Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | SANDRA MELO | ||
Descritores: | PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO DECISÃO SURPRESA | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 06/07/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | 1- A observância do princípio do contraditório impõe que se efetue a audição prévia das partes quando na sentença se faça um enquadramento legal, decisivo para o resultado da ação, totalmente díspar do efetuado por aquelas, com base em ponderações jurídicas que não tinham qualquer encaixe no por elas perspetivado, que sobressaiam, pela originalidade no contexto dos autos e da matéria em discussão, e que por isso que estas não previram, nem tinham a obrigação de prever tal enquadramento. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães .I - Relatório Autora e Apelada: Massa Insolvente de P... – Pré-Fabricação, S.A. Ré e Apelante: D..., S.A. Autos de: apelação em ação declarativa de condenação com processo comum A Autora formulou os seguintes pedidos: que a Ré seja condenada a entregar à Autora a quantia de 216.358,63 €, acrescida de juros de mora, desde a citação até integral pagamento. Alegou, para tanto e em síntese, que celebrou com a Ré contratos de subempreitada e realizou obras para esta. Nesse âmbito, a Ré fez retenções de 10% do valor de cada fatura que pagava á sociedade da qual a Autora é Massa Insolvente, como caução do cumprimento do contrato, para garantia do cumprimento desses contratos de subempreitada referentes às obras realizadas, que deveria devolver após a receção definitiva das obras e que se recusa a entregar á Autora. A Ré contestou, invocando, em súmula, que foi celebrado um acordo entre a A., a O..., S.A, a O... SGPS, S.A. e a Ré, em 30/04/2019, pelo qual as partes intervenientes compensaram expressamente e mutuamente créditos, extinguindo estes créditos. Mais pediu a condenação da Ré no pagamento de uma indemnização no valor de 2.500,00 Euros a seu favor, por litigância de ma fé. A Autora respondeu, invocando, em sinopse, que este “Acordo” foi celebrado quando a P... já se encontrava em situação de insolvência, como muito bem sabia a Ré, por ter sido notificada no dia 18 de junho de 2018 para penhora do crédito referente às retenções feitas à P..., pelo que esse documento foi um veículo utilizado para a Ré não entregar esse montante à massa insolvente, concluindo, por fim, pela invocação da nulidade, por simulação, desse acordo de compensação. Juntou elementos documentais referentes a tal penhora, que não foram impugnados. Veio a ser proferida sentença, que julgou a ação parcialmente procedente, e condenou a Ré no pagamento à Autora da quantia de 86.200,00€ (oitenta e seis mil e duzentos euros), acrescida de juros moratórios legais, previstos no art.º 102.º, §3 do Código Comercial, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento [e absolvendo-a do demais]. É desta decisão que a Ré apela, formulando, para tanto, as seguintes conclusões: I. Vem a Recorrente interpor recurso de apelação da sentença proferida no processo n.º 2155/22...., para o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, no qual foi julgada parcialmente procedente a ação e, consequentemente, foi a Recorrente condenada no pagamento da quantia de €86.200,00 (oitenta e seis mil e duzentos euros) à Recorrida. II. Salvo o devido e merecido respeito, não pode a Recorrente concordar com aquela sentença, pelo que dela decorre com os seguintes fundamentos: – Nulidade da sentença e/ou nulidade processual que contamina a sentença; – Erro de julgamento na matéria de facto; – Erro de julgamento de Direito. III. Primeiramente, a sentença proferida deve considerar-se como nula, uma vez que constitui sentença-surpresa, isto nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, que ora se invoca. IV. Neste conspecto, determina aquele preceito normativo que “é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento” (destacado nosso). V. De igual modo, estipula o artigo 3.º, n.º 3 do CPC, que não é lícito ao juiz decidir sobre questões de facto ou de direito, mesmo que sejam de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido oportunidade para se pronunciarem sobre aquelas. VI. Deste modo, resulta da leitura concatenada daqueles dois preceitos normativos, que consubstanciará decisão-surpresa aquela que comporte solução jurídica ou solução fáctica que as partes não tinham obrigação de prever, por não terem tomado posição sobre aquela. VII. Ora, nos presentes autos, a Recorrida veio a peticionar o pagamento do valor de €215.091,43 (duzentos e quinze mil e noventa e um euros e quarenta e três cêntimos), a título de retenções feitas pela Recorrente ao abrigo de vários contratos de subempreitada celebrados entre aquelas. VIII. Não obstante, perscrutada a sentença proferida, constata-se que a ora Recorrente não foi condenada no pagamento daquele valor. Antes, foi condenada no pagamento da quantia de €86.200,00, na decorrência de penhora de “créditos” efetuada no âmbito da execução n.º 3668/17..... IX. Ora, para além de a Recorrente não ser parte processual naqueles autos executivos, desconhecendo, por completo, o conteúdo e estado daqueles – dos quais, inclusive, não se deu conta nestes presentes autos -, é certo que a condenação foi feita com base em factos que não foram alegados na douta petição inicial, tendo sido decretado efeito, com a prolação da sentença, que nunca foi peticionado pela Recorrida. X. Ao que acresce que, a ora Recorrente não teve oportunidade de percecionar a relevância daqueles nos presentes autos, nem tampouco foi alertada pelo Tribunal ad quo para tal, não lhe tendo sido dada a possibilidade de se pronunciar sobre aqueles, sendo que, o Tribunal ad quo estava obrigado, por força do princípio do contraditório, a dar oportunidade às partes para se pronunciarem, uma vez que estavam em causa factos ou questões de Direito suscetíveis de integrar – como sucedeu – a base da decisão. XI. Por tudo isto, é entendimento da Recorrente que o Tribunal ad quo violou, de forma ostensiva, o princípio do contraditório, previsto no artigo 3.º, n.º 3, do CPC, garantido constitucionalmente no artigo 20.º, n.º 4, enquanto dimensão do direito a um processo justo e equitativo. XII. O Tribunal ad quo proferiu decisão-surpresa, com a qual a Recorrente não poderia razoavelmente contar em face do objeto da ação determinado pelo pedido e causa de pedir formulados pela Recorrida, pelo que a sentença é nula por excesso de pronúncia, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, o que ora se invoca com os devidos efeitos legais. Sem prescindir, XIII. A sentença proferida é nula, ao abrigo do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. e), do CPC, uma vez que o Tribunal ad quo condenou a ora Recorrente “em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido”, violando, desse modo, o disposto no n.º1, do artigo 609.º, do CPC, o que se invoca, desde já, para os devidos efeitos legais. XIV. De facto, ao condenar a ora recorrente no pagamento da quantia de €86.200,00, o Tribunal ad quo alheou-se do objeto da presente ação, definido pela Recorrida no pedido e causa de pedir. XV. Alvitramos que o objeto da presente ação se cinge às retenções levadas a efeito pela Recorrente na sequência da celebração de contratos de subempreitada com a Recorrida. XVI. Sucede que, o valor de €86.200,00 em que a Recorrente foi condenada prende-se, como dissemos, com o auto de penhora de “crédito” emitido ao abrigo do processo executivo n.º .... XVII. Assim, sendo certo que o Tribunal ad quo deu como provado que a Recorrente e Recorrida celebraram acordo que levou à extinção da dívida no valor de €215.091,43, que era, precisamente, o objeto da presente ação, devendo, por isso, ter proferido decisão no sentido de total improcedência, XVIII. Em simultâneo, condenou a Recorrente no pagamento da quantia de €86.200,00, ao abrigo de um processo totalmente alheio a estes autos. XIX. Em bom rigor, com a prolação da sentença nestes moldes, verifica-se uma dupla penalização da Recorrente, pois se pelas bandas do acordo ficou líquido que as partes extinguiram as dívidas peticionadas pelo Autor no valor de 215.091,43 Euros, por outro, encontra-se plasmado na sentença ora recorrida que haverá lugar ao pagamento de mais 86.200,00 Euros. XX. Acresce que, por força da celebração do acordo, ao extinguir-se a dívida naqueles moldes, a Recorrente liberou as retenções feitas ao abrigo dos contratos de subempreitada. XXI. Deste modo, com a sentença proferida, a Recorrente vê-se condenada a pagar uma quantia de que não é devedora, bem como fica sem as retenções levadas a efeito para garantia do bom cumprimento dos contratos de subempreitada. XXII. Por este motivo, deve a sentença ser declarada nula. Sem prescindir, XXIII. Sempre se deverá ter como nula a sentença de que ora se recorre, uma vez que o Tribunal ad quo não especificou os fundamentos de facto que justificam a sentença, estando em causa, portanto, a nulidade prevista na alínea b), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC, que ora se invoca. XXIV. Como vimos, a Recorrente foi condenada no pagamento da quantia de €86.200,00, ao abrigo de um processo executivo n.º, o qual é totalmente alheio aos presentes autos. XXV. Acresce que, conforme sobredito, a Recorrente não é parte daqueles autos, não tendo conhecimento do estado dos mesmos. XXVI. Sucede que, o Tribunal ad quo alicerçou a sentença no auto de penhora de “créditos”, sem tampouco ter facultado o exercício do contraditório às partes no que respeita àquela factualidade, nem tampouco ter carreado, oficiosamente, elementos daqueles autos para que as partes se pudessem pronunciar, ou ter decretado que a Recorrida carreasse para o presente processo elementos daqueles outros autos, relevantes na tomada de decisão. XXVII. Por isto, é entendimento da Recorrente que o Tribunal ad quo violou o princípio do inquisitório, previsto no artigo 411.