Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | EVA ALMEIDA | ||
Descritores: | CITAÇÃO CITAÇÃO POR VIA POSTAL | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 01/25/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 2.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | I - Na citação por via postal, a aposição de data no aviso de recepção é útil para a aferição pelo Tribunal e pelas partes, do cumprimento dos prazos para contestar, sendo certo que, actualmente, com a possibilidade de, através do número do registo/código de barras, se obter a data de entrega da carta (pesquisa de objectos na página online dos Correios), tal informação, omitida no aviso de recepção, poder ser prontamente suprida por este meio ou, de forma mais morosa, por informação solicitada por escrito aos serviços postais. II - A carta de advertência prevista no art.º 233º do CPC não é condição da citação nem do início da contagem do prazo da contestação. III - Constando dessa carta que a citação se considerava efectuada na data da assinatura do aviso de recepção, de que se anexou cópia, e sendo este omisso neste ponto, a citação considera-se efectuada na data em que se comprovar ter sido a carta entregue a quem assinou o aviso de recepção, competindo ao citando alegar e provar que não lhe foi entregue no prazo que a lei lhe confere de dilação em razão da citação não ter sido efectuada na sua pessoa. IV – Sendo os réus casados e residindo na mesma morada, tendo as cartas sido entregues e os avisos de recepção assinados pelo réu marido na mesma ocasião, e sendo igual o prazo para contestarem, apenas acrescendo a dilação de 5 dias em virtude da ré mulher ter sido citada por carta entregue ao réu marido, não tendo sido alegado que este não lhe entregou prontamente a carta, o facto de, no aviso de recepção da carta da ré mulher, não constar (ou não ser perceptível) a data em que aquele o assinou, não prejudicou a defesa de ambos. V – A circunstância do requerimento apresentado pelos réus, no sentido do prazo para contestarem se contar da data da carta enviada nos termos do art.º 233º do CPC (advertência ao citando), não ter sido apreciado pelo Tribunal antes do termo do prazo para contestarem, não equivale a um deferimento tácito do requerido. Nem tal requerimento tinha a virtualidade de suspender o prazo em curso (art.º 138º do CPC). | ||
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO Nos autos de acção declarativa, com processo comum, instaurada por Maria e que prossegue com os seus herdeiros habilitados, os réus José e Joana, citados por carta registada com aviso de recepção, requereram, em 25.10.2016, que seja considerada efectuada a citação da ré mulher em 4 de Outubro, correndo a partir daí o prazo para contestarem. Alegaram, para tanto e em síntese, que o réu marido foi citado por carta registada no dia 26 de Setembro de 2016, mas a ré mulher foi citada em momento posterior, tendo sido o réu marido a apor a assinatura no aviso de recepção, em data exacta que desconhece, por dele não constar, constando apenas a data em que o mesmo devolvido ao Tribunal, nele seu entrada (4 de Outubro), não conseguindo assim aferir em que data se considera citada. * Os réus apresentaram-se a contestar a acção em 8.11.2016.Os autores arguiram a extemporaneidade da contestação. * Proferiu-se então o seguinte despacho:– Resulta da informação dos Correios de fls. 48 que os réus foram citados a 26.09.2016. Note-se que ambos os réus foram citados na mesma morada e na pessoa do réu José (cfr. fls. 11 e 13), sendo certo que os próprios réus admitem que o réu foi, efectivamente, citado naquela data (cfr. requerimento de fls. 14 e seguintes).Acresce que os réus de nenhuma forma alegaram ou comprovaram que a carta de citação da ré não lhe foi oportunamente entregue pelo réu, que a recebeu, por forma a ilidirem a presunção decorrente do artigo 230.º, n.º 1 do Código de Processo Civil. Ademais, diga-se, que a circunstância de não se revelar perceptível a data do carimbo aposta no aviso de recepção da citação da ré mostra-se absolutamente irrelevante, porquanto tal aviso de recepção não se destina às partes, mas ao Tribunal. De todo o modo, conforme se assinalou já, os competentes serviços postais informaram o Tribunal que os réus foram citados a 26.09.2016, pelo que, nos termos do disposto no artigo 230.