de sangue não se poderiam dar como provados factos, que serviram de base e fundamentação à condenação do arguido.
15. Na verdade e atenta a nulidade supra invocada, que aqui se reproduz, jamais se poderia dar como provado que o arguido apresentava uma taxa álcool no sangue de 3.45 g/I.

B - DA NULIDADE DA DECISÃO RECORRIDA - DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO

16. Em primeiro lugar, o Tribunal a quo profere uma decisão alegando que “ Por último, nota-se que os depoimentos de M. N. e A. P. revelaram incongruências entre si e ainda em conjugação com as declarações do arguido ou de S. S.”, não justificando, nem fundamentando o porquê de assim ter considerado, já que tal inverte os princípios fundamentais do procedimento judicial criminal, onde cabe da audiência de discussão e julgamento fazer prova de que ocorreram os factos contidos na acusação deduzida e não ao arguido fazer prova de que não aconteceram, o que não se pode aceitar.
17. Importa referenciar que a decisão recorrida deveria ser fundamentada, contendo uma exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com a indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a sua convicção, originando que a decisão recorrida padeça de nulidade por violação do artigo 374º n.º n.º2 e 379.º nº.1 do CPP.
18. O exame crítico deve consistir na explicitação do processo de formação da convicção do julgador, concretizado na indicação das razões pelas quais, e em que medida, determinado meio de prova ou determinados meios de prova, foram valorados num certo sentido e outros não o foram ou seja, a explicação dos motivos que levaram o tribunal a considerar certos meios de prova como idóneos e/ou credíveis e a considerar outros meios de prova como inidóneos e/ou não credíveis, e ainda na exposição e explicação dos critérios, lógicos e racionais, utilizados na apreciação efetuada, o que não sucedeu.
19. Não pode a Meritíssima juiz a quo resguardar-se nas regras de experiência comum e da suposição sem nenhumas premissas que o permitam.
20. Sendo que, o Tribunal Recorrido ao não ter analisado criticamente as provas, ao não ter fundamentado as conclusões a que chegou, determina a nulidade da sentença recorrida por falta de fundamentação.
21. Sendo assim, a decisão recorrida não se encontra, com o devido respeito, fundamentada, nem justifica o porquê de não dar credibilidade aos depoimentos das testemunhas indicadas na contestação, principalmente da testemunha S. S..
22. Pelo que, com o devido respeito, a decisão recorrida é nula por violação do n.º2 do artigo 374.º e 379.º n.º1 do CPP.

C - DA IMPUGNAÇÃO DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS

23. O Arguido/Recorrente considera que foram incorretamente dados como provados os factos número 1, 2, 3 e 9 da matéria de facto provada, em virtude de não ter havido produção de prova suficiente em audiência de discussão e julgamento para os considerar como provados, como infra iremos ver.
24. Desde logo, atenta a prova documental e testemunhal produzida e examinada em sede de audiência de julgamento, entendemos que não se podia dar como provada a factualidade supra identificada.
25. Antes de mais, importa salientar que o Recorrente, como veremos infra, quando prestou declarações em audiência de julgamento apresentou a sua versão dos factos, que foi corroborada por todas as testemunhas indicadas na Contestação/Rol de Testemunhas.
26. Justificando todas as situações descritas na acusação de forma concreta e objetiva, respondendo de forma incisiva.
27. Resulta que, em audiência de discussão e julgamento, todos os elementos de prova testemunhal contradizem, quer as conclusões e decisão preferida em sede da apreciação da validade do meio de prova — recolha de sangue — que apurou a taxa de álcool que levou à condenação do arguido, como todas as outras premissas e conclusões em que assentou a Meritíssima Juiz a quo para sustentar a condenação do Arguido.
28. Na verdade, não vislumbramos que a, sempre respeitável, livre convicção do tribunal se possa alicerçar em fundamentos e provas inexistentes e contraditórias, à revelia dos mais elementares princípios de Direito Penal!

- Do facto dado como provado nº 1, 2 e 3

29. Na verdade com o devido respeito, que é muito, estes factos deveriam ter sido dados como não provados, em primeiro lugar, atentas as declarações do Recorrente, uma vez que este em audiência de discussão e julgamento negou a prática dos factos constantes da acusação do Ministério Público, por não corresponderem à verdade.
30. Senão vejamos, o Recorrente no seu depoimento demonstrou o que na realidade sucedeu, apresentando uma outra versão dos factos, que estes sim correspondem à verdade. (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 1, início 09:35:20 e termo 09:54:55 passagem de 02:34 a 03:59)
31. O arguido manteve de forma objetiva a sua versão dos factos, refutando todas as testemunhas elencadas na acusação do Ministério Público.
32. A sentença recorrida refere que “ (…) o próprio arguido disse desde logo nem se lembrar da quantidade de vinho que bebera no café e de ter sido o proprietário do estabelecimento que o informou, o que claramente indicia que já estaria muito embriagado.” (sublinhado nosso).
33. O arguido refere que não se lembra do que bebeu no Café da “P.”” que foi o dono do estabelecimento que lhe disse, o que é normal, face ao mesmo ter assumido que bebeu uma garrafa de whisky na hora imediatamente a seguir.
34. A Meritíssima Juiz a quo, com o devido respeito que é muito, fez um juízo de valor meramente indiciário
35. As próprias testemunhas indicadas pelo Ministério Público depuseram com alguma incongruência.
36. Senão vejamos, as respostas discrepantes das duas testemunhas da acusação pública, ambos militares da GNR: (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 2, início 09:55:26 e termo 10:07:38 passagem de 04:11 a 04:22) (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 10, início 09:42:27 e termo 09:56:02 passagem de 04:57 a 06:06)
37. Com o devido respeito, um militar viu o arguido conduzir o veículo cinco (5) metros e o outro militar viu o arguido conduzir cem (100) metros. Esta é uma diferença de medida muito significativa, atendendo que vinham ambos no mesmo carro patrulha.
38. Mais ainda de referir o lapso temporal no preenchimento dos autos de notícia (fls. 4 a 6, fls. 12 e 13.
39. As testemunhas indicadas na Contestação depuseram de forma credível, relatando os factos que viram.
40. As testemunhas afirmam categoricamente que o arguido já tinha chegado a casa pelo menos uma hora antes dos militares da GNR chegarem. Mais ainda, declaram que o arguido estacionou o veículo na berma encostado a um muro, e quando a GNR chegou, embora o arguido estivesse perto do veículo não o estava a conduzir. O arguido explicou, bem como as testemunhas que este estava a tentar arranjar o veículo.
41. E foi no intervalo de tempo em que o arguido chegou a casa, por volta das quinze (15) horas e as dezasseis (16) horas que o arguido bebeu a garrafa de whisky.
42. Contudo, sem nunca neste espaço temporal ter conduzido o veículo descrito na acusação ou qualquer outro.
43. A versão do arguido foi corroborada pelas testemunhas presenciais, que se encontravam perto do local, e que visualizaram tanto o arguido como os militares da GNR. (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 03, início 10:07:38 e termo 10:23:44 passagem de 00:24 a 04:07)
44. As declarações da testemunha M. N. vão ao encontro das declarações do arguido, ou seja, o arguido esteve pelo menos uma hora em casa, onde esteve a arranjar o veículo, daí os livros que a testemunha falou, eram a garantia e manuais de instruções da viatura.
45. A testemunha refere ainda que os militares da GNR nunca viram o arguido conduzir.
46. A testemunha A. P. também refere que viu o arguido chegar e só passada uma hora chegaram os militares da GNR, declara ainda que o arguido subiu, entrou e saiu da casa pelo menos três vezes neste espaço de tempo. E que os militares da GNR não viram o arguido conduzir. (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 04, início 10:24:19 e termo 10:42:28 passagem de 02:57 a 04:48)
47. As testemunhas apresentadas na contestação pelo arguido são testemunhas presenciais dos factos: Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 1, início 09:35:20 e termo 09:54:55 passagem de 13:44 a 14:01) (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 1, início 09:35:20 e termo 09:54:55 passagem de 13:44 a 14:01) (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 03, início 10:07:38 e termo 10:23:44 passagem de 04:24 a 05:13) (Sessão de 30/01/2018, CD Faixa 10, início 09:42:27 e termo 09:56:02 passagem de 05:46 a 06:06)
48. As testemunhas S. S. e M. F. não conheciam o arguido à data dos factos, e depuseram com desprendimento do final da causa.
49. A testemunha S. S. foi perentória. Afirmou que o arguido não estava a conduzir quando os militares da GNR chegaram ao local. (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 06, início 10:44:29 e termo 11:05:44 passagem de 00:20 a 01:52)
50. Perante a evidente contradição entre o depoimento da testemunha S. S. e dos militares da GNR, foi feita a diligência da acareação entre ambos.
51. E nesse quadro, manteve a testemunha S. S. as suas declarações. Insistindo, mesmo em conversa direta e frente-a-frente com os militares da GNR que quando estes chegaram o senhor P. I. não estava a conduzir, declarando que o carro estava estacionado à sua esquerda, encostado ao muro. (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 06, início 10:44:29 e termo 11:05:44 passagem de 16:23 a 18:18) (Sessão de 30/01/2018, CD Faixa 10, início 09:42:28 e termo 09:56:02 passagem de 10:23 a 12:07)
52. Relativamente, ao depoimento de M. F., não se entende porque não foi levado em consideração. Pelo que a mesma presenciou a chegada do arguido, fortalecendo a versão do mesmo. (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 07, início 11:06:16 e termo 11:16:12 passagem de 01:49 a 02:40)
53. O arguido apresentou a sua versão dos factos de que apenas ingeriu bebidas alcoólicas após ter estacionado o seu carro na berma da Rua (…) em Vila Verde. O arguido teve uma hora entre a sua chegada e a chegada da patrulha da GNR para ingerir as referidas bebidas alcoólicas.
54. A testemunha S. S. confirma que a patrulha da GNR não viu o arguido a conduzir.
55. As pessoas que viram o arguido, conforme refere na sentença, não dizem que o mesmo estava no seu estado normal. Dizem apenas que não notaram alterações no comportamento do mesmo. Todavia a testemunha A. P. a instâncias do Digníssimo Procurador Adjunto acaba por referir que o arguido estava vermelho: (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 04, início 10:24:19 e termo 10:42:28 passagem de 10:05 a 10:28)
56. Ficar vermelho após o consumo de bebidas alcoólicas, resulta de uma substância gerada pelo álcool no organismo, acetaldeído, que se acumula no sistema e faz com que os vasos sanguíneos se contraiam e isso propicia que o rosto fique vermelho.
57. O arguido não percebe como a colocação do anúncio do jornal foi colocada em causa. Afinal, como os próprios militares da GNR admitiram estamos nas traseiras no Pingo Doce que dinamiza uma afluência de pessoas na zona, ao contrário do referido na sentença recorrida. (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 2, início 09:55:26 e termo 10:07:38 passagem de 01:39 a 01:57) (Sessão de 29/01/2018, CD Faixa 1, início 09:35:20 e termo 09:54:55 passagem de 13:04 a 13:42)
58. Pelo que, face ao supra exposto, os mencionados factos 1, 2 e 3 foram incorretamente dados como provados, em virtude de não existir prova credível e suficiente, para os ter dado como provados.
59. Ao invés, e com o devido respeito, entendemos, ter sido produzida prova suficiente para que o tribunal recorrido desse esses mesmos factos como não provados, e ao não tê-lo feito, julgou incorretamente estes concretos de facto ao dá-los como provados (artigo 412º, nº 3 alínea a) e b) do Código de Processo Penal).

- Do facto dado como provado nº 9

60. Na verdade, com o devido respeito, que é muito, este facto deveria ter sido dado como não provado, em primeiro lugar, atentas as próprias declarações do recorrente, uma vez que este em audiência de discussão e julgamento referiu que tinha o 9º ano de escolaridade conforme facto dado como provado nº10.
61. Pelo que, com o devido respeito, entendemos ter sido produzida prova suficiente para que o Tribunal recorrido desse esse mesmo facto como não provado, e ao não tê-lo feito, julgou incorretamente este concreto ponto de facto ao dá-lo como provado (artigo 412º, nº3 alínea a) e b) do Código de Processo Penal).
62. Acresce que, o Tribunal Recorrido deveria ter dado mais valoração às declarações das testemunhas referidas e das declarações do Recorrente do que às declarações dos militares da GNR.
63. Ora, o Tribunal a quo ao ter valorado a versão dos militares da GNR em detrimento da versão do Recorrente e corroborada pelas testemunhas indicadas na contestação, violou o disposto no artigo 32º nº2 da CRP.
64. No direito processual penal o ónus da prova é da acusação e não do arguido, e não é a este que compete demonstrar que está inocente, mas sim à acusação compete provar que o arguido é culpado dos crimes de que vem acusado e que, face à prova produzida, entendemos não o ter conseguido.
65. Sempre deveria ser aplicado o princípio in dubio pro reo, enquanto correlato processual do princípio da presunção da inocência do arguido, gozando o arguido da presunção de inocência (artigo 32° n°2, da Constituição da República Portuguesa), toda e qualquer dúvida com que o tribunal fique reverterá a favor daquele.
66. Pelo que, não se deve partir do princípio que o Recorrente praticou os factos pelos quais vem acusado, pois vigora o princípio da presunção de inocência e o ónus da prova recai sobre a acusação e as dúvidas aproveitam ao acusado.
67. Assim sendo, o Tribunal Recorrido ao ter dado mais valor às declarações dos militares da GNR do que às prestadas pelo arguido e demais testemunhas presenciais, inverteu o ónus da prova em detrimento do recorrente, tendo assim violado o disposto no artigo 32º, nº2 da CRP.
68. Pelo que, não restam dúvidas, que não existe e nem foi produzida prova segura e cabal de que o Recorrente tivesse praticado os factos constantes da douta acusação pública.
69. Sendo que, se impõe a absolvição do arguido pela prática de um crime de condução de veículo em estado embriaguez p. e p. pelo artigo 292º do Código Penal.

D - DA MEDIDA CONCRETA DA PENA

70. Não pode o arguido conformar-se com a sua condenação pela prática: Como autor material pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelo artigo 292.º, nº1 do Código Penal na pena de seis meses de prisão, a qual, se suspende por um período de um ano, sujeita a regime de prova, que incluirá a obrigação de o arguido se submeter a tratamento ao alcoolismo, a fiscalizar pela Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais.

O arguido vai, ainda, condenado na sanção acessória de proibição de conduzir p. e p. no artigo 69º, nº1 alínea a) do Código Penal, pelo período de um ano e seis meses.

Com o devido respeito, que é muito, caso se considere que o Recorrente praticou o crime pelo qual foi condenado, o que não se aceita, a pena pelo qual foi condenado é manifestamente exagerada e desproporcional.
71. O Tribunal a quo, não teve devidamente em conta a situação socioeconómica do Recorrente.
72. O arguido está inserido no seio familiar, vive com a companheira.
73. Está integrado socialmente como confirmou a namorada do enteado.
74. Pelo que, o Tribunal Recorrido não teve devidamente em conta a situação do arguido.
75. Mais ainda a pena acessória aplicada ao recorrente, consubstancia uma solução desajustada e manifestamente excessiva, sendo não rigorosa e irrazoável.
76. Face aos factos dados como provados, a aplicação da pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados aplicada ao arguido, afigura-se desproporcionada.
77. O recorrente é bem comportado e padecia à data dos factos de problemas de consumo excessivo de álcool, contudo o arguido está abstinente do consumo de álcool desde 29 de agosto de 2017, conforme declaração médica junta aos autos.
78. Ponderados todos estes fatores e tendo em conta as considerações de prevenção especial e geral, a pena que se consideraria justa, proporcional e adequada, seria uma pena de três meses de prisão e ainda numa sanção acessória de proibição de conduzir pelo período de um ano.
79. A Douta sentença violou o disposto nos artigos 71.° e 40.° do Código Penal e o artigo 18.° da CRP.

