Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | JOSÉ FERNANDO CARDOSO AMARAL | ||
Descritores: | REGIME DE BENS DO CASAMENTO BEM IMÓVEL DOADO NA VIGÊNCIA DO CASAMENTO CONSTRUÇÃO DE HABITAÇÃO NA VIGÊNCIA DO CASAMENTO EMPRÉSTIMO BANCÁRIO CONTRAÍDO NA VIGÊNCIA DO CASAMENTO BEM COMUM DO CASAL ACESSÃO INDUSTRIAL IMOBILIÁRIA | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 05/18/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 1º SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | I) Tendo, na vigência do casamento celebrado no regime de comunhão de adquiridos, sido doada ao cônjuge marido uma parcela de terreno, no valor de 5.000,00€, e tendo o casal, com recurso a empréstimo bancário, contraído por ambos, no valor de 65.000,00€, nela edificado uma casa de habitação de rés-do-chão e andar, no valor de 117.100,00€, que, enquanto perdurou o consórcio, foi utilizada como morada de família, o bem assim modificado – prédio urbano – passou a ser comum, nos termos do artº 1726º, do Código Civil, e como tal deve ser partilhado. II) Não ocorrem, em tais circunstâncias, os pressupostos da aquisição da obra, pelo donatário do terreno, por via de acessão industrial imobiliária. Os membros do casal também não podem ser considerados como benfeitores, nem a obra como simples benfeitoria ou coisa benfeitorizante e o resultado (o novo prédio urbano) como coisa benfeitorizada. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: 1. RELATÓRIO A autora AA, intentou, em 02-07-2015, no Tribunal de Fafe, vindo depois a correr seus termos e a ser decidida no de Guimarães, acção declarativa comum, sob a forma de processo sumário(1), contra o réu BB, seu ex-marido. Pediu que seja declarado e reconhecido como bem comum do casal, por isso e como tal sujeito a partilha, o imóvel que constituía a casa de morada de família por ambos construída, composto de casa de habitação, tipo T4, de r/c e 1º andar, com logradouro, sito em Fafe, descrito na CRP sob o nº xxxx e inscrito na Matriz sob o artº xxxx, no valor patrimonial de 117.110,55€. Alegou, em resumo, que, em 04-04-1997, casou com o réu, no regime de comunhão de adquiridos, mas tal casamento foi dissolvido por divórcio judicialmente decretado em decisão transitado no dia 25-01-2012. Sucedeu que, numa acção executiva para pagamento de quantia certa (crédito indemnizatório) intentada (pelo lesado) contra o réu (lesante) foi penhorado o imóvel supra referido – bem comum do casal ainda não partilhado – e, na sequência disso, instaurada, por apenso, a separação de bens. O credor/exequente reclamou da relação de bens onde o imóvel foi descrito como comum, defendendo que se trata de bem próprio do réu, contra o que entendem este e a autora. A pretexto da complexidade da questão assim suscitada, foram os interessados remetidos para os meios comuns. Daí a necessidade desta acção. O dito imóvel – casa de habitação – foi edificado pelo casal, durante a vigência do casamento, tendo sido concluído em 31-05-2007, numa parcela para construção doada ao réu em 03-03-2006 que foi desanexada de um prédio rústico descrito sob o nº 03023/280497 e inscrito na matriz sob o artº XXX, com recurso a empréstimo para o efeito solicitado e obtido por ambos junto de um banco em 22-06-2006 e cujas prestações são pagas através de conta por eles titulada, fruto da economia comum do casal. O imóvel passou a constituir a casa de morada de família e, por isso, até pediram e beneficiaram de isenção do IMI. O réu, apesar de devidamente citado, não contestou. Em despacho subsequente, entendeu-se que, por ser caso de litisconsórcio necessário, havia ilegitimidade passiva do réu, pelo que a autora foi convidada a deduzir o incidente de chamamento do credor CC. Tendo-se esta oposto, entretanto, o próprio credor referido deduziu incidente da instância – intervenção espontânea passiva – nele defendendo que deve ser julgada improcedente a acção e consequentemente o pedido da autora e “ser o bem imóvel reconhecido e declarado como bem próprio do réu”. Alegou, para tal, que o divórcio e a presente acção são simulados tendo como único objectivo retirar o bem do património do réu e não pagar a dívida deste. O bem foi doado apenas ao réu pelos pais deste. A autora apenas tem direito às benfeitorias nele realizadas, devendo estas ser relacionadas na partilha e não o imóvel, por, apesar da construção, continuar a ser bem próprio do réu, conforme jurisprudência que indica. Tal incidente foi admitido e, notificadas as partes para o contestar, apenas a autora o fez, impugnando a factualidade alegada pelo interveniente, defendendo a inadmissibilidade do incidente e a procedência da acção. Em posterior despacho, foi decidido que, não tendo o réu primitivo também contestado o incidente tal equivale ao reconhecimento por ele do direito do interveniente e, por isso, este tomará a sua posição de réu na causa, conforme artº 337º, nº 1, CPC. Foi também fixado