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, a citação considera-se efectuada nessa data. Ora, não tendo a citação da ré sido efectuada na pessoa desta (cfr. fls. 11), ao prazo de trinta dias para a apresentação da contestação, acresceu uma dilação de cinco dias (cfr. artigos 245.º, n.º 1, alínea a), e 569.º ambos do Código de Processo Civil). O prazo para a apresentação da contestação terminou, assim, no dia 31.10.2016. Compulsados os autos, constata-se que os réus apresentaram a respectiva contestação a 08.11.2016. Concluímos, assim, ser legalmente inadmissível, por manifestamente extemporânea, a contestação apresentada. Em face do exposto, decide-se considerar não escrita e de nenhum efeito a contestação apresentada nos autos pelos réus. Notifique e anote o ora decidido no local próprio. Após, dê cumprimento ao disposto no artigo 567.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.» * Inconformados, os réus interpuseram o presente recurso, que instruíram com as pertinentes alegações, em que formulam as seguintes conclusões:– «1. Considerou a Mm.ª Juiz a quo ser a contestação apresentada pelos Réus, marido e mulher, ora Recorrentes, manifestamente extemporânea, afirmando que “O prazo da contestação terminou, assim, no dia 31.10.2016, já que, “(…) os competentes serviços postais informaram o Tribunal que os réus foram citados a 26.09.2016, pelo que, nos termos do disposto no art. 230.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, a citação considera-se efectuada nessa data.” 2. Tal entendimento, que merece a total discordância dos Recorrentes, escamoteou, de forma plena, toda a factualidade subjacente, bem como todas as irregularidades que por diversas vezes, e em momentos distintos, foram expostas pelos Réus, nomeadamente no que concerne à citação da Recorrente mulher; 3. Ambos os Recorrentes foram citados na mesma morada, circunstância natural derivada do seu matrimónio, tendo ambas as citações sido efetuadas na pessoa do Recorrente marido; 4. Em virtude de tal facto, o prazo de trinta dias para apresentar contestação, previsto no art. 569.º, n.º 1 do CPC foi acrescido de uma dilação de cinco dias, nos termos do previsto no art. 245.º, n.º 1, al. a) do CPC, já que a citação foi realizada em pessoa diversa da Recorrente mulher; 5. Prevê o art. 569.º, n.º 2 do CPC que, em caso do término do prazo de defesa de vários réus em dia distinto, o prazo que termine em último lugar aproveita aos restantes; 6. À luz de tal normativo, revelava-se a referida dilação de extrema importância para ambos os Recorrentes, pois alargava o seu prazo para apresentar defesa, permitindo uma melhor organização e preparação da mesma; 7. Analisados os avisos de receção assinados, de imediato se constatou que no respeitante à citação da Recorrente mulher se encontrava em falta a aposição da data em que o mesmo tinha sido assinado, como facilmente se comprova através da análise do mesmo, junto aos auto (vide Doc.1); 8. A ausência de tal indicação provocava inegável prejuízo à defesa dos Recorrentes, já que impedia o cálculo correto do prazo para apresentar contestação, sendo que o prazo de trinta dias apenas começa a correr após a citação, que se considera feita “(…) no dia em que mostre assinado o aviso de receção (…)”; 9. Como facilmente se compreende, e à luz dos mais elementares critérios de lógica, desconhecendo, com certeza, a data em que foi realizada a citação, revela-se impossível determinar com exatidão a data em que termina o prazo para apresentar contestação; 10. Toda a factualidade narrada foi, desde o início, do conhecimento do Tribunal a quo, já que os Recorrentes, por via de requerimento datado de 25 de Outubro de 2016, expuseram toda a situação supra referenciada, terminando por requerer que fosse a citação considerada feita na data de 04 de Outubro de 2016, única data legível constante do aviso de receção assinado, e portanto única data de conhecimento dos Recorrentes, nomeadamente, da Recorrente mulher (vide Doc. 2); 11. Tal requerimento, de forma absolutamente incompreensível, nunca mereceu qualquer tipo de resposta da parte do Tribunal, quer deferindo, quer indeferindo o requerido; 12. De igual forma, apenas na data de 27 de Dezembro de 2016, dois meses após tal requerimento, e em momento em que se encontravam já ultrapassados todos os prazos de defesa, em momento foram oficiados os competentes serviços dos Correios, por forma a conseguir esclarecer toda a questão. 