Termos em que, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e consequentemente, revogando a sentença Recorrida, farão V. Ex.
A HABITUAL E NECESSÁRIA JUSTIÇA.»

3. O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto da primeira instância respondeu ao recurso, no sentido de lhe dever ser negado provimento, tendo formulado as seguintes conclusões (transcrição):

«CONCLUINDO:

Atento tudo o que se deixou exposto é nosso entendimento que:

a) O exame de sangue é a via excecional para a recolha de prova admitida na lei para tal efeito, apenas admissível em casos expressamente tipificados, nomeadamente quando o estado de saúde não permite o exame por ar expirado ou esse exame não for possível, como se consagra nos artigos 153.º, n.º 8 e 156.º, n.º 2 do Código da Estrada;
b) No caso vertente, cumpre ter por referência e por subjacente que os factos que vieram a motivar a sujeição do arguido e ora recorrente ao aludido exame de pesquisa de álcool no sangue por meio de recolha deste último, se vieram a suceder na sequência da prévia intervenção do mesmo num acidente de viação;
c) Bem como, a circunstância de o aludido exame de recolha de sangue – para efeitos de aferição da taxa de álcool por litro do mesmo, evidenciada pelo arguido -, apenas se ter vindo a suceder, na sequência da circunstância de o arguido e ora recorrente se ter vindo a demonstrar incapaz de o fazer por meio de teste de ar expirado;
d) Contrariamente ao invocado pelo arguido e ora recorrente, no que concerne ao seu alegado não consentimento para a realização do aludido exame de pesquisa de álcool no sangue por meio de recolha de sangue, cumpre salientar que, em casos como o apreço (contexto de acidente de viação), havendo necessidade (por impossibilidade de o fazer, como no caso vertente, por meio de ar expirado) de realizar tal exame, por tal forma, não se afigura necessário obter o seu consentimento, com tal desiderato;
e) Em momento algum a lei impõe ou exige o consentimento expresso do visado para a recolha de sangue para posterior exame de diagnóstico do estado de influenciado pelo álcool, pelo que, nesta matéria, se encontram apenas excluídos os exames coercivos, aos quais o titular do interesse manifestou oposição, através de recusa em sujeitar-se ao exame. De onde decorre, desde logo, que nesta matéria se encontram apenas excluídos os exames coercivos, aos quais o titular do interesse manifestou oposição, através de recusa em sujeitar-se ao exame;
f) A recolha de amostra de sangue efetuada ao arguido, no circunstancialismo dos autos, constituiu um meio de obtenção de prova legal, constituindo o respetivo resultado da pesquisa quantitativa de álcool efetuada nessa amostra um meio de prova válido, inexistindo, por conseguinte, contrariamente ao por si invocado, qualquer violação “dos princípios da dignidade da pessoa, da presunção da inocência e do contraditório”, por referência aos artigos 1º, 25º, 32º, n.º1, 2 e 8 da Constituição da Republica Portuguesa ou, sequer, do direito à não autoincriminação;
g) A matéria de facto dada como provada pelo tribunal “a quo” correspondeu apenas a um fiel retrato da prova produzida em sede de audiência de julgamento, mas também, porque o tribunal se limitou a fazer uma ponderação conjugada e consentânea com as regras de experiência comum, da prova produzida à luz do princípio da liberdade de apreciação da prova, consignado no artigo 127º do Código de Processo Penal;
h) Compulsado o teor da referida sentença recorrida, verificamos que na mesma consta uma análise crítica, criteriosa e objetiva – e, como tal, uma correta fundamentação -, das razões que se encontraram subjacentes à decisão de dar tal factualidade como assente por provada;
i) Resultando de tal sentença recorrida, quando analisada, de forma objetiva e atenta, que tal factualidade veio a ser dada como assente e a ter como fundamento, a valoração e apreciação conjugada – nomeadamente e, com particular enfoque, no que concerne à dinâmica e contexto em que os factos em apreço se vieram a suceder - dos depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas em sede de audiência de julgamento (a saber, M. S., R. G. e J. M.), das declarações prestadas pelo recorrente e ora arguido P. I. e, dos elementos de ordem documental e pericial de fls. 4 a 13, constantes dos autos, quando valorados e apreciados em função das regras de experiência e normalidade;
j) A fundamentação da sentença em matéria de facto consiste na indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, que constitui a enunciação das razões de ciência reveladas ou extraídas das provas administradas, a razão de determinada opção relevante por um ou por outro dos meios de prova, os motivos de credibilidade dos depoimentos, o valor e documentos e exames, que o Tribunal privilegiou na formação da sua convicção, em ordem a que os destinatários (e um homem médio suposto pela ordem jurídica, exterior ao processo, com experiência razoável de vida e coisas) fiquem cientes da lógica do raciocínio seguido pelo Tribunal e das razões da sua convicção;
k) Não se verificando, por conseguinte, a nulidade de falta de fundamentação invocada e alegada, decorrente das disposições conjugadas dos artigos 374º, n.º 2 e 379º, n.º 1, do Código de Processo Penal;
l) O Tribunal “a quo”, no que concerne aos factos por si considerados e dados como provados e não provados estribou-se, a nosso ver, de forma lógica, coerente e consistente, “no conjunto da prova produzida em sede de audiência de julgamento, analisada, criticamente, à luz das regras de experiência”;
m) Designadamente, nos depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas em sede de audiência de julgamento (a saber, M. S., R. G. e J. M.), das declarações prestadas pelo recorrente e ora arguido P. I. e, dos elementos de ordem documental e pericial de fls. 4 a 13, quando valorados e apreciados em função das regras de experiência e normalidade;
n) As declarações – e inerente versão - do arguido P. I. veio a ser manifesta e claramente infirmada – no que concerne à sua efetiva condução do veículo automóvel de marca “Mercedes Benz”, modelo “C220 CDI”, de matrícula …- DC-…, no circunstancialismo espácio-temporal em apreço nos autos, pelos depoimentos (que o Tribunal “a quo” reputou, corretamente, como isentos e desinteressados), de ambos os elementos da G.N.R. que o vieram, então, a abordar e, fiscalizar;
o) O erro notório na apreciação da prova “é de concluir, sempre que, para a generalidade das pessoas, seja evidente uma conclusão contrária à exposta pelo tribunal, nisto se concretizando a limitação ao princípio da livre apreciação da prova estipulada no artigo 127º do Código de Processo Penal, quando afirma que a prova é apreciada segundo as regras da experiência”;
p) Não se verificou qualquer erro de julgamento, decorrente do alegado erro notório na apreciação da prova, porquanto o entendimento a que o tribunal “a quo” chegou resultou, tão só, da análise e interpretação conjugada dos elementos probatórios disponíveis, aos quais, fazendo uso do princípio da livre apreciação da prova e às regras de experiência comum, conferiu credibilidade e relevância;
q) No caso concreto dos autos atendendo aos factos dados como assentes e ponderando, quer a moldura abstrata fixada no normativo legal atinentes à pena principal e à pena acessória do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, para a pena de prisão, quer as exigências de prevenção geral e especial que no caso concreto se fazem sentir e impõem, quer o grau de ilicitude e de culpa manifestados e decorrentes da factualidade imputada aos arguidos, cremos não assistir razão ao recorrente quando este considera que a pena de prisão suspensa na sua execução e a pena acessória de proibição de conduzir que, em concreto lhe vieram a ser aplicadas, se revelam demasiado severas;
r) A sentença recorrida, no nosso entender, obedeceu estritamente aos pressupostos e critérios legais do artigo 70º e 71º do Código Penal (tendo em conta os factos apurados e dados como provados em sede de audiência de julgamento, designadamente, por um lado, os 5 antecedentes criminais – por referência à data da prática dos factos ora em julgamento – averbados quanto ao arguido e, por outro, o grau elevado de ilicitude do seu comportamentos, na vertente de desvalor da ação, decorrente da elevada taxa de álcool evidenciada pelo arguido e ora recorrente – de 3,45g/ls, ou seja, 2,26 g/ls acima do limite legalmente determinado e, a partir do qual a condução, com presença de álcool no sangue prefigura a prática de ilícito criminal – e, do facto de o mesmo ter agido com dolo direto, correspondente à forma mais intensa de dolo).
s) A decisão (e inerente ponderação efetuada pelo Tribunal “a quo”), relativamente à pena de prisão suspensa na sua execução concretamente e à pena acessória de proibição de conduzir aplicadas ao arguido e ora recorrente, a nosso ver e, salvo melhor entendimento, observou e ponderou, de forma correta, estrita e rigorosa, os critérios de determinação concreta da pena consignados no artigo 71º, do Código Penal, designadamente, os sobreditos três critérios, ínsitos ao princípio da proporcionalidade (da idoneidade ou adequação, da necessidade ou da exigibilidade e da proporcionalidade em sentido estrito ou da justa medida) em função do grau de ilicitude e culpa evidenciados pelos arguidos na prática dos factos ora em apreço, bem como, em função das necessidades de prevenção geral e especial existentes.
t) Como tal, deve o presente recurso ser declarado improcedente por infundado, mantendo-se, integralmente tal sentença e por inerência a condenação do arguido, ora recorrido.

TERMOS EM QUE, deve ser negado provimento ao recurso interposto pelo arguido P. I. e, em consequência, mantendo a sentença recorrida farão V. Exas. JUSTIÇA.»

4. Neste Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, a concordar com a assertiva resposta do Ministério Público na primeira instância – à exceção da referência ao vício do art. 410º, n.º 3, alínea c), do CPP, que não se mostra invocado pelo recorrente, e do erro de julgamento quanto ao ponto de facto n.º 9 – desmontando a argumentação do recorrente em qualquer das suas vertentes, não deixando, todavia, de lhe acrescentar algumas notas complementares, com pertinentes citações jurisprudenciais, para concluir que: «inexiste valoração de prova proibida, tal como não foi aplicada qualquer norma que viole a CRP; a sentença não padece de nulidade por falta de fundamentação; a matéria de facto provada deverá manter-se imodificada, por não padecer de erro de julgamento, à exceção do ponto de facto provado n.º 9 que deve ser eliminado; na sentença não ocorreu violação do princípio in dúbio pro reo; a pena e a sanção acessória cominadas deverão manter-se».
5. No âmbito do disposto no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o arguido não apresentou resposta a esse parecer.
6. Colhidos os vistos, teve lugar a conferência, por o recurso dever ser aí julgado, de harmonia com o preceituado no art. 419º, n.º 3, al. c) do citado código.

II. FUNDAMENTAÇÃO

1. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Dispõe o artigo 412º, n.º 1 do Código de Processo Penal que “a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido”.

Daí o entendimento unânime de que o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal ad quem tem de apreciar, sem prejuízo das que forem de conhecimento oficioso [2].

Atenta a conformação das conclusões formuladas, importa conhecer das seguintes questões, elencadas pela ordem lógica das consequências da sua eventual procedência:

a) – A nulidade da prova obtida por recolha e análise de amostra de sangue para quantificação da taxa de alcoolemia;
b) - A nulidade da sentença, por falta de fundamentação;
c) - A impugnação da matéria de facto por erro de julgamento, com invocação também da violação do principio in dubio pro reo;
d) - A medida concreta da pena de prisão;
e) – A medida da pena acessória.

2. DA SENTENÇA RECORRIDA

2.1 - A primeira instância considerou provados os seguintes factos (transcrição):

«1- No dia 22.08.2017, pelas 15H30m, o arguido P. I., conduzia o veículo automóvel, ligeiro de passageiros, de marca “Mercedes Benz”, modelo “C220 CDI” de matrícula …-DC-…, no Parque de Estacionamento da (...), em Loureira, neste concelho de Vila Verde, com uma T.A.S. igual a 3,45 g/l.
2- O arguido P. I. sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas em quantidades suscetíveis de ultrapassar o limite legal de teor de álcool e ainda assim quis conduzir veículo automóvel, ligeiro de passageiros em causa, na via pública, com a mencionada taxa de álcool no sangue, apesar de saber que tal facto era proibido e punido por lei, mas apesar de o saber quis atuar da forma descrita, e conduzir o mesmo nas condições em que o fez.
3- O arguido P. I. agiu sempre livre, voluntária e conscientemente.
4 – Por sentença de 07.07.2004, o arguido foi condenado no processo Comum Singular n.º 1277/03.5GAEPS, do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Esposende, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 4,00 e na pena acessória de oito meses de proibição de conduzir veículos motorizados na via pública, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez em 17.11.2003.
5- Por sentença de 12.03.2009 o arguido foi condenado no processo Comum Singular n.º 1187/06.4TABCL do 2.º Juízo Local Criminal do Tribunal Judicial de Barcelos, na pena única de 11 meses de prisão, pela prática de dois crimes de descaminho em 21.07.2006 e 17-7-2007.
6- Por sentença de 21.12.2009 o arguido foi condenado no processo Comum Singular n.º 1118/08.7TDPRT do Porto – Juízos Criminais – 1º Juízo – 1ª Secção, na pena de 90 dias de multa à taxa diária de € 3,00, pela prática do crime de denúncia caluniosa em 19.08.2006.
7- Por sentença de 04.04.2016 o arguido foi condenado no processo Sumário n.º 122/15.3GBVVD do Juízo Local Criminal do Tribunal de Vila Verde, na pena de 4 meses e 10 dias de prisão, substituída por 110 dias de multa à taxa diária de € 12,00, pela prática dos crimes de desobediência em 16.03.2015 e injúria agravada em 17-3-2015 e na sanção acessória de proibição de conduzir veículos motorizados.
8- No processo n.º 122/15.3GBVVD o arguido foi condenado pelo crime de desobediência por se recusar a efetuar o teste de alcoolemia ao sangue, depois de ter sido interveniente em acidente de viação, alegando em julgamento que tinha ingerido bebidas alcoólicas entre o momento do acidente e o momento em que foi abordado pelos militares da Guarda Nacional Republicana.
9- Tem o 4.º ano de escolaridade.
10- O arguido reside com uma companheira em casa arrendada pagando € 350 de renda, está reformado auferindo cerca de € 750,00 de reforma, a sua companheira não trabalha há cerca de um ano. Possui um veículo de marca Mercedes modelo 220 CDI de 2004. Paga mensalmente € 218,00 de prestação do carro. Tem dívidas de cerca de € 2 000,00 em lojas, por utilização de um cartão de crédito. O arguido foi seguido em psiquiatria por causa de problemas de alcoolismo e fez um tratamento numa instituição. Tem o 9.º de escolaridade.»