em 117.100,00€ o valor da acção e, por isso, ordenada a remessa dos autos a Guimarães. Aqui foi proferido despacho a convidar a autora a concretizar o valor do prédio doado e o valor da construção nele incorporada, o que esta fez indicando o de 5.000,00€ e de 117.100,00€, respectivamente – valores estes que o interveniente impugnou, pedindo a realização de uma perícia. Entretanto, foram confrontadas as partes com o despacho no sentido de que o estado dos autos já permitia o conhecimento de mérito, nada tendo oposto. Seguiu-se, então, com data de 01-02-2017, saneador-sentença, no qual: -se declararam verificados tabelarmente os pressupostos do processo e a validade deste. -se apreciou como “questão prévia” o pedido formulado pelo interveniente de que deve “ser o bem imóvel reconhecido e declarado como bem próprio do réu”, considerando-o “não escrito”. -se considerou também “não escrita” a impugnação do oponente ao valor dos bens indicado pela autora. -se fixaram os factos provados. -por fim, após dissertação sobre a qualificação da acção como de “simples apreciação positiva” e interesse nela da autora, citações doutrinárias sobre os conceitos de benfeitoria e de acessão e a citação de três acórdãos a que se declarou adesão, foi decidido (sic): “Declara-se é bem comum do extinto casal formado pela aqui autora e réu e como tal ser sujeito a partilha, o imóvel que constituía a casa de morada de família, constituído por Casa de Habitação, de r/c e 1º andar, com logradouro, sito na freguesia e concelho de Fafe, descrita na CRP de Fafe sob o nº XXXX e inscrito na matriz sob o art. XXXX. Custas pelo oponente, atento o decaimento. Registe e notifique.”. O interveniente não se conformou e dela interpôs recurso para esta Relação, alegando e concluindo assim: “1ª No regime de comunhão de adquiridos, são bens próprios os “bens que cada um deles tiver ao tempo da celebração do casamento” e ainda bens próprios “os bens que lhes advierem depois do casamento por sucessão ou doação”. 2ª “A construção de uma casa em terreno próprio, na pendência do casamento celebrado sob o regime da comunhão de adquiridos (…) não perde a qualidade de bem próprio deste, pois estamos perante despesas levadas a efeito e que integram a noção de benfeitorias úteis por força do disposto no artigo 216º, n.º 1, 2 e 3 do CC” 3ª O prédio cuja recorrida quer ver como considerado comum por subsunção no conceito de acessão imobiliária, não se concebe, pois a moradia não foi construída em terreno alheio uma vez que se entenda que apesar do terreno ser próprio do marido a recorrente não alheia ao mesmo, porquanto tem uma relação matrimonial com o proprietário. 4ª A possibilidade de adquirir pela acessão está excluída quando o proprietário do terreno tenha comparticipado na feitura da obra. 5ª Afastando-se o instituto jurídico da Acessão, sem negar no entanto, que estamos perante uma despesa realizada à custa de valores comuns do casal (a benfeitoria) e que, perante a extinção do vínculo conjugal, importa pois, contrariar o enriquecimento injustificado de um dos ex-cônjuges e repor o equilíbrio económico entre os patrimónios. 6ª À luz do disposto nos artigos 1722º e 1728º ambos do Código Civil, o bem melhorado não perde o seu “estatuto de bem próprio”, embora, como já se havia referido, deva verificarse uma reposição do equilíbrio económico entre os patrimónios, resultando um crédito do património comum sobre o cônjuge proprietário a compensar no momento da partilha. 7ª Não integrando a construção da moradia em terreno pertencente a um dos cônjuges, a qualidade de bens adquiridos, a que se refere o artigo 1724º do Código Cívil, não pode ser considerado esse bem como comum do casal. Termos em que, e pelo que Vossas Excelências doutamente suprirão, no que o patrocínio se mostre insuficiente, deve dar-se provimento ao recurso, e em consequência alterar a decisão recorrida - julgar-se a acção não provada e improcedente com as legais consequências, fazendo-se assim JUSTIÇA!”. A autora, na sua resposta, defendeu que, por corresponder à jurisprudência maioritária, a decisão recorrida deve ser mantida. Foi admitido o recurso como de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo. Corridos os Vistos legais, cumpre decidir, uma vez que nada a tal obsta. II. QUESTÕES A RESOLVER Pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo dos poderes oficiosos do tribunal, se fixa o thema decidendum e se definem os respectivos limites cognitivos. Assim é por lei e pacificamente entendido na jurisprudência – artºs 5º, 608º, nº 2, 609º, 635º, nº 4, 637º, nº 2, e 639º, nºs 1 e 2, do CPC. No caso, importa apreciar e decidir se, nas circunstâncias apuradas, o bem não é comum do casal. III. FACTOS O tribunal recorrido considerou como assentes os seguintes factos(2): “A) A. e R. foram casados entre si, no regime de comunhão de adquiridos, tendo o respetivo casamento sido celebrado em 04 de Abril de 