13. Nos termos da lei processual civil, “Incumbe à secretaria promover oficiosamente, sem necessidade de despacho prévio, as diligências que se mostrem adequadas à efectivação da regular citação pessoal do réu e à rápida remoção das dificuldades que obstem à realização do ato (…) – art. 226.º/1 do CPC, sendo um dever da secretaria do Tribunal assegurar “(…) o expediente, autuação e regular tramitação do processo (…) em conformidade com a lei de processo e na dependência funcional do magistrado competente” – art. 157.º/1 do CPC, sempre sendo certo que “Os erros e omissões dos atos praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes”, como prevê o art. 157.º, n.º 4 do CPC; 14. Tendo em atenção tais normativos, mais incompreensível se torna a total ausência de resposta ao requerimento apresentado pelos Recorrentes em 25 de Outubro de 2016, dada a importância da questão suscitada, bem como os dois meses decorridos entre a apresentação do mencionado requerimento e o ofício enviado pela secretaria do Tribunal aos Correios no sentido de esclarecer toda a dúvida levantada; 15. Se tal informação tivesse sido obtida em tempo útil, e transmitida aos Recorrentes, como impõe a lei, e a questão da extemporaneidade nunca seria, sequer, levantada, já que a apresentação de tal requerimento precedeu, inclusive, a apresentação da contestação; 16. Atendendo à completa ausência de informações e esclarecimentos da parte do Tribunal, perante uma inércia completamente incompreensível, e apesar dela, e sem outra forma de obter os devidos esclarecimentos, não tiveram os Recorrentes melhor solução que não a de apresentar a sua contestação dentro do prazo calculado à luz da única data para eles conhecida, por ser a única legível no aviso de recepção – 04 de Outubro de 2016; 17. A apresentação da contestação na data de 08/11/2016 não levantou qualquer questão da parte do douto Tribunal a quo, mormente no que concerne à extemporaneidade; 18. Não é despiciendo apontar que a contestação em questão foi apresentada perfeitamente em prazo, se o mesmo for calculado a partir da única data legível, de todas das que se encontram apostas no Aviso de Receção em análise; 19. Na sequência de douto despacho de 13 de Setembro de 2017, os Recorrentes expuseram, mais uma vez, toda a factualidade e fundamentação de direito que motivou a apresentação da contestação em tal data; 20. Assim expondo, mais uma vez, de forma clara, a sua total ausência de responsabilidade em tal apresentação tardia, à luz de tudo o alegado; 21. Não deixa de causar a mais viva surpresa e estupefacção em face do teor do despacho que declara manifestamente extemporânea a sua contestação, já que o mesmo ignora por completo toda a factualidade vertida pelos Recorrentes, nomeadamente, no que concerne à irregularidade da citação realizada. 22. Tivesse tal factualidade sido tida em conta, e inegavelmente teria o teor da douta decisão de que ora se recorre sido integralmente distinto, e sem dúvida mais conforme com a verdade material. Aliás, tendo o primeiro requerimento dos Recorrentes merecido a devida atenção, e facilmente teria sido suprida tal ausência de informação, em tempo útil, nomeadamente, oficiando os serviços postais, e juntando a informação assim obtida aos autos. 23. Afirma a Mm.ª Juíz a quo, em determinado passo do seu despacho, que “Ademais, diga-se, que a circunstância de não se mostrar percetível a data do carimbo aposta no aviso de receção da citação da ré mostra-se absolutamente irrelevante, porquanto tal aviso de receção não se destina às partes, mas ao Tribunal.”; 24. Ora, e salvo o devido respeito, tal interpretação revela-se errónea, não merecendo tal posição a concordância dos Recorrentes; 25. A citação é definida, no art. 219.º, n.º 1 do CPC como “(…) o acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao processo para se defender; (…)”, postulando o n.