2.2 – Da sentença recorrida consta a seguinte motivação da decisão de facto (transcrição):

«O Tribunal baseou a sua convicção, no que respeita aos factos descritos na acusação, na concatenação das declarações do arguido e depoimentos testemunhais de M. S., R. G. e J. M., concatenados com o teor de folhas 4 a 13, tudo conjugado com as regras da experiência e da normalidade.
O arguido prestou declarações de modo muito confuso, atabalhoado, disperso, desconexo e incongruente. Admitiu ter bebido vinho branco no café da ponte, dizendo que depois foi para casa beber quase uma garrafa de whisky. Contudo diz não se lembrar daquilo que bebeu no café, foi o dono do café que o informou. Instado disse nunca beber álcool, bebendo apenas quatro vezes por ano. Instado a esclarecer por que motivo naquele dia bebeu tal variedade e quantidade de bebidas alcoólicas começou por mencionar a morte dos pais e de um irmão, depois mencionou quarenta cartas das Finanças por causa das portagens e, por fim mencionou que um irmão foi para Inglaterra ficou de comprar um terreno, mas não o fez. Considera que foi a reflexão sobre esses assuntos todos que o fez beber, contudo diz que não mais bebeu desde esse dia. Instado disse: «Ando lixado, sou bastante nervoso e há situações que eu não encaro.», começando depois a falar daquilo que a senhora «Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça» teria dito sobre as portagens, dizendo que em seu entender o problema das portagens não é um problema de infração tributária…
Instado disse não se lembrar de ir buscar os documentos do carro, ou de ir para o hospital.
R. G. é militar da Guarda Nacional Republicana, quando cerca das 15h30 (o militar recorda-se que já estava a sair de serviço) tendo sido contactado por causa de um acidente em que o condutor se tinha ausentado do local. Depois de informados da residência do condutor (através da matrícula), deslocaram-se para lá e quando chegavam viu o arguido a conduzir o veículo no meio da faixa de rodagem. Instado se o viu conduzir, a testemunha sorriu e disse com veemência, «Ele vinha no meio da estrada!». Esclareceu que foi a testemunha que teve que travar o carro e que teve que o segurar, enquanto o seu colega foi desviar o jipe da Guarda Nacional Republicana, para impedir que o carro embatesse no jipe uma vez que o arguido não o travou. Quando lhe disseram para travar o carro o arguido disse «eu estava parado, vocês não me viram a conduzir!». O arguido estava de tal modo embriagado que não se percebia bem o que ele dizia, foi o militar que o ajudou a sair do carro, o arguido não conseguiu fazer o teste de alcoolemia, quer no local, quer no Posto da Guarda Nacional Republicana, no Posto quase adormecia. Instado o militar reconheceu ter cometido um lapso (quanto às horas) no preenchimento da participação de acidente de viação de folhas 6 (que ocorreu às 15h30) e no preenchimento do documento de análise para quantificação da taxa de álcool no sangue de folhas 13, tendo este teste ocorrido às 16h45.
Tentaram explicar ao arguido que ele iria ser conduzido ao hospital, mas ele estava muito alcoolizado. Apareceu no local a companheira do arguido que disse «é sempre a mesma coisa», ele mandou-a embora e ela foi.
O arguido estava de tal modo alcoolizado que, no hospital, teve que ser levado de cadeira de rodas e vomitou duas vezes.
M. S. viu o arguido sair do café e bater com o carro que conduzia (um Mercedes) contra outro veículo, tendo anotado a matrícula do carro que deu ao proprietário do carro danificado. Depois foi abordada pelos militares da Guarda Nacional Republicana, que foram chamados pelo proprietário do carro. Esta testemunha depôs com total isenção e desprendimento.
M. N. é companheira do arguido, prestando declarações de modo muito nervoso, dizendo inclusivamente que não se lembrava da sua morada porque residia lá há pouco tempo, não obstante habite esse local há dois anos… Afirma que quando o seu companheiro chegou estava sozinha na varanda. Instada disse que não o viu beber, mas mais tarde viu uma garrafa de whisky meio vazia no escritório. Não revelou qualquer credibilidade por se encontrar nervosa e hesitante, tendo sido claramente parcial, designadamente quando instada quanto aos hábitos alcoólicos do arguido.
A. P. estava em casa do arguido quando o viu a chegar. Instada disse que o arguido bebe vinho tinto às refeições, o que contraria as declarações do arguido e da sua companheira. Disse que o arguido estacionou mal o carro, o que contraria igualmente as declarações do arguido e da sua companheira. Aliás disse ter sido a companheira do arguido quem pediu aos militares para estacionar o veículo por estar mal estacionado. Depôs de modo contido e objetivo.
S. S. leu no jornal (...), edição de 10-12-2017, o anúncio colocado pelo arguido, pelo que o contactou. Relatou ter visto o arguido a chegar, a subir e descer as escadas de casa e os militares a chegar também, passado cerca de uma hora e o arguido a soprar no alcoolímetro. Instado disse não ter visto ninguém em casa do arguido, seja nas escadas ou na varanda. Depôs de modo seco, perentório e objetivo.
O depoimento de M. F. não revelou interesse para a matéria em discussão nos autos.
J. M. veio corroborar o depoimento de R. G., sendo que ambos se revelaram isentos.
Certo é que o arguido ingeriu bebidas alcoólicas e depois foi conduzir o seu automóvel, contudo o arguido admite apenas ter ingerido um copo e meio de vinho verde. Ora, decorre da prova produzida que o arguido ingeriu bebidas alcoólicas em maior quantidade do que aquela que admite ter acontecido, naturalmente conforme análise do resultado do teste de alcoolemia. Aliás, o próprio arguido disse desde logo nem se lembrar da quantidade de vinho que bebera no café e ter sido o proprietário do estabelecimento que o informou, o que claramente indicia que já estaria muito embriagado. O arguido estava efetivamente completamente embriagado, de tal modo que não era sempre percetível o seu discurso, não conseguiu travar o carro que conduzia, não conseguiu sair do carro pelo seu pé, não se recorda sequer dos factos a partir do momento em que teve que soprar ao balão e, já no hospital, teve que ser transportado numa cadeira de rodas e vomitou duas vezes.

Alega o arguido que teria ingerido bebidas alcoólicas após chegar a casa, contudo relata uma versão completamente inverosímil e descabida, invocando um estado de nervosismo que não logrou explicar. Não foi produzida qualquer prova quanto a este facto, a não ser a referência a uma garrafa de whisky, alegadamente, quase vazia, no seu escritório. Apenas o arguido afirma ter bebido após a condução do veículo, sendo certo que as pessoas que o viram dizem que estava no seu estado normal e apenas os militares afirmam que estava embriagado, fazem-no descrevendo concretas situações que os fizeram perceber isso, sendo os seus depoimentos inteiramente corroborados pelo resultado do teste de alcoolemia. Note-se que o arguido já havia tentado esta tática processual no âmbito dos autos n.º 122/15.3GBVVD, debalde contudo.

Cumpre notar que os militares da Guarda Nacional Republicana ouvidos depuseram de modo muito espontâneo e desprendido e não conheciam o arguido antes dos factos, sendo que nada os move contra esta pessoa.

Importa ainda salientar que o aparecimento no processo da testemunha S. S. levanta sérias dúvidas sobre a sua isenção, sendo de estranhar a colocação do anúncio no jornal, até porque os factos imputados ao arguido não ocorreram nas traseiras do Pingo Doce.

Por último, nota-se que os depoimentos de M. N. e A. P. revelaram incongruências entre si e ainda em conjugação com as declarações do arguido ou de S. S..

O elemento subjetivo decorre da prova dos factos objetivos, sendo do conhecimento comum a proibição de conduzir após ingestão de bebidas alcoólicas, o que aliás bem sabe o arguido que já foi condenado, entre o mais, pelo crime de condução de veículo em estado de embriaguez, mas também, pela prática do crime de desobediência, por se ter recusado a efetuar o teste de alcoolemia quando se encontrava a conduzir. A taxa de alcoolemia apresentada atesta a grande quantidade de bebidas alcoólicas ingeridas pelo arguido.

No que se reporta aos antecedentes criminais do arguido o Tribunal atendeu ao teor do certificado de registo criminal.
No que toca às condições pessoais do arguido o Tribunal atendeu às suas declarações e da sua companheira por serem o único elemento de prova a tal respeito.»

3. APRECIAÇÃO DO RECURSO

3.1 – Da nulidade da prova obtida através de recolha e análise de amostra de sangue para quantificação da taxa de alcoolemia

O recorrente põe em causa a validade da colheita de sangue a que foi sujeito e que serviu para, mediante análise toxicológica desse seu material biológico, quantificar a taxa de álcool no sangue que apresentava no exercício da condução, alegando, em suma, que não prestou qualquer consentimento ou foi informado porque o transportaram ao hospital, que destinando-se a colheita de sangue a outro fim que não o benefício clínico do doente, como foi o caso, para efeitos de apurar o grau de alcoolemia, deveria ter sido informado previamente desse fim, dando-lhe a possibilidade de poder recusar ou consentir nessa recolha, que são nulas as provas obtidas mediante ofensa à integridade física ou moral da pessoa (arts. 126º, n.º 1, do Código de Processo Penal e 25º e 32º, n.º 8, da Constituição da República Portuguesa) e que a aceitar-se a admissibilidade da prova assim obtida, estar-se-ia a violar o principio da proibição de diligências conducentes à autoincriminação do arguido e, por arrasto, os princípios da dignidade da pessoa, da presunção da inocência e do contraditório, constitucionalmente garantidos (arts. 1º, 25º, 32º, n.ºs 1, 2 e 8, da Constituição). Defende, assim, que constituindo a concreta recolha de sangue prova ilegal, inválida ou nula, não produz qualquer efeito em juízo, não se podendo, consequentemente, dar como provado que o arguido apresentava uma taxa de álcool no sangue de 3,45 g/l, facto este que serviu de base à sua condenação (conclusões 3ª a 15ª).

O Ministério Público discorda desta argumentação, alegando que os factos que motivaram a sujeição do arguido ao exame de pesquisa de álcool no sangue por meio de recolha de amostra sanguínea sucederam na sequência da intervenção do mesmo num acidente de viação e de não ter sido possível aferir a taxa de álcool por meio de teste ao ar expirado, pois que o arguido se demonstrou incapaz de o fazer, circunstâncias em que não é necessário obter o seu consentimento, que a lei não impõe ou exige, apenas excluindo os exame coercivos, em que o titular do interesse manifestou oposição, através de recusa em sujeitar-se ao exame, concluindo, assim, que no circunstancialismo dos autos, a recolha de amostra de sangue efetuada ao arguido constitui um meio de obtenção de prova legal, sendo o respetivo resultado válido, sem qualquer violação dos princípios e do direito à não autoincriminação invocados pelo recorrente.

3.1.1 - Cumpre apreciar a questão suscitada, para o que importa ter presente os procedimentos legalmente estabelecidos para a realização do teste de pesquisa de álcool no sangue, destinado à averiguação do grau de alcoolemia de que sejam portadores os condutores de veículos ou outros intervenientes na circulação rodoviária, para efeito de apuramento de responsabilidade criminal ou contraordenacional.

De acordo com o estatuído no art. 1º, n.º 1, da Lei n.º 18/2007, de 17 de maio (Regulamento de fiscalização da condução sob o efeito do álcool), primeiramente é efetuado um teste qualitativo no ar expirado, destinado a despistar a presença de álcool no sangue do examinando, sem qualquer finalidade de medir a respetiva taxa, embora a possa acusar.

Sendo o resultado positivo, segue-se a realização de um teste quantitativo ou análise de sangue quando não for possível realizar o teste em analisador quantitativo, com a finalidade de quantificar a efetiva taxa de álcool no sangue (n.ºs 2 e 3 do art. 1º e n.º 1 do art. 2º da citada Lei).

Por seu turno, dispõe o art. 153º, n.ºs 1, 2, al. c), 3, als. a) e b), e 8, do Código da Estrada que o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito, sendo que, em caso de resultado positivo, a contraprova que venha a ser requerida pelo examinando deve ser realizada, de acordo com a vontade do mesmo, por novo exame, a efetuar através de aparelho aprovado, ou por análise de sangue, sendo que, se não for possível a realização de prova por pesquisa de álcool no ar expirado, o examinando deve ser submetido a colheita de sangue para análise ou, se esta não for possível por razões médicas, deve ser realizado exame médico, em estabelecimento oficial de saúde, para diagnosticar o estado de influenciado pelo álcool.

O art. 4º da referida Lei n.º 18/2007, sob a epígrafe “Impossibilidade de realização do teste no ar expirado” prevê, no seu n.º 1, que “quando, após três tentativas sucessivas, o examinando não conseguir expelir ar em quantidade suficiente para a realização do teste em analisador quantitativo, ou quando as condições físicas em que se encontra não lhe permitam a realização daquele teste (como sucede, por exemplo, se ficar gravemente ferido num acidente de viação), é realizada análise de sangue”.

3.1.2 - No caso dos autos, tal como é explicitado na motivação da decisão de facto e, efetivamente, resulta da participação de acidente de viação e do impresso relativo ao resultado no teste de ar expirado (juntos a fls. 6 a 9 e 13), cujo teor foi confirmado em audiência pelo militar da GNR que os elaborou (testemunha R. G.), designadamente no excerto transcrito na motivação do recurso pelo próprio arguido, este, após várias tentativas, não conseguiu efetuar o sopro necessário à realização do ar expirado, sendo elucidativas as afirmações da referida testemunha de que o arguido quase que adormecia no posto da GNR e que, no hospital, teve de ser transportado em cadeira de rodas, tendo vomitado duas vezes, bem como que lhe tentou explicar por que razão o levava ao hospital, mas que ele estava muito embriagado, conforme, aliás, resulta da elevadíssima taxa de álcool que apresentava (3,45 g/l). Além disso, o próprio arguido admite, nas declarações prestadas em audiência (cf. os excertos por si transcritos), que embora se lembre de ter estado a soprar ao balão, não se sentia bem e não se recorda do que lhe disseram os militares da GNR nem de ter estado no hospital, o que é esclarecedor do seu estado físico e psicológico.

Perante isto, a situação não pode deixar de ser reconduzida a uma impossibilidade de realização do teste no ar expirado, por o examinando, fruto do estado físico decorrente do elevado grau de embriaguez que apresentava, não o conseguir realizar, não se encontrando igualmente em condições de prestar o seu consentimento à recolha de sangue.

Consequentemente, verifica-se a previsão dos arts. 153º, n.º 8, do Código da Estrada e 4º, n.º 1, da Lei n.º 18/2007, justificadora do recurso à colheita de amostra sanguínea.

Ainda que a referida impossibilidade, decorrente do estado do arguido, não emirja do elenco dos factos provados, conforme foi decidido no acórdão desta Relação de 05-06-2017 [3], proferido num caso semelhante ao agora em análise, “as circunstâncias de onde decorre a validade de um meio de prova, se bem que tenham que emanar dos autos, não têm que ser alegadas na acusação nem de constar do elenco dos factos que, a final, são dados como provados e não provados na sentença”.

