Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2045/08.3TBFAF.G1
Relator: ANTÓNIO SOBRINHO
Descritores: CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
DEVER DE INFORMAR
SEGURO DE VIDA
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/03/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1. Por força do artº 5º, nº3, do Dec. Lei nº 446/85, de 25.10 (diploma relativo às Cláusulas Contratuais Gerais), na redação introduzida pelo Dec. Lei n 220/95, de 31.01, o ónus de prova da comunicação adequada e efetiva cabe ao contratante que submeta a outrem tais cláusulas.
2. No âmbito de um contrato de seguro de vida, incidindo esse dever de informação sobre o tomador do seguro ou a seguradora, também sobre estes recai não só o dito ónus de prova como também de alegação.
3. A seguradora, enquanto credora das obrigações que o segurado assume no referido contrato, incluindo a do pagamento do prémio, não se pode alhear dos termos e condições em que os segurados aderem ao seguro de grupo e lhes prestam ou não o dever de informação sobre o seu conteúdo.
4. A falta do dever de informação reflete-se no próprio contrato de adesão, na sua conexão com a seguradora, afetando a falta de informação a relação jurídica entre segurado-tomador de seguro, entre segurado-seguradora ou entre tomador de seguro-seguradora (eventual direito de regresso), não deixando a seguradora de responder perante o segurado pela ausência dessa informação por parte do tomador do seguro.
5. Num contrato de seguro do ramo vida, regulado pelo Decreto de 21 de Outubro de 1907 (artº 33º), a falta de pagamento do prémio não implica a automática resolução do contrato, dependendo esta, primeiramente, da notificação da seguradora ao devedor para efetuar esse pagamento dentro do prazo mínimo de oito dias.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:


I – Relatório;

Recorrente(s): P… e mulher M… (AA.);
Recorrido(s): Caixa Agrícola…, S.A. (Ré);
Comarca de Fafe

*****
Pedido:
Na presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, os autores pediram a condenação da Ré a:
a) pagar à Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, CRL o capital em dívida dos contratos de mútuo invocados no montante de € 65.879,45;
b) pagar aos restantes beneficiários do contrato de seguro invocado, L…, M… e C…, o remanescente do capital seguro, no montante de € 33.880,13;
c) pagar-lhes todas as quantias que lhes estão a ser exigidas pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, CRL, para além do capital garantido pelo contrato de seguro que nesse momento liquidavam em € 179.472,29, sem prejuízo da sua posterior actualização;
d) reembolsar-lhes as quantias pagas a título de prémio do contrato de seguro invocado desde inícios do ano de 2001 até 31.12.2004 cuja liquidação requerem que seja efectuada pela Ré;
e) pagar-lhes a quantia de € 15.000, a título de danos morais, pelo seu sofrimento em resultado da penhora para posterior venda da sua casa de habitação, na acção executiva intentada pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, CRL, contra si, que corre termos com o nº 1214/05.2TBFAF pelo 3º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe.

Causa de pedir:
Alegam, em síntese, que celebraram em 17 de Fevereiro de 1998 celebraram com a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, CRL dois contratos de mútuo nos quais se confessaram devedores dos montantes de Esc. 12.036.781$00 e Esc. 5.725.083$00, respectivamente, a que acresciam os respectivos juros remuneratórios e para cuja garantia constituíram hipoteca dos prédios.
Além disso, para garantia do capital mutuado, em 7 de Fevereiro de 1996, celebraram com a Companhia de Seguros…, S.A. um contrato de seguro de vida titulado pela apólice nº 9700577 a favor da Caixa de Crédito Agrícola mútuo de…, CRL, cobrindo o risco de morte ou invalidez total e permanente de qualquer um, com o capital de Esc. 20.000.000$00, o qual foi depois transferido para a ré, dando origem a duas apólices.
De acordo com as condições especiais do contrato, uma invalidez permanente de grau igual ou superior a 75% seria considerada total.
Em 8 de Maio de 2000, o Autor caiu do tractor que conduzia, sofrendo diversas lesões, as quais lhe demandaram uma IPP total de 78,62%, encontrando-se totalmente incapacitado para a sua profissão habitual ou qualquer outra.
Além da ré se recusar a pagar o capital seguro reclamado, tal acarretou diversos prejuízos aos demandantes, cujo valor também peticionam.
A ré contestou, impugnando os factos alegados pelos autores, concluindo pela improcedência da acção.
Foi admitida a intervenção principal provocada da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, CRL, a qual contestou.
Houve réplica dos autores.
Realizou-se audiência preliminar, saneando-se o processo e seleccionando-se os factos provados e a provar.
Admitidas as provas apresentadas pelas partes, teve lugar a audiência de discussão e julgamento, decidindo-se sobre a matéria de facto.

Seguidamente foi proferida sentença em que se julgou a acção não provada e improcedente, absolvendo-se a Ré Caixa Agrícola…, S.A. e a Interveniente Principal Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, CRL dos pedidos contra as mesmas formulados.

*****

Inconformados com tal decisão, dela interpuseram recurso os autores, em cuja alegação formulam, em suma, as seguintes conclusões:

(…)
*****

Foram apresentadas contra-alegações a pugnar pela confirmação do julgado.

II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar;

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos do artº 639º, do Código de Processo Civil (doravante CPC).

As questões suscitadas pelas recorrentes são, em resumo:

a) Impugnação da matéria de facto;
b) Vigência do contrato de seguro;
c) Obrigação de indemnizar;

Colhidos os vistos, cumpre decidir.