º, do CPC, e que estipula que “incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos que lhe é lícito conhecer”. XXVIII. O princípio do inquisitório enforma o campo da iniciativa processual do juiz, designadamente, no âmbito da instrução do processo. XXIX. Assim, a iniciativa do juiz deve pautar-se por uma intervenção dirigida ao andamento regular do processo e a boa resolução da causa. XXX. Deste modo, os elementos relativos ao processo executivo, preponderante na prolação da sentença que ora se sindica, por serem pertinentes e necessários à demonstração de (todos os) factos relevantes para a causa, deveriam ter sido carreados para o processo oficiosamente ou decretado à Recorrida que assim o fizesse. XXXI. Não o fazendo, violou o princípio do inquisitório, e, por conseguinte, acabou por não explicitar todos os fundamentos de facto necessários para conhecimento do iter decisório pelas partes. Sem prescindir, XXXII. Ainda que se considere inexistir nulidade da sentença por força do regime estatuído no artigo 615.º, do CPC, em específico, e como se deu conta, alíneas b), d) e e), sempre se deverá concluir pela verificação de nulidade processual, nos termos e para os efeitos dos artigos 195.º, n.º 1 e 2, do CPC, invocável na presente pretensão recursiva. XXXIII. Assim, o Tribunal ad quo ao pronunciar-se sobre questão sem audição das partes e sobre a qual não foi produzida qualquer prova em sede de audiência de julgamento, fazendo-o apenas por referência a um documento respeitante a outros autos de matéria diversa ao objeto da presente ação, sem que a Recorrente tivesse oportunidade de esclarecer o verdadeiro alcance daquele, violou ostensivamente o princípio do contraditório e o princípio do inquisitório. XXXIV. Concretizando, o Tribunal ad quo viola o princípio do inquisitório, previsto no artigo 411.º do CPC, porque, considerando relevante para decisão da causa factualidade atinente a outros autos, não diligenciou no sentido de que fossem juntos todos os elementos necessários e pertinentes sobre o estado do processo executivo que foi preponderante na decisão em causa. XXXV. De igual modo, viola o princípio do contraditório, previsto no artigo 3.º, n.º 3 do CPC, porquanto não foi dada a faculdade à ora Recorrente de se pronunciar sobre aquela factualidade. Ainda, XXXVI. Vem a Recorrente impugnar a decisão de matéria de facto e de Direito, peticionando-se o Tribunal ad quem a reapreciação da prova e consequente aplicação do Direito, com as devidas consequências legais. XXXVII. Assim, salvo melhor entendimento, a Recorrente considera que os factos 60 e 66 dados como provados na douta sentença padecem de erro de julgamento, conforme aduziremos de seguida. XXXVIII. Ora, resulta do facto 60 dado como provado na douta sentença que “Os trabalhos referentes às obras mencionados 8), 13), 18), 24), 29), 34), 39), 44) 49) e 54) foram executados íntegra, nos termos contratados e sem defeitos XXXIX. Contudo, não resulta de qualquer depoimento testemunhal, nem dos documentos apresentados pelas partes, e admitidos aos autos, que os trabalhos referentes às obras supra identificadas, foram executados na integra, nos termos contratados e sem defeitos como escorre da sentença recorrida. XL. Ademais, resulta dos factos provados 10 e 11, 15 e 16, 20 e 21, 26 e 27, 31 e 32, 36 e 37, 40 e 41, 46 e 47, 51 e 52, 56 e 57, resulta que o prazo de garantia dos trabalhos realizados pela autora/recorrida é de 10 anos. XLI. Bem como, dos factos provados 12, 17, 23, 28, 33, 38, 43, 48, 53 e 58, que os trabalhos executados pela autora/recorrida ainda não foram objeto de receção definitiva, XLII. O que significa que o prazo de garantia ainda se encontra em curso, e que a Recorrida ainda pode ser responsabilizada pela existência de defeitos que venham a surgir até ao termo desse prazo de garantia de 10 anos XLIII. Pelo que a obrigação contratual de eliminação de defeitos que venham a surgir durante o prazo de garantia e até ao seu termo (o que não se apurou em concreto para cada contrato em causa nos autos) não se encontra cumprida totalmente. XLIV. E o termo “sem defeitos”, sempre levaria à conceção errónea de que os trabalhos referentes às obras se encontram à data, e futuramente, sem ocorrência de defeitos. O que merece censura, na medida em que, não se vislumbra possível aferir da existência ou inexistência de defeitos à posterior. XLV. Ainda neste sentido, veja-se o depoimento da Testemunha AA - Ficheiro áudio n.º 20230117155232_6040718_2870507, tempo de áudio 10:07, dia 17/01/2023 (audiência de julgamento) -, bem como as declarações de parte do legal representante da Recorrente, BB - Ficheiro áudio n.º 20230117162036_6040718_2870507, tempo de áudio 20:31, dia 17/01/2023, audiência de julgamento. XLVI. Assim, pelo exposto e pelo douto suprimento, deve ser alterado o facto provado 60, sendo o mesmo alterado por: Os trabalhos referentes às obras mencionados 8), 13), 18), 24), 29), 34), 39), 44) 49) e 54) foram executados íntegra, nos termos contratados e sem denúncia de defeitos até à data, mas ainda sujeitos à obrigação de boa execução durante o prazo de garantia. Ainda, XLVII. Resulta do facto n.º 66 dado como provado na douta sentença, o seguinte:“66.A ré D..., SA aceitou antecipar o vencimento do crédito referido em 59), detido pela P... – PRÉ-FABRICADOS, SA, prescindido da retenção desse capital a título caução antes do decurso integral dos prazos de garantia (05 e 10 anos).” XLVIII. Sucede que, a Recorrente aceitou antecipar a liberação das retenções (e não do “crédito), conforme veremos de seguida), apenas e só no âmbito e para o efeito do acordo, conforme resulta da factualidade dada como provada nos n.ºs 60 a 65 da sentença. XLIX. Isto resulta claro quer da própria alegação da Recorrente nos seus articulados, quer das Declarações de Parte do legal representante da recorrente, BB - Ficheiro áudio n.º 20230117162036_6040718_2870507, tempo de áudio 20:31, dia 17/01/2023, audiência de julgamento. L.Assim, e por tudo quanto se disse atá agora e sem prejuízo do mencionado de seguida, o facto 66 deverá ser objeto de alteração, devendo passar a ter a seguinte redação: “66.No âmbito do acordo descrito no facto 61, a ré D..., SA , aceitou antecipar o vencimento do crédito referido em 59), detido pela P... – PRÉ-FABRICADOS, SA, prescindido da retenção desse capital a título caução antes do decurso integral dos prazos de garantia (05 e 10 anos). Sem prescindir, LI. O facto n.º 66 dado como provado padece, ainda, de erro de julgamento quando refere que os prazos de garantia eram de 5 e 10 anos, pois resulta provado dos documentos juntos (contratos de subempreitada) e dos factos provados que os consideraram, designadamente dos factos 10, 15, 20, 26, 31, 36, 41, 46, 51 e 56, que os prazos de garantia contratados e acordados eram todos de 10 anos, não se encontrando previsto qualquer prazo de 5 anos de garantia. LII. Deste modo, o facto n.º 66 deve ser alterado, propondo-se a seguinte redação: “66. No âmbito do acordo descrito no facto 61, a ré D..., SA, aceitou antecipar o vencimento do crédito referido em 59), detido pela P... – PRÉ-FABRICADOS, SA, prescindido da retenção desse capital a título caução antes do decurso integral dos prazos de garantia (10 anos).” LIII. Acresce que, o Tribunal ad quo procedeu à qualificação do valor referido no facto 59) como um “crédito”, quando mencionado no facto 66: “(…) aceitou antecipar o vencimento do crédito referido em 59) (…)”. LIV. Sucede que, no facto 59) dado como provado na sentença discorre-se o seguinte: “O valor total das retenções efetuadas ao abrigo dos contratos mencionados em 8), 13), 18), 24), 29), 34), 39), 44) 49) e 54) foi de 215.091,43€”. LV. Deste modo, o Tribunal ad quo deu como provado no facto 59) que o valor em discussão nos presentes autos respeita a retenções, LVI. Contradizendo-se no facto 66) dado como provado, ao qualificar aquelas quantias como um crédito. LVII. A qualificação jurídica como sendo de um alegado crédito é outra coisa e decorre, salvo o devido respeito, de erro de julgamento de direito sobre o qual nos debruçaremos de seguida. LVIII. Mas, em termos de matéria de facto e atendendo à remissão do facto 66 para o facto 59, o que deveria constar era o seguinte: “(…) aceitou antecipar o vencimento das retenções referido em 59) (…)”. LIX. Até porque resultou do depoimento da testemunha AA - Ficheiro áudio n.º 20230117155232_6040718_2870507, tempo de áudio 10:07, dia 17/01/2023 (audiência de julgamento) -, e das declarações de parte do legal representante da recorrente BB - Ficheiro áudio n.º 20230117162036_6040718_2870507, tempo de áudio 20:31, dia 17/01/2023, audiência de julgamento, testemunha BB, a referência a retenções e nunca a créditos. LX. Pelo que o facto provado 66) deveria fazer menção a “retenções” e não a “crédito”, requerendo-se desde já a sua alteração, para os devidos e legais efeitos. LXI. Em suma, propõe-se a alteração da redação do facto dado como provado n.