1997, sem convenção antenupcial. B) Tendo tal matrimónio sido dissolvido por Divórcio, por meio de acção que correu termos na Conservatória do Registo Civil de Fafe, sob o nº xxx, decisão transitada em julgado em 25/01/2012 B) Por escritura de doação de 3 de março de 2006, Emília e outro, doaram ao ex cônjuge da A. aqui, réu, uma “parcela de terreno para construção, com a área de 1450 m2 a confrontar de norte co herdeiros de Avelino, nascente Maria e poente com proprietário a que foi atribuído o numero provisório P6463 urbano. C) A referida parcela é a desanexar de um prédio rustico denominado “leira DD “ situado no mesmo e de que faz parte o descrito na conservatória sob o nº XXXX, inscrito na matriz sob o artº XXX rustico e foi-lhe atribuída o valor de 5.000,00 euros. D) Consta do registo predial de Fafe a inscrição sob o nº XXX do prédio adquirido por doação a favor do reu Manuel com a descrição de 1450m2 sendo 192 m2 de área coberta – casa de rez de chão e primeiro andar -logradouro- 1258m 2 de área descoberta. inscrito na matriz sob o art. XXX, no valor patrimonial de € 117.110,55 E) Por escritura lavrada no competente cartório notarial em 22 de julho de 2006, O BCP concedeu à aqui A e R o empréstimo do montante de 65.000,00 euros, para efeitos de construção de uma casa de habitação permanente no imóvel “abaixo hipotecado parcela de construção situada no Concelho de Fafe descrito na conservatória sob o nº XXX participado à matriz sob o artigo provisório P-6463 urbano. (…) E) Por documento complementar à escritura de mutuo ficou clausulado que a (…) é entregue pelo banco aos mutuários a primeira parcela da quantia mutuada no montante de 20.000,00 euros A quantia remanescente de 45.000,00 euros será entregue aos mutuários de forma fraccionada… (…)evolução da construção será verificada por via de avaliações a realizar pelos serviços do banco por sua iniciativa ou a pedido dos mutuários. (…) o período de utilização da quantia remanescente é de vinte e quatro meses F) A Hipoteca a favor do BCP foi registada provisoriamente a 31.05.2006 tornando-se definitiva em 25.10.2006 G) No processo-crime sob o nº 355/10.9TAFAF o ora R. foi condenado no pagamento, ao ali assistente, aqui oponente, Artur, de €10.600,00 para ressarcimento de danos não patrimoniais e patrimoniais sofridos e em quantia a liquidar posteriormente correspondente à perda da capacidade de ganho resultante das lesões provadas com o limite máximo de €31.750,00 euros, tendo esse montante posteriormente sido liquidado em processo que correu termos para o efeito em 9.000,00 euros. H) Foi instaurada por apenso ao mesmo a competente execução sob o nº 355/10.9TAFAF-A, estando inscrita desde 24.04.2013 sobre o mesmo imóvel penhora para garantia de quantia exequenda de 10.600,00 euros a favor do oponente CC. H) Nos autos 355/10.9TAFAF-apenso B) correu ação especial de Partilha de Bens do extinto casal I) Nesta o bem imóvel penhorado foi relacionado como bem comum. J) O ora oponente citado deduziu reclamação requerendo a exclusão deste dos bens a partilhar por se tratar de bem próprio do réu. K) Foi proferido despacho judicial já transitado a remeter a questão para os meios comuns. L) Do auto de penhora, junto a fls 74 consta o valor do imóvel de 117.100,55 euros M) Este mesmo valor é o atribuído ao prédio na relação de bens comuns e da certidão matricial. “ IV. DIREITO Conquanto o apelante insista em dizer, agora no recurso, tal como antes no seu articulado inicial, que esta acção é simulada, visando retirar o bem do património individual do réu devedor/executado, o certo é que, na sentença recorrida, nada se disse sobre tal questão. No recurso nenhuma consequência se retira dessa omissão. No entanto, tratando-se, por força do disposto no artº 612º, CPC, tal como sucede com a litigância de má-fé prevista no artº 542º, de matéria de conhecimento oficioso, não deixaremos de, a final, em função até do resultado, abordar o problema, ao abrigo do nº 2, do artº 608º, in fine. Tendo a autora alegado que o valor do prédio, enquanto parcela de terreno objecto da doação, era o declarado na escritura, de 5.000,00€, e, enquanto prédio urbano composto de casa de habitação, depois de construída esta, de 117.100,00€, e tendo o tribunal decidido considerar “não escrita” a impugnação de tais factos deduzida pelo interveniente – decisão que não vem questionada –, importa ter em conta esses dois factos, na versão por ela alegada, sendo que, aliás o segundo deles resulta dos pontos L) e M), por referência à certidão matricial, ao auto de penhora e à relação de bens apresentada no processo de separação. De resto, não sendo em qualquer dos seus pontos questionada a decisão da matéria de facto nem se vendo motivos que oficiosamente levem a alterá-la, para a mesma se remete – artº 663º, nº 6, CPC. O presente caso, em suma, cinge-se ao seguinte: tendo, na vigência do casamento, celebrado no regime de comunhão de