A questão suscitada pelo recorrente saber se a colheita de sangue a que foi submetido constitui um método proibido de prova, nos termos do art. 32º, n.º 8, da Constituição e do art. 126º do Código de Processo Penal, por não a ter consentido nem ter tido a possibilidade de a recusar, tratando-se de um ato que viola a sua integridade física e moral e que tem como objetivo uma possível incriminação – tem sido objeto de decisão pelos tribunais superiores no sentido da legalidade desse meio de prova, como sucedeu, nomeadamente, no mencionado acórdão desta Relação, onde foi entendido que “o exame de sangue é a via excecional de recolha de prova admitida na lei para deteção de álcool, apenas admissível em casos expressamente tipificados, designadamente quando o estado de saúde não permite o exame por ar expirado ou esse exame não for possível” e que “em momento algum a lei impõe ou exige o consentimento expresso do visado para a recolha de sangue para posterior exame de diagnóstico do estado de influenciado pelo álcool, pelo que, nesta matéria, se encontram apenas excluídos os exames coercivos, aos quais o titular do interesse manifestou oposição, através de recusa em sujeitar-se ao exame” [4].

Com pertinência para a questão sub judice, na vertente da ofensa à integridade física e moral do examinando, o Tribunal Constitucional, no seu acórdão n.º 397/2014 [5], considerou que «(…) o disposto no artigo 25.º, n.º 1, da Constituição, corolário do reconhecimento da dignidade da pessoa humana (artigo 1.º da Constituição), não implica que ao direito à integridade física seja reconhecida uma prevalência absoluta, imune a qualquer limitação, mas apenas uma “interdição absoluta das formas mais intensas da sua violação”, conforme resulta do seu n.º 2 (cf. PEDRO GARCIA MARQUES, in JORGE MIRANDA/RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2ª edição, 2010, pp. 553 e 554). Intensidade que não tem correspondência na colheita imposta de sangue prevista no n.º 8 do artigo 153.º do Código da Estrada, em que a interferência no corpo é muito reduzida – similar, por exemplo, a ações de vacinação que recaem sobre recém-nascidos -, relevando ainda a circunstância de ser realizada em ambiente hospitalar e por pessoal de saúde qualificado (artigo 4.º, n.ºs 2 e 3, do Regulamento n.º 18/2007, de 17 de maio)».

Também no acórdão n.º 418/2013 [6], proferido a propósito da norma paralela do art. 156º, n.º 2, do Código da Estrada, que impõe a recolha de sangue em caso de acidente, o Tribunal Constitucional, consignou o seguinte, transponível para o caso dos autos:

«(…) a recolha de amostra de sangue, envolvendo uma punção venosa e a subtração de material biológico que não seria naturalmente expelido pelo organismo, corresponde a uma interferência na integridade física de outrem. Porém, tendo em conta as características de tal intervenção - nomeadamente o facto de ser obrigatoriamente realizada em estabelecimento de saúde, com observância das leges artis médicas; o grau de afetação da integridade corporal envolvido, designadamente a duração, a dor ou incómodo infligido, bem como a reversibilidade da lesão, na perspetiva da facilidade de recuperação dos tecidos afetados e da sua (ir)relevância no contexto do funcionamento global do organismo - poderemos concluir que se traduz numa violação do direito à integridade física do visado de grau muito baixo. (…)

No tocante à integridade moral ou psíquica, enquanto bem jurídico relativo à autodeterminação e livre manifestação de vontade de cada pessoa, diremos que a ressonância que sobre a mesma se produz pela recolha de amostra de sangue, nas circunstâncias em análise, resulta não da direta violação da vontade do examinando - como sucederia, caso se admitisse a execução forçada da recolha, perante a recusa - mas da impossibilidade de considerar tal vontade, no sentido de executar a intervenção, apesar do estado do examinando não lhe permitir prestar ou recusar o consentimento.

Igualmente se pode considerar que o direito à reserva da vida privada, tutelado no artigo 26.º da CRP, é afetado pela recolha de amostra de sangue. Porém, o alcance intrusivo de tal intervenção é reduzido, tanto mais que envolve apenas a extração de uma amostra de um definido material biológico, com vista a uma informação muito circunscrita, destinada a fins legalmente fixados, sendo que a recolha se desenrola num espaço recatado - o estabelecimento hospitalar -, sendo realizada por profissionais de saúde sujeitos a segredo profissional.»

No que concerne à igualmente invocada violação do direito à não autoincriminação, refere-se no mesmo aresto que:

«O princípio nemo tenetur se ipsum accusare, não se encontrando expressa e diretamente consagrado no texto constitucional, constitui um corolário da tutela de valores ou direitos fundamentais, com direta consagração constitucional, que a doutrina vem referindo como correspondendo à dignidade humana, à liberdade de ação e à presunção de inocência.

Encontra-se sobretudo associado ao direito ao silêncio, ou seja, à faculdade de o arguido não prestar declarações autoincriminatórias, nomeadamente não respondendo a questões sobre os factos que lhe são imputados e cuja prova pode importar a sua responsabilização e sancionamento. Protege igualmente o arguido contra o exercício impróprio de poderes coercivos tendentes a obter a sua colaboração forçada na autoincriminação, nomeadamente mediante a utilização de meios enganosos ou coação (cf. M. Costa Andrade, Sobre as proibições de prova em processo penal, Coimbra Editora, 1992, pp. 120 e ss.).
A jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem considerado que o direito à não autoincriminação não se estende à utilização, num processo criminal, de meios de prova que possam ser obtidos do arguido e que existam independentemente da sua vontade, por exemplo, recolha de amostras de sangue (cf. caso Saunders v. Reino Unido, decisão de 17 de dezembro de 1996).

Assim, (…) a recolha de amostra de sangue, para deteção do grau de alcoolemia, em condutor incapaz de prestar ou recusar o seu consentimento, não implica uma violação do direito à não autoincriminação, sendo que tal recolha constitui a «base para uma mera perícia de resultado incerto», não contendo qualquer declaração ou comportamento ativo do examinando no sentido de assumir factos conducentes à sua responsabilização.»

Por fim, questionando se a aludida interferência no direito à integridade pessoal (nas componentes de direito à integridade física e à autodeterminação) e no direito à reserva da vida privada do examinando, é justificada pela proteção de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, refere-se ainda no mesmo acórdão que:

«A circulação rodoviária, constituindo uma atividade de manifesta utilidade social, acarreta riscos consideráveis de lesão de bens jurídicos fundamentais como a vida, a integridade pessoal, a propriedade privada.
Atendendo à elevada sinistralidade das nossas estradas e a preponderância de circunstâncias atinentes ao condutor como fatores causais de acidentes, tornou-se imperioso garantir a adoção de especiais medidas legislativas destinadas a garantir a segurança rodoviária, nomeadamente através da imposição da abstenção de conduzir a indivíduos que se encontrem em condições psicomotoras suscetíveis de propiciar um aumento do risco de produção de acidentes.

Sendo conhecida a interferência do consumo de álcool no comportamento dos condutores - designadamente quanto ao processamento e interpretação de estímulos exteriores, bem como quanto ao tempo e qualidade da reação aos mesmos - o legislador intensificou a tutela dos bens jurídicos afetados pelo incremento do risco resultante da condução sob influência de tal substância.

Neste contexto, no âmbito da tutela penal, antecipou a proteção do bem jurídico segurança rodoviária - e, reflexamente, a tutela da vida e integridade pessoal, bem como do direito à propriedade privada - a um momento prévio à produção do resultado de dano ou de perigo, consagrando um tipo legal de perigo abstrato, no artigo 292.º do Código Penal (condução de veículo em estado de embriaguez). (…)

Acontece que, correspondendo a proteção dos direitos fundamentais a uma exigência positiva de atuação dos poderes públicos, consubstanciada na garantia de efetiva tutela material de tais direitos, nomeadamente tutela penal (cf. J. Miranda e R. Medeiros, op. cit., p. 557), a criação de tipos legais incriminatórios não pode deixar de ser acompanhada de meios legais que permitam tornar exequível e operante a produção de prova dos factos respetivos e o seu consequente sancionamento, sob pena de ficar prejudicada a satisfação das necessidades de proteção dos bens jurídicos tutelados e as restantes finalidades de prevenção das penas.

No caso da condução em estado de embriaguez - que pressupõe uma exata quantificação da taxa de alcoolemia, apenas aferível com recurso a meios técnicos legalmente definidos e num período de tempo muito limitado (tratando-se de informação perecível) - a eventual proibição da recolha de amostra de sangue, em condutores incapazes de prestarem ou recusarem o seu consentimento, corresponderia à impossibilidade de produção de prova relativa aos elementos objetivos do tipo legal e, em consequência, à impunidade dos eventuais crimes praticados por tais condutores. Aliás, tal proibição poderia conduzir ao perverso resultado de os condutores com mais elevada taxa de álcool no sangue, cuja incapacidade de prestar ou recusar o consentimento à recolha da amostra de sangue esteja mais ligada à presença de tal substância no organismo do que às consequências do acidente - maxime, os que chegam ao estabelecimento hospitalar em situação próxima do estado de coma alcoólico - não serem responsabilizados pela prática do crime previsto no artigo 292.º do Código Penal.»

Em suma, na linha desta jurisprudência do Tribunal Constitucional, a admissibilidade da colheita de amostra de sangue, para exame do estado de influenciado pelo álcool, não comporta, por si, um juízo de desconformidade constitucional, pois a Constituição autoriza, atendendo às finalidades em causa, e respeitadas as demais exigências constitucionais, a restrição dos direitos fundamentais à integridade pessoal, à reserva da vida privada ou à autodeterminação informativa.

Posto isto, é de concluir que, nas específicas circunstâncias do caso em análise, em que o estado físico do arguido, fruto do seu acentuado estado de embriaguez, não lhe permitia realizar o teste no ar expirado nem prestar ou recusar o seu consentimento à recolha de sangue, esta diligência de prova, destinada a quantificar a sua taxa de alcoolemia, apesar de contender com o direito à integridade pessoal e o direito à reserva da vida privada do examinando, não comporta um juízo de desconformidade constitucional.

Com efeito, a intervenção em análise é obrigatoriamente realizada em estabelecimento de saúde, com observância das leges artis médicas, envolve um grau de afetação da integridade corporal muito baixo, tem um alcance intrusivo reduzido e não envolve uma direta violação da vontade do examinando, mas sim uma impossibilidade de consideração da mesma - dada a circunstância de o examinando não estar em condições de prestar ou recusar o consentimento - correspondendo, assim, a uma forma menos grave de interferência no direito à autodeterminação.

Trata-se, pois, de uma restrição adequada, por corresponder ao meio idóneo à prossecução do objetivo de proteção dos direitos fundamentais em análise, necessária, por corresponder ao único meio, face ao caráter perecível da prova, que ainda permite a satisfação da pretensão punitiva do Estado, e proporcional, por ser equilibrada e correspondente à justa medida imposta pela proteção dos direitos que cumpre acautelar.

Conclui-se, assim, que a recolha de amostra de sangue efetuada ao arguido, destinada ao apuramento do estado de influenciado pelo álcool no exercício da condução, constituiu um meio de obtenção de prova legal, pelo que o tribunal a quo se socorreu de prova válida para dar como provada a taxa de álcool no sangue por ele apresentada, não tendo violado os preceitos legais e constitucionais invocados pelo mesmo.

Termos em que improcede este segmento do recurso.

3.2 - Da nulidade da sentença por falta de fundamentação

Nas conclusões 16ª a 22ª invoca o recorrente que a sentença recorrida padece de nulidade, por falta de fundamentação, traduzida na violação dos arts. 374º, n.º 2, e 379º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal, diploma a que pertencem os preceitos doravante citados sem qualquer referência.

Para tanto, alega que o tribunal a quo não justificou nem fundamentou por que razão considerou que "os depoimentos de M. N. e A. P. revelaram incongruências entre si e ainda em conjugação com as declarações do arguido ou de S. S." nem o porquê de não dar credibilidade aos depoimentos das testemunhas indicadas na contestação, principalmente do referido S. S., não tendo, pois, analisado criticamente as provas.

Vejamos se lhe assiste razão:

3.2.1 – De acordo com o disposto no n.º 1 do art. 205º da Constituição, “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.

Concretizando essa estatuição, o Código de Processo Penal, no n.º 5 do art. 97º, impõe que os atos decisórios dos juízes sejam sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão.

Especificamente quanto à sentença proferida em processo abreviado, como é o caso dos autos, necessariamente mais sucinta do que em processo comum, o art. 389º-A, n.º 1, aplicável por remissão do art. 391º-F, estabelece os respetivos requisitos, dispondo, nomeadamente e no que agora releva, que a mesma contém: "a) A indicação sumária dos factos provados e não provados, que pode ser feita por remissão para a acusação e contestação, com indicação e exame crítico sucintos das provas; b) A exposição concisa dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão; (…)".

O referido exame crítico «consiste na enunciação das razões de ciência reveladas ou extraídas das provas administradas, a razão de determinada opção relevante por um ou outro dos meios de prova, os motivos da credibilidade dos depoimentos, o valor de documentos e exames, que o tribunal privilegiou na formação da convicção, em ordem a que os destinatários (e um homem médio suposto pelo ordem jurídica, exterior ao processo, com a experiência razoável da vida e das coisas) fiquem cientes da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e das razões da sua convicção (…). O rigor e a suficiência do exame crítico têm de ser aferidos por critérios de razoabilidade, sendo fundamental que permita exteriorizar as razões da decisão e o processo lógico, racional e intelectual que lhe serviu de suporte» [7].

Para além de indicar os meios de prova utilizados, torna-se necessário explicitar o processo de formação da convicção do tribunal, a partir desses meios de prova, com apelo às regras de experiência e aos critérios lógicos e racionais que conduziram a que a convicção se formasse em determinado sentido. Só assim será possível comprovar se foi seguido um processo lógico e racional na apreciação da prova ou se esta se fundou num subjetivismo incomunicável que abre as portas ao arbítrio.

Mais concretamente, através do exame crítico das provas, o julgador enuncia as razões de ciência dos vários meios de prova, explicita a razão da opção por uma e não por outra das versões em confronto e indica os motivos da credibilidade que atribuiu a depoimentos, a documentos e a exames.

Por sua vez, os arts. 379º e 380º estabelecem as consequências da inobservância dos requisitos previstos no art. 374º: a nulidade ou a mera irregularidade da sentença, consoante os casos. De acordo com a al. a) do n.º 1 daquele primeiro preceito, é nula a sentença que não contiver, entre outras, as menções referidas no n.º 2 do art. 374º, acrescentando o seu n.º 2 que as nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso.

A propósito da exigência de fundamentação em análise, a doutrina vem entendendo que só a sua falta absoluta é que conduz à nulidade da decisão. A fundamentação insuficiente, deficiente ou não convincente não constitui nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso [8].

Também a jurisprudência se orienta no mesmo sentido, defendendo que só a falta absoluta de fundamentação, «por ausência total de explicação da razão por que se decide de determinada maneira» determina a nulidade do despacho/sentença. A «insuficiência ou a mediocridade da motivação [que] é espécie diferente [da falta absoluta de motivação] afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade» [9].

3.2.2 - No caso vertente, da motivação da decisão de facto elaborada pela Mmª. Juíza, atrás transcrita, resulta clara a explicitação do processo de formação da convicção que a levou a dar como provados os factos descritos na acusação, integrantes dos elementos típicos do crime de condução de veículo em estado de embriaguez.