º 66) para o seguinte: “66. No âmbito do acordo descrito no facto 61, a ré D..., S.A., aceitou antecipar a liberação das retenções referidas em 59), prescindindo da retenção a título de caução antes do decurso integral do prazo de garantia (10 anos)”. Quanto ao Direito, LXII. Salvo o devido e merecido respeito, entende a Recorrente que se verifica erro de julgamento na qualificação jurídica das retenções identificadas nos autos como um “crédito”. Vejamos, LXIII. Ora, resulta dos factos provados 8, 13, 18, 24, 29, 34, 39, 44, 49 e 54, que a Recorrente, na qualidade de empreiteira, celebrou com a recorrida contratos de subempreitada para a execução de trabalhos de estruturas pré-fabricadas em betão armado. LXIV. Deste modo, a Recorrente é credora da obrigação da Recorrida de execução dos trabalhos subcontratos em conformidade com o que foi convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor ou a sua aptidão para o uso ordinário. LXV. Assim, nos casos das relações jurídicas dos autos, após a aceitação das trabalhos, que ocorre com a receção provisória dos trabalhos, vulgo, obras, inicia-se um prazo de garantia, que como já vimos, no caso dos trabalhos executados pela recorrida é de 10 anos. LXVI. Em bom rigor, e uma vez que os defeitos podem não ser desde logo aparentes, e podem revelar-se no prazo de 10 anos, apenas no termo deste prazo se pode considerar a obra como executada “sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato” – cfr. art. 1208º CCIV. LXVII. E assim, dever-se-á considerar que apenas com a receção definitiva se verifica o cumprimento integral dessa obrigação, que é a obrigação principal de resultado, do contrato de subempreitada. LXVIII. Isto posto, verifica-se assim ERRO DE JULGAMENTO de Direito relativo ao facto 60, quando o Tribunal ad quo considera que os trabalhos executados pela Recorrida foram executados na íntegra e sem defeitos. LXIX. Pois, como vimos, apenas decorrido o prazo de garantia de 10 anos, se poderia alcançar – ou não – tal conclusão. LXX. Na data da prolação da sentença, os contratos em causa nos autos não se encontravam assim integralmente cumpridos, estando a Recorrida sujeita ao cumprimento de obrigações de eliminação de defeitos que sejam denunciados até ao termo do prazo de garantia. LXXI. Ainda, LXXII. É entendimento da Recorrente que o Tribunal ad quo erra na qualificação jurídica das retenções enunciadas e consideradas nos presentes autos, e concretamente no erro de julgamento patente do facto provado 66, quando considera que o valor das retenções efetuadas ao abrigo dos contratos identificados nos autos, remetendo para o facto provado 59), é um “crédito”. LXXIII. Isto porque, foi convencionado entre as partes a prestação de uma “caução” pela Recorrida, a favor da Recorrente, em depósito em dinheiro, através da retenção das percentagens acordadas para esse efeito, no pagamento das faturas por si emitidas - cfr. resulta dos factos provados 9 (10%), 14 (10%), 19 (10%), 25 (10%), 30 (10%), 35 (10%), 40 (5%), 45 (5%), 50 (5%) e 55 (10%) -, a qual é válida até à receção definitiva, e reveste a natureza de garantia do cumprimento das suas obrigações contratuais, ou seja, da efetiva e cabal execução dos trabalhos sem vícios nem defeitos. LXXIV. Por outras palavras, recaindo sobre a Recorrida uma obrigação de resultado que apenas se considera integralmente cumprida aquando da receção definitiva, garantida por caução em depósito em dinheiro, a caução prestada pela Recorrida não pode ser tida como crédito daquela. LXXV. Antes, tendo em conta as concretas relações jurídicas em causa nos autos, o credor é a Recorrente (credora da obrigação dos trabalhos por si contratados - e pagos - não padecerem de defeitos, nem vícios). LXXVI. De resto, a caução encontra-se regulada de uma forma genérica na lei, nos arts. 623.º e s. do CC, no capítulo reservado às garantias especiais das obrigações, e decorre da disciplina legal daquela figura, que pode ser imposta ou autorizada por lei, decisão judicial ou estipulada negocialmente, assumindo, consoante os casos, as mais várias formas – cfr. doutrina referenciada no Ac. Do STJ proferido em 02/05/2019, tendo por Relatora, a Sr.ª Conselheira, Prof.ª Dr.ª Catarina Serra -, sendo de afastar o regime aplicável aos direitos de crédito, aproximando-se, antes, a figura da caução em depósito em dinheiro do regime do penhor, aplicável por analogia. LXXVII. De igual modo, refira-se que não está em causa um qualquer crédito condicionado ou crédito futuro da Recorrida, uma vez que está em causa o cumprimento de uma obrigação ao qual está associada a prestação de uma garantia/caução. LXXVIII. Isto porque a figura da caução – que, in casu, foi prestada por meio de retenções – não se confunde com créditos. LXXIX. Nas relações jurídicas em causa nos autos, as partes não subordinaram a um acontecimento futuro e incerto a produção de efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução. LXXX. O negócio jurídico – o contrato de subempreitada – produziu todos os seus efeitos, não se encontrando condicionado a nada. LXXXI. Direitos e obrigações foram cumpridos, restando uma obrigação por cumprir na sua integralidade, como vimos, a da efetiva execução dos trabalhos sem vícios, tendo as partes convencionado um prazo de garantia durante o qual a subempreiteira é responsável pela eliminação de defeitos que possam surgir nos seus trabalhos. LXXXII. Deste modo, a conversão de uma obrigação de resultado, de um dever ao qual se encontra associado uma caução que garante o seu cumprimento, em crédito, ou seja, em direito patrimonial, a favor da Recorrida, consiste numa total subversão do contratualmente acordado entre as partes e do regime legal aplicável. LXXXIII. Entendemos, portanto, que mal andou o Tribunal ad quo ao qualificar aquelas retenções como crédito, bem como a retirar as consequências jurídicas que considera na sentença em crise, e que desde já se impugnam. LXXXIV. Ademais, a prestação de cauções através de retenção nos pagamentos, em contratos de empreitada e subempreitada de direito privado, resulta de uma importação de um regime previsto já há muito tempo para as empreitadas de obras públicas. LXXXV. Ora, no âmbito do atual Código da Contratação Publica (CCP), nunca se refere à caução prestada, ainda que mediante depósito em dinheiro, como sendo um crédito, LXXXVI. Estando expressamente previsto um regime de liberação da caução no artigo 295ºdo CCP. LXXXVII. Regime para o qual os contratos de subempreitada em causa nestes autos remetem expressamente, na sua clausula 16ª, e que o tribunal a quo ignorou. LXXXVIII. Vale por isto dizer que, a Recorrida será titular de um direito, verificado o prazo de garantia da obra de 10 anos sem que existam defeitos, que é o de reaver a garantia prestada, e como, neste caso, se trata de um depósito em dinheiro, podemos considerar que se trata de um crédito patrimonial. LXXXIX. Para reforçar o que vimos a dizer, basta pensarmos na prestação de caução através de garantia bancária, em que teríamos uma relação jurídica de natureza similar, à qual se reconhece, sem margem para dúvidas, que não estamos perante direitos de crédito de quem presta a garantia. XC. Por tudo o quanto foi exposto, deve o Tribunal ad quem considerar que se verifica erro de julgamento na matéria de Direito quanto à consideração das retenções efetuadas como créditos da Recorrida, e, consequentemente, revogar-se a decisão. XCI. Sem prescindir, XCII. Considera a sentença em recurso o seguinte: XCIII. “Com efeito, decorre dos factos mencionados de 73) a 75), que, no âmbito da execução n.º 3668/17...., a ré D..., SA foi notificada, nos termos do art.º 773.º do CPC, de que os créditos detidos pela P..., SA se achavam penhorados até ao limite de 86.200,00€, tendo a mesma confirmado a existência de um débito perante a P..., SA de valor inclusivamente superior (215.091,43€) e, ainda, as condições a que essa devolução estava sujeita”. XCIV. Não se desconhecendo o regime legal previsto no artigo 773º do CPC, nem a declaração prestada pela recorrente (de uma sua colaboradora), não se pode ignorar um evidente erro na declaração por parte de quem prestou essa informação. XCV. Antes de mais, esclareça-se que o facto provado n.º74 considera que a “ré declarou”, mas não foi a ré/recorrente, mas sim uma colaboradora sua, CC, que integra o departamento de contabilidade e a quem incumbiu verificar a conta corrente e responder ao AE. XCVI. É claro que esta matéria podia e devia ter sido objeto dos autos, atendendo à relevância factual e jurídica que a sentença deu aos factos 73, 74 e 75, que foram trazidos aos autos pelo articulado de resposto e sem qualquer direito ao exercício do contraditório pela ré/recorrente, como já vimos em sede de arguição de nulidade desta decisão, em recurso. XCVII. A resposta a uma notificação para penhora constitui matéria eminentemente jurídica e de complexidade, designadamente, no que compreende à correta perceção do regime a aplicar no caso de retenções feitas a título de caução. XCVIII. A verdade dos factos é que, sem instruções superiores e sem conhecimentos jurídicos que respaldasse o teor da resposta, a referida CC respondeu ao AE, nos termos constantes do documento junto aos autos e considerado como provado no facto 74. XCIX. A efetiva declarante do documento que se encontra vertido para o facto provado 74, é uma colaboradora da Recorrente do departamento de contabilidade que, nessa qualidade e nessa condição, consultou a conta corrente e verificou existirem retenções no valor de € 215.091,43, na conta de “retenções” da recorrida, acrescentando, ainda, que aquele valor não estava vencido, e que apenas a partir de 2020 se “venceriam” € 23.600,17. C. Por um lado, como resulta dos factos provados e já elencados supra, não é verdade, pois os prazos de garantia são de 10 anos, e não existe qualquer contrato celebrado em 2020, pelo que existe erro material na declaração. CI. Acresce que, em bom rigor, a colaboradora declarante não tinha conhecimentos jurídicos para perceber o âmbito e a extensão do que estava a declarar. CII. Assim, quando a declarante concretiza que o alegado “crédito” corresponde a “(…) retenções prestadas para garantia de boa execução”. CIII. Em face do exposto, deve considerar-se que se verifica um erro nesta declaração, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 236º do CCIV, um erro que equivale sempre à ignorância de algo e implica «uma avaliação falsa da realidade: seja por carência de elementos, seja por má apreciação destes», o que desde já se invoca, com os devidos efeitos, designadamente, a declaração prestada não poder ser relevada para os efeitos do disposto no artigo 773º do CPC. CIV. Assim, mal andou o Tribunal a quo quando considerou que a Recorrente “confirmou” a existência de um débito perante a recorrida, incorrendo em erro de julgamento, pois devia ter classificado a realidade jurídica das retenções, não como “créditos” como já vimos – reduzindo-as a uma mera existência patrimonial e económica, e olvidando a sua dimensão jurídica e obrigacional – mas como caução. Ainda, CV. No que respeita à penhora do alegado crédito, cumpre esclarecer que a Recorrente desconhece por completo a emissão de auto de penhora, não tendo sido notificada daquele, nem tampouco se fez prova nos presentes autos nesse sentido. CVI. De igual modo, a Recorrente desconhece, como já se disse, todo o processado no âmbito desse processo executivo, designadamente, conteúdo e estado do mesmo (inclusive, se por hipótese houve pagamento voluntário ou coercivo). CVII. Neste sentido, o Tribunal ad quo também nada referiu, ainda que eventualmente tenha tido conhecimento daquele oficiosamente, o que é certo é que nos presentes autos não se faz menção ao estado daquele processo executivo – o que, como vimos, infere a sentença de nulidade. CVIII. Sucede que, contrariamente à Recorrente, a Recorrida tinha – e tem – conhecimento do estado daquele processo e, nos presentes autos, com a prolação da sentença que se sindica, acabou por beneficiar, em claro abuso de direito e em manifesta má-fé, quando, sabendo dessa alegada penhora, celebrou o acordo com a recorrente! CIX. Assim, a decisão em recurso considerou – erroneamente – o seguinte: “Ora, estando tal crédito regularmente penhorado, conforme decorre na notificação efetuada à devedora (a par estes efeitos a D..., Sa) e do auto de penhora lavrado naquela execução, esta situação determina a inoponibilidade à execução n.