º 3 do mesmo artigo que “A citação e as notificações são sempre acompanhadas de todos os elementos e de cópias legíveis dos documentos e peças do processo necessárias à plena compreensão do seu objecto.”; 26. Revela-se inegável que o conhecimento da data em que se mostra assinado o aviso de recepção se revela, assim, um elemento da maior importância, influindo diretamente na defesa dos réus contrariamente ao proferido pela Mm.ª Juiz a quo; 27. Primeiramente, porque, como já dito supra, o prazo para contestação começa a correr a partir do momento da citação dos réus, dispondo o o art. 230.º, n.º1 do CPC que, nos casos em que a citação é efetuada por via postal, a mesma considera-se feita “(…) no dia em que se mostre assinado o aviso de receção (…)”; 28.Sendo desconhecido o dia de assinatura do aviso de rececção, em virtude de tal data não se encontrar aposta no mesmo, como foi o caso, revela-se impossível calcular com exatidão qual o término do prazo para apresentar a contestação, com o que acarreta prejuízo grave para a defesa dos Recorrentes; 29. Dispõe a alínea a) do artigo 233.º do CPC que, caso a citação se mostre efectuada em pessoa diversa do citando, deverá ser enviada, pela secretaria do Tribunal, a data e o modo por que o ato se considera realizado; 30. Tal comunicação foi, de facto, enviada para a aqui Recorrente esposa, firmando na dita a seguinte expressão: “fica V. Ex.ª notificado de que se considera citado na pessoa e na data da assinatura do Aviso de Receção de que se junta cópia”; 31. Contudo, tal menção revela-se nada mais do que uma remissão vazia, tendo em conta, reitera-se, a omissão da data de assinatura do aviso de receção junto aos autos, não se encontrando, por isso mesmo, cumprido o que se estatui na alínea a) do artigo 233.º do CPC; 32. A jurisprudência emanada dos Tribunais superiores vem dar acolhimento ao entendimento dos Recorrentes, tendo o Tribunal da Relação do Porto, em Acórdão de 15/04/2010, referente ao processo 2544/08.7TJPRT.P1, afirmado que “a expedição da carta registada a que se refere o art. 241.º do CPC [actual 233.º do CPC] está longe de ser uma inutilidade; se o fosse não teria consagração legal nem se justificava o reforço da exigência de carta em dois dias úteis após a citação”, e que “caso a caso se deverá observar quando é que a preterição de formalidades relacionadas com a dita carta registada acarreta a possibilidade de afetação da defesa do citado e a anulação do ato.”; 33. In casu, verifica-se que a formalidade descrita não foi plenamente cumprida, dada a remissão que é feita para um Aviso de Recepção em que a data de assinatura se encontra por preencher e que o carimbo dos Serviços se revela ilegível, sendo apenas decifrável a data de receção do Aviso de Recepção aquando da sua devolução ao Tribunal a quo; 34. A consideração de qualquer uma das datas ininteligíveis para efeitos de contagem dos prazos de defesa revela-se altamente prejudicial para a defesa dos Réus, pelo que forçosamente teremos de concluir que a defesa do citado se encontra prejudicada; 35. Foi à luz de tal raciocínio, e com o fundado receio de ver a sua defesa prejudicada, que os RR. requereram ao Tribunal a quo a apreciação destes factos, como já se repetiu até aqui ex abundantia, não tendo obtido uma resposta senão quando tal resposta era, com o devido respeito, inútil; 36. As diligências prosseguidas pela secretaria do Tribunal a quo, que apenas no dia 20 de dezembro de 2016 (mais de dois meses após a submissão do requerimento dos Recorrentes), enviou ofício ao departamento de Apoio a Clientes e Negócio dos Correios, requerendo a consulta nas bases de dados da referida entidade, revelam-se tardias e inócuas, uma vez que à data de envio do pedido de informações, já quaisquer prazos de defesa se encontrariam ultrapassados; 37. Mais uma vez se repete o teor do art. 157.º, n.º 6 do CPC: “Os erro e omissões dos atos praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes.”; 38.O Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão de 30 de Março de 2017, cujo Juiz Relator foi o Dr. Abrantes Geraldes, pronunciou-se sobre uma situação com contornos semelhantes, em que se discutia a clareza da data aposta por agente de execução, na situação prevista pelo artigo 231.