adquiridos, sido doada ao cônjuge marido uma parcela de terreno para construção, no valor de 5.000,00€, e tendo o casal, com recurso a empréstimo bancário contraído por ambos no valor de 65.000,00€, lá edificado uma casa de habitação de rés-do-chão e andar, no valor de 117.100,00€, que, aliás, utilizaram, enquanto consorciados, como morada de família, o bem assim modificado passou a ser comum – como preconiza a autora e se entendeu na sentença – e como tal deve ser relacionado e partilhado na acção de separação apensa à execução? Ou continua a ser bem próprio do réu, apenas devendo este compensar aquela pelas benfeitorias, como defende o aqui apelante? Tendo-se o tribunal a quo, quanto à tarefa de “indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas” adequadas à justa solução do litígio, prevista no nº 3, do artº 607º, do CPC, limitado a aderir a três arestos citados que considerou representativos da orientação jurisprudencial mais correcta, mas defendendo o apelante outra e no essencial também apenas invocando jurisprudência de sentido contrário favorável à sua pretensão, vejamos que posição tomar. Ainda que a propriedade da parcela de terreno tenha advindo ao património do cônjuge réu por doação feita e aceite depois do casamento, ela, pela regra da alínea b), do nº 1, do artº 1722º, do Código Civil, permanece, em princípio, bem próprio dele. Tanto mais que nada declararam em contrário os doadores – artº 1729º. Nisso estão as partes de acordo. Porém, se o donatário e seu cônjuge, enquanto casados no regime de comunhão de adquiridos, levaram a cabo nele uma construção, com dinheiro dos dois, a realidade que, desde logo, se nos patenteia é esta: a coisa, antes objecto do direito de propriedade exclusiva daquele, transformou-se de parcela de terreno em uma casa de habitação, diluindo-se no conjunto o que, sendo antes de um, perdeu as características e a autonomia primitivas, e o que, sendo de ambos, depois nele se incorporou, assumindo incontestavelmente diversa fisionomia predial. Como afirma Oliveira Ascensão(3), não há prédio urbano sem aderência a uma determinada porção de terreno. Esta porção de terreno sobre que o edifício assenta deixou de ser um prédio rústico. Após a implantação do prédio urbano, perdeu autonomia, uma vez que a sua função específica foi absorvida no novo conjunto. Aquilo que era antes um prédio rústico modificou-se e passou, portanto, depois, em substância, a ser e a ter a função de um prédio urbano, habitado pelo casal. Logo, não tem sentido falar-se do terreno como bem próprio e, concomitantemente, da casa como bem comum. Sendo esta a nova realidade incontornável com que naturalmente todos nos deparamos e resultando ela de empreendimento gerado por vontade e acção dos dois membros do casal, com aplicação de recursos comuns e sobre bem próprio de um deles, mas não se encontrando no direito constituído, seja no campo real seja no matrimonial, norma que, expressa, imediata e directamente, preveja o problema jurídico assim criado e estatua uma clara solução a dar-lhe sobretudo quando chega o momento de partilhar o património comum e acertar contas entre os cônjuges, a Doutrina e a Jurisprudência têm-se dividido, preconizando-se, de um lado, o recurso ao instituto da acessão imobiliária e, do outro, a aplicação do regime de benfeitorias. É, aliás, nesse momento, em regra coincidente com a divergência de interesses contraposta à pacífica situação anterior, que tal problema, se aviva e ainda mais se agudiza quando, como neste caso, nele confluem pretensões de terceiros para cuja satisfação pode não ser indiferente a qualificação e inserção do bem num ou noutro dos patrimónios. Na verdade, as coisas imóveis (entre outras categorias de bens) distinguem-se em prédios rústicos e urbanos – nº 1, do artº 204º, Código Civil. Entende-se por prédio rústico uma parte delimitada do solo e as construções nele existentes que não tenham autonomia económica. Mas é prédio urbano qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro – nº 2. Em resultado da obra feita pelo casal – construção da casa –, portanto, o terreno deixou de ter existência jurídica autónoma, tendo ficado integrado no prédio urbano e passando uma e outra coisas a formar uma unidade jurídica indivisível, ou seja, coisa nova e diversa. Perante tal dinâmica objectiva do direito de propriedade (insignificante prima facie, porém, de que se tenha extinguido o anterior e nascido um novo), mantém-se o mesmo subjectivamente estático e, portanto, na esfera jurídica do dono do terreno? Se, por um lado, os direitos reais – incapazes de dar ao problema uma solução global compreensiva da referida modificação objectiva implicante da extinção (concomitante com o desaparecimento das características do prédio como rústico) do direito de propriedade sobre ele e, em sintonia com a nova construção estrutural e funcionalmente urbana, da criação de um novo direito sobre esta, e