III – Fundamentos;

1. De facto;

A factualidade dada como assente na sentença recorrida é a seguinte:

1. No dia 17 de Fevereiro de 1998, os Autores, celebraram com a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., na agência desta em Fafe, dois contratos de mútuo garantidos por fiança e hipoteca [nos termos constantes dos documentos juntos a petição inicial com os números 1 e 2, que aqui se dão por integralmente reproduzidos] [alínea A) dos factos assentes].
2. Através dos referidos contratos, os Autores confessaram-se devedores à Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., do montante de Esc. 12.036.781$00, ou seja, € 60.039,21, e do montante de Esc. 5.725.083$00, ou seja, € 28.556,59, respetivamente, a que acresceriam os respetivos juros [alínea B)].
3. Para garantia dos referidos contratos de mútuo, foi constituída hipoteca a favor da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., sobre o prédio rústico denominado “Quintais da Casa”, sito no lugar de Sobreira, freguesia de Freitas, concelho de Fafe, descrito na Conservatória do Registo Predial de Fafe sob o nº 319 e inscrito na matriz sob o artigo 971, e sobre o prédio rústico denominado “Campinho”, sito no lugar da Sobreira, freguesia de Freitas, concelho de Fafe, descrito na Conservatória do Registo Predial de Fafe sob o nº 560 e inscrito na matriz sob o artigo 732 [alínea C)].
4. Para garantia de capital mutuado pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., os Autores celebraram, em 7 de Fevereiro de 1996, um contrato de seguro de vida com a Companhia de Seguros…, S.A., titulado pela apólice nº 9700577, a favor da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., cobrindo o risco de morte ou invalidez total e permanente de qualquer um dos Autores, com o capital de Esc. 20.000.000$00, ou seja, € 99.759,58, nos termos constantes da cópia da proposta junta à petição inicial como documento 3 [que aqui se dá por reproduzida] [alínea D)].
5. Caso se verificasse algum dos riscos contratados, morte ou invalidez total e permanente de um dos Autores, o capital seria entregue à Chamada CCAM até ao limite do que no momento de qualquer desses acontecimentos estivesse em dívida a esta, e o remanescente seria entregue aos beneficiários constantes da proposta de seguro, filhos dos Autores, L…, M… e C… [alínea E)].
6. De acordo com o artigo 2º das Condições Especiais do referido contrato de seguro, uma invalidez permanente de grau igual ou superior a 75% seria considerada total [alínea F)].
6.A. Consta também do artigo 2º das Condições Especiais da apólice identificada em 4) que “a pessoa segura será considerada inválida total e permanentemente quando em consequência de doença ou acidente se encontrar total e definitivamente incapaz para exercer a sua profissão ou qualquer outra actividade lucrativa correspondente à sua posição social, aos seus conhecimentos e às suas capacidades” [doc. de fls. 45 a 50, considerado e aditado ao abrigo do disposto no artigo 5º nº 2 alínea b) do Código de Processo Civil].
7. A escolha da companhia de seguros referida em 4) foi feita pela própria Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., alegando que, mais tarde, esse contrato de seguro seria transferido para uma companhia de seguros sua participada que ainda teria que ser criada [resposta ao artigo 1º da base instrutória].
8. No dia 31 de Dezembro de 1999 o referido contrato de seguro foi transferido para a Ré Seguradora dando origem às apólices nº 8118/5001110/29 e 8120/5001110/30 (consta 20 certamente por lapso) [alínea H)].
9. A transferência referida em 8) foi efectuada, por ordem da interveniente Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L. [artigo 2º].
10. Esta transferência foi consumada e subscrita pelos Autores no balcão da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L. [artigo 5º].
11. À data da transferência referida em 8) o capital era de Esc. 20.000.000$00 [artigo 45º].
12. O facto referido em 8) deveu-se à existência de dois contratos distintos, cujo capital, à data, ascendia a € 24.570,78 e € 60.040,30, respetivamente [artigo 46º].
13. As Condições Gerais da Apólice do contrato de seguro transferido são as constantes do documento nº 5 junto com a contestação as quais se dão por integralmente reproduzidas [alínea L)].
14. De acordo com a cláusula nº 2 da declaração de adesão, sob a epígrafe “Garantias”, a Ré Seguradora comprometeu-se a pagar “o capital contratado em caso de morte ou de invalidez total e definitiva, salvo se excluída, da pessoa segura durante o prazo de adesão do contrato”, constando ainda da referida cláusula que “para o efeito, considera-se que a pessoa segura se encontra na situação de invalidez total e definitiva quando esta for irreversível, de grau superior a 75%, e impossibilite o exercício de uma actividade remunerada” [artigo 3º].
14.A. A declaração de adesão referida em 14) foi assinada pelos Autores [doc. de fls. 52, considerado e aditado ao abrigo do disposto no artigo 5º nº 2 alínea b) do Código de Processo Civil].
15. A Ré Seguradora assumiu a cobertura referida em 14) e o capital referido em 11) [resposta ao artigo 4º da base instrutória].
16. Em Maio de 2000, enquanto trabalhava numa exploração agrícola, o Autor caiu do tractor que conduzia [artigo 6º].
17. Dessa queda resultaram-lhe traumatismos craniano e da coluna lombosagrada com lombo-citalgia esquerda por Hérnia Discal a nível L5 – S1 [artigo 7º].
18. Foi operado duas vezes no Porto tendo ficado com sequelas [artigo 8º].
19. A situação clínica do Autor manteve-se a mesma desde Outubro de 2006 até à presente data [artigo 13º].
20. Na sequência de perícia levada a cabo no âmbito do processo de acidente de trabalho, que correu termos sob o nº 118/2002 do 2º Juízo do Tribunal de Trabalho de Guimarães, decorrente do referido em 16), em 30 de Abril de 2002 foi atribuída ao Autor Incapacidade Permanente Parcial de 15% [artigo 15º].
21. Desde 2001 o Autor sofre de cefaleias [artigo 16º].
22. Em 25 de Agosto de 2003, foi diagnosticado ao Autor um meningioma da base do crânio com implantação na sela turca, deformando a hipófise, a protuberância, o mensencéfalo e o pedúnculo cerebeloso médio [artigo 18º].
23. Que invadiu o seio cavernoso e a artéria carótida interna à esquerda [artigo 19º].
24. Pese embora o referido diagnóstico não lhe foi indicada qualquer intervenção cirúrgica devido ao tamanho e localização do tumor e à alta complexidade da mesma e riscos associados a graves sequelas [artigo 22º].
25. Actualmente, em resultado desse meningioma, o Autor sofre cefaleias persistentes que o obrigam a medicação de forma continuada [artigo 23º].
26. E sofre de perturbações de equilíbrio, insónias e alterações do humor com períodos de ansiedade e depressão [artigo 24º].