º do CPC (Citação por agente de execução ou funcionário judicial); 39. Mesmo sabendo que, nesse caso, se discutia uma citação por um agente de execução, a analogia com o caso sub judice é notória, residindo a mesma no facto de a data que se encontra aposta na nota de citação ser ilegível; 40. Com relevância para a causa, foi proferido pelo STJ que “os actos processuais que hajam de ser reduzidos a escrito devem ser redigidos de modo que o seu teor se mostre inequívoco, o que é especialmente relevante quando se trata da citação do réu (art. 131º, nº 3, do CPC)”, que “a ilegibilidade ou a falta de clareza da nota de citação deve ser apreciada sob a perspectiva do destinatário confrontado com o texto que lhe foi entregue, e não de forma genérica, por comparação grafológica desse documento com outros documentos elaborados pelo mesmo agente de execução que efectuou a citação” e que “os erros ou deficiências dos actos processuais, incluindo os praticados por agentes de execução, não podem prejudicar as partes (art. 157º, nº 6, do CPC)” (pontos III., V. e VI. do sumário do Acórdão referenciado, sublinhado nosso); 41. No mesmo Acórdão, propugna o STJ ainda, no que concerne com a menção da data na nota de citação, que “sem dúvida que era indispensável que essa indicação [da data] fosse feita de modo legível e inteligível, a fim de habilitar os interessados a apreender, sem riscos de ambiguidade oude incerteza, os elementos decisivos para o exercício atempado do direito de defesa” e que “era invocável pelo citado a falta de clareza do teor da nota de citação se e na medida em que a mesma deixasse transparecer dúvidas acerca do seu conteúdo, com reflexos no exercício oportuno do seu direito de defesa.” (sublinhados nossos); 42. É inegável a semelhança entre o caso sub judice e o acórdão referido: em ambos se invoca, como ponto fundamental, a falta de clareza da data em que a citação foi efectuada; 43. No douto Acórdão afirma-se ainda que “as exigências são especialmente rigorosas no que respeita ao acto de citação, tal o seu relevo processual e as suas repercussões na esfera jurídica do demandado, (…) de tal modo que, perante irregularidades susceptíveis de interferir, em abstracto, no exercício do direito de defesa, se privilegiava a repetição da diligência, afastando, ainda que por excesso, o risco de ser proferida decisão à revelia do demandado. Já para os casos em que a irregularidade se traduzisse na concessão de um prazo superior ao legalmente previsto, a ordem que emanava do art. 198º, nº 3 (art. 191º, nº 3, do NCPC), era a de considerar tempestiva a prática do acto dentro desse prazo, num sinal claro de que os erros de terceiros não deveriam prejudicar o exercício do direito de defesa, como se estabelecia na norma geral do art. 161º, nº 6 (art. 157º, nº 6, do NCPC) (…), no pressuposto de que o direito processual deve assegurar, sem qualquer dúvida, o exercício dos direitos conferidos às partes, com especial destaque para os que rodeiam o exercício do direito de defesa” (sublinhado nosso); 44. Conclui o STJ ao afirmar que “é a segurança e a certeza que devem ser privilegiadas num campo em que se trata de apreciar a multiplicidade de actos em que se desdobra a citação do réu, sem olvidar de modo algum o nível de exigência que o legislador impôs relativamente ao primeiro e principal acto destinado a proporcionar o exercício do direito de defesa. 45. Nesta perspectiva, a detecção de uma situação geradora de ambiguidade susceptível de influir no exercício tempestivo do direito de defesa do demandado não deve reverter contra si, mas a seu favor. (…) 46. Na dúvida – e trata-se, como as instâncias os reconheceram, de uma dúvida objectiva – a solução deve pender para os RR. que, aliás, tiveram a iniciativa de confrontar o tribunal de 1ª instância logo que apresentaram as contestações e que, quando foram confrontados com as objecções apresentadas pela A., trouxeram aos autos o elemento de que dispunham e no qual sustentaram a tempestividade do acto de defesa a partir de uma determinada data permitida por uma leitura da nota de citação que fora entregue ao R. DD.” (sublinhado nosso); 47. Os Recorrentes aderem, na íntegra, ao entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal de Justiça mais uma vez se apontando a natureza análoga com a situação em discussão, tendo em conta que no caso em apreço também a data da notificação se considera ilegível, situação idónea a interferir no exercício do direito de defesa dos aqui Recorrentes – como veio, aliás, a acontecer–, e que esta questão foi igualmente suscitada pelos Réus citados, ainda antes de apresentar a sua contestação dentro do prazo contado a partir da única data que consta do Aviso de Recepção junto aos autos e anexo à comunicação a que se refere o artigo 233.