º 3668/17.... de qualquer ato extintivo do crédito penhorado, «por causa dependente da vontade do executado ou do seu devedor, verificada depois da penhora» (art.º 820.º do CC), encontrando-se este preceito alinhado com o regime geral previsto no art.º 819.º do CC”. CX. Em face do exposto, não poderia, sem os necessários e preponderantes elementos de prova carreados para o processo (designadamente que comprovassem que a penhora foi regularmente feita, entre outras questões, tais como o estado do processo executivo), o Tribunal ad quo ter decidido no sentido em que o fez. CXI. Por fim, urge enunciar o quinto ERRO DE JULGAMENTO, que reside, no fato do tribunal ter considerado provada a antecipação da liberação das retenções, como já vimos supra, no facto provado 66, não mencionando que o foi apenas no âmbito e para os efeitos do acordo em causa nos autos e considerado provado. CXII. Ora, mesmo que se considere como válida e eficaz a penhora das retenções, prevalecendo sobre o acordo, não são as mesmas exigíveis, CXIII. Já que, como vimos, a liberação antecipada tinha em vista a compensação imediata com os créditos identificados no referido acordo. CXIV. Não sendo o valor de €86.200,00 incluindo neste acordo de acerto de contas, então deve aguardar os prazos de liberação previstos contratualmente, que são de 10 anos. CXV. Acresce que se desconhece a que contrato corresponde que valor de retenções que perfazem a referida quantia de € 86.200,00. CXVI. As retenções no valor de € 86.200,00 não se encontram vencidas, não sendo exigível a sua liberação. CXVII. Devendo a decisão ser alterada neste sentido. Foram apesentadas contra-alegações. II- Objeto do recurso O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, mas esta limitação não abarca as questões de conhecimento oficioso, nem a qualificação jurídica dos factos (artigos 635º nº 4, 639º nº 1, 5º nº 3 do Código de Processo Civil). Este tribunal também não pode decidir questões novas, exceto se estas forem de conhecimento oficioso ou se tornaram relevantes em função da solução jurídica encontrada no recurso e os autos contenham os elementos necessários para o efeito. - artigo 665º nº 2 do mesmo diploma. Assim, são as seguintes as questões a apreciar, por ordem de conhecimento: - Se ocorreu a nulidade da sentença, por ser uma decisão surpresa, por ter condenado em quantidade superior ou objeto diverso do pedido ou por falta de especificação dos seus fundamentos e as suas consequências; - (caso não se verifique tal nulidade ou este tribunal a possa suprir), se os factos provados nº 60 a 66 devem ser alterados por força da impugnação da matéria de facto; - se os montantes dados em caução se devem entender como créditos da Autora ou se a Recorrida só será titular de um direito, verificado o prazo de garantia da obra de 10 anos sem que existam defeitos. III- Fundamentação de Facto A sentença vem com os seguintes factos provados: 1. A sociedade anónima P..., SA foi declarada insolvente, no âmbito do processo n.º 244/19.... (Juízo de Comércio ... - Juiz ...), por sentença proferida às 19.15h, do dia 30/04/2019, a qual transitou em julgado a 22/05/2019; 2. No processo referido em 1), foi nomeado como administrador da insolvência o Dr. DD; 3. No dia 17/06/2019, realizou-se assembleia de credores para apreciação de relatório e, nessa data, ordenado o prosseguimento dos autos apresentação de um plano de insolvência no prazo de 60 dias; 4. Apresentado plano de insolvência pela devedora P... – PRÉ-FABRICADOS, SA, por despacho de 30/01/2020, o mesmo foi julgado não aprovado e, como tal, declarada cessada a administração da massa insolvente pela devedora e determinado o prosseguimento dos autos para liquidação, com encerramento imediato da atividade da insolvente; 5. A insolvente P... – PRÉ-FABRICADOS, SA dedicava-se à fabricação, comercialização, aplicação de materiais pré-esforçados, pré-fabricados, à conceção de projetos na área de pré-fabricação em betão e produtos afins, 6. A ré D..., SA dedica-se à atividade de construção civil; 7. No exercício desta sua atividade, a ré D..., SA celebrou com a C... um contrato de empreitada referente à construção de edifício, designado como “Armazém de Produto Acabado”, sito em ..., ...; 8. Na qualidade de adjudicatária da referida obra, no dia 06/06/2013, a ré D..., SA acertou com a P... – PRÉ-FABRICADOS, SA um contrato de subempreitada, mediante o qual esta se obrigou a realizar os trabalhos conexos com a estrutura de betão do “Armazém de Produto Acabado”, pelo valor de 1.539,000,00€, acrescido de IVA à taxa legal (tudo em conformidade com o teor integral do contrato junto sob a ref.ª ...08 –docs. ... e ... - e que aqui se dão por reproduzido); 9. Nos termos do contrato referido em 8), ficou acordado que o pagamento da obra seria feito mediante apresentação de fatura, emitida com base em auto de medição mensal, retendo a ré o equivalente a 10% de cada uma dessas faturas, para caução do bom cumprimento do contrato [clausula 4.ª], obra essa a concluir até ao dia 27/08/2013 [cláusula 5.ª]; 10. Nos termos do contrato referido em 8), ficou ainda acordado que o prazo de garantia dos trabalhos que constituíam a subempreitada era de 10 anos, contado desde a data da receção provisória da obra, podendo o dono de obra acionar a caução referida em 9) para reparação de eventuais defeitos [clausula 6.ª]; 11. Nos termos do contrato referido em 8), estabeleceu-se que, findo o prazo de garantia de 10 anos, seria realizado auto de vistoria para receção definitiva da obra e, caso a mesma se achasse em condições de ser recebida, por ausência de quaisquer deficiências, as quantias retidas seriam devolvidas (100%) pela D..., SA à P... – PRÉ-FABRICADOS, SA [cláusula 6.ª]; 12. A P... – PRÉ-FABRICADOS, SA concluiu a obra referida em 8), tendo sido elaborado, em momento não apurado, auto de receção provisória da obra, sem que, até à data, tenha sido elaborado auto de receção definitiva da mesma; 13. Na qualidade de adjudicatária de empreitada geral de «Expansão do Armazém de produto acabado – C...», no dia 27/10/2015, a ré D..., SA acertou com a P... – PRÉ-FABRICADOS, SA um contrato de subempreitada, mediante o qual esta se obrigou a realizar os trabalhos de betão «Madre M40», pelo valor de 95.400,00€, acrescido de IVA à taxa legal (tudo em conformidade com o teor integral do contrato junto sob a ref.ª ...08 – doc. ... e ... - e que aqui se dá por reproduzido); 14. Nos termos do contrato referido em 13), ficou acordado que o pagamento da obra seria feito mediante apresentação de faturas, retendo a ré o equivalente a 10% de cada uma dessas faturas, para caução do bom cumprimento do contrato [clausula 4.ª], obra essa a concluir até ao dia 11/12/2015 [cláusula 5.ª]; 15. Nos termos do contrato referido em 13), ficou ainda acordado que o prazo de garantia dos trabalhos que constituíam a subempreitada era de 10 anos, contados desde a data da receção provisória da obra, podendo o dono de obra acionar a caução referida em 14) para reparação de eventuais defeitos [clausula 6.ª]; 16. Nos termos do contrato referido em 13), estabeleceu-se que, findo o prazo de garantia de 10 anos, seria realizado auto de vistoria para receção definitiva da obra e, caso a mesma se achesse em condições de ser recebida, por ausência de quaisquer deficiências, as quantias retidas seriam devolvidas (a 100%) pela D..., SA à P... – PRÉ-FABRICADOS, SA [cláusula 6.ª]; 17. A P... – PRÉ-FABRICADOS, SA concluiu a obra referida em 13), tendo sido elaborado, em momento não apurado, auto de receção provisória da obra, sem que, até à data, tenha sido elaborado auto de receção definitiva da mesma; 18. Na qualidade de adjudicatária de empreitada geral denominada «Construção da Fábrica de Produção de Papel da ... – 1.ª fase», em ..., no dia 17/12/2014, a ré D..., SA acertou com a P..., SA um contrato de subempreitada, mediante o qual esta se obrigou a realizar os trabalhos de «estrutura pré-fabricada», pelo valor de 525.000,00€, acrescido de IVA à taxa legal (tudo em conformidade com o teor integral do contrato junto sob a ref.ª ...20 - docs. ... e ... - e que aqui se dá por reproduzido); 19. Nos termos do contrato referido em 18), ficou acordado que o pagamento da obra seria feito mediante apresentação de faturas, emitidas com base em autos de medição mensais, retendo a ré o equivalente a 10% de cada uma dessas faturas, para caução do bom cumprimento do contrato [clausula 4.ª], obra essa a concluir até ao dia 17/05/2014 [cláusula 5.ª]; 20. Nos termos do contrato referido em 18), ficou ainda acordado que o prazo de garantia dos trabalhos que constituíam a subempreitada era de 10 anos, contados desde a data da receção provisória da obra, podendo o dono de obra acionar a caução referida em 19) para reparação de eventuais defeitos [clausula 6.ª]; 21. Nos termos do contrato referido em 18), estabeleceu-se que, findo o prazo de garantia de 10 anos, seria realizado auto de vistoria para receção definitiva da obra e, caso a mesma se achesse em condições de ser recebida, por ausência de quaisquer deficiências, as quantias retidas seriam devolvidas (a 100%) pela D..., SA à P... – PRÉ-FABRICADOS, SA [cláusula 6.