27. Actualmente o Autor tem uma incapacidade permanente geral de 45 pontos [artigo 26º].
28. O Autor sofre de uma patologia osteo-articular degenerativa da coluna cervical desde 2001, sem compromisso neurológico [artigo 27º].
29. O Autor apresenta uma rectificação da coluna cervical [artigo 30º].
30. E a nível C2-C3, Uncartrose à direita com diminuição discreta da amplitude do buraco de conjunção, não sendo caso de conflito de espaço [artigo 31º].
31. E, a nível C3-C4, C4-C5, C5-C6, protusões discais medianas que podem obliterar o espaço sub-aracnoideu anterior [artigo 32º].
32. O Autor foi considerado incapaz para o exercício da profissão a partir de 4 de Novembro de 2003 [artigo 35º].
33. A Ré tem-se recusado, desde 2001, a pagar à Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., e aos restantes beneficiários do contrato de seguro o capital acordado, alegando que o Autor não tinha o grau de incapacidade exigido [artigo 36º].
34. Em 27.02.2002, o Autor solicitou à Ré ser examinado por um médico por esta nomeado, de forma a que lhe fossem avaliadas as lesões e atribuído o grau de incapacidade [alínea I)].
35. Os Autores sobrevivem graças às pensões de invalidez do Autor, sendo uma no montante de € 236,47, do Centro Nacional de Pensões, que começou a receber em 4 de Novembro de 2003 [artigo 37º].
36. E outra que lhe é conferida pelo Estado Espanhol, desde Outubro de 2007, no montante de € 785,04, em resultado da incapacidade permanente total para o trabalho, que lhe é reconhecido pelo Ministerio de Trabajo Y Asuntos Sociales espanhol [artigo 38º].
37. Desde a data do acidente referido em 16) e até às datas mencionadas em 35) e 36), os Autores auferiam apenas o rendimento de uma exploração agrícola que detinham e pela qual a Autora se tornou a única responsável [artigo 39º].
38. Contando com a ajuda de familiares, amigos e vizinhos [artigo 38º-A].
39. Em virtude desse facto, os Autores deixaram de poder pagar os montantes correspondentes ao reembolso dos referidos contratos de mútuo celebrados com a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L. [artigo 39º-A].
40. Os Autores deixaram de pagar as prestações devidas a partir de Dezembro de 2000 [artigo 40º].
41. Em 19 de Abril de 2005, Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., intentou uma acção executiva contra os Autores que corre termos pelo 3º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe, com o nº 1214/05.2TBFAF, com base nos contratos de mútuo referidos, nos termos constantes da certidão extraída dos mesmos [e cujos termos aqui se dá por integralmente reproduzida] [alínea J)].
42. No âmbito do processo referido em 41) a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., penhorou aos Autores o prédio rústico denominado “Quintais da Casa”, sito no lugar de Sobreira, freguesia de Freitas, inscrito na matriz sob o artigo 971 [alínea K)].
43. O prémio do contrato de seguro era pago mensalmente pelos Autores através de desconto automático na conta bancária que aqueles tinham aberto na Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., com o nº 0045.1110.0000000264978 [alínea G)].
44. Os Autores tiveram a sua conta aprovisionada salvo entre 17 de Junho e 8 de Outubro, 13 e 25 de Outubro, a 23 de Novembro, 4 de Dezembro de 1998, 8 a 25 de Janeiro, 3 a 25 de Março, 6 de Abril, 19 de Maio, 5 de Novembro a 9 de Dezembro de 1999, 7 e 29 de Fevereiro, 28 de Março, 27 de Abril, 15 de Junho a 3 de Julho, 8 de Novembro de 2000, 8 de Maio, 11 de Junho de 2001, 3 de Janeiro, 2 de Setembro, 1 de Outubro, 4 de Novembro de 2002, 2 de Janeiro, 3 de Fevereiro, 3 de Março de 2003, 3 de Janeiro e 1 de Fevereiro de 2005 [artigo 50º].
45. A Caixa debitava importâncias a descoberto relativas a cobranças de cheques emitidos pelos Autores na conta destes [artigo 51º].
46. E comunicava posteriormente aos Autores a necessidade de efetuar depósito das quantias debitadas [artigo 52º].
47. O referido em 45) devia-se à relação de confiança existente entre ambos [artigo 53º].
48. A interveniente não comunicava aos Autores a necessidade de aprovisionar a conta quando estava em causa o pagamento do prémio das apólices referidas em 8) [artigo 55º].
49. Uma vez que os Autores deixaram de pagar os prémios respeitantes à apólice nº 8120/5001110/30 a Ré remeteu-lhes a carta datada de 7.03.2003, expedida por correio registado em 10.03.2003 da qual consta, designadamente, que:(...)
Lisboa, 7 de Março de 2003
Assunto: Cancelamento da Adesão
Exmo(a) Senhor(a)
Comunicamos-lhe a resolução da sua Adesão N.º 30 à Apólice N.º 5001110, da Protecção Crédito Habitação, 10 dias após a data de envio desta carta, cessando a garantia dos riscos até agora cobertos pelo contrato.
Referimos igualmente que na data indicada deixaremos de efectuar o débito do Prémio periódico relativo à sua Protecção Crédito Habitação, mantendo a Crédito Agrícola Vida o direito aos Prémios em dívida, no montante de 58,44 EUR, correspondentes ao período decorrido. (...)” [artigo 47º].
O Artigo 3.° das Condições Gerais da Apólice (CGA) do contrato em causa define as Garantias e Riscos Cobertos pelo contrato, estipulando no n.º 2 que: “Está abrangida por esta Apólice a cobertura do risco de morte ou de invalidez total e definitiva da Pessoa Segura, se ocorrida durante o prazo definido no respectivo Certificado de Adesão, salvo disposição em contrário no Certificado Individual de Adesão” [artigo 48º].
Estipulando, por sua vez, o n.º 3 do referido artigo 3.° das CGA que “3. Para efeitos deste contrato entende-se por invalidez total e definitiva toda a situação em que se verifiquem simultaneamente as seguintes condições na Pessoa Segura: a) Situação irreversível de invalidez provocada por doença ou acidente; b) Impossibilidade de desenvolver a sua profissão ou qualquer outra actividade remunerada compatível com os seus conhecimentos, capacidades ou aptidões; c) Um grau de invalidez geral de, pelo menos, 75%, determinado com base na Tabela Nacional de Incapacidades e confirmado pelo médico nomeado pelo Crédito Agrícola Vida.” [artigo 49º].
50. Os Autores pagaram [o pagamento d]o prémio de € 11,96 referente à apólice nº 81118/5001110/29 até Dezembro de 2004 [artigo 41º].
51. A Apólice n.º 8118/5001110/29 foi resolvida pela Ré em virtude de não lhe terem sido pagos os respetivos prémios, resolução essa que foi invocada e comunicada aos Autores, pela Ré, por carta datada de 8.03.2005, expedida por correio registado em 11.03.2005 [alínea M)].
52. Os Autores vivem numa casa existente no prédio referido em 42) com dois dos seus filhos, a progenitora de um deles e uma tia [artigo 42º].
53. Desde a data da penhora referida em 42), os Autores vivem em desassossego e receosos de perderem a casa que sempre habitaram [artigo 43º].
54. Tal provoca-lhes angústia e preocupação com o futuro [artigo 44º].