da assunção da titularidade do mesmo pelo casal à custa da perda daquele pelo respectivo cônjuge – sugerem a aplicação das regras das benfeitorias e da acessão como forma de regular os efeitos da obra na relação com a coisa pré-existente quanto à titularidade de uma e outra e inerente compensação; por outro, o direito matrimonial, prevendo embora algumas situações em que, dado o regime de bens e sua imutabilidade, procura equilibrar os interesses dos cônjuges porventura posto em causa por algumas das vicissitudes ocorridas no desenvolvimento da relação conjugal, parece não acautelar uma, específica, a que decisivamente se subsuma a nova realidade por eles criada e com a qual pacificamente conviveram fazendo, à custa de ambos, de um bem próprio um bem de cujas potencialidades na prática desfrutaram em conjunto como se ele fosse juridicamente comum. Atentos, na verdade, os princípios que comandam o lado interno dos direitos reais, como os da coisificação, compatibilidade ou exclusão, tipicidade e da taxatividade, não é fácil descortinar um tipo de direito capaz de acolher e aglutinar a nova realidade criada pelo casal sobre o prédio próprio de um dos membros e, sobretudo, que opere claramente aquando da extinção da comunhão conjugal, nem, atentos os modos de aquisição e transmissão previstos na lei, atribuir a qualquer deles a definição de titularidade no novo conjunto predial, sendo certo que predomina a tendência ora no sentido de prevalecer o princípio acessorium sequitur principale ora do princípio superfícies solo cedit. De facto, nem a noção de coisa imóvel nem a do direito de propriedade contemplam uma realidade assim sugestiva de um prédio urbano edificado sobre um prédio rústico constituintes de coisas objecto de autónomo direito real titulado por entidades distintas(4), nem para a transformação dos dois numa só coisa e necessária atribuição subjectiva do correspondente direito unitário, seja pela via originária seja pela derivada ou outra, se encontram soluções adequadamente correspondentes às peculiares e públicas circunstâncias conjugais em que o fenómeno ocorre.(5) No entanto, em casos similares, à questão de saber se o bem se conserva próprio ou passa a ser comum tem sido dada resposta através da acessão ou do regime de benfeitorias. Contudo, não sendo alheia, no sentido habitualmente considerado, a parcela de terreno primitiva (bem próprio de um), nem feita a obra com materiais alheios, participando o próprio dono do terreno na construção, sabendo um dos cônjuges que o terreno não lhe pertencia e não ocorrendo propriamente uma autorização do outro para a incorporação, generalizou-se o entendimento de que não se verificam os pressupostos normalmente exigidos para funcionar a acessão industrial imobiliária, nos termos dos artºs 1325º, 1339º e 1340º, do CC. Tal conclusão perfilha o próprio apelante, aliás na linha do que mais fundamentadamente a tal propósito se defende, por exemplo, no Acórdão da Relação de Coimbra, de 23-10-2012(6), por ele apontado. Neste, aliás, se envereda pela tese de que o prédio receptor da construção conserva o seu estatuto de bem próprio do cônjuge ao qual foi doado e se resolve o problema da incorporação do edifício naquele por via do regime das benfeitorias úteis, assim se procurando repor o equilíbrio entre os patrimónios próprio e comum e rejeitando a consideração do conjunto como bem comum do casal.(7) A solução, porém, é muito duvidosa e algo fictícia. Entende-se por benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhor a coisa – nº 1, do artº 216º. Apresentando-se manifestamente estranha à finalidade de conservar uma parcela de terreno a construção nela de uma casa de habitação (pelo contrário, a obra pode até, em vez disso, modificá-la radicalmente), também tal obra não quadra bem com a ideia de a melhorar. Resultando daí, sem dúvida, um conjunto predial mais valioso, a relação entre este e a coisa anterior não se reflecte nitidamente numa simples adjectivação das suas características ou substância em função do grau (“melhor”), precisamente porque estas, enquanto naturalmente muito diversas, não são comparáveis. Só, portanto, reduzindo indevidamente e contra natura o fenómeno a um aumento de valor da coisa (e, nessa perspectiva, a uma certa melhoria dela) seria possível considerar ambos os membros do casal como benfeitores, a obra como coisa benfeitorizante e o resultado (o novo prédio urbano) como simples benfeitoria. De resto, para operar o direito a benfeitorias é necessário que o benfeitor se encontre numa determinada posição jurídica relativamente à coisa benfeitorizada, a este propósito se citando amiudadamente os casos de posse (artº 1273º), de locação (artº 1046º), comodato (artº 1138º), compropriedade (artº 1411º), usufruto (artº 1450º) e de doação (artºs 2115º e 2177º). Também no âmbito do direito conjugal àquele surgem referências nos artºs 1723º, alínea c), e 1733º, nº 