ª]; 22. Por documento reduzido a escrito, celebrado a 18/11/2014, intitulado de «conta final do contrato», a D..., SA e a P... – PRÉ-FABRICADOS, SA acertaram que o valor final dos trabalhos realizados e dos trabalhos a mais executados foi o de 532.669,08€, acrescido de IVA, tudo sem prejuízo «das retenções contratuais efetuadas pela D..., Sa, que funcionarão conforme previsto no contrato e anexos subscritos, bem como todos os trabalhos que sejam obrigação do subempreiteiro a executar durante o período de garantia, conforme estabelecido no contrato e anexos» [tudo em conformidade com o documento n.º ... que aqui se dá por reproduzido] 23. A P... – PRÉ-FABRICADOS, SA concluiu a obra referida em 18), tendo sido elaborado, em momento não apurado, auto de receção provisória da obra, sem que, até à data, tenha sido elaborado auto de receção definitiva da mesma; 24. Na qualidade de adjudicatária de empreitada geral denominada «Construção da Fábrica de Produção de Papel da ... – 2.ª fase», em ..., no dia 31/10/2014, a ré D..., SA acertou com a P..., SA um contrato de subempreitada, mediante o qual esta se obrigou a realizar os trabalhos de «estrutura pré-fabricada», pelo valor de 615.000,00€, acrescido de IVA à taxa legal (tudo em conformidade com o teor integral do contrato junto sob a ref.ª ...60 - docs. ... e ... - e que aqui se dá por reproduzido); 25. Nos termos do contrato referido em 24), ficou acordado que o pagamento da obra seria feito mediante apresentação de faturas, emitidas com base em autos de medição mensais, retendo a ré o equivalente a 10% de cada uma dessas faturas, para caução do bom cumprimento do contrato [clausula 4.ª], obra essa a concluir até ao dia 23/01/2015 [cláusula 5.ª]; 26. Nos termos do contrato referido em 24), ficou ainda acordado que o prazo de garantia dos trabalhos que constituíam a subempreitada era de 10 anos, contado desde a data da receção provisória da obra, podendo o dono de obra acionar a caução referida em 25) para reparação de eventuais defeitos [clausula 6.ª]; 27. Nos termos do contrato referido em 24), estabeleceu-se que, findo o prazo de garantia de 10 anos, seria realizado auto de vistoria para receção definitiva da obra e, caso a mesma se achasse em condições de ser recebida, por ausência de quaisquer deficiências, as quantias retidas seriam devolvidas (a 100%) pela D..., SA à P... – PRÉ-FABRICADOS, SA [cláusula 6.ª]; 28. A P... – PRÉ-FABRICADOS, SA concluiu a obra referida em 24), tendo sido elaborado, em momento não apurado, auto de receção provisória da obra, sem que, até à data, tenha sido elaborado auto de receção definitiva da mesma; 29. Na qualidade de adjudicatária de empreitada geral denominada «Construção da Fábrica de Produção de Papel da ... – 4.ª fase», em ..., no dia 26/06/2015, a ré D..., SA acertou com a P..., SA um contrato de subempreitada, mediante o qual esta se obrigou a realizar os trabalhos de «estrutura pré-fabricada», pelo valor de 225.000,00€, acrescido de IVA à taxa legal (tudo em conformidade com o teor integral do contrato junto sob a ref.ª ...60 - docs. ... - e que aqui se dá por reproduzido); 30. Nos termos do contrato referido em 29), ficou acordado que o pagamento da obra seria feito mediante apresentação de faturas, emitidas com base em autos de medição mensais, retendo a ré o equivalente a 10% de cada uma dessas faturas, para caução do bom cumprimento do contrato [clausula 4.ª], obra essa a concluir até ao dia 14/08/2015 [cláusula 5.ª]; 31. Nos termos do contrato referido em 29), ficou ainda acordado que o prazo de garantia dos trabalhos que constituíam a subempreitada era de 10 anos, contado desde a data da receção provisória da obra, podendo o dono de obra acionar a caução referida em 30) para reparação de eventuais defeitos [clausula 6.ª]; 32. Nos termos do contrato referido em 29), estabeleceu-se que, findo o prazo de garantia de 10 anos, seria realizado auto de vistoria para receção definitiva da obra e, caso a mesma se achasse em condições de ser recebida, por ausência de quaisquer deficiências, as quantias retidas seriam devolvidas (a 100%) pela D..., SA à P... – PRÉ-FABRICADOS, SA [cláusula 6.ª]; 33. A P... – PRÉ-FABRICADOS, SA concluiu a obra referida em 29), tendo sido elaborado, em momento não apurado, auto de receção provisória da obra, sem que, até à data, tenha sido elaborado auto de receção definitiva da mesma; 34. Na qualidade de adjudicatária de empreitada geral denominada «V...», em ..., ..., cujo dono da obra era V... Portugal – Produtos Médicos e Farmacêuticos, Ld.ª, no dia 10/01/2015, a ré D..., SA acertou com a P..., SA um contrato de subempreitada, mediante o qual esta se obrigou ao fornecimento, transporte e montagem de «estrutura pré-fabricada», pelo valor de 237.500,00€, acrescido de IVA à taxa legal (tudo em conformidade com o teor integral do contrato junto sob a ref.ª ...60 - docs. ...0 - e que aqui se dá por reproduzido); 35. Nos termos do contrato referido em 34), ficou acordado que o pagamento da obra seria feito mediante apresentação de faturas, emitidas com base em autos de medição mensais, retendo a ré o equivalente a 10% de cada uma dessas faturas, para caução do bom cumprimento do contrato [clausula 4.ª], obra essa a concluir até ao dia 31/03/2015 [cláusula 5.ª]; 36. Nos termos do contrato referido em 34), ficou ainda acordado que o prazo de garantia dos trabalhos que constituíam a subempreitada era de 10 anos, contado desde a data da receção provisória da obra, podendo o dono de obra acionar a caução referida em 35) para reparação de eventuais defeitos [clausula 6.ª] 37. Nos termos do contrato referido em 34), estabeleceu-se que, findo o prazo de garantia de 10 anos, seria realizado auto de vistoria para receção definitiva da obra e, caso a mesma se achasse em condições de ser recebida, por ausência de quaisquer deficiências, as quantias retidas seriam devolvidas (a 100%) pela D..., SA à P... – PRÉ-FABRICADOS, SA [cláusula 6.ª]; 38. A P... – PRÉ-FABRICADOS, SA concluiu a obra referida em 34), tendo sido elaborado, em momento não apurado, auto de receção provisória da obra, sem que, até à data, tenha sido elaborado auto de receção definitiva da mesma; 39. Na qualidade de adjudicatária de empreitada geral denominada «...», em ..., cujo dono da obra era I... S.A.U. – ..., no dia 09/12/2016, a ré D..., SA acertou com a P... – PRÉ-FABRICADOS, SA um contrato de subempreitada, mediante o qual esta se obrigou ao fornecimento, transporte e montagem de «suporte de silos», pelo valor de 223.000,00€, acrescido de IVA à taxa legal (tudo em conformidade com o teor integral do contrato junto sob a ref.ª ...61 - docs. ...1 - e que aqui se dá por reproduzido); 40. Nos termos do contrato referido em 39), ficou acordado que o pagamento da obra seria feito mediante apresentação de faturas, emitidas com base em autos de medição mensais, retendo a ré o equivalente a 5% de cada uma dessas faturas, para caução do bom cumprimento do contrato [clausula 4.ª], obra essa a concluir até ao dia 31/01/2017 [cláusula 5.ª]; 41. Nos termos do contrato referido em 39), ficou ainda acordado que o prazo de garantia dos trabalhos que constituíam a subempreitada era de 10 anos, contado desde a data da receção provisória da obra, podendo o dono de obra acionar a caução referida em 40) para reparação de eventuais defeitos [clausula 6.ª] 42. Nos termos do contrato referido em 39), estabeleceu-se que, findo o prazo de garantia de 10 anos, seria realizado auto de vistoria para receção definitiva da obra e, caso a mesma se achasse em condições de ser recebida, por ausência de quaisquer deficiências, as quantias retidas seriam devolvidas (a 100%) pela D..., SA à P... – PRÉ-FABRICADOS, SA [cláusula 6.ª]; 43. A P... – PRÉ-FABRICADOS, SA concluiu a obra referida em 39), tendo sido elaborado, em momento não apurado, auto de receção provisória da obra, sem que, até à data, tenha sido elaborado auto de receção definitiva da mesma; 44. Na qualidade de adjudicatária de empreitada geral denominada «...», em ..., cujo dono da obra era I... S.A.U. – ..., no dia 06/12/2016, a ré D..., SA acertou com a P... – PRÉ-FABRICADOS, SA um contrato de subempreitada, mediante o qual esta se obrigou ao fornecimento, transporte e montagem de túneis em betão armado, para a obra designada por «subempreitada box», pelo valor de 41.400,00€, acrescido de IVA à taxa legal (tudo em conformidade com o teor integral do contrato junto sob a ref.ª ...61 - docs. ...2 - e que aqui se dá por reproduzido); 45. Nos termos do contrato referido em 44), ficou acordado que o pagamento da obra seria feito mediante apresentação de faturas, emitidas com base em autos de medição mensais, retendo a ré o equivalente a 5% de cada uma dessas faturas, para caução do bom cumprimento do contrato [clausula 4.ª], obra essa a concluir até ao dia 13/01/2017 [cláusula 5.ª]; 46. Nos termos do contrato referido em 44), ficou ainda acordado que o prazo de garantia dos trabalhos que constituíam a subempreitada era de 10 anos, contados desde a data da receção provisória da obra, podendo o dono de obra acionar a caução referida em 45) para reparação de eventuais defeitos [clausula 6.ª] 47. Nos termos do contrato referido em 44), estabeleceu-se que, findo o prazo de garantia de 10 anos, seria realizado auto de vistoria para receção definitiva da obra e, caso a mesma se achasse em condições de ser recebida, por ausência de quaisquer deficiências, as quantias retidas seriam devolvidas (a 100%) pela D..., SA à P... – PRÉ-FABRICADOS, SA [cláusula 6.ª]; 48. A P... – PRÉ-FABRICADOS, SA concluiu a obra referida em 44), tendo sido elaborado, em momento não apurado, auto de receção provisória da obra, sem que, até à data, tenha sido elaborado auto de receção definitiva da mesma; 49. Na qualidade de adjudicatária de empreitada geral denominada «Requalificação da Segunda Circular – Ligação à Avenida ...», em ..., no dia 27/04/2017, a ré D..., SA acertou com a P... – PRÉ-FABRICADOS, SA um contrato de subempreitada, mediante o qual esta se obrigou ao fornecimento, transporte e montagem de lajes, painéis e cornijas pré-fabricadas em betão armado, pelo valor de 76.700,00€, acrescido de IVA à taxa legal (tudo em conformidade com o teor integral do contrato junto sob a ref.