*****

2. Apreciação fáctico/jurídica;

a) Impugnação da matéria de facto;
(…)

Pelo que se deixa aduzido, altera-se a matéria de facto provada e não provada da decisão recorrida nos seguintes termos:
FACTOS PROVADOS:
- Os factos vertidos nos pontos 1 a 12, 14-A, 16 a 31, 33 a 48 e 50 a 54 da sentença, os quais se dão por reproduzidos.
E ainda os seguintes:
- «13. As Condições Gerais da Apólice relativas às apólices nºs 8118/5001110/29 e 8120/5001110/20 são as constantes do documento nº 5 junto com a contestação as quais se dão por integralmente reproduzidas [alínea L)].
14. De acordo com a cláusula nº 2 da declaração de adesão, sob a epígrafe “Garantias”, a Ré Seguradora pagaria “o capital contratado em caso de morte ou de invalidez total e definitiva, salvo se excluída, da pessoa segura durante o prazo de adesão do contrato”, constando ainda da referida cláusula que “para o efeito, considera-se que a pessoa segura se encontra na situação de invalidez total e definitiva quando esta for irreversível, de grau superior a 75%, e impossibilite o exercício de uma actividade remunerada” [artigo 3º]»
- O ponto nº 15 é suprimido;
32. O Autor encontra-se incapaz para o exercício de toda e qualquer profissão a partir de 4 de Novembro de 2003”.
49. Uma vez que os Autores deixaram de pagar os prémios respeitantes à apólice nº 8120/5001110/30, a Ré remeteu-lhes a carta datada de 7.03.2003, expedida por correio registado em 10.03.2003 da qual consta, designadamente, que: (...)
Lisboa, 7 de Março de 2003
Assunto: Cancelamento da Adesão
Exmo(a) Senhor(a)
Comunicamos-lhe a resolução da sua Adesão N.º 30 à Apólice N.º 5001110, da Protecção Crédito Habitação, 10 dias após a data de envio desta carta, cessando a garantia dos riscos até agora cobertos pelo contrato.
Referimos igualmente que na data indicada deixaremos de efectuar o débito do Prémio periódico relativo à sua Protecção Crédito Habitação, mantendo a Crédito Agrícola Vida o direito aos Prémios em dívida, no montante de 58,44 EUR, correspondentes ao período decorrido. (...)” [artigo 47º].
O Artigo 3.° das Condições Gerais da Apólice (CGA) nº 8120/5001110/30 em causa define as Garantias e Riscos Cobertos, estipulando no n.º 2 que: “Está abrangida por esta Apólice a cobertura do risco de morte ou de invalidez total e definitiva da Pessoa Segura, se ocorrida durante o prazo definido no respectivo Certificado de Adesão, salvo disposição em contrário no Certificado Individual de Adesão” [artigo 48º].
Estipulando, por sua vez, o n.º 3 do referido artigo 3.° das CGA que “3. Para efeitos deste contrato entende-se por invalidez total e definitiva toda a situação em que se verifiquem simultaneamente as seguintes condições na Pessoa Segura: a) Situação irreversível de invalidez provocada por doença ou acidente; b) Impossibilidade de desenvolver a sua profissão ou qualquer outra actividade remunerada compatível com os seus conhecimentos, capacidades ou aptidões; c) Um grau de invalidez geral de, pelo menos, 75%, determinado com base na Tabela Nacional de Incapacidades e confirmado pelo médico nomeado pelo Crédito Agrícola Vida.” [artigo 49º].
*

b) Vigência do contrato de seguro;
c) Obrigação de indemnizar;