2. Nenhuma, porém, que contemple a específica situação de que aqui se trata, dada a peculiar interferência da relação pessoal/conjugal no resultado. Assim, como recortar e definir uma relação jurídica que possa aceitar-se como nítida e relevante, titulada colectivamente pelos dois membros do casal em relação à coisa própria de um deles que constitua a base legitimadora de um direito comum daquele a benfeitorias úteis? Em face destas dificuldades(8) e mais sensível à conformação do Direito à realidade da vida a que nem sempre os esquemas legais respondem satisfatoriamente e as construções jurisprudenciais sistematicamente repetidas esquecem, entendeu-se no Acórdão da Relação do Porto, de 25-05-2006(9), que: “É possível solução diferente, como propõe Rita Lobo Xavier, enquadrando a questão no Direito Matrimonial [Das relações entre o Direito comum e o Direito matrimonial, em Comemoração dos 35 anos do Código Civil, Vol. I, 487 e segs., que acompanhamos]. Nota, desde logo, que o raciocínio descrito deveria conduzir à conclusão de que o edifício construído – enquanto benfeitoria – era um bem comum, por força do art. 1733º nº 2: as benfeitorias realizadas em bens próprios de cônjuges casados no regime de comunhão de adquiridos devem ser qualificadas como bens comuns [Neste sentido, Pereira Coelho e Guilherme Oliveira, Curso de Direito da Família, I, 2ª ed.]. Por outro lado, acrescenta a mesma Autora, o espírito do sistema da comunhão de adquiridos é o de que ingressam no património comum todos os “ganhos” “alcançados” pelos cônjuges, todos os bens que “advierem” aos cônjuges durante o casamento que não sejam exceptuados por lei. Assim, parece que a construção de uma casa estará abrangida por este conceito amplo de “adquirido”, que prescinde da sua distinção baseada no fundamento jurídico da aquisição. A casa constitui uma unidade jurídica com o terreno onde está implantada e não faz sentido pretender que o terreno mantém a qualidade de bem próprio e que a casa é bem comum. Ora, nos termos do art. 1726º, os bens adquiridos em parte com dinheiro ou bens próprios de um dos cônjuges e noutra parte com dinheiro ou bens comuns revestem a natureza da mais valiosa das prestações. O objectivo desta disposição, afirma a referida Autora, é precisamente obstar a que um bem possa, em parte, ser qualificado como comum e, em parte, como próprio de um dos cônjuges, na proporção do valor das entradas do património comum e do património próprio desse cônjuge. O legislador evitou este resultado difícil recorrendo à regra simples da prevalência da parte maior para a qualificação do bem. Acrescenta depois que a situação em que os cônjuges constroem uma casa num terreno que é propriedade exclusiva de um deles, utilizando valores comuns na construção, não parece ser substancialmente diferente daquela em que os cônjuges pagam o preço de uma casa por meio da entrega de valores comuns e de um terreno incluído num dos patrimónios próprios (situação que seria evidentemente subsumível na hipótese da referida norma). Esta solução será também a que melhor corresponde às expectativas dos cônjuges. Com efeito, os cônjuges têm o dever de conjugar esforços de ordem patrimonial para acorrer às necessidades da família e existem expectativas fundadas, sobretudo quando o regime é comunitário, de que irão participar de forma igual nos resultados dessa colaboração. É aliás tais expectativas que o regime da comunhão de adquiridos protege e, por isso, um regime deste tipo corresponderá melhor à natural e espontânea interpenetração de patrimónios que ocorre durante a vida conjugal.” Reconhecendo-se embora que se trata de um modo peculiar de objectivamente salvaguardar e proteger a coisa nova criada enquanto unidade predial de natureza urbana resultante da incorporação da obra no solo e de constituição e aquisição do direito de propriedade sobre o conjunto por via da atribuição ope legis à mesma da natureza comum ou própria conforme a mais valiosa das prestações efectuadas (seja em dinheiro, seja em bens), parece-nos a que melhor respeita a vontade recíproca dos cônjuges, concretiza os aludidos princípios acessorium sequitur principale e superfícies solo cedit em termos, aliás, próximos dos da acessão(10), sem prejudicar os interesses do cônjuge cedente nem as pretensões de terceiros com direitos sobre o património deste. Na verdade, à luz do artº 1726º, do CC, o bem assim adquirido e colocado sob o domínio do casal, na medida em que obtido segundo a vontade e em resultado da acção e obra conjugada de ambos os seus membros ainda que à custa (para além do dinheiro de ambos) da voluntária entrada e consequente disposição pelo proprietário do seu direito absoluto sobre o terreno em favor do património comum, em nada difere do que sucederia se tal aquisição fosse feita a um qualquer terceiro ao qual fosse pago o preço com dinheiro e bens. Também aqui prevalecendo a regra do maior valor e se