º do CPC (cfr. documento 1). 48. Coincide, assim, o entendimento dos Requerentes com o do Supremo Tribunal de Justiça no passo em que refere que “a detecção de uma situação geradora de ambiguidade susceptível de influir no exercício tempestivo do direito de defesa do demandado não deve reverter contra si, mas a seu favor”; 49. Sustentando, nesse sentido, que a data que deve ser considerada para contagem dos prazos para o exercício do direito de defesa dos aqui Recorrentes, deve ser a única que é legível e percetível no aviso de receção junto com a comunicação prevista no artigo 233.º do CPC. 50. Assim sendo, e tendo em consideração o impacto que a preterição das formalidades enumeradas no artigo 233.º tem no exercício do direito de defesa dos Réus, aqui Recorrentes, e atendendo ao facto de que a única data que se encontra legível na comunicação enviada pelo Tribunal é o dia em que o Aviso foi recebido pelo Tribunal, sem esquecer, contudo, o requerimento entregue com vista ao esclarecimento da questão, apresentado em prazo que permitiria aos Réus contestar (no prazo que o Tribunal a quo ora vem esclarecer), não poderemos deixar de pugnar, na senda do que foi defendido no Acórdão do STJ referido, pela aceitação da contestação apresentada pelos Réus, aqui Recorrentes, no prazo calculado a partir da data que lhe era cognoscível, desta forma assegurando que a sua defesa não seja prejudicada em virtude de um erro que lhes não é imputável. NESTES TERMOS, E NOS MELHORES DE DIREITO, QUE V. EXAS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO, REVOGANDO O DESPACHO RECORRIDO NA PARTE EM QUE DECLARA A CONTESTAÇÃO APRESENTADA INADMÍSSIVEL,POR MANIFESTAMENTE EXTEMPORÂNEA» * Não foram apresentadas contra-alegações* O processo foi remetido a este Tribunal da Relação, onde o recurso foi admitido nos termos em que o fora na 1ª instância.Colhidos os vistos, cumpre decidir. II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A DECIDIR. O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da apelante, tal como decorre das disposições legais dos artºs 635º nº4 e 639º do CPC, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso (art.º 608º nº2 do CPC). A única questão a decidir é a da (in)tempestividade da contestação. III - FUNDAMENTOS DE FACTO Os factos com interesse para a apreciação deste recurso são os seguintes: 1º Os réus são casados e têm residência comum. 2º. Foram citados por cartas registadas com aviso de recepção (registos/códigos RE0769….PT e RE076968…PT) enviadas para a morada comum. 3º As cartas foram recebidas pelo réu marido, no dia 26.9.2016, que assinou os dois avisos de recepção (fls. 31 e 32), com a declaração, no tocante à carta destinada à ré mulher, de a entregar prontamente ao destinatário. 4º Em 4.10.2016 o Tribunal expediu carta registada à ré (art.º 233º do CPC), notificando-a de que se considerava citada na sua pessoa e na data da assinatura do aviso de recepção de que se juntava cópia (…) que o prazo para contestar era de 30 dias, a que acrescia a dilação de 5 dias por a citação não ter sido efectuada na sua pessoa. 5º No aviso de recepção, de que se enviou cópia à ré, não constava ou não era legível a data em que o aviso de recepção foi assinado. Motivação: A prova destes factos resulta dos documentos juntos aos autos a fls. 31, 32, 50 deste apenso ou porque foram admitidos pelos réus nos artºs 2º e 3º, última parte, do respectivo requerimento de 25.10.2016. Os réus aceitaram que são casados e têm residência comum na própria procuração conjunta, que consta nos autos, conferindo poderes forenses aos advogados que os patrocinam. IV – FUNDAMENTOS DE DIREITO Estabelece o art.