Abordemos agora a questão de direito.
Neste âmbito, começam os recorrentes por dizer que o contrato de seguro em causa é um seguro de vida e o contrato de seguro, à data dos factos, era um contrato obrigatoriamente formal, atento o disposto nos arts. 426.º e 427.º do C. Comercial.
Além disso, argumentam que, de acordo com o contrato de seguro originariamente celebrado pelos Autores com a M…, para que a pessoa segura fosse considerada em situação de invalidez total e permanente bastava que estivesse incapacitada de exercer a sua posição ou outra para a qual demonstrasse estar capacitado anteriormente, sem a necessidade de verificação de qualquer outro requisito.
Mais: contrapõem que o seu clausulado, relativamente à situação de invalidez total e permanente, era menos exigente que o clausulado tipo dos contratos de seguro cuja redacção estava a cargo da Ré Crédito…, que previa uma série de requisitos cumulativos.
Acolhem-se tais fundamentos.
Estamos perante um contrato de seguro, dito seguro de vida, objecto da apólice nº 9700577 (inicialmente) e das apólices nºs 8118/5001110/29 e 8120/5001110/30 (posteriormente).
É inquestionável, como reconhece inclusive o tribunal a quo, que “a transferência operada consubstanciada pela sucessão de entidades na cobertura do risco não foi levada a cabo nas mesmas condições”.
De facto, enquanto que na apólice nº 9700577 (Condições Especiais) se define invalidez a situação em que a pessoa segura, “em consequência de doença ou acidente, se encontrar total e definitivamente incapaz de exercer a sua profissão ou qualquer outra actividade lucrativa correspondente à sua posição social, aos seus conhecimentos e às suas capacidades”, nas apólices nºs 8118/5001110/29 e 8120/5001110/30 já se define invalidez como a situação em que a pessoa segura, além se encontrar em invalidez total e definitiva, “esta for irreversível, de grau superior a 75% e impossibilite o exercício de uma actividade remunerada”, sendo assim a cobertura destas últimas muito mais restritiva e gravosa para os aderentes, aqui AA.
O tribunal recorrido - referindo que os AA. assinaram a declaração de adesão referida no ponto 14) supra e referente às aludidas 2ªs apólices e “considerando o conteúdo da declaração de adesão, onde foi feita expressa referência ao âmbito da cobertura”, além de que “uma eventual omissão da informação não podia ser imputada à demandada” - acabou por concluir que “a garantia contratual em caso de invalidez tem de ser aferida pelo tríplice critério anteriormente explicitado”.
Ou seja, o contrato de seguro devia ter em conta as condições ou ‘garantias’ de cobertura relativa às apólices nºs 8118/5001110/29 e 8120/5001110/30.
Não se perfilha esta posição, na medida em que, como até o próprio tribunal recorrido sublinha, “no âmbito do seguro de grupo (…) o legislador optou por estatuir no artigo 4º do DL nº 176/95 de 26 de Julho que o tomador do seguro deve obrigatoriamente informar os segurados sobre as coberturas e exclusões contratadas, as obrigações e direitos em caso de sinistro e as alterações posteriores que ocorram neste âmbito, em conformidade com um espécimen elaborado pela seguradora, competindo-lhe o ónus da prova de ter fornecido tais informações, sendo certo que o contrato poderá prever que a obrigação de informar os segurados seja assumida pela seguradora”.
E nem a demandada nem a interveniente lograram provar que informaram os demandantes, ‘segurados’ ou aderentes da nova cobertura ou exclusão (em relação à originária apólice) relativa às apólices nºs 8118/5001110/29 e 8120/5001110/30, pese embora estes tenham assinado a declaração de adesão.
Pelo contrário: decorre inclusive dos autos - veja-se o conteúdo das cartas de fls. 44 a 50, 51 a 53 e carta de fls. 54, datada de 28.03.2001, que a informação fornecida induzia aqueles em erro ou, dito de outro modo, os desinformava quanto a tal cobertura, na medida em que expressamente nelas se referia “Vimos por este meio informar que o contrato em epígrafe (acrescente-se, relativo à apólice de Vida Grupo nº 9.700.577) foi transferido para a Companhia de Seguros C… , em 31/12/1999 com as mesmas coberturas e garantias” e ainda “Mais informamos que as presentes condições são idênticas às que vigoravam no anterior contrato subscrito através da Seguradora M…”.
É assim claro que, em termos de homem médio, na posição de contraente/aderente, não é possível imputar aos AA. uma falta diligência da sua parte no conhecimento real e efectivo do conteúdo e especificidade das novas cláusulas emergentes daquelas apólices, mormente no que concerne à alteração do âmbito de cobertura e definição de invalidez para esse efeito.
Ademais, sendo linear que, por força do artº 5º, nº3, do Dec.Lei nº 446/85, de 25.10 (diploma relativo às Cláusulas Contratuais Gerais), na redacção introduzida pelo Dec.Lei n 220/95, de 31.01, o ónus de prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem tais cláusulas e incidindo esse dever de informação sobre o tomador do seguro ou a seguradora – cfr. artº 4º, nºs 1 a 5 do citado Dec.Lei nº 176/95 – também sobre estes recai não só o dito ónus de prova como também de alegação (artºs 342º, nº1, do Código Civil e 5º do CPC).
Também não se acolhe o entendimento, ventilado na decisão recorrida, de que, tendo-se provado que a subscrição da declaração de adesão foi levada a cabo no balcão da interveniente em Fafe, tomadora do novo seguro, a obrigação de prestar a informação não cabia à Ré, mas àquela, inexistindo assim omissão de informação imputável à demandada.
Desde logo, a seguradora é a credora das obrigações que o segurado assume no referido contrato, incluindo a do pagamento do prémio, não se podendo alhear dos termos e condições em que os segurados aderem ao seguro de grupo. E o próprio contrato que a seguradora estabelece com o tomador do seguro só se concretiza verdadeiramente no momento em que os segurados aderem ao mesmo.
Daí que a falta do dever de informação se reflicta no próprio contrato de adesão, na sua conexão com a seguradora. Isto é, a falta de informação tanto afecta a relação jurídica segurado-tomador de seguro, como segurado-seguradora ou tomador de seguro-seguradora (eventual direito de regresso), não deixando a seguradora de responder perante o segurado pela ausência dessa informação por parte da tomador do seguro, ainda que aquela possa vir a demandar este pelos eventuais prejuízos decorrentes dessa falta de informação [1].
Cumpre não descurar que estamos perante riscos de massa, despoletados por uma sociedade de consumo, em que o estatuto de parte mais fraca cabe ao segurado.
Além disso, como aqui sucede, seguradora e tomadora do seguro não deixam de ter objectivos e interesses comuns, constituindo um mesmo grupo de empresas, em que o objecto social da primeira não é mais que uma transferência ou transmutação da actividade da segunda, entidade bancária, para o exercício do ramo de seguros.
Acresce, no entanto, que in casu é a própria seguradora (através do teor das aludidas cartas de fls. 44 e sgs., 51 e sgs. e 54 e 55) quem presta uma informação errada aos segurados.
Aliás, o regime jurídico do contrato de seguro estatuído pelo Dec.Lei nº 72/2008, de 16.04, não deixa de prescrever regras próprias para a obrigação de informação a cargo do segurador (artºs 18º a 23º) e quanto aos seguros de grupo faz incidir sobre o tomador do seguro esse dever também (artº 78º, nºs 1 e 5).
Pode-se concluir do exposto, que, atenta a complexidade e especificidade das condições das novas apólices relativas ao contrato de seguro, nomeadamente quanto às ‘garantias’ de cobertura associada à definição e situação de invalidez, tinha a demandada seguradora que alegar e provar o conhecimento completo e efectivo das Condições Gerais das aludidas novas apólices - por banda dos segurados e que foram invocadas para não assumir a sua responsabilidade – veja-se ponto de facto provado nº 33 e teor das reditas cartas de fls. 44 e sgs., 51 e sgs. e 54 e 55.
Não tendo a seguradora (nem o tomador do seguro) alegado e provado que cumpriu essa obrigação, no que tange à assinalada cláusula nº 2 da declaração de adesão, sob a epígrafe “Garantias”, a Ré Seguradora pagaria “o capital contratado em caso de morte ou de invalidez total e definitiva, salvo se excluída, da pessoa segura durante o prazo de adesão do contrato”, constando ainda da referida cláusula que “para o efeito, considera-se que a pessoa segura se encontra na situação de invalidez total e definitiva quando esta for irreversível, de grau superior a 75%, e impossibilite o exercício de uma actividade remunerada” (ponto de facto provado nº 14 supra), impõe-se a exclusão da mesma – cfr. artº 8º, do citado Dec.Lei nº 446/85 [2].
Resulta daqui que prevalece a cláusula atinente ao artigo 2º das Condições Especiais da apólice inicial, apólice nº 9700577, a qual estabelece que “a pessoa segura será considerada inválida total e permanentemente quando em consequência de doença ou acidente se encontrar total e definitivamente incapaz para exercer a sua profissão ou qualquer outra actividade lucrativa correspondente à sua posição social, aos seus conhecimentos e às suas capacidades” – ponto de facto provado nº 6.A.
Daqui deflui que a apurada incapacidade para exercício de toda e qualquer profissão, a partir de 04.11.2003, pelo A. marido, se encontra garantida na aludida apólice de seguro.