ª ...60 e que aqui se dá por reproduzido); 50. Nos termos do contrato referido em 49), ficou acordado que o pagamento da obra seria feito mediante apresentação de faturas, emitidas com base em autos de medição mensais, retendo a ré o equivalente a 5% de cada uma dessas faturas, para caução do bom cumprimento do contrato [clausula 4.ª], obra essa a concluir até ao dia 20/07/2017 [cláusula 5.ª]; 51. Nos termos do contrato referido em 49), ficou ainda acordado que o prazo de garantia dos trabalhos que constituíam a subempreitada era de 10 anos, contados desde a data da receção provisória da obra, podendo o dono de obra acionar a caução referida em 50) para reparação de eventuais defeitos [clausula 6.ª] 52. Nos termos do contrato referido em 49), estabeleceu-se que, findo o prazo de garantia de 10 anos, seria realizado auto de vistoria para receção definitiva da obra e, caso a mesma se achasse em condições de ser recebida, por ausência de quaisquer deficiências, as quantias retidas seriam devolvidas (a 100%) pela D..., SA à P... – PRÉ-FABRICADOS, SA [cláusula 6.ª]; 53. A P... – PRÉ-FABRICADOS, SA concluiu a obra referida em 49), tendo sido elaborado, em momento não apurado, auto de receção provisória da obra, sem que, até à data, tenha sido elaborado auto de receção definitiva da mesma; 54. Na qualidade de adjudicatária de empreitada geral denominada «H...», na zona industrial de ..., em ..., no dia 08/06/2016, a ré D..., SA acertou com a P... – PRÉ-FABRICADOS, SA um contrato de subempreitada, mediante o qual esta se obrigou ao fornecimento, transporte e montagem de estrutura pré-fabricada em betão armado, pelo valor de 247.500,00€, acrescido de IVA à taxa legal (tudo em conformidade com o teor integral do contrato junto sob a ref.ª ...60 e que aqui se dá por reproduzido); 55. Nos termos do contrato referido em 54), ficou acordado que o pagamento da obra seria feito mediante apresentação de faturas, emitidas com base em autos de medição mensais, retendo a ré o equivalente a 10% de cada uma dessas faturas, para caução do bom cumprimento do contrato [clausula 4.ª], obra essa a concluir até ao dia 23/09/2016 [cláusula 5.ª]; 56. Nos termos do contrato referido em 54), ficou ainda acordado que o prazo de garantia dos trabalhos que constituíam a subempreitada era de 10 anos, contado desde a data da receção provisória da obra, podendo o dono de obra acionar a caução referida em 55) para reparação de eventuais defeitos [clausula 6.ª] 57. Nos termos do contrato referido em 54), estabeleceu-se que, findo o prazo de garantia de 10 anos, seria realizado auto de vistoria para receção definitiva da obra e, caso a mesma se achasse em condições de ser recebida, por ausência de quaisquer deficiências, as quantias retidas seriam devolvidas (a 100%) pela D..., SA à P... – PRÉ-FABRICADOS, SA [cláusula 6.ª]; 58. A P... – PRÉ-FABRICADOS, SA concluiu a obra referida em 34), tendo sido elaborado, em momento não apurado, auto de receção provisória da obra, sem que, até à data, tenha sido elaborado auto de receção definitiva da mesma; 59. O valor total das retenções efetuadas ao abrigo dos contratos mencionados em 8), 13), 18), 24), 29), 34), 39), 44) 49) e 54) foi de 215.091,43€; 60. Os trabalhos referentes às obras mencionados 8), 13), 18), 24), 29), 34), 39), 44) 49) e 54) foram executados íntegra, nos termos contratados e sem defeitos; 61. No dia 30/04/2019, por acordo reduzido a escrito celebrado entre D..., SA (1.ª outorgante), O... ENGENHARIA, SA (2.ª outorgante), P... – PRÉ-FABRICAÇÃO, SA (3.ª outorgante), e O..., SA (4.ª outorgante), estas últimas três representadas pelos mesmos administradores (EE e FF) foi celebrado o seguinte acordo: «Considerando que: a) No âmbito das relações contratuais e comerciais entre si havidas, a SEGUNDA OUTORGANTE deve à PRIMEIRA OUTORGANTE, o montante de 465.441,57€; b) No âmbito das relações contratuais e comerciais entre si havidas, a PRIMEIRA OUTORGANTE reteve a SEGUNDA OUTORGANTE, a título de caução para garantia do bom e pontual cumprimento dos trabalhos de subempreitada por esta executados para aquela, o montante de 215.091,43€, (…); c) A SEGUNDA OUTORGANTE é detentora de um crédito sobre a TERCEIRA OUTORGANTE, no valor de 231.707,99€, decorrente do pagamento de salários aos trabalhadores desta última, durante o ano de 2018 até Abril de 2019 (…); d) A SEGUNDA e TERCEIRA OUTORGANTES encontram-se em relação de grupo, sendo a totalidade do seu capital social detido pela QUARTA OUTORGANTE, havendo justificado interesse destas sociedades na celebração do presente acordo; É celebrado o presente ACORDO que se regerá pela seguinte CLÁUSULA ÚNICA: 1. Pelo presente, as OUTORGANTES expressamente acordam, por ser essa a sua real e esclarecida vontade, que, por intermédio do mecanismo de compensação de créditos, as dívidas existentes entre si se encontram saldadas até ao montante de 215.091,43€. 2- Deste modo, encontrando-se extinta a dívida da PRIMEIRA OUTORGANTE para com a TERCEIRA OUTORGANTE, entre as OUTORGANTES permanecem em dívidas as quantias que excedam o montante de 215.091,43€»; 62. Aquando da celebração do acordo referido em 61), a ré D..., SA detinha um crédito sobre a O..., SA, no valor de 465.441,57€; 63. Aquando da celebração do acordo referido em 61), a O..., SA detinha um crédito sobre a P... – PRÉ-FABRICADOS, SA no valor de 231.707,99; 64. Aquando da celebração do acordo referido em 61), a totalidade do capital social da O..., SA e da P... – PRÉ-FABRICADOS, SA era detido pela O... SGPS, SA 65. Aquando da celebração do acordo referido em 61), as sociedades nele intervenientes pretenderam efetuar um encontro de contas, acertando os créditos e débitos existentes entre elas; 66. A ré D..., SA aceitou antecipar o vencimento do crédito referido em 59), detido pela P... – PRÉ-FABRICADOS, SA, prescindido da retenção desse capital a título caução antes do decurso integral dos prazos de garantia (05 e 10 anos); 67. As sociedades detidas pela O... SGPS, SA, da qual a O..., SA e da P... – PRÉ-FABRICADOS, SA faziam parte, mantinham, à data, múltiplos negócios com a ré D..., SA, sendo habitual efetuarem compensações semelhantes às referidas em 61); 68. Os contratos referidos em 8), 13), 18), 24), 29), 34), 39), 44) 49) e 54) contemplam, na sua cláusula de «Pagamentos, deduções e retenções», entre o mais, o seguinte: «Os pagamentos poderão ser realizados pela primeira à segunda contraente, por intermédio de compensação com os créditos sobre a segunda outorgante ou qualquer empresa do grupo económico em que esta se insira (…) dando a segunda contratante, pelo presente, o seu expresso consentimento para tal»; 69. Por carta datada de 11/02/2021, a autora Massa Insolvente da P... – PRÉ-FABRICADOS, SA interpelou a ré D..., SA a fim de que esta procedesse ao pagamento do valor global de 216.358,63, a título de retenções efetuadas em obas concluídas nos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017; 70. Por carta datada de 18/02/2021, a ré D..., SA a negou dever a quantia solicitada em 69) e informou a autora do acordo descrito em 61). 71. No dia 09/04/2019, a sociedade O..., SA foi declarada insolvente no âmbito do processo n.º 27481/18...., sentença esta que veio a ser revogada pode decisão judicial que transitou em julgado a 18/06/2019; 72. No dia 06/08/2019, a sociedade O..., SA foi declarada insolvente no âmbito do processo n.º 6746/19...., por sentença transitada em julgado a 29/10/2019; 73. No dia 18/06/2018, no âmbito da execução n.º 3668/17...., a ré D..., SA foi notificada, nos termos do art.º 773.º do CPC, de que os créditos detidos pela P..., SA se achavam penhorados até ao limite de 86.200,00€; 74. Na sequência da notificação referida em 73), a ré declarou o seguinte: «Com referência ao V. ofício de 18/06/2018 (…), informamos que temos créditos perante a sociedade P..., Sa, no montante de 215.091,43€, mas cuja obrigação reconhecemos de forma condicionada, uma vez que esses créditos respeitam todos a retenções contratuais prestadas para garantia de boa execução, cuja verificação está prevista começar a partir de 2020, no valor de 23.600,17€, e o restante valor a partir de 2027, caso inexistam vícios na empreitada que recamem a sua utilização, só então será possível aferir o saldo efetivo do fornecedor executado»; 75. No dia 05/04/2019, no âmbito da execução referidas em 73), foi elaborado auto de penhora no valor de 86.200,00€. B) FACTOS NÃO PROVADOS a) O valor acertado para a subempreitada mencionada em 54) foi o de 262.613,77€; b) No dia e hora da celebração do acordo referido em 61), a sociedade P..., SA já havia sido declarada insolvente; c) No dia e hora da celebração do acordo referido em 61), a declaração de insolvência da P..., SA era do conhecimento dos legais representantes da mesma, bem como os legais representantes da ré; d) A ré tinha conhecimento da declaração de insolvência referida em 71); e) A ré reclamou créditos na insolvência referida em 71); f) As partes intervenientes no acordo referido em 61) não pretendiam celebrar qualquer compensação de créditos; g) O acordo referido em 61) foi elaborado com o propósito de subtrair o valor referido em 59) aos credores da P..., SA e não entregar tal quantia à respetiva massa insolvente. IV -Fundamentação de Direito Da nulidade por ter sido proferida decisão surpresa A Recorrente invoca em primeiro lugar a nulidade da decisão, por ter violado o principio do contraditório, consistindo numa decisão surpresa. .1- Da decisão surpresa O artigo 3º nº 3 do Código de Processo Civil é impressivo ao impor a observância do princípio do contraditório ao longo de todo o processo e bem assim a salientar que o juiz não deve decidir as questões, mesmo se de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a oportunidade de se pronunciarem, “salvo caso de manifesta desnecessidade”. O princípio do contraditório é uma das bases do Estado de Direito Democrático, como resulta dos artigos 20º da Constituição da República Portuguesa, sendo pedra mestra no acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva. No artigo 3º nº 3 do Código de Processo Civil encontra-se plasmada uma conceção abrangente deste princípio, porquanto, para além de permitir às partes apresentar as suas pretensões e defesas e respetivos meios de prova, lhes dá mais profunda e contínua intervenção no processo, de molde a poderem influenciar a decisão, “entendida como uma garantia de participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objeto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão”.