º 225º do CPC que a citação pessoal pode ser efectuada mediante entrega ao citando de carta registada com aviso de recepção (…) e que “nos casos expressamente previstos na lei, é equiparada à citação pessoal a efectuada em pessoa diversa do citando, encarregada de lhe transmitir o conteúdo do acto, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento. Concretizando as formalidades e requisitos da citação de pessoa singular por via postal, diz-nos o art.º 228.º: – «1 - A citação de pessoa singular por via postal faz-se por meio de carta registada com aviso de recepção, de modelo oficialmente aprovado, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho, incluindo todos os elementos a que se refere o artigo anterior e ainda a advertência, dirigida ao terceiro que a receba, de que a não entrega ao citando, logo que possível, o faz incorrer em responsabilidade, em termos equiparados aos da litigância de má fé. 2 - A carta pode ser entregue, após assinatura do aviso de recepção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando. 3 - Antes da assinatura do aviso de recepção, o distribuidor do serviço postal procede à identificação do citando ou do terceiro a quem a carta seja entregue, anotando os elementos constantes do cartão do cidadão, bilhete de identidade ou de outro documento oficial que permita a identificação. 4 - Quando a carta seja entregue a terceiro, cabe ao distribuidor do serviço postal adverti-lo expressamente do dever de pronta entrega ao citando. (…)» Sempre que a citação se mostre efectuada em pessoa diversa do citando, o art.º 233º impõe ainda o envio, neste caso pela secretaria, no prazo de dois dias úteis, de carta registada ao citando, comunicando-lhe: a) A data e o modo por que o acto se considera realizado; b) O prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta; c) O destino dado ao duplicado; d) A identidade da pessoa em quem a citação foi realizada Por seu turno art.º 230.º, sobre a data e valor da citação por via postal, diz-nos que a citação postal efectuada ao abrigo do artigo 228.º se considera feita no dia em que se mostre assinado o aviso de recepção e tem-se por efectuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário. Nenhuma destas normas impõe que do aviso de recepção conste a data em que foi assinado, embora, especialmente para o Tribunal, a aposição dessa data seja útil para a verificação do cumprimento dos prazos estabelecidos para a contestação, sendo certo que, actualmente, com a possibilidade de através do número do registo/código de barras se efectuar a pesquisa online da data de entrega da carta pelos Correios, nem sequer é necessário notificar tal serviço para fornecer a informação, que a própria página dos Correios fornece e certifica, bastando inserir as letras e algarismos que se encontram por baixo do código de barras, o que nem sequer constitui novidade, pois, a ora relatora recorreu por diversas vezes a esta página dos Correios, quando, ainda na 1ª instância e por isso há mais de 8 anos, se levantavam dúvidas deste género ou, v.g., sobre a notificação de algum interveniente, imprimindo a informação e inserindo-a no processo (1). Contudo, no caso de citação efectuada em pessoa diversa do citando, o art.º 233º impõe que na carta a enviar ao citando conste a data em que o acto se considera realizado. No caso em apreço tal informação, que deveria constar da referida carta, não pode ser suprida com a remissão para o aviso de recepção, ainda que cópia do mesmo tenha sido enviada, pois deste não constava (ou não era perceptível) tal data. Como se refere no acórdão do TRP de 15-04-2010 (proc. 2544/08.7TJPRT.P1), publicado em dgsi.pt, “Não sendo hoje considerada pela lei uma formalidade essencial, a expedição da carta registada a que se refere o art.º 241º do CPC está longe de ser uma inutilidade; se o fosse não teria consagração legal nem se justificava o reforço da exigência de envio de carta em dois dias úteis após a citação).” Mas, prosseguindo, este mesmo acórdão, em que aliás os apelantes sustentam as suas alegações, também refere, que, “caso a caso se deverá observar quando é que a preterição de formalidades relacionadas com a dita carta registada acarreta a possibilidade de afectação da defesa do citado e a anulação do acto”. Sendo que a concreta situação aí apreciada tem contornos bem diversos da presente, pois se trata de citação por afixação de nota e a carta a que se refere o art.