Suscitam ainda os apelantes a questão relativa à resolução das apólices 8118/5001110/29 e 8120/50011110/30, por falta de pagamento dos respectivos prémios de seguro.
Com efeito, quanto à primeira, tendo sido resolvida pela Ré, por falta de pagamento, por efeitos da carta datada de 08.03.2005, e verificando-se a incapacidade total e definitiva do Autor para a sua profissão, desde 04.11.2003, ainda ocorreu durante a sua vigência.
Já no tocante à apólice 8120/50011110/30, quer à data da estipulação da apólice (31.12.1999), quer à data do sinistro (Maio de 2000), quer à data da declaração de incapacidade (04.11.2003), o contrato de seguro do ramo vida era regulado pelo Decreto de 21 de Outubro de 1907, designadamente o seu artº 33º, relativamente às consequências por falta de pagamento do prémio.
Preceitua este artº 33º que “O contrato de seguro de vidas somente poderá considerar-se insubsistente por falta de pagamento do prémio, quando o segurado, depois de avisado por meio de carta registada, não satisfaça a quantia em dinheiro no prazo de oito dias ou noutro, nunca inferior a este, que porventura se ache estipulado na apólice.
§ único. O prazo a que se refere o presente artigo contar-se-ha da data do registo da carta, a qual será dirigida para a última residência do segurado, que conste dos registos da sociedade seguradora.”
Logo, atenta a legislação aplicável ao presente caso em análise, a simples falta de pagamento do prémio num contrato de seguro de vida não implicava a automática resolução do contrato, dependendo esta resolução da notificação da seguradora para efectuar esse pagamento dentro do prazo atrás referido.
Daí que, a respeito da apólice nº 8120/50011110/30, não tendo a Ré comunicado aos AA. qualquer falta de pagamento do prémio, nem os tendo notificado para esse mesmo pagamento, até ao dia 04.11.2003, a mesma também tinha de considerar-se subsistente, ou seja, em vigor.
Neste sentido, vejam-se os Acórdãos da RL de 31.05.2007, proc. 4560/2007-6, e de 21.01.2010, proc. 1518.2TBDL.L1-8, in dgsi.pt, nos quais se realça que, no âmbito desse diploma, relativo ao contrato de seguro do ramo vida, “a simples falta de pagamento de prémio de contrato temporário de seguro de vida não confere, só por si, à instituição seguradora o direito de resolução do contrato, o qual depende ainda da conversão da mora em incumprimento definitivo, designadamente mediante notificação admonitória nos termos do artigo 808º do CC”.
Isto porque se entende que, “quanto aos seguros de vida, existe um interesse público na sua manutenção, merecendo mais ampla protecção legal, pelo que, enquanto a seguradora não colocar termo ao contrato mediante o cumprimento diligente do artigo 33º do Decreto de 21 de Outubro de 1907, continua a responder pelo risco assumido”.
De frisar que nem o Dec.Lei nº 142/2000, de 15/7, nem os anteriores Dec.Lei nº 105/94, de 23.04, e Dec.Lei nº 162/84, de 18.05, alteraram tal normativo, excluindo todos a sua aplicabilidade aos contratos de seguro do ramo «Vida».
Por quanto se deixa aduzido, resulta estarem preenchidos os pressupostos necessários ao cumprimento da obrigação contratual que emerge da celebração do contrato de seguro, entregando a Ré o capital em dívida, à data de 04.11.2003, à chamada Caixa de Crédito Agrícola, sendo que o remanescente deverá ser entregue aos beneficiários constantes da proposta de seguro, filhos dos Autores, L…, M… e C… .
Da matéria de facto provada – ponto de facto provado nº 41 - e documentos de fls. 73 a 80, decorre que, em 19 de Abril de 2005, a chamada Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., intentou uma acção executiva contra os Autores que corre termos pelo 3º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe, com o nº 1214/05.2TBFAF, com base nos contratos de mútuo referidos.
Nessa acção, relativamente ao primeiro contrato de mútuo, a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., exige dos Autores o pagamento do capital ainda dívida, naquela data, no montante de € 60.039,21, o montante de € 5.840,24, a título de juros remuneratórios, o montante de € 43.275,49, a título de juros de mora, e ainda os juros de mora vencidos desde 19 de Abril de 2005 e vincendos até integral pagamento.
Relativamente ao segundo contrato de mútuo, a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., exige dos Autores o pagamento do capital ainda dívida, naquela data, no montante de € 20.778,86, o montante de € 817,30, a título de juros remuneratórios e o montante de € 14.600,73, a título de juros de mora e ainda os juros de mora vencidos desde 19 de Abril de 2005 e vincendos até integral pagamento.
Por último, exige também as despesas judiciais e extrajudiciais que a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., tiver de suportar para a cobrança daqueles montantes, nomeadamente, com honorários de advogado e solicitador de execução e que aquela se comprometeu a liquidar numa fase posterior.
Assim, atendendo àquele capital em dívida, naquela data, e levando em consideração que “os Autores deixaram de poder pagar as prestações devidas a partir de Dezembro de 2000”, deve a Ré ser condenada a pagar à chamada Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., o montante global de € 65.879,45, e o remanescente do capital contrato de seguro invocado, no montante de € 33.880,13, aos restantes beneficiários, L…, M… e C… .