[1] Exige-se que as partes beneficiem da faculdade de se pronunciar sobre questões determinantes para a decisão a proferir e que por serem novidade no processo, no decurso do normal contraditório previsto na tramitação processual não foram objeto da sua pronúncia, nem seria de antecipar que o fossem. Enfim, “Do princípio do contraditório decorre a regra fundamental da proibição da indefesa, em função da qual nenhuma decisão, mesmo interlocutória, deve ser tomada, pelo tribunal, sem que, previamente, tenha sido dada às partes ampla e efetiva possibilidade de a discutir, contestar e valorar”, como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 298/2005, de 7-6-2005. Embora as partes devam ser diligentes na defesa dos seus interesses, cabendo-lhes o ónus de alegarem nas peças processuais sobre os factos, o direito e as pretensões e fundamentos que formulam ou a que se opõem, casos há em que o juiz se vê confrontado com a necessidade de proferir decisões sobre matérias novas, que as partes não discutiram, ou porque não foram perspetivadas por qualquer uma delas (mesmo considerando que agiram com uma diligência mediana), ou porque são despoletados em fase em que já não são abarcados pelos articulados e requerimentos processualmente previstos. O artigo 3º nº 3 do Código de Processo Civil exige então que o tribunal conceda às partes a faculdade de se pronunciar sobre tais questões. A redação dos nºs 3 e 4 do artigo 3º do Código de Processo Civil vem já da reforma operada pelo DL 329-A/95, de 12/12, e as questões da decisão surpresa são discutidas desde então, como se verifica do seu preâmbulo “Assim, prescreve‐se, como dimensão do princípio do contraditório, que ele envolve a proibição da prolação de decisões surpresa, não sendo lícito aos tribunais decidir questões de facto ou de direito, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que previamente haja sido facultada às partes a possibilidade de sobre elas se pronunciarem, e aplicando‐se tal regra não apenas na 1.ª instância mas também na regulamentação de diferentes aspetos atinentes à tramitação e julgamento dos recursos”. “Pretende-se evitar que as partes se defrontem, sem pronúncia prévia, com uma interpretação judicial que não poderiam antecipar ou com uma tramitação processual que escape ao modelo formal aplicável, visando que a decisão seja o culminar de um processo argumentativo justo e equitativo que permita que cada um dos justiciáveis faça ouvir a sua voz, trazendo ao decisor a sua perspetiva e, nessa medida, influenciando a decisão.”[2] Tem desde então sido jurisprudência e doutrina assente que o juiz não deve conhecer de questões substancialmente inovadoras nos autos face à forma como as partes configuraram o processo– como uma exceção de conhecimento oficioso que as partes não vislumbraram ou um enquadramento jurídico substancialmente distinto do originalmente perspetivado nos articulados – sem permitir que estas se pronunciem sobre as mesmas, da mesma forma que o tribunal deve facultar às partes a pronúncia em todos os casos em que se não possa considerar que estas não o podiam fazer dentro dos articulados processuais admissíveis. Numa versão ampla, entende-se que “Antes de decidir com base em questão (de direito material ou de direito processual) de conhecimento oficioso que as partes não tenham considerado, o juiz deve convidá-las a sobre ela se pronunciarem, seja qual for a fase do processo em que tal ocorra (despacho-saneador, sentença, instância de recurso» [3] No entanto, nem todas as questões não perspetivadas pelas partes que sejam objeto da decisão exigem a sua prévia audição: delas se afastam as questões que não são centrais á decisão e bem assim aquelas que cabem dentro do âmbito do que é discutido pelas partes, sendo pormenorização ou concretização das questões centrais do litígio que estas ou discutiram ou deviam efetivamente discutir, usando de normal diligência. Entende-se que, nestes casos, as partes tiveram a possibilidade de se pronunciarem sobre elas e que se o não fizeram terão que aceitar as consequências dessa sua omissão, por força do princípio da autorresponsabilidade. Dito de outra forma, “Decisão-surpresa é apenas aquela em que o tribunal se pronuncia sobre e/ou decide algo com que a parte (apesar de competentemente patrocinada), de forma expectável ou previsível, não podia nem devia contar, usando de normal diligência, competência, aptidão e sagacidade.”[4] É verdade que nem sempre é dada a mesma amplitude às exceções que dispensam o juiz de conceder à parte a faculdade de querendo se pronunciar sobre a questão não perspetivada pelas partes[5], mas em regra, que mais não seja, em caso de dúvida, o princípio da cooperação e do contraditório justificam que se postergue a vontade de dar celeridade aos autos contrariando a pausa que resulta da audição das partes, em que se baseia o princípio em causa: o aporte de argumentos fáticos e meios de prova permite uma maior aproximação à justiça material, e o erguer de novos argumentos jurídicos, mesmo que contrários, permite uma maior profundidade na análise da questão e no convencimento quanto ao seu acerto. De qualquer forma, no que toca às exceções dilatórias e à efetivação de um volte-face no enquadramento jurídico face ao que anteriormente se perspetivava nos autos, a jurisprudência e a doutrina são claras, a primeira por força da própria letra do artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil, a segunda mais que não fosse, por força dos princípios da cooperação e da boa-fé. A estas questões cujo conhecimento não era expetável pelas partes, se acrescentam aquelas levantadas em momento em que a parte que com ela é confrontada já se não pode debruçar no âmbito dos articulados e requerimentos processualmente admissíveis: também então se exige que o tribunal faculte ás partes a possibilidade de se pronunciarem. “O lugar próprio da promoção autónoma de pronúncia é, por isso, o das decisões que se pronunciam sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes no processo ou daquelas que tendo sido suscitadas o foram no último articulado possível, impossibilitando a pronúncia ordinária da parte contrária que, assim, há-de ser promovida por outro modo.”[6] É patente o cuidado do Código em manter ativo o contraditório nesta visão mais ampla. Hoje já não se entende o processo como uma discussão entre as partes que o juiz dirime, em posição cimeira (antes se incentiva a colaboração das partes na formação da decisão, influenciando-a diretamente), mas também se não transformou a dialética do processo: “a estrutura do nosso processo civil não prevê que o tribunal “discuta” com as partes o que quer que seja” [7]. Porque o artigo 3º nº 3 do Código de Processo Civil afasta a audição das partes nos casos de manifesta desnecessidade, há que perceber quais são os critérios para apurar dessa desnecessidade. Por um lado, há que atentar na importância da questão para a decisão do pleito: “a audição excecional e complementar das partes, fora dos momentos processuais normalmente idóneos para produzir alegações de direito, só deverá ter lugar quando se trate de apreciar questões jurídicas suscetíveis de se repercutirem, de forma relevante e inovatória, no conteúdo da decisão e quando não for exigível que a parte interessada a houvesse perspetivado durante o processo, tomando oportunamente posição sobre ela”cf Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Volume I, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2004, p. 33. Ou, como refere José Lebre de Freitas, in Introdução ao Processo Civil, 3º ed., Coimbra ed., p. 133: “No plano das questões de direito, o princípio do contraditório exige que, antes da sentença, às partes seja facultada a discussão efetiva de todos os fundamentos de direito em que a decisão se baseie. Tratando-se de um fundamento de direito na disponibilidade exclusiva das partes, a possibilidade de discussão resulta naturalmente da sua invocação (necessária) pelo interessado e do direito de resposta da parte contrária. Mas a proibição da chamada decisão-surpresa tem sobretudo interesse para as questões, de direito material ou de direito processual, de que o tribunal pode conhecer oficiosamente: se nenhuma das partes as tiver suscitado, com concessão à parte contrária do direito de resposta, o juiz – ou o relator do tribunal de recurso – que nelas entenda dever basear a decisão, seja mediante o conhecimento do mérito da causa, seja no plano meramente processual, deve previamente convidar ambas as partes a sobre elas tomarem posição, só estando dispensado de o fazer em casos de manifesta desnecessidade (art. 3-3).” “Só estaremos perante uma decisão surpresa quando, a mesma, comporte uma solução jurídica que as partes não tinham obrigação de prever, quando lhes não era exigível que a houvessem perspetivado no processo.” cf acórdão do Supremo Tribunal de Justiça no processo 602/18.9T8PTG.E1.S1, de 09/08/2020 Mas “O juiz tem o dever de participar na decisão do litígio, participando na indagação do direito – iura novit curia –, sem que esteja peado ou confinado à alegação de direito feita pelas partes. Porém, a indagação do direito sofre constrangimentos endoprocessuais que atinam com a configuração factológica que as partes pretendam conferir ao processo.II - Há decisão surpresa se o juiz de forma absolutamente inopinada e apartado de qualquer aportamento factual ou jurídico envereda por uma solução que os