Com efeito, não obstante aí constar que o arguido apenas admitiu ter ingerido um copo e meio de vinho verde, a Mmª. Juíza indicou e explicitou os motivos pelos quais se convenceu de que o mesmo ingeriu bebidas alcoólicas em maior quantidade, consonante com o resultado do teste de alcoolemia a que foi submetido. Desde logo pelo facto de o próprio arguido nem sequer se lembrar da quantidade de vinho que bebera no café, tendo sido o proprietário do estabelecimento que o informou sobre isso, o que, no entender da julgadora, claramente indicia que já estaria muito embriagado, bem como por não se recordar dos factos a partir do momento em que soprou no balão. Mais refere a Mm.ª Juíza que o arguido estava de tal modo embriagado que não era sempre percetível o seu discurso, não conseguiu travar o carro que conduzia nem sair do mesmo pelo seu pé e, já no hospital, teve de ser transportado numa cadeira de rodas e vomitou duas vezes, conforme foi relatado pela testemunha R. G., militar da GNR.

Nesse raciocínio, não olvidando a alegação do arguido de que teria ingerido bebidas alcoólicas após chegar a casa e antes de aí ser encontrado pelos militares da GNR que, depois o submeteram aos procedimentos de pesquisa de álcool no sangue, a Mmª. Juíza considerou essa versão completamente inverosímil e descabida, explicitando porquê. Designadamente por o arguido não ter logrado explicar o estado de nervosismo que invocou para justificar a ingestão de tão elevada quantidade de álcool: a reflexão sobre vários assuntos, como sejam a morte dos pais e de um irmão, ter recebido quarenta cartas das finanças por causa das portagens e um irmão ter ido para Inglaterra e ter ficado de comprar um terreno, o que não fez, sendo que, não obstante esses problemas, afirmou que não mais bebeu desde esse dia, afirmação esta causadora de estranheza, desde logo por se manterem aqueles problemas.

Ponderou ainda a Mmª. Juíza que apenas o arguido confirmou a ingestão de bebidas alcoólicas após a condução do veículo, não havendo qualquer outra prova a esse respeito, a não ser a referência a uma garrafa de whisky, alegadamente quase vazia, no seu escritório.

Por fim, consignou que os militares da GNR, ao afirmarem ter visto o arguido a conduzir quando chegaram a casa dele e ao descreverem situações concretas reveladores de que o mesmo estava embriagado, em coerência com o resultado do teste de alcoolemia, depuseram de modo muito espontâneo e desprendido, não conhecendo o arguido antes dos factos e nada os movendo contra ele.

Contrariamente ao sustentado pelo recorrente, a Mmª. Juíza justificou cabalmente por que razões considerou que os depoimentos das testemunhas M. N. (companheira do arguido) e A. P. (namorada do filho da mesma), revelaram incongruências entre si e ainda em conjugação com as declarações do arguido e com o depoimento da testemunha S. S..

Nomeadamente, um pouco antes dessa afirmação, pôs em evidência a contradição entre, por um lado, o depoimento da testemunha A. P. e, por outro o depoimento da testemunha M. N. e as declarações do arguido, quanto à ingestão por este de vinho às refeições e ao facto de o mesmo ter estacionado bem o veículo.

Por outro lado, salientou a discrepância verificada entre os depoimentos, por um lado, dessas duas testemunhas e, por outro lado, da testemunha S. S., quanto ao facto de estar alguém nas escadas ou na varanda da casa do arguido.

Também não se reconhece razão ao recorrente quando afirma que o tribunal a quo não justificou o porquê de não atribuir credibilidade aos depoimentos das testemunhas indicadas na contestação, principalmente ao depoimento da testemunha S. S..

Na verdade, a Mmª. Juíza, no confronto com os depoimentos muito espontâneos e desprendidos dos militares da GNR, salientou expressamente "que o aparecimento no processo da testemunha S. S. levanta sérias dúvidas sobre a sua isenção, sendo de estanhar a colocação do anúncio no jornal, até porque os factos não ocorreram nas traseiras do Pingo Doce" e que a testemunha M. N., companheira do arguido, prestou "declarações de modo muito nervoso, dizendo inclusivamente que não se lembrava da sua morada porque residia lá há pouco tempo, não obstante habite nesse local há dois anos …".

Assim, para além da enumeração especificada dos factos provados e não provados, a sentença recorrida contém a indicação das provas que serviram para fundar a convicção do tribunal, sobretudo os depoimentos das testemunhas R. G. e J. M., militares da GNR, conjugados com o depoimento, isento e desprendido, da testemunha M. S., que presenciou o arguido embater com o carro que conduzia num outro veículo e a ausentar-se de imediato do local, bem como, ainda, a explicação da relevância probatória atribuída a esses meios de prova e das razões da sua credibilização, permitindo, sem qualquer dificuldade, a total e efetiva compreensão do raciocínio lógico que conduziu à decisão de facto.

Mostra-se, portanto, feita a análise crítica das provas fundamentadoras da convicção do tribunal.

Pode-se discordar, como faz o recorrente, da valoração feita pelo tribunal relativamente aos meios de prova produzidos sobre a factualidade em apreço. Mas esta divergência de perspetivas não significa, de modo algum, a verificação da nulidade da sentença por falta ou até deficiente fundamentação, prendendo-se antes com a impugnação da decisão sobre a matéria de facto nos termos do art. 412º, n.ºs 3 e 4, da qual o recorrente também lançou mão.

Em suma, a sentença recorrida cumpre as exigências do art. 389º-A, n.º 1, al. a), não enfermando da nulidade prevista na al. a) do nº 1 do art. 379º, assim improcedendo este segmento do recurso.

3.3 - Do erro de julgamento

Em sede de recurso sobre a matéria de facto, sustenta o recorrente (conclusões 23ª a 69ª) que o tribunal a quo não apreciou corretamente a prova produzida em audiência, impondo-se decisão diversa quanto a determinados factos considerados como provados, que deverão ser dados como não provados.

3.3.1 – Nos termos do art. 428º, os tribunais da relação conhecem não só de direito mas também de facto, assim se concretizando a garantia do duplo grau de jurisdição na matéria de facto, sendo que uma das vertentes aqui admitida é a da impugnação ampla, visando o chamado erro de julgamento.

Este erro resulta da forma como foi valorada a prova produzida e ocorre quando o tribunal considere provado um determinado facto, sem que dele tenha sido feita prova, pelo que deveria ter sido considerado não provado, ou quando dá como não provado um facto que, face à prova que foi produzida, deveria ter sido considerado provado. O erro de julgamento pressupõe que a prova produzida, analisada e valorada não podia conduzir à fixação da matéria de facto provada e não provada nos termos em que o foi.

Nesta forma de impugnação ampla, os poderes de cognição do tribunal de recurso não se restringem ao texto da decisão recorrida (como acontece com os vícios previstos no art. 410º, n.º 2), alargando-se à apreciação do que contém e se pode extrair da prova documentada e produzida em audiência, nomeadamente pela audição da prova gravada pelo tribunal de recurso, sempre delimitada pelo recorrente através do ónus de especificação previsto nos n.ºs 3 e 4 do art. 412º, tendo em vista o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento e visando a modificação da matéria de facto, nos termos do art. 431º, al. b).

Todavia, conforme jurisprudência constante [10], esse recurso sobre a matéria de facto não visa a realização de um segundo e novo julgamento, com base na audição de gravações e na apreciação total do acervo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, como se esta não existisse, destinando-se antes a obviar a eventuais erros ou incorreções da mesma, na forma como apreciou a prova, quanto aos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente.

Ao apreciar-se o processo de formação da convicção do julgador, importa ter presente que entre nós vigora o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no art. 127º, segundo o qual “salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”.

Tal não significa que a atividade de valoração da prova seja arbitrária, pois está vinculada à busca da verdade, sendo limitada pelas regras da experiência comum e por algumas restrições legais.
Concedendo esse princípio uma margem de discricionariedade na formação do seu juízo de valoração, o julgador deverá ser capaz de o fundamentar de modo lógico e racional.

A livre apreciação da prova (ou do livre convencimento motivado) não se pode confundir com a íntima convicção do juiz, assente numa apreciação arbitrária dos meios de prova, impondo-lhe a lei que extraia deles um convencimento lógico e motivado, avaliando-os com sentido de responsabilidade e bom senso.

Mais se exige que o julgador indique os fundamentos que foram decisivos para a formação da sua convicção, ou seja, os meios concretos de prova e as razões ou motivos pelos quais relevaram ou obtiveram credibilidade no seu espírito. Não basta indicar o concreto meio de prova gerador do convencimento, urgindo expressar a razão pela qual, apoiando-se nas regras de experiência comum, o julgador adquiriu, de forma não temerária, a convicção sobre a realidade de um determinado facto.

Embora a reapreciação da matéria de facto esteja igualmente subordinada ao princípio da livre apreciação da prova e sem limitações (à exceção da prova vinculada), no processo de formação da sua convicção, deverá o tribunal da relação ter em conta que a ausência de imediação determina que o tribunal superior, no recurso da matéria de facto, só possa alterar o decidido pela primeira instância se as provas indicadas pelo recorrente impuserem decisão diversa da proferida (cf. art. 412º, n.º 3, al. b)).

Significa isto que se a decisão factual da primeira instância se baseia numa livre convicção objetivada numa fundamentação compreensível, optando por uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, a fonte de tal convicção, obtida com os benefícios da imediação, apenas pode ser afastada se ficar demonstrado ser inadmissível a sua utilização, pelas mesmas regras da lógica e da experiência comum.

A imediação, que se traduz no contacto pessoal entre o juiz e os diversos meios de prova, podendo também ser definida como “a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes no processo, de modo tal que aquele possa obter uma perceção própria do material que haverá que ter como base da sua decisão” [11], confere ao julgador em primeira instância certos meios de apreciação da prova pessoal de que o tribunal da relação não dispõe.

Para além da comunicação verbal, que é suscetível de ser escrutinada pelo tribunal de recurso mediante a audição das gravações, o julgador, para a complementar e interpretar, também deve atender à comunicação não verbal, a qual, porém, já não lhe é acessível.

Não basta, pois, que no recurso sobre a matéria de facto, o recorrente pretenda fazer uma revisão da convicção alcançada pelo tribunal recorrido por via de argumentos que permitam concluir que uma outra convicção era possível, sendo imperioso demonstrar que as provas indicadas a impõem. É necessária a demonstração que a convicção obtida pelo tribunal recorrido é uma impossibilidade lógica, uma impossibilidade probatória, uma violação de regras de experiência comum, uma patentemente errada utilização de presunções naturais, ou seja, que se demonstre não só a possível incorreção decisória, mas a imperatividade de uma diferente convicção.

Na realidade, ao tribunal de recurso cabe, sem esquecer a apontada limitação, analisar o processo de formação da convicção do julgador do tribunal a quo, verificando se os juízos de racionalidade, de experiência e de lógica confirmam ou não o raciocínio e a avaliação feita em primeira instância sobre o material probatório constante dos autos e os factos cuja veracidade cumpria demonstrar, não bastando, para uma eventual alteração, uma diferente convicção ou avaliação do recorrente quanto à prova testemunhal produzida.

Por isso, a decisão recorrida só é de alterar quando for evidente que as provas não conduzem a ela, já não o devendo ser quando, perante duas versões, o juiz optou por uma, fundamentando-a devida e racionalmente. Ou seja, o tribunal da relação só pode e deve determinar uma modificação da matéria de facto quando concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitem uma outra decisão [12].

Como já referimos supra, o recurso da matéria de facto não tem por finalidade nem pode ser confundido com a realização de um segundo julgamento, visando antes uma reapreciação autónoma sobre a razoabilidade da decisão do tribunal a quo quanto aos pontos de facto que o recorrente especifique como incorretamente julgados, através da avaliação das provas que, em seu entender, imponham decisão diversa da recorrida.

Como é salientado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-01-2010 [13], «(…) o regime do recurso em matéria de facto, se não exige do tribunal de recurso uma avaliação global, impõe-lhe, todavia, como se referiu, que confronte o juízo sobre os factos do tribunal recorrido com a sua própria convicção determinada pela valoração autónoma das provas que o recorrente identifica nas conclusões da motivação.

A decisão do recurso sobre a matéria de facto exige que aprecie se, no caso concreto, a matéria de facto, rectius, os pontos questionadas da matéria de facto, tem efetivo suporte, avaliando e comparando especificadamente os meios de prova indicados na decisão recorrida e os meios de prova indicados pelo recorrente e que este considera imporem «decisão diversa». (…)

Mas a convicção autónoma sobre o sentido da decisão em matéria de facto relativamente aos pontos questionados só poderá resultar da ponderação, em concreto, das provas identificadas pelo recorrente que o tribunal de recurso deve analisar em juízo e ponderação autónomos; as razões da convicção têm de ser as razões da convicção do próprio tribunal formadas perante os elementos de prova que ponderou nos limites do recurso, e não a assunção ou a recuperação genéricas da convicção ou dos termos da convicção do tribunal recorrido. (…)

Com efeito, a garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto tem como pressuposto que o princípio da livre apreciação da prova (e a livre convicção, no sentido materialmente adequado do conceito) não esteja deferido, ou seja passível de aplicação, apenas ao tribunal de 1ª instância, mas também à instância de recurso no limite dos poderes de cognição definidos pela delimitação do recorrente.

A livre convicção do tribunal de recurso substitui-se, nos limites da cognição, à convicção do tribunal recorrido, aceitando-a na identidade de apreciação, ou sobrepondo-lhe, se for o caso, a sua própria convicção

Assim, deve o tribunal de recurso verificar se os pontos de facto questionados têm suporte na fundamentação da decisão recorrida, avaliando e comparando especificadamente os meios de prova nela indicados e os meios de prova apontados pelo recorrente e que este considera imporem decisão diversa, cabendo-lhe confrontar o juízo que sobre esses pontos foi realizado pelo tribunal a quo com a sua própria convicção, determinada por uma autónoma valoração probatória.

Daí a exigência feita nas als. a), b) e c) do n.º 3 do art. 412º, no sentido de o recorrente que pretenda impugnar amplamente a decisão sobre a matéria de facto ter de especificar, respetivamente, os concretos pontos da mesma que considera incorretamente julgados, as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida e, sendo caso disso, as que devem ser renovadas.

3.3.2 – No caso em apreço, cumprindo o ónus de especificação previsto nessas duas primeiras alíneas e no n.º 4 do mesmo artigo, o recorrente indica nas conclusões, conforme exige o art. 417º, n.º 3, quer os factos individualizados que considera terem sido incorretamente julgados (constantes dos pontos 1, 2, 3 e 9 da matéria de facto provada), quer as concretas provas que, em seu entender, impõem decisão diversa (as suas próprias declarações e os depoimentos das testemunhas arroladas na contestação), com explicitação do conteúdo específico desses meios de prova e das razões da imperatividade de decisão diferente da recorrida em relação a eles, fazendo-o por referência ao consignado em ata, nos termos do n.º 2 do art. 364º, mediante a indicação concreta das passagens em que funda a impugnação, por forma a que o tribunal de recurso proceda à sua audição, bem como de outras que considere relevantes para a descoberta da verdade e boa decisão da causa (art. 412º, n.º 6).

Posto isto, apreciemos a impugnação da matéria de facto.

Insurge-se o recorrente, em primeiro lugar, contra a decisão da Mm.ª Juíza em dar como provados os factos dos pontos 1, 2 e 3, alegando não ter havido sobre eles prova suficiente, pelo que deverão ser dados como não provados.