Acresce que dispõe o artº. 798.º do CC que “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”, sendo que, nos termos do artº. 804.º do CC, “ a simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor”.
Os factos provados demonstram que a Ré, desde 2001, tem-se recusado a pagar à chamada Caixa de Crédito Agrícola e aos restantes beneficiários do contrato de seguro o capital acordado, pese embora, como se demonstrou, estarem reunidas, pelo menos, desde 04.11.2003 (data em que o Autor foi considerado incapaz para toda e qualquer profissão), todas as condições para que se efectuem esses pagamentos. Ou seja, a Ré incumpriu o contrato a que se obrigou, ou, no mínimo, entrou em mora.
Em virtude dessa recusa e da impossibilidade de os Autores pagarem as prestações dos contratos de mútuo referidos, a chamada Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., intentou contra os AA. a acção executiva atrás referida, peticionando o atrás descrito.
Caso a Ré tivesse pago o capital do seguro invocado à Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., tal como resultava das condições do contrato de seguro e como foi reclamado oportuna e reiteradamente pelo Autor, nunca os AA. veriam ser intentada contra si a citada acção executiva, uma vez que já teria ocorrido o reembolso dos contratos de mútuo referidos, ficando os AA., nomeadamente, isentos do pagamento de qualquer montante a título de juros de mora ou de quaisquer despesas judiciais e extrajudiciais que a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., venha a suportar.
Assim, nos termos do disposto nos artºs 798.º e 804.º do CC, deve também a Ré ser condenada no pagamento de todas as quantias que estão a ser exigidas aos Autores pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., no processo nº 1214/05.2TBFAF que corre termos pelo 3º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe, para além do capital garantido pelo contrato de seguro.
Conforme resulta do requerimento da acção executiva descrita e que ainda se encontra pendente, os montantes aí exigidos vencem juros diariamente, além de que, nessa mesma acção, é também pedido o pagamento das despesas judiciais e extrajudiciais que a chamada Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., tiver de suportar para a cobrança daqueles montantes, nomeadamente, com honorários de advogado e solicitador de execução e que se comprometeu a liquidar numa fase posterior.
Os autos não contêm elementos suficientes que permitam conhecer com exactidão a extensão desses montantes.
Assim, por se desconhecer com exactidão os valores em questão à data de hoje, apenas se sabendo que está constituída a obrigação, deve a Ré ser condenada no pagamento de todas as quantias que estão a ser exigidas aos Autores pela chamada Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., no processo nº 1214/05.2TBFAF que corre termos pelo 3º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe, para além do capital garantido pelo contrato de seguro, a liquidar posteriormente, nos termos do disposto no art.º 609º, do CPC.
Por último, resulta igualmente provado que, na acção executiva descrita, intentada devido à mora no cumprimento da obrigação por parte da Ré, foi penhorado o imóvel onde residem os Autores – pontos de facto provados nºs 42 e 52 - , sendo que, desde a data da referida penhora, os Autores vivem em desassossego e receosos de perderem a casa que sempre habitaram e que tal provoca-lhes angústia e preocupação com o seu futuro – pontos de facto provados nºs 53 e 54. Tanto mais que o A. marido se encontra doente e incapacitado para trabalhar.
É hoje entendimento maioritário, quer na jurisprudência, quer na doutrina, que, mesmo no âmbito da responsabilidade meramente contratual, há lugar à atribuição do direito a uma indemnização por danos de natureza não patrimonial, verificados que se encontrem os requisitos previstos no artº. 496.º, nº 1, do C. Civil.
Ponto assente é que tais danos morais reclamados mereçam, pela sua gravidade, a tutela do direito.
Ora, não obstante se admitir que a litigância em tribunal será a forma comum de resolver direitos litigiosos, entre as pessoas, devendo estas contar com a intranquilidade, desassossego e até receio em relação a essa actividade, certo é que, atento o factualismo concreto provado, os AA. viveram a contingência de lhes ser penhorada e até perderem a casa de habitação, com execução do seu património, por banda do tomador do seguro (entidade bancária associada ou conexa com a entidade seguradora), em acção executiva, relativamente ao bem imóvel cujo pagamento o próprio contrato de seguro do ramo ‘vida’ visava assegurar.
Logo, a angústia e receio dos AA. de perderem a casa, por via da sua penhora na referida acção executiva, além da desconsideração social que tal acto de penhora sempre acarreta, despoletada pela conduta omissiva da Ré em assumir a obrigação decorrente do dito seguro de vida, configuram gravidade bastante, merecedora de protecção legal.
Daí que, a esse título, deva a Ré ser condenada no pagamento dos danos não patrimoniais sofridos pelos AA. em montante que se fixa globalmente, com referência à presente data, em € 5.000,00 (cinco mil euros).