sujeitos processuais não quiseram submeter ao seu juízo, ainda que possa ser a solução que mais se adeqúe a uma correcta e atinada decisão do litígio.III - Não tendo as partes configurado a questão na via adoptada pelo juiz, cabe-lhe dar a conhecer a solução jurídica que pretende vir a assumir para que as partes possam contrapor os seus argumentos.” cf o ao do Supremo Tribunal de Justiça no processo 2005/03.0TVLSB.L1.S1, de 09/27/2011. Enfim, quando na sentença se faça um enquadramento legal totalmente díspar do efetuado pelas partes, que estas não previram nem tinham a obrigação de prever e tal enquadramento é decisivo para o resultado da ação, há que efetuar a audição prévia das partes (sendo caso de escola a verificação da nulidade do contrato quando as partes discutiam o seu incumprimento). “É necessário que o enquadramento legal realizado seja manifestamente diferente do sustentado pelos litigantes. Deverá ser uma subsunção notada pela sua originalidade, pelo seu carácter invulgar e singular, objetivamente considerado …o correcto entendimento do princípio do contraditório não reclama que, a todo o tempo, o tribunal ausculte as partes sobre a decisão a tomar, só o devendo fazer quando preveja que esta se filiará em fundamentos fácticos ou jurídicos que aquelas não anteviram nem poderiam antever”: cfr acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 06/30/2022 no processo 199/21.2T8EPS.G1. Postas estas reflexões, estamos em condições de verificar se no presente caso houve violação do princípio do contraditório. . - concretização A Autora fundou o seu pedido na titularidade de um direito de crédito sobre a Ré consistente na retenção por esta de parte do preço devido à Autora pela realização de determinadas obras. Retenção esta efetuada como caução, a título de garantia, por 10 anos, da conformidade da obra. A Ré excecionou a compensação operada por acordo escrito pelo qual as partes intervenientes expressamente se pagaram mutuamente com tais créditos, extinguindo-os. A Autora, em resposta, defendeu a nulidade desse acordo, por simulação. Referiu, também, juntando documentos que não foram impugnados, que a Ré foi notificada no dia 18 de junho de 2018 para penhora do crédito referente às retenções feitas à P..., o que invoca para demonstrar que a Ré conhecia a situação de insolvência da Autora. Na sentença, com base nos documentos apresentados, foi levada á matéria de facto provada a realização dessa penhora, a sua notificação á ora Ré, na qualidade de devedora da sociedade de que a Autora é massa insolvente, e a resposta que esta apresentou a tal notificação (pontos 73 a 75 da matéria de facto provada). Na fundamentação, a sentença considera que esta penhora determinou a inoponibilidade do acordo compensatório relativamente a tal parte do crédito também aqui exigido pela Autora, com base nos artigos 819º e 820º do Código Civil, da qual beneficia também a insolvência ao integrar na apreensão tal crédito e por isso considerou que nesta parte o acordo compensatório não operou. E condenou a Ré no valor que havia sido objeto da penhora, absolvendo do mais, por considerar que o referido acordo compensatório produziu efeitos na parte restante. Nenhuma das partes atentou na inoponibilidade determinada pela penhora, levantou esta questão ou pensou que a mesma era um impedimento à eficácia do acordo compensatório em que se baseou a contestação para afastar a condenação da Ré. Não era exigível às partes que atentassem nesses efeitos da penhora na disponibilidade dos créditos penhorados, visto que, não obstante ter sido considerado na sentença como um dos pilares centrais para a procedência parcial da ação, se afasta já muito do cerne da causa de pedir em que a Autora fundou o seu pedido. Enfim, as partes não tinham a obrigação de prever esta solução jurídica, exposta na sentença em termos totalmente inovatórios, considerando facto trazido pelas partes para determinado efeito como produzindo um outro não esperado por estas. Assim, atenta a centralidade da questão dos efeitos da penhora na condenação da Ré, trazida como fundamento para a condenação de forma surpreendente na sentença, sem que as partes a tivessem configurado ou a obrigação de a prever, entende-se que efetivamente ocorreu a violação do princípio do contraditório e da cooperação, por o tribunal ter conhecido de questão de direito sem ter dado às partes a possibilidade de para tanto se pronunciarem previamente. .2- Consequências da violação do dever de facultar às partes a pronúncia sobre a questão (surpresa) conhecida e sua impugnação Parece claro que quando o tribunal, antes de proferir decisão, não convida as partes a pronunciarem-se sobe uma questão determinante para a mesma e o devia fazer, por estas não terem tido a oportunidade de se lhe referirem, omite um ato que a lei prescreve e que pode influir no exame da causa, contendendo com o princípio do contraditório. Enfim, comete uma nulidade processual, por não ter seguido todos os trâmites previstos para a prolação dessa decisão. Podemos considerar que estamos perante uma nulidade secundária, como tem sido defendido pela doutrina dominante, a qual põe em causa todos os atos que dele dependem diretamente. No entanto, a preterição desse ato é cometida com a prolação da decisão. Há que ter em conta, face ao esgotamento do poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa após a prolação da sentença (artigo 613º nº 1 do Código de Processo Civil, aplicável aos despachos por força do seu nº 3), princípio básico no nosso Código, que “se há um despacho a ordenar ou autorizar a prática ou omissão do ato ou da formalidade, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade que se tenha cometida, não é a arguição da nulidade, mas sim a impugnação do respetivo despacho mediante a interposição do competente recurso”[8], sob pena de se permitir que o juiz se voltasse a pronunciar sobre matéria sobre a qual já se havia debruçado e decidido. Mas há situações em que uma decisão não aprecia diretamente sobre se se verificou ou não uma nulidade, embora se possa considerar que a acoberte: aqui se tem colocado a possibilidade de reclamar da nulidade ou recorrer da decisão.[9] Mostra-se já ultrapassada a ideia, mais exigente para as partes e mais formalista, que entendia que tal nulidade, por não ser de conhecimento oficioso, se tinha por sanada se não fosse invocada pelo interessado no prazo de 10 dias após o seu conhecimento: sendo a nulidade em causa criada pela própria prolação da decisão, nada obsta a que a mesma seja invocada e conhecida em sede de recurso da decisão, na medida em que a parte se insurge contra a mesma e a decisão acoberta, deu causa ou partilha da violação da lei (pelo menos quando devia ter conhecido da nulidade, se for de conhecimento oficioso). É já ideia pacífica que nada obsta a parte se centre na própria decisão, recorrendo da mesma, por constituir em si um ato violador da lei. Esta ideia funda-se no brocardo “das nulidades reclama-se, das decisões recorre-se”, fundado na extinção do poder jurisdicional com a prolação da decisão. É, assim, entendimento maioritário que no caso das decisões surpresa “a nulidade processual cometida está a coberto da decisão judicial que se lhe seguiu” pelo que esta pode ser objeto de recurso e aquela deve ser conhecida pela Relação. Assim, entendemos que a violação da lei em que a sentença incorreu, por ter retirado à parte a possibilidade de se pronunciar, ao ser proferida, violando o princípio do contraditório expresso no artigo 3º nº 3 do Código de Processo Civil, exige a revogação da decisão. Torna-se, pois, impossível apreciar as demais questões levantadas pelo Recorrente. Termos em que procede o recurso por a decisão recorrida ter violado o principio do contraditório, devendo a sentença ser substituída por despacho que determine o seu cumprimento e prosseguindo os autos os seus termos. V- Decisão Por todo o exposto, julga-se procedente a primeira parte da apelação interposta e em consequência revoga-se a decisão recorrida. Custas pelos Recorridos. Guimarães, 7/6/2023. Sandra Melo Conceição Sampaio Fernanda Proença Fernandes [1] Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Conceito e Princípios Gerais à Luz do Código Revisto, 3.ª edição, Coimbra Editora, 2013, pp. 124-125. [2] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10/10/2019, no processo 26411/11.8T2SNT-D.L1-6, (sendo este e todos os demais acórdãos citados sem menção de fonte, consultados in dgsi.pt com a data na forma ali indicada: mês/dia/ano) [3] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, 3ª edição, Coimbra Editora, setembro de 2014, p. 9. [4] Acórdão de 05/21/2020 ,no processo 1426/19.1T8VCT.G1. [5] Exemplos de acórdãos com uma visão mais exigente no que toca ao dever de previsão das questões em debate no processo, cf. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 01/23/2018, no processo 34/16.3YFLSB, de 03/11/2010 no processo 1860/07.0TVLSB.S1, de 06/04/2009, no processo 09B0523, e de 06/17/2014, no processo 233/2000.C2.S1, estes últimos afastando a aplicação direta da doutrina alemã ao nosso sistema jurídico. [6] acórdão de 09/10/2020 no processo 12841/19.08T8LSB.L2-6 [7] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/17/2014, no processo 233/2000.C2.S1 [8] Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, II, Coimbra Editora, pag 507-508. [9] Temos para nós, que as partes podem escolher qualquer das vias, quando tal pronúncia efetuada no despacho não é clara: reclamar da causa ou recorrer da decisão que (implicitamente ou por omissão) lhe deu cobertura. Admitir a arguição da nulidade processual que a decisão não aprecia, nem conhece (mas se considera que implicitamente pode acobertar) não coloca em causa o princípio do esgotamento do poder jurisdicional, visto que a decisão que será anulada por força da omissão processual cometida não decidiu sobre a existência ou não dessa nulidade; por outro lado tal decisão não transita enquanto a nulidade não for apreciada (neste sentido os acórdãos nos processos nºs 3439/09.2TBBRG-A.G1 e 216/16.8T8VNF.G2, com mais detalhe) |