Tais pontos têm a seguinte redação:

«1- No dia 22.08.2017, pelas 15H30m, o arguido P. I., conduzia o veículo automóvel, ligeiro de passageiros, de marca “Mercedes Benz”, modelo “C220 CDI” de matrícula …-DC-…, no Parque de Estacionamento da (...), em Loureira, neste concelho de Vila Verde, com uma T.A.S. igual a 3,45 g/l.
2- O arguido P. I. sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas em quantidades suscetíveis de ultrapassar o limite legal de teor de álcool e ainda assim quis conduzir veículo automóvel, ligeiro de passageiros em causa, na via pública, com a mencionada taxa de álcool no sangue, apesar de saber que tal facto era proibido e punido por lei, mas apesar de o saber quis atuar da forma descrita, e conduzir o mesmo nas condições em que o fez.
3- O arguido P. I. agiu sempre livre, voluntária e conscientemente.»

Em causa está, pois, a factualidade integrante dos elementos objetivos e subjetivos do crime de condução em estado de embriaguez pelo qual o recorrente foi condenado.
Para demonstrar a imposição de uma decisão diversa quanto a tais factos, alega o recorrente que os mesmos foram por si negados, tendo apresentado uma outra versão dos acontecimentos, a refutar os depoimentos das testemunhas de acusação (militares da GNR R. G. e J. M.) e corroborada pelas testemunhas de defesa M. N., A. P., S. S. e M. P..

Efetivamente, de acordo com a versão por si apresentada em audiência de julgamento, o arguido negou que, anteriormente ao exercício da condução, tivesse ingerido álcool em quantidade suficiente para lhe provocar a taxa de alcoolemia detetada no exame ao sangue (3,45 g/l), tendo apenas bebido um copo e meio de vinho branco no café, atribuindo essa taxa de alcoolemia ao facto de, uma vez chegado a casa e antes de ser submetido à recolha de amostra sanguínea, ter bebido praticamente uma garrafa de whisky.

Porém, procedendo à audição integral das suas declarações, e não apenas do excerto por ele indicado, constata-se que, instado pela Mm.ª Juíza para explicar a razão da inusitada ingestão de tão considerável quantidade de álcool, o arguido invocou um estado de nervosismo que, claramente, não logrou explicar, concretamente invocando sucessivamente a morte dos pais e de um irmão, a receção de 40 cartas das Finanças por causa das portagens e o facto de um irmão ter ido para Inglaterra, ter ficado de comprar um terreno e não o ter feito. Explicação esta incompreensível, quando conjugada com a afirmação de que apenas costuma beber cerca de quatro vezes por ano e que não o voltou a fazer depois dos factos, dando, pois, a entender ser extremamente regrado na ingestão de bebidas alcoólicas.

Daí que se acompanhe a conclusão da Mm.ª Juíza no sentido de a versão dos factos apresentada pelo arguido ser completamente inverosímil e descabida, para mais produzida num contexto de declarações prestadas de modo confuso, atabalhoado, disperso e incongruente, como efetivamente se constata pela sua audição.

Com efeito, afronta as regras da experiência comum que, depois de ter chegado a casa e enquanto esteve na rua, durante cerca de uma hora, a tentar consertar a avaria que o seu veículo apresentava e, portanto, à partida abstraído das aludidas preocupações, o arguido tivesse, por várias vezes, ido ao interior da habitação, subindo e descendo as escadas (conforme referido pelas testemunha M. N., A. P. e S. S.), para beber praticamente uma garrafa de whisky.

Aliás, como a Mm.ª Juíza também evidencia, não foi produzida qualquer prova sobre essa ingestão, já que apenas a testemunha M. N., companheira do arguido, afirmou que posteriormente aos acontecimentos, viu uma garrafa de whisky no escritório, fazendo-o, porém, em termos contraditórios, começando por dizer que lhe faltava “um bocadinho de whisky” (cf. minuto 03:48 do seu depoimento) e, mais adiante, que estava “quase vazia”, acrescentando que desconhecia a quantidade de bebida que teria anteriormente, pois tinha-a visto pela última vez há alguns dias (cf. a partir do minuto 07:30).

Acresce o facto, invocado pelo arguido, de não se conseguir recordar da quantidade de vinho que ingeriu no café, tendo sido o dono deste que lhe terá dado essa informação, o que será indiciário de que, nesse momento, já se encontraria em acentuado estado de embriaguez, compatível com a elevada taxa de alcoolemia que veio a acusar, não sendo de acolher o argumento de que essa afetação da memória se ficou a dever à ingestão posterior de álcool por esta, geralmente, não retirar a recordação de acontecimentos anteriores.

O mesmo se refira relativamente ao facto de o arguido não se recordar de, ao sair do parque de estacionamento do café, ter embatido com a traseira do seu automóvel na parte lateral de um veículo aí estacionado, causando-lhe danos e ausentando-se do local, conforme foi relatado pela testemunha M. S., que se encontrava na esplanada e que apontou a matrícula da viatura do arguido, permitindo aos militares da GNR localizá-lo na sua habitação, situada nas proximidades.

Decisivos para a formação da convicção do tribunal a quo foram os depoimentos desses militares (testemunhas R. G. e J. M.) que, ao receberem do posto a comunicação sobre a ocorrência de um acidente com condutor em fuga, bem como a indicação da morada deste, obtida pela consulta do registo automóvel, deslocaram-se para essa residência e, aí chegados, viram o arguido a conduzir o veículo automóvel pelo meio da estrada e, quando se apercebeu da GNR, a imobilizar a viatura, dizendo às testemunhas que estava parado e que elas não o tinham visto a conduzir. Mais atestaram o estado de embriaguez que o mesmo evidenciava, em consonância com a elevada taxa de álcool no sangue que veio a acusar, dado que tinha um discurso em parte impercetível, não conseguiu travar o carro nem sair deste pelo seu próprio pé, não foi capaz de efetuar o teste de pesquisa no ar expirado, quase que adormecia no posto da GNR e, no hospital, teve que ser transportado em cadeira de rodas e vomitou por duas vezes.

Tal como foi a perceção da Mm.ª Juíza, também se nos afigurou que estas testemunhas depuseram de modo espontâneo e desprendido, tanto mais que nem sequer não conheciam o arguido.

Para pôr em causa esses depoimentos, na parte em que as testemunhas afirmaram ter visto o arguido a conduzir, este arrolou as testemunhas M. N. (sua companheira), A. P. (namorada do filho daquela), S. S. (que se encontrava no interior do seu veículo, aparcado no parque de estacionamento do Pingo Doce, situado próximo) e M. P. (moradora nas proximidades e que, no circunstancialismo em apreço, se deslocou a esse estabelecimento comercial).

Em relação a esta última, que o tribunal a quo considerou não ter revelado interesse para a matéria em discussão, alega o recorrente não compreender porque não foi levada em consideração, uma vez que presenciou a chegada do arguido.

Porém, da audição desse depoimento resulta que a testemunha, ao deslocar-se para o Pingo Doce, terá visto o arguido a chegar e a estacionar o veículo na rua, em frente à respetiva residência, sendo que, volvida cerca de uma hora, ao regressar a casa, já viu no local a GNR. Ora, não tendo a testemunha presenciado a chegada dos militares e não sendo de excluir a hipótese de o arguido, depois daquele primeiro momento, ter voltado a sair com o carro, o depoimento da testemunha não é suscetível de infirmar as declarações dos militares, donde se compreende que o tribunal a quo não lhe tenha atribuído relevância.

Por seu lado, as demais testemunhas indicadas pelo recorrente afirmaram efetivamente que quando os militares da GNR chegaram a casa do arguido, já este aí se encontrava há cerca de uma hora, na rua, em volta do seu automóvel, estacionado, pelo que aqueles não o viram a conduzir.

Porém, da audição do respetivo depoimento, nota-se que, tal como percecionou a Mm.ª Juíza, a testemunha M. N., companheira do arguido, depôs com nervosismo e hesitações, nomeadamente quanto instada a localizar temporalmente os problemas de alcoolismo daquele, não sendo merecedora de credibilidade, sobretudo ao afirmar que o mesmo se encontrava bem, contrariando frontalmente a descrição feita pelos militares da GNR e as regras da experiência comum, face ao elevado estado de embriaguez do arguido, comprovado pelo resultado do exame toxicológico.

O que acaba de se referir é extensível aos depoimentos da testemunha A. P., ao afirmar que o arguido não parecia estar embriagado, e da testemunha S. S., segundo o qual o arguido andava normalmente a subir e a descer as escadas, ou seja, aparentando um estado e tendo um comportamento não compatíveis com o incide de alcoolemia que comprovadamente apresentava e contrários aquilo que, instantes depois, foi observado pelos militares da GNR.

Note-se também a discrepância entre as declarações do arguido e da sua companheira, por um lado, ao afirmarem que ele muito raramente ingere bebidas alcoólicas, e, por outro lado, o depoimento da testemunha A. P., que afirmou que o arguido bebe vinho tinto às refeições.

A propósito da consideração tecida pela Mmª. Juíza na motivação da decisão de facto, ao consignar que o aparecimento da testemunha S. S. no processo lhe levanta sérias dúvidas sobre a sua isenção, por ser de estranhar a colocação de um anúncio no jornal, alega o recorrente que não compreende esta estranheza.

Porém, ainda que não seja inusual o recurso a esse tipo de procedimento com vista a tentar identificar testemunhas presenciais de certos acontecimentos, sobretudo acidentes de viação, no caso vertente não deixa de ser curioso que a testemunha S. S. tenha lido o anúncio em apreço, publicado no jornal cujo exemplar foi junto em audiência de julgamento, desde logo pela pequeníssima dimensão da publicação, mas também pelo decurso do tempo decorrido desde os factos (cerca de quatro meses) e pela normal dificuldade em os identificar, em face dos parcos elementos fornecidos (matrícula, marca e cor do veiculo), uma vez que segundo o depoimento da própria testemunha, encontrava-se a alguma distância do local onde os mesmos ocorreram.

Ainda que essa constatação possa não ser decisiva, não deixa de constituir um elemento suscetível de contribuir para afetar a credibilidade do depoimento da testemunha, sobretudo no confronto com os depoimentos opostos dos militares da GNR, merecedores de toda a credibilidade.

Invoca também o recorrente a existência de uma discrepância entre estes últimos depoimentos, alegando que a testemunha R. G. afirmou ter visto o veículo do arguido a circular durante cerca de 5 metros, ao passo que o militar J. M. terá aludido a cerca de 100 metros.

Todavia, da audição integral deste último depoimento, constata-se que, expressamente questionada sobre esse facto, a testemunha, a partir dos minutos 05:04 e 07:38, esclareceu que 100 metros é a distância entre a entrada do Pingo Doce e a casa do arguido, tendo visto este último a conduzir num trajeto bastante curto.

O recorrente chama também à colação a incongruência entre a hora indicada no auto de notícia e na participação de fls. 4 e 6 como sendo a do acidente (16h e 30m) e a hora registada no impresso de fls. 13 como aquela em que não foi possível obter o resultado no teste de ar expirado (15h e 45m) e que, necessariamente, teria de ser posterior àquela outra.

Todavia, o militar da GNR que elaborou tais documentos (testemunha R. G.), confrontado com essa discrepância, prontamente e em termos perfeitamente credíveis, esclareceu e assumiu ter havido um lapso da sua parte, retificando que o acidente terá ocorrido por volta das 15h e 45m e a impossibilidade de realização do teste registada às 16h e 45m (cf. depoimento a partir do minuto 07:39).

De tudo quanto vem de se expor decorre que o recorrente não logrou de modo algum demonstrar a imposição de uma decisão diversa quanto aos factos por si impugnados e agora em análise, sendo, ao invés disso, os mesmos perfeitamente sustentados pelos depoimentos isentos, imparciais, desprendidos e coerentes dos militares da GNR, que não foram suficientemente infirmados pelos depoimentos das testemunhas de defesa, prestados por pessoas, relativamente às quais, pelas relações próximas com o arguido ou pela forma como surgiram no processo e prestaram declarações, existem razões para duvidar da respetiva credibilidade.

Assim se compreende perfeitamente que a Mmª. Juíza tenha optado por valorar os depoimentos dos referidos militares da GNR, em detrimento das testemunhas arroladas pelo arguido e das declarações deste último que, aliás, brigam com as regras da experiência comum, pelas razões supra expostas.

3.3.3 – Daí que também não tenha cabimento a igualmente invocada violação do princípio in dubio pro reo.

Tal princípio tem aplicação no domínio probatório, consequentemente no domínio da decisão de facto, e significa que, em caso de falta de prova sobre um facto, a dúvida se resolve a favor do arguido. Ou seja, será dado como não provado se lhe for desfavorável, mas por provado se justificar o facto ou for excludente da culpa.

Contudo, para tanto não basta dar relevância às dúvidas que as partes encontram na decisão ou que derivem da sua interpretação da factualidade revelada nos autos. Acresce que não é toda a dúvida que justifica a absolvição com base neste princípio, mas apenas aquela em que for inultrapassável, séria e razoável a reserva intelectual à afirmação de um facto que constitui elemento de um tipo de crime ou com ele relacionado, deduzido da prova globalmente considerada. A própria dúvida está sujeita a controlo, devendo revelar-se conforme à razão ou racionalmente sindicável, pelo que, não se mostrando racional, tal dúvida não legitima a aplicação do citado princípio [14].

A dúvida razoável, que determina a impossibilidade de convicção do tribunal sobre a realidade de um facto, distingue-se da dúvida ligeira, meramente possível, hipotética. Terá de ser uma dúvida séria, positiva, racional e que ilida a certeza contrária. Por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a íntima convicção do tribunal, que seja argumentada e coerente.

Em suma, o princípio in dubio pro reo constitui uma imposição dirigida ao juiz, no sentido de se pronunciar de forma favorável ao arguido quando não houver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa.

No âmbito dos seus poderes de cognição sobre a matéria de facto, compete ao tribunal da relação sindicar a concreta utilização do princípio in dubio pro reo por parte da primeira instância.

Com efeito, a violação desse princípio pode resultar da análise do texto da própria decisão recorrida e do processo decisório nela evidenciado, ocorrendo quando se concluir que o tribunal recorrido ficou em dúvida quanto a elementos que permitem estabelecer o grau de culpabilidade do arguido e, nesse estado de dúvida, decidiu contra ele, o que não sucede no caso vertente, uma vez que a motivação da decisão de facto é clara em arredar a existência de qualquer dúvida sobre a participação do arguido nos factos.

Para além dessa situação, de verificação pouco frequente, a imputação da violação do princípio in dubio pro reo torna necessário demonstrar a existência de erro na apreciação dos meios probatórios produzidos, através do reexame dos mesmos, com vista a evidenciar que, em face da carência ou insuficiência da prova, o tribunal deveria ter ficado em estado de dúvida quanto a factos relevantes para a responsabilidade criminal do arguido.

No caso vertente, o recorrente faz assentar a violação desse princípio na alegada insuficiência da prova produzida em audiência, para considerar como provado que a elevada taxa de álcool no sangue que apresentava foi provocada pela ingestão de bebidas alcoólicas anteriormente ao exercício da condução, facto esse que esteve na base da sua condenação pelo crime de condução em estado de embriaguez.