º 233º só foi expedida depois de terminado o prazo para contestar. Assim, não se pode concluir automaticamente, que a não indicação da data em que o aviso foi assinado prejudica a defesa dos réus e, muito menos que, como os mesmos requerem, o prazo para contestar se deva contar da data da carta de advertência, enviada em cumprimento do disposto no art.º 233º do CPC Com efeito, a carta de advertência não é condição da citação nem do início da contagem do prazo da contestação, mas, apenas, uma preocupação suplementar do legislador em pretender informar o citado de que o foi, tendo como efeito útil, por exemplo, o de lhe dar conhecimento de quem recebeu a citação, em que data e de que forma (2). No caso em apreço as duas citações foram efectuadas no mesmo dia e hora (em simultâneo). O réu marido tinha o dever de entregar prontamente a carta à ré mulher e tinha perfeito conhecimento da data em que assinou o aviso de recepção, presumindo-se, salvo prova em contrário (que compete ao citando), que foi entregue nesse mesmo dia (prontamente), pois a lei já contempla uma dilação de 5 dias, quando a citação é efectuada em terceira pessoa, precisamente para compensar algum atraso. Em parte alguma a ré alega a data em que a carta lhe foi entregue, sendo que, de boa-fé, apenas poderia requerer que o prazo contasse a partir dessa data (em que a carta lhe foi entregue) e não a partir da data da carta prevista no art.º 233º. O que ambos requerem, a coberto do lapso de não ter sido aposta, nem pelo réu que o assinou, nem pelo funcionário dos Correios, a data dessa assinatura, é que o Tribunal lhes conceda a ambos, porque o prazo da ré também aproveita ao réu, outra dilação, a acrescer á prevista na Lei, agora de mais 8 dias. Destarte, o requerimento que apresentaram – em que aliás não arguíram expressamente qualquer nulidade da citação ou nulidade processual – a corresponder ao exercício de um direito (que não se lhes reconhece), sempre o seria de forma anómala e abusiva. O facto do requerimento que apresentaram em 25.10.2016 só ter sido apreciado pelo Tribunal depois do termo do prazo para contestarem (ocorrido escassos 6 dias depois), não equivale a um deferimento tácito do requerido. Nem tal requerimento tinha a virtualidade de suspender o prazo em curso (art.º 138º do CPC). Pelo que em nada contende com o juízo emitido sobre a extemporaneidade da contestação. Também a invocação do disposto no art.º 157º nº 6 do CPC (“Os erro e omissões dos actos praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes.”) não colhe. Com efeito, como já referimos, o aviso de recepção destina-se ao remetente, a quem é devolvido, e não ao destinatário. A sua utilidade é certificar que a citação foi efectuada e permitir ao Tribunal e à contraparte controlar o cumprimento do prazo para contestar. O réu não ficou com o aviso de recepção da sua citação, nem lhe foi enviada carta com cópia do mesmo ou com a data em que se considerava citado. Foi citado na sua pessoa, tem de fixar a data em que recebeu a carta para poder controlar o prazo. Ora, se as cartas foram entregues e os avisos de recepção assinados pelo réu na mesma ocasião, se o prazo era o mesmo para ambos, apenas acrescendo a dilação de 5 dias em virtude da ré mulher ter sido citada por carta entregue ao réu marido, não tendo sido alegado que este não lhe entregou prontamente a carta, não se vislumbra que o facto de, no aviso de recepção da carta da ré mulher, não constar (ou não ser perceptível) a data em que aquele o assinou, tenha prejudicado a defesa de ambos. Pelo exposto, sucumbindo as conclusões dos apelantes, resta-nos confirmar a decisão recorrida. V – DELIBERAÇÃO Nestes termos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida Custas pelos apelantes. Guimarães, 25-01-2018 Eva Almeida António Beça Pereira Maria Amália Santos 1. http://www.cttexpresso.pt/feapl_2/app/open/cttexpresso/objectSearch/objectSearch.jspx?lang=def RE07696…PT Citação Via Postal 2016/09/26 09:40 Objeto entregue RE076968…PT Citação Via Postal 2016/09/26 09:40 Objeto entregue 2. Ac. do TRC de 13-10-2015, proc. 211/13.9TBVZL.C1 in dgsi.pt |