prevendo a compensação do prejudicado no momento da dissolução e partilha da comunhão, não se inviabiliza a satisfação de eventual crédito de terceiro pelo qual responda apenas o cônjuge disponente tendo em conta a previsão do artº 1696º, nº 1. Por isso é que, no sumário do referido aresto, se concluiu: “I – [A] Situação em que os cônjuges constroem uma casa num terreno que é propriedade exclusiva de um deles, utilizando valores comuns na construção, não parece ser substancialmente diferente daquela em que os cônjuges pagam o preço de uma casa por meio da entrega de valores comuns e de um terreno incluído num dos patrimónios próprios II - A qualificação do imóvel como bem próprio ou comum depende de qual seja a prestação mais valiosa. III - Será comum se a contribuição conjunta dos cônjuges para a construção do armazém for de valor superior ao valor do terreno onde foi implantado o armazém.” Nessa linha apontou o Acórdão da Relação do Porto, de 11-07-2012(11), embora em termos e com fundamentos que não se no afiguram peremptórios: “I - A realização, na pendência do casamento, de uma construção no prédio doado a um dos ex-cônjuges, em que o casamento fora celebrado segundo a comunhão de adquiridos, haverá que ser qualificada como benfeitoria que se integra na comunhão, por efeito do regime de bens de casamento. II - A presunção juris et de jure de comunhão decorrente do artº 1723º, c) do Código Civil visa primordialmente acautelar interesses de terceiros e do comércio jurídico em geral, não impedindo que na relação entre os cônjuges seja arredada, por qualquer meio de prova”. No mesmo sentido, considerando firmemente que em rigor o conceito de benfeitorias não se adequa a tal situação por estar precisamente em causa uma obra que não se limita a benfeitorizar mas que altera a substância da coisa e cuja construção se deve considerar abrangida no conceito amplo de «adquirido», se orientou o Acórdão da Relação do Porto, de 28-05-2013(12), em que se sustentou a decisão recorrida, de cujo sumário se colhe: “I - Quando os cônjuges eram casados no regime da comunhão de adquiridos e procederam à construção de uma casa em prédio próprio da mulher, que integrou uma casa que anteriormente aí existia, é aplicável a este bem o regime previsto no art. 1726° do Cód. Civil. II - Verificando-se que a prestação dos bens comuns é superior à prestação dos bens próprios na contribuição para a aquisição/construção da casa deve esta ser considerada como bem comum. III - Porém, o proprietário do prédio, ao abrigo do n" 2 do art. 1726° do Cód. Civil, deve ser compensado pela deslocação que foi feita do seu património próprio para o património comum do casal.” Assim também, chamando precisamente a atenção para a necessidade de tais casos serem apreciados à luz dos interesses e valores prosseguidos pelo direito matrimonial e não tanto à luz dos do direito comum ante a especial relação em causa e assumindo, na linha da citada Drª Rita Lobo Xavier, posição que considera ser uma «pedrada no charco» face às tradicionais, o Acórdão da Relação de Coimbra, de 24-04-2007(13), de cujo sumário se colhe: “I – Sendo os cônjuges casados em regime de comunhão de adquiridos e tendo o casal construído uma casa em terreno que pertencia ao marido, antes do casamento, tendo a edificação um valor superior ao terreno, a casa constitui um bem comum. II – Deve, todavia, o proprietário do terreno (marido) ser compensado pelo valor actual do terreno.” Sem deixar de se reconhecer a dificuldade da controversa questão, inclinamo-nos, portanto, para acolher esta tese por ser a que melhor, mais natural e consensualmente se acomoda às realidades da vida salientes do quadro fáctico em apreço e aos interesses em jogo e a que, na tarefa de indagação, interpretação e aplicação do Direito, equilibrando razoavelmente as normas reguladoras da relação matrimonial com as das relações patrimoniais comuns, mais se aproxima da ideia comunitária de justiça, notando-se que o princípio da imutabilidade do regime de bens do casamento não é absoluto, uma vez que sempre alberga os “casos previstos na lei” (nº 1, do artº 1714º), sendo um deles o previsto no artº 1726º. Daí que, atenta a factualidade apurada, designadamente o maior valor da prestação do casal, seja de concluir como na decisão recorrida e, portanto, de, com os fundamentos aqui expostos, a confirmar. Relativamente à conduta dos cônjuges que o apelante qualifica de processualmente anómala ou contrária aos ditames da boa-fé, é evidente que de todo não existem factos apurados, seja relativamente aos motivos e objectivos do divórcio, seja quanto ao implícito consenso entre eles sobre a qualificação do bem como comum, capazes de, apesar da origem do seu crédito e voluntário não cumprimento da obrigação pelo ex-membro devedor, sustentar o desencadeamento de qualquer dos mecanismos dos artºs 612º ou 542º, CPC, tanto mais que não será consequência da decisão a temida inviabilização do pagamento. V. DECISÃO Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso e, em consequência, negando provimento à apelação, confirmam a decisão recorrida. * Custas da apelação pelo apelante – (artºs 527º, nºs 1 e 2, e 529º, do novo CPC, e 1º, nºs 1 e 2, 3º, nº 1, 6º, nº 2, referido à Tabela anexa I-B, 7º, nº 2, 12º, nº 2, 13º, nº 1 e 16º, do RCP). * Notifique. Guimarães, 18 de Maio de 2017 José Fernando Cardoso Amaral Helena Maria de Carvalho Gomes de Melo Higina Orvalho Castelo 1.Evidentemente tem de se entender como processo comum, nos termos do artº 548º, do CPC, embora nada tenha sido referido nos autos quanto a isso, designadamente no saneador. 