Porém, pelas razões supra expostas, é de concluir pela inteira correção do juízo probatório efetuado pelo tribunal a quo sobre tais factos, o que, no âmbito da reapreciação da prova, afasta a conclusão de que a Mm.ª Juíza deveria ter ficado em estado de dúvida sobre os mesmos, não se mostrando violado o princípio in dubio pro reo.

3.3.4 – No que respeita à demais factualidade impugnada pelo recorrente, sustenta este ter ainda sido incorretamente julgado o facto vertido no ponto 9 da matéria provada, donde consta que o arguido «tem o 4º ano de escolaridade», uma vez que, atentas as suas próprias declarações, possui o 9º ano de escolaridade, conforme, aliás, foi dado como provado na parte final do ponto 10º.

Assiste-lhe efetivamente razão, porquanto, da audição das suas declarações retira-se que o mesmo, ao responder às perguntas sobre as respetivas condições socioculturais, afirmou ter concluído o 9º ano, declarações essas em que a Mmª. Juíza se estribou para dar como provados os factos atinentes às condições pessoais do arguido, conforme expressamente consignou na motivação da decisão de facto.

Existe, pois, uma contradição entre os pontos 9º e 10º, parte final, dos factos provados, a qual, todavia, não integra o vício decisório previsto no art. 410º, n.º 2, al. b), na medida em que, por via da impugnação ampla da matéria de facto agora em apreço, é a mesma sanável, com a consequente eliminação daquele ponto 9º, cuja inclusão no elenco da matéria provada se terá ficado a dever, ao que tudo indica, a mero lapso.

Em face de tudo quanto fica exposto, conclui-se que, com exceção do facto dado como provado no ponto 9º, quanto à demais factualidade impugnada pelo recorrente, o tribunal a quo, norteando-se pelo princípio da livre apreciação da prova e pelas regras da experiência comum, e podendo contar ainda com os indiscutíveis benefícios derivados da imediação, procedeu a uma avaliação global da prova produzida, nada havendo a censurar no processo lógico e racional subjacente à formação da sua convicção, o qual se mostra explicitado em termos perfeitamente percetíveis e assimiláveis, não se evidenciando qualquer afrontamento às regras da experiência comum, ou qualquer apreciação manifestamente incorreta, desadequada, fundada em juízos ilógicos ou arbitrários, de todo insustentáveis, pelo que nenhuma censura pode merecer o juízo valorativo acolhido em primeira instância, subtraído a qualquer dúvida, inexistindo motivos para reconhecer razão ao recorrente quando invoca também a violação do princípio in dubio pro reo, não tendo, assim, logrado demonstrar a existência de provas que imponham uma decisão diferente daquela que foi proferida.

Procede, assim, parcialmente a questão da impugnação ampla da matéria de facto, com a consequente eliminação do ponto 9º da matéria provada, por estar em contradição com o facto descrito na parte final do ponto 10º, este último com apoio da prova produzida, no mais se mantendo inalterada a decisão sobre a matéria de facto, assim improcedendo a pretensão de absolvição do arguido com fundamento nessa almejada alteração.

3.4 - Da medida da pena

Nas conclusões 70ª a 74ª e 77ª a 79ª, insurge-se também o recorrente contra a medida concreta da pena que lhe foi aplicada (seis meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano), alegando que o tribunal a quo não teve devidamente em conta a sua situação socioeconómica, porquanto, ponderando que está inserido no meio familiar, vivendo com a companheira, integrado socialmente, que tem bom comportamento e que, embora padecesse à data dos factos de problemas de consumo excessivo de álcool, está abstinente desde 29 de agosto de 2017, conforme declaração médica junta aos autos, e tendo ainda em conta as considerações de prevenção especial e geral, a pena justa, proporcional e adequada é de a de 3 meses de prisão.

Vejamos se tem razão nessa crítica que direciona à sentença recorrida.

3.4.1 - De acordo com o disposto no art. 40º, n.º 1, do Código Penal, a aplicação de penas e de medidas de segurança, tem como finalidade “a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”, acrescentando o n.º 2 que “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.

A proteção de bens jurídicos consubstancia-se na denominada prevenção geral, enquanto a reintegração do agente na sociedade, ou seja, o seu retorno ao tecido social lesado, se reporta à denominada prevenção especial. A culpa consiste num juízo de censura dirigido ao arguido em virtude de uma conduta desvaliosa, porquanto, podendo e devendo agir conforme o direito, não o fez.

Em consonância com estes princípios dispõe o art. 71º, n.º 1, do mesmo código que “a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”.

De acordo com os ensinamentos de Anabela Miranda Rodrigues [15], a medida da pena há de ser encontrada dentro de uma moldura de prevenção geral positiva e definida e concretamente estabelecida em função de exigências de prevenção especial, nomeadamente de prevenção especial positiva ou de socialização; a pena, por outro lado, não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa. Mais adianta que é o próprio conceito de prevenção geral de que se parte – proteção de bens jurídicos alcançada mediante a tutela das expectativas comunitárias na manutenção (e no reforço) da validade da norma jurídica violada - que justifica que se fale de uma moldura de prevenção. Proporcional à gravidade do facto ilícito, a prevenção não pode ser alcançada numa medida exata, uma vez que a gravidade do facto ilícito é aferida em função do abalo daquelas expectativas sentido pela comunidade. A satisfação das exigências de prevenção terá certamente um limite definido pela medida da pena que a comunidade entende necessária à tutela das suas expectativas na validade das normas jurídicas: o limite máximo da pena. Que constituirá, do mesmo passo, o ponto ótimo de realização das necessidades preventivas da comunidade, que não pode ser excedido em nome de considerações de qualquer tipo, ainda quando se situe abaixo do limite máximo consentido pela culpa. Mas, abaixo daquela medida (ótima) de pena (da prevenção), outras haverá que a comunidade entende que são ainda suficientes para proteger as suas expectativas na validade das normas - até ao que considere que é o limite do necessário para assegurar a proteção dessas expectativas. Aqui residirá o limite mínimo da pena que visa assegurar a finalidade de prevenção geral.

A mesma autora apresenta, então, três proposições em jeito de conclusões e de forma sintética: “Em primeiro lugar, a medida da pena é fornecida pela medida de necessidade de tutela de bens jurídicos, isto é, pelas exigências de prevenção geral positiva (moldura de prevenção). Depois, no âmbito desta moldura, a medida concreta da pena é encontrada em função das necessidades de prevenção especial de socialização do agente ou, sendo estas inexistentes, das necessidades de intimidação e de segurança individuais. Finalmente, a culpa não fornece a medida da pena, mas indica o limite máximo da pena que em caso algum pode ser ultrapassado em nome de exigências preventivas”.

Em suma, o limite mínimo da pena deve corresponder às exigências e necessidades de prevenção geral que no caso se façam sentir, de modo a que a sociedade continue a acreditar na validade da norma punitiva, ao passo que o limite máximo não deve exceder a medida da culpa do agente revelada no facto, sob pena de degradar a condição e dignidade humana do mesmo; e, dentro desses limites mínimo e máximo, a pena deve ser individualizada no quantum necessário e suficiente para assegurar a reintegração do agente na sociedade, com respeito pelo mínimo ético a todos exigível, sendo, pois, as razões de prevenção especial que servem para encontrar o quantum de pena a aplicar [16].

Por seu lado, as várias alíneas do n.º 2 do art. 71º do Código Penal elencam, a título exemplificativo, as seguintes circunstâncias, agravantes e atenuantes, a atender na determinação concreta da pena, devendo o tribunal abster-se de considerar aquelas que já fazem parte do tipo de crime cometido:

- O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente (al. a);
- A intensidade do dolo ou da negligência (al. b);
- Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram (al. c);
- As condições pessoais do agente e a sua situação económica (al. d);
- A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime (al. e);
- A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena (al. f).

Assim, as circunstâncias e os critérios do art. 71º do Código Penal têm a função de fornecer ao juiz módulos de vinculação na escolha da medida da pena, devendo contribuir tanto para codeterminar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (por exemplo, a natureza e o grau de ilicitude do facto impõem maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afetação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento) ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objetivas para apreciar e avaliar a culpa do agente [17].

3.4.2 – Posto isto, analisemos a situação concreta.

O crime de condução em estado de embriaguez cometido pelo recorrente é punível com pena de prisão de 1 mês a 1 ano ou com pena de multa de 10 a 120 dias (arts. 41º, n.º 1, 47º, n.º 1 e 292º, n.º 1, todos do Código Penal).

O tribunal recorrido optou pela pena privativa da liberdade por ter constado que as necessidades de prevenção geral são elevadas, uma vez que se trata de um tipo de crime de verificação frequente e que são altas as necessidades de prevenção especial, dado que o arguido evidencia um total desrespeito pelo direito e uma completa indiferença pelas advertências que sucessivamente lhe foram feitas com as condenações anteriores pela prática de vários crimes e ainda que denota hábitos alcoólicos.

Não sendo posta em causa esta opção pela pena de prisão nem havendo razões para o fazer, atentas, sobretudo, as exigências de prevenção especial que se fazem sentir, cumpre então apreciar a medida concreta da mesma que foi determinada pelo tribunal a quo.

Não há dúvidas de que é suscetível de revista a correção do procedimento ou das operações de determinação da medida da pena, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de fatores relevantes para aquela determinação, ou, pelo contrário, a indicação de fatores que devem considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis. Estando a questão do limite da culpa plenamente sujeita a revista, assim como a forma de atuação dos fins das penas no quadro da prevenção, já não o está a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exato da pena, exceto quando tiverem sido violadas regras de experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada [18].

Assim, o tribunal de recurso deve intervir na pena, alterando-a, apenas quando detetar incorreções ou distorções no processo de aplicação da mesma, na interpretação e aplicação das normas legais e constitucionais que a regem. Nesta sede, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de atuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do ato de julgar.

A sindicabilidade da pena em via de recurso situa-se, pois, na deteção de um desrespeito dos princípios que norteiam a pena e das operações de determinação impostas por lei. E esta sindicância não abrange a determinação/fiscalização do quantum exato de pena que, decorrendo duma correta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionada [19].

A Mm.ª Juíza, na fundamentação da determinação da pena concreta fez consignar o seguinte (transcrição):

«Contra o arguido depõem as seguintes circunstâncias: o facto de ter atuado com dolo direto; a taxa de alcoolemia apresentada (das mais elevadas na comarca); as exigências muito elevadas de prevenção que se fazem sentir face ao flagelo da sinistralidade rodoviária; as condenações sofridas, indiciadoras de falta de preparação do arguido para manter uma conduta conforme ao direito, voltando a praticar atos ilícitos pelos quais inclusivamente já havia sofrido condenação.
Será considerado como atenuante a sua inserção familiar.
Valorando e ponderando todos estes fatores, considerando ainda que o valor de alcoolemia apresentado se situa num nível muito alto atenta a moldura penal, considero justa e adequada a aplicação de uma pena de seis meses de prisão.»
Afigura-se-nos acertada a ponderação desses fatores feita pelo tribunal a quo, desde logo o crucial relevo atribuído às exigências de prevenção geral e especial.

Com efeito, a frequência com que são cometidos crimes de condução em estado de embriaguez, contribuindo para o índice de sinistralidade rodoviária que constitui um autêntico flagelo no nosso país, com importantes reflexos sociais, familiares e económicos, e a que urge por cobro de forma eficaz, faz elevar bastante o limite mínimo necessário para assegurar a proteção das expectativas na reposição da validade da norma violada.

Por seu turno, no plano das exigências de prevenção especial releva particularmente a circunstância de, à data dos factos, o arguido já ter sofrido quatro condenações, pela prática de um total de seis crimes, de variada natureza: condução em estado de embriaguez, descaminho (2), denúncia caluniosa, desobediência e injúria agravada.

Conquanto as três primeiras condenações tenham sido proferidas já nos anos de 2004 e 2009, reportando-se a crimes praticados entre os anos de 2003 e 2007, porém, a última delas teve lugar em 2016, pouco mais de um ano antes dos factos agora em apreço, e respeita a crimes relativamente recentes (2015), um deles de injúria agravada e o outro de desobediência, por recusa do arguido a efetuar o teste de alcoolemia ao sangue, depois de ter sido interveniente em acidente de viação, alegando em julgamento que tinha ingerido bebidas alcoólicas entre o momento do acidente e o momento em que foi abordado pelos militares da Guarda Nacional Republicana, factos estes com contornos semelhantes aos que estão em apreço nos autos.

Acresce que, para além de duas penas de multa, já foram aplicadas ao arguido uma pena de prisão, inicialmente substituída por trabalho a favor da comunidade e, posteriormente, suspensa na sua execução (pelos crimes de descaminho), bem como uma outra pena de prisão, primeiramente substituída por multa e depois por trabalho a favor da comunidade (precisamente naquela última condenação), conforme melhor resulta dos boletins do certificado de registo criminal juntos a fls. 64-vº, 65, 68 e 68º-vº, embora tais substituições não estejam devidamente mencionadas no elenco dos factos provados.

O arguido tem, assim, demonstrado que as anteriores punições, particularmente em duas penas de prisão, substituídas por multa e por prestação de trabalho a favor da comunidade, não se revelaram suficientes para o afastar da criminalidade, voltando a incorrer na prática de novo crime, por factos semelhantes aos que estiveram na base da última condenação (pelo crime de desobediência por recusa de submissão ao teste de pesquisa de álcool no sangue).

Acresce que os factos agora em apreço foram cometidos menos de seis meses após a extinção da pena aplicada nessa condenação (de prisão substituída primeiramente por multa e depois por trabalho a favor da comunidade), o que é por demais revelador da insensibilidade e indiferença perante o teor admonitório da mesma.

A extensão e relevância dos antecedentes criminais do arguido, muito para além do que já foi valorado na escolha da pena, contribui para acentuar fortemente as exigências de prevenção especial, o mesmo sucedendo com os problemas de alcoolismo que têm pautado o seu percurso de vida, pois já foi seguido em psiquiatria e efetuou tratamento numa instituição, conforme consta do ponto 10º dos factos provados.
Sustenta agora no recurso que, embora padecendo, à data dos factos, de problemas de consumo excessivo de álcool, contudo, está abstinente desde 29 de agosto de 2017, remetendo para a declaração médica junta em audiência de julgamento.

Para além dessa alegada abstinência não ter respaldo na matéria de facto provada, note-se que da referida declaração médica apenas consta o seguinte: «O doente acima referido esteve internado Casa Saúde S. João de Deus de 29/08 a 07/09/17, na última consulta em que esteve presente, 09/11/2017, refere manter-se abstinente de bebidas alcoólicas e cumprir medicação prescrita” (sublinhado nosso), o que não é apto a permitir a conclusão de que o arguido se mantém abstinente, uma vez que se limita a reproduzir uma declaração do próprio.

Contrariamente ao que o recorrente pretende fazer crer, os alegados bom comportamento e integração social são contrariados pela repetida e regular assunção de condutas contrárias às regras da vida em sociedade, particularmente o cometimento de crimes de condução sob o efeito do álcool (2), descaminho (2), denúncia caluniosa, injúria e desobediência por recusa a efetuar um teste de pesquisa de álcool no sangue no exercício da condução.

Por fim, a igualmente invocada inserção no seio familiar, traduzida em viver com a companheira, não é merecedora de um valor atenuante maior do que aquele que já lhe foi atribuído pelo tribunal a quo.