Procede, assim, a apelação nos termos acima enunciados.

Sumariando:
1. Por força do artº 5º, nº3, do Dec.Lei nº 446/85, de 25.10 (diploma relativo às Cláusulas Contratuais Gerais), na redacção introduzida pelo Dec.Lei n 220/95, de 31.01, o ónus de prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem tais cláusulas.
2. No âmbito de um contrato de seguro de vida, incidindo esse dever de informação sobre o tomador do seguro ou a seguradora, também sobre estes recai não só o dito ónus de prova como também de alegação.
3. A seguradora, enquanto credora das obrigações que o segurado assume no referido contrato, incluindo a do pagamento do prémio, não se podem alhear dos termos e condições em que os segurados aderem ao seguro de grupo e lhes prestam ou não o dever de informação sobre o seu conteúdo.
4. A falta do dever de informação reflecte-se no próprio contrato de adesão, na sua conexão com a seguradora, afectando a falta de informação a relação jurídica entre segurado-tomador de seguro, entre segurado-seguradora ou entre tomador de seguro-seguradora (eventual direito de regresso), não deixando a seguradora de responder perante o segurado pela ausência dessa informação por parte da tomador do seguro.
5. Num contrato de seguro do ramo vida, regulado pelo Decreto de 21 de Outubro de 1907 (artº 33º), a falta de pagamento do prémio não implica a automática resolução do contrato, dependendo esta, primeiramente, da notificação da seguradora ao devedor para efectuar esse pagamento dentro do prazo mínimo de oito dias.


*****

IV – Decisão:

Em face do exposto, acordam os Juizes da 1ª Secção Cível deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e, por consequência, revogar a decisão recorrida nos seguintes termos:
1. Altera-se a matéria de facto, relativamente aos pontos 13, 14, 15, 32 e 49, em conformidade com o descrito no item III-2, a) supra.
2. Condenar a Ré a pagar à chamada Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, C.R.L., o montante global de € 65.879,45, e o remanescente do capital do contrato de seguro invocado, no montante de € 33.880,13, aos restantes beneficiários, L…, M… e C… .
3. Condenar a Ré a pagar aos AA. todas quantias que lhes estão a ser exigidas pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de…, CRL, no processo nº 1214/05.2TBFAF que corre termos pelo 3º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe, para além do capital garantido pelo contrato de seguro, a liquidar posteriormente, nos termos do disposto no art.º 609º, do CPC.
4. Condenar a Ré a pagar aos AA. a quantia global de € 5.000,00 (cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais.
5. Absolver a Ré do demais pedido.


Custas pela apelante e apelados na proporção de 6/9 e 3/9 respectivamente.
Guimarães, 3 de julho de 2014
António Sobrinho
Isabel Rocha
Moisés Silva
_________________
[1] Neste sentido vide Acs. RP de 11.09.2008 e RL de 05.03.2009.
[2] Consulte-se ainda o Ac. da RG de 25.09.2002, in dgsi.pt.