2.Transcrevem-se tal como constam da sentença, inclusive com as alíneas repetidas. 3.Direitos Reais, 4ª edição, página 43. 4.Tal como nenhuma das suas figuras derivadas, como a compropriedade, a propriedade horizontal ou o direito de superfície – artºs 1403º e sgs, 1414º e sgs. e 1524º e sgs. 5.Os modos de aquisição do direito de propriedade estão tipificados no artº 1316º (contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e “demais modos previstos na lei”) e os de constituição daquelas figuras derivadas nos artºs 1417º e 1528º. 6.Processo nº 1058/09.2TBTMR-A.C1, relatado pelo Desembargador Virgílio Mateus. 7.Esta parece ser, aliás, a orientação predominantemente seguida. 8.Em Parecer aprovado na sessão de 24-02-2011 do Conselho Técnico do Instituto dos Registos e do Notariado dado no Pº nº C. P. 104/2010 SJC-CT, acessível na Internet, desencadeado no âmbito do procedimento simplificado de partilha de património conjugal, estando em causa obra realizada pelos cônjuges em terreno próprio de um deles, referiu-se expressamente, por um lado, que, atentas as específicas circunstâncias, “estando em causa uma inovação, como será a que se traduz em implantação de edifício novo no solo, também nós temos dificuldades em encarar o acto material correspondente a uma benfeitoria (acto de melhoramento ou de conservação)”, e, por outro, que “na noção de acessão (artº 1325º do CC) e nos pressupostos de aquisição contidos no seu desenho jurídico não entra o quadro factual traçado na consulta em apreço, desde logo porque, para o cônjuge proprietário do solo e co-autor da obra, nem o terreno nem os materiais, nem a obra são alheios, e isto é quanto basta para declinar aqui o instituto e para que não faça falta deslindar, neste âmbito, a posição do outro cônjuge em relação à coisa intervencionada.” Não aceitando assim adoptar qualquer das duas posições jurisprudenciais mais correntes mas não ousando ir tão longe quanto a jurisprudência adiante referida e a que se arrimou a sentença proferida no tribunal a quo, isto porque, como diz, “teríamos de ver no acto de incorporação (realizado à custa de valores comuns e em imóvel próprio de um dos cônjuges) um facto jurídico com eficácia real, capaz de extinguir o direito de propriedade pré-existente e de constituir um novo direito sobre a coisa, e no artº 1726º do CC a fonte normativa de tamanho efeito (no pressuposto de que adquirir a coisa é adquirir o direito de propriedade sobre ela), ou de preconizar uma modificação subjectiva do direito de propriedade com causa na modificação do seu objecto e no esforço económico implicado”, o que “não é propósito do Direito Matrimonial”, concluiu-se que a “solução deste problema está apenas no acerto da conta-corrente entre património comum e os patrimónios próprios que se fecha no momento da partilha e não na aplicação do artº 1726º”, pois que “o direito de propriedade sobre a coisa beneficiada não se extingue, para dar lugar a um novo direito, antes recobre o objecto melhorado, sem que a vicissitude no objecto se projecte na titularidade do direito real, senão no seu conteúdo (conjunto das faculdades normativamente atribuídas ao seu titular), por via de eventuais direitos reconhecidos ao autor da benfeitoria” e, enfim, que “inclinamo-nos para acomodar a situação em tabela no princípio geral de compensação entre patrimónios, propondo que, no plano da titulação da partilha, se leve em consideração este movimento de capital e se reconheça o crédito de compensação em favor do património comum”. Sobrevalorizou-se, portanto, a perspectiva real e registral em detrimento da matrimonial. 9. Processo nº 0631411, relatado pelo então Desembargador e actual Conselheiro Dr. Pinto de Almeida. 10. Imaginando-se que o bem próprio de um dos cônjuges não deixa de ser terreno alheio em relação à sociedade conjugal autora da incorporação e que esta, dado o especial contexto, agiu de boa fé. 11. Processo nº 1579/10.4TBMCN.P1, relatado pela Desembargadora Ana Paula Carvalho, incorrectamente identificado na sentença recorrida. 12. Processo nº 3255/08.9TJVNF-B.P1, relatado pelo Desembargador Rodrigues Pires. 13. Publicado na CJ, ano XXXII, tomo II, 2007, paginas 29 a 32, relatado pelo Desembargador Isaías Pádua. |