Saliente-se, ainda, o superior grau de ilicitude dos factos, atenta a elevadíssima taxa de alcoolemia apresentada pelo arguido (3,45 g/l), bem como a sua conduta posterior, destinada a obstaculizar à descoberta da verdade, invocando que a ingestão das bebidas alcoólicas que lhe provocou semelhante taxa ocorreu já depois da condução, o que é revelador de traços de personalidade que também acentuam as exigências de prevenção especial.

Não merece, pois, censura o elenco dos fatores e a ponderação que deles foi feita pelo tribunal a quo na determinação da medida da pena, não se descortinando circunstâncias, mormente as invocadas pelo recorrente, que imponham uma redução da mesma, de forma a facilitar a sua ressocialização.

Em suma, sopesando todas as apontadas circunstâncias atendíveis, concretamente as relevantes exigências de prevenção geral, que fazem elevar o limite mínimo necessário para assegurar a proteção das expectativas comunitárias, o acentuado grau de ilicitude, a intensidade da culpa e as fortes exigências de prevenção especial, afigura-se-nos que a medida concreta da pena encontrada, situada ligeiramente abaixo do meio da moldura abstrata, se apresenta como necessária para satisfazer as finalidades da punição, não excedendo o limite estabelecido pela medida da culpa, pelo que não se apresenta desproporcionada, expressando uma correta e adequada valoração dos fatores atendíveis.

Nessa perspetiva, uma pena inferior, mormente a propugnada pelo recorrente (3 meses de risão), apresentar-se-ia como inadequada e insuficiente para acautelar as necessidades preventivas, quer de prevenção especial, quer de prevenção geral.

Em conclusão, a decisão recorrida não violou os critérios de determinação da pena, enunciados nos invocados art.s 40º, n.ºs 1 e 2, e 71º do Código Penal, tendo igualmente sido respeitado o princípio da proporcionalidade na graduação da pena, ínsito no art. 18º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

Pelo exposto, improcede a questão em apreço.

3.5 – Da medida da pena acessória

A prática do crime de condução em estado de embriaguez, pelo qual o recorrente foi condenado, para além da pena principal (prisão ou multa), é ainda sancionada com proibição de conduzir veículos com motor por um período entre 3 meses e 3 anos, conforme dispõe o art. 69º, n.º 1, al. a), do Código Penal.

No caso vertente, o tribunal recorrido fixou essa pena acessória em 1 ano e 6 meses, quantitativo contra o qual se insurge o recorrente, reputando-o desproporcionado e pugnando pela sua redução para o período de 1 ano, invocando o mesmo conjunto de circunstâncias que invocou para obter a redução da pena de prisão (conclusões 70ª a 78ª).

3.5.1 – A referida sanção inibitória tem natureza de pena acessória, como resulta claramente do texto do citado artigo, da sua inserção sistemática e do elemento histórico [20], traduzindo-se numa censura adicional pelo crime praticado.

Correspondendo a uma manifesta necessidade de política criminal, que se prende com a elevada sinistralidade rodoviária, a aplicação de tal pena acessória visa dissuadir os condutores de ingerirem bebidas alcoólicas em quantidades que diminuem os reflexos e afetam a capacidade de reação e a destreza, indispensáveis ao exercício da condução em condições de segurança.

A propósito das suas finalidades, refere Figueiredo Dias [21] que, “se (…) pressuposto material de aplicação desta pena deve ser que o exercício da condução se tenha revelado, no caso, especialmente censurável, então essa circunstância vai elevar o limite da culpa do (ou pelo) facto. Por isso à proibição de conduzir deve também assinalar-se (e pedir-se) um efeito de prevenção geral de intimidação, que não terá em si nada de ilegítimo porque só pode funcionar dentro do limite da culpa (…). Por fim, mas não por último, deve esperar-se desta pena acessória que contribua, em medida significativa, para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano”.

A pena em apreço tem, assim, uma função preventiva adjuvante da pena principal, sendo a sua finalidade a intimidação da generalidade e dirigindo-se ainda à perigosidade do agente.

Embora distintas nos seus pressupostos, quer a pena principal quer a acessória assentam num juízo de censura global pelo crime praticado. Daí que para a determinação da medida concreta de uma e de outra se imponha o recurso aos critérios estabelecidos no art. 71º do Código Penal.

Como já referimos supra a propósito da determinação da pena principal, para onde remetemos para maiores desenvolvimentos, nos termos desse preceito, a determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo o tribunal a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo, depuserem a favor ou contra ele.

Quanto aos factos praticados, haverá que ter em consideração todas as circunstâncias que caracterizam a gravidade da violação jurídica cometida (o dano, material ou moral, causado pela conduta e as suas consequência típicas, o grau de perigo criado nos casos de tentativa e de crimes de perigo, o modo de execução do facto, o grau de conhecimento e a intensidade da vontade nos crimes dolosos, a reparação do dano pelo agente, o comportamento da vítima, etc.).

Quanto à personalidade do agente, haverá que atender às condições pessoais, situação económica, capacidade para se deixar influenciar pela pena (sensibilidade à pena), falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, e conduta anterior e posterior ao facto [22].

3.5.2 – No caso vertente são muito fortes as exigências de prevenção geral, atenta a frequência com que é cometido o crime de condução em estado de embriaguez, sendo, reconhecidamente, uma das principais causas da elevada sinistralidade rodoviária em Portugal, com devastadoras consequências, demonstrando o insucesso das repetidas campanhas de alerta para o perigo do álcool no exercício da condução. Continua, pois, a sentir-se uma particular necessidade de combater essa sinistralidade.

Acresce que, nos delitos de tráfego automóvel, à pena acessória de proibição de conduzir é, muitas vezes, associado um efeito mais penalizante do que à pena principal de multa (que os infratores pagam sem grandes inconformismos) ou de prisão suspensa na sua execução (que é vista até como menos onerosa que aquela). Daí que a pena acessória seja encarada como um importante instrumento para restabelecer a confiança da comunidade na validade da norma infringida com o cometimento do crime de condução em estado de embriaguez.

Assim, a medida ótima de tutela do bem jurídico e das expectativas comunitárias faz elevar consideravelmente os limites da moldura da prevenção geral.

Se é certo que no crime de condução de veículo em estado de embriaguez o desvalor da ação é de pouca monta (por isso se integra no vasto universo da pequena criminalidade), não pode ser desvalorizado o grau de perigo criado com essa conduta, atento o interesse tutelado (a segurança da circulação rodoviária). Sendo a condução automóvel, em si, já uma atividade perigosa, sê-lo-á muito mais quando exercida por quem, por ter ingerido bebidas alcoólicas em excesso, não está em condições de o fazer. Esta é uma conduta que, por colocar frequentemente em causa valores de particular relevo, como a vida, a integridade física e o património, se reveste de acentuada perigosidade.
É justamente essa perigosidade que se visa prevenir com a aplicação da pena acessória de proibição de conduzir.

Uma vez que tal perigosidade é tanto maior quanto maior for o grau de alcoolemia detetado no condutor, a taxa de álcool no sangue há de constituir um fator relevante na determinação da medida da pena acessória.

Neste conspecto, o recorrente exercia a condução de um veículo ligeiro de passageiros, na via pública, apresentando uma taxa de álcool no sangue de 3,45 g/l, ou seja, extremamente elevada e afastada do limiar a partir do qual a conduta é criminalizada (1,20 g/l), sendo, pois, muito acentuado o grau da perigosidade criada com o exercício da condução nessas condições, o que, só por si, justifica e reclama a aplicação de uma pena acessória expressiva.

Ademais, não sendo o crime de condução de veículo automóvel em estado de embriaguez exclusivamente doloso, podendo ser cometido por negligência, in casu, importante para o doseamento da pena acessória em apreço é também o facto de o recorrente ter agido dolosamente, como resulta dos factos provados.

Com efeito, é consabido que o substrato da punibilidade é a culpa e o substrato da culpabilidade é a vontade. Crime é, pois, um facto voluntário, sendo esta voluntariedade passível de se integrar em conceitos diferenciados.

O dolo é uma forma de realização do ilícito típico que, psicologicamente, se traduz no conhecimento e vontade de realização de um tipo legal de crime. É, em síntese, a expressão de uma atitude pessoal contrária ou indiferente ao dever ser jurídico-penal [23].

O dolo compõe-se de três elementos: - a representação, previsão ou conhecimento dos elementos do tipo de crime (elemento intelectual); - a vontade de realização daqueles elementos do tipo objetivo (elemento volitivo); - e a atitude ou consciência da ilicitude (elemento emocional).

Ora, os factos dados como provados denotam claramente a existência de dolo, porquanto em face deles se conclui que o agente representou o facto e quis realizá-lo.

Com efeito, resulta da matéria provada que o arguido, sabendo que tinha ingerido bebidas alcoólicas em quantidades suscetíveis de ultrapassar o limite legal de teor de álcool no sangue (elemento intelectual) e que tal conduta era criminalmente punida (elemento emocional), ainda assim, quis conduzir o veículo automóvel na via pública, agindo livre, voluntária e conscientemente (elemento volitivo).

De relevar são ainda os antecedentes criminais do recorrente, que já sofreu quatro condenações anteriores, uma delas pelo mesmo tipo de crime do em apreço nos autos (condução em estado de embriaguez) e uma outra pelo crime de desobediência por recusa a efetuar o teste de pesquisa de álcool no sangue, tendo-lhe sido aplicadas penas acessórias de proibição de conduzir com a duração de 8 meses, na primeira, e 1 ano, na segunda (cf. boletim n.º 9 do certificado de registo criminal, junto a fls. 67).

Embora a extinção dessa primeira pena acessória já tenha ocorrido em 2005, a segunda, relativa a factos praticados em 2015, apenas foi extinta cerca de 3 meses antes dos factos agora em apreço, o que é particularmente demonstrativo da insensibilidade do arguido face à influência da condenação, não se conseguindo descortinar um esforço de ressocialização, tanto mais que também não beneficia da eventual atenuação decorrente de um arrependimento, que não demonstrou, antes procurando negar a sua conduta e obstar à descoberta da verdade.

Acresce que o arguido apresenta um percurso de vida associado ao consumo excessivo de bebidas alcoólicas.

Face ao exposto, afigura-se-nos que a medida da pena acessória de proibição de conduzir fixada pela primeira instância em 1 ano e 6 meses se apresenta como necessária para se atingir o nível mínimo de verdadeira advertência penal, de modo a que a eficácia preventiva de tal pena não fique irremediavelmente afetada, pelo que não peca por excesso.

Em conclusão, não se reconhece na decisão recorrida a invocada violação dos critérios de determinação da pena acessória, enunciados no art. 71º do Código Penal, tendo sido respeitado o que resulta ainda dos arts. 40º e 69º, n.º 1, al. a) do mesmo Código, bem como o princípio da proporcionalidade na graduação da pena, ínsito no art. 18º da Constituição da República Portuguesa.

Pelo exposto, também este segmento do recurso improcede.

III. DISPOSITIVO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo arguido, P. I., e, em consequência, decidem:

A) – Alterar a decisão sobre a matéria de facto, eliminando o ponto 9º da matéria de facto provada, por estar em contradição com a parte final do ponto 10º.
B) - Confirmar, quanto ao mais, a sentença recorrida.

Pese embora o parcial provimento do recurso e o disposto no art. 513º, n.º 1, do Código de Processo Penal, fixa-se a taxa de justiça a cargo do recorrente em 4 (quatro) unidades de conta, atenta a absoluta irrelevância da alteração introduzida na decisão sobre a matéria de facto, aliás, completamente inócua na economia da decisão recorrida e tendo em vista os fins pretendidos com a interposição do recurso.
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(Texto elaborado pelo relator e revisto por ambos os signatários - art. 94º, n.º 2, do CPP)

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Guimarães, 08 de outubro de 2018

(Jorge Bispo)
(Pedro Miguel Cunha Lopes)


[1]- Todas as transcrições efetuadas respeitam o respetivo original, salvo a correção de gralhas evidentes, a ortografia e a formatação, que são da responsabilidade do relator.
[2]- Conforme jurisprudência uniformizada pelo acórdão n.º 7/95 do STJ, de 19-10-1995, in Diário da República – I Série, de 28-12-1995).
[3]- Proferido no processo n.º 70/16.0PTBRG.G1, disponível em http://www.dgsi.pt.
[4]- Cf. ainda os acórdãos do TRE de 06-06-2017 (processo n.º 344/15.7GCSLV.E1) e de 21-04-2015 (processo n.º 45/09.5GECUB.E3), ambos disponíveis em http//www.dgsi.pt.
[5] – Datado de 07-05-2014 (processo n.º 937/13) e disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ 20140397.html.
[6] - Proferido a 15-07-2013 (processo n.º 120/11), disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ 20140397.html.
[7] - Cf. o acórdão do STJ de 25-01-2006 (processo n.º 05P3460), disponível em http://www.dgsi.pt.
[8] - Vd. Alberto do Reis, Código de Processo Civil, anotado, vol. 5, pág. 140; Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, Vol. III (1972), pág. 246; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, pág. 669 e Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, pág. 221.
[9] - Cf., entre outros, os acórdãos do STJ de 26-03-2014 (processo n.º 15/10.0JAGRD.E2.S1), disponível em http://www.dgsi.pt., e de 30-04- 2014, (processo n.º 330.08.3PATNV.C2.S1), disponível na Coletânea de Jurisprudência online, com a referência 8895/2014.
[10] - Cf., nomeadamente, os acórdãos do STJ de 18-01-2018 (processo n.º 563/14.3TABRG.S1), de 17-03-2016 (processo n.º 849/12.1JACBR.C1.S1), de 20-01-2010 (processo n.º 149/07.9JELSB.E1.S1), de 14-03-2007 (processo n.º 07P21) e de 23-05-2007 (processo n.º 07P1498) e do TRP de 11-07-2001 (processo n.º 110407), todos disponíveis em http://www.dgsi.pt.
[11] - Vd. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Coimbra, 1984, Volume I, pág. 232.
[12]- Cf. os acórdãos do STJ de 18-01-2018 (processo n.º 563/14.3TABRG.S1) e de 25-03-2010 (processo n.º 427/08.OTBSTB.E1.S1), disponíveis em http://www.dgsi.pt.
[13]- Proferido no processo n.º 149/07.9JELSB.E1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt.
[14] - Cf. o acórdão do STJ de 04-11-1998, in BMJ n.º 481, pág. 265.
[15] - “O Modelo de Prevenção na Determinação da Medida Concreta da Pena”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 12, n.º 2, Abril/Junho de 2002, págs. 147 e ss.
[16]- Vd. Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas Editorial Notícias, 1993, págs. 227 e ss..
[17]- Cf. o acórdão do STJ de 28-09-2005, in Coletânea de Jurisprudência-STJ, 2005, tomo 3, pág. 173.
[18]- Vd. Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas Editorial Notícias, pág. 196 a 197.
[19]- Cf. o acórdão do TRE de 22-04-2014, disponível em http://www.dgsi.pt.
[20]- Atas da Comissão de Revisão do Código Penal, n.ºs 5, 8, 10 e 41.
[21]- In Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, Aequitas Editorial Notícias, 1993, pág. 165.
[22]- Vd. Figueiredo Dias, As consequências jurídicas do crime, Aequitas Editorial Notícias, 1993, pág. 245.
[23]- Figueiredo Dias, Direito Penal, policopiado, pág. 187.