Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
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| Nº Convencional: | JTRG000 | ||
| Relator: | EVA ALMEIDA | ||
| Descritores: | DIREITO DE PREFERÊNCIA COMPROPRIEDADE VENDA ACÇÃO DE DIVISÃO DE COISA COMUM | ||
| Nº do Documento: | RG | ||
| Data do Acordão: | 03/02/2010 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | AGRAVO | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
| Sumário: | Não tem qualquer apoio, nem na letra do nº 1 do artigo 1409º do Código Civil, nem na sua razão de ser, a extensão do direito de preferência aos comproprietários, em caso de alienação da totalidade do prédio a terceiros. | ||
| Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES
I - RELATÓRIO B..., SA, propôs contra C..., D... e mulher, E..., acção de divisão de comum relativa aos seguintes prédios: Declarada a indivisibilidade dos prédios objecto desta acção e não tendo as partes chegado a acordo quanto à adjudicação, o processo seguiu para venda por propostas em carta fechada. Na acta da abertura de propostas em carta fechada e após a Mmª. Sra. Juiz a quo ter aceite a proposta apresentada pela Requerente B..., para aquisição de dois dos prédios a vender, os Requeridos D... e esposa E..., declararam, por intermédio dos respectivo mandatário, que pretendiam exercer o direito legal de preferência, que lhes assiste enquanto comproprietários da verba nº2, devendo para o efeito ser dado cumprimento ao disposto no artº.896º do Código de Processo Civil, na versão aplicável ao caso dos autos. Cumprido o contraditório foi proferida o seguinte despacho: Não se conformando, os requerentes recorreram, recurso que foi admitido como agravo, a subir em separado e com efeito devolutivo. Apresentaram alegações, pugnando pela substituição “do despacho recorrido por outro que julgue verificado o invocado direito de preferência, cumprindo-se o artº 896º, dando consequentemente sem efeito a aludida venda. Formularam, a posteriori, as seguintes conclusões: Dos autos não constam as contra-alegações da recorrida no tocante a este agravo (apenas estão juntas as contra-alegações respeitantes ao agravo que subiu em separado e que, nesta 2ª secção do Tribunal da Relação de Guimarães, correu termos com o número 185-C/2002.G1). Consultado este apenso C, verificou-se que nele se encontram as alegações, que a este respeitam e de que se extraiu cópia, que se inseriu nos autos. O recurso veio a ser admitido neste Tribunal com a forma, modo de subida e efeito fixados na 1ª instância. Colhidos os vistos, cumpre apreciar. II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO: O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, tal como decorre das disposições legais dos artº 684º nº3 e 690º-nº1 e 2 do CPC, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões “salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras” (artº 660º-nº2 do CPC). De entre estas questões, excepto no tocante aquelas que o tribunal conhece ex officio, o tribunal de 2ª instância apenas poderá tomar conhecimento das questões já trazidas aos autos pelas partes, nos termos dos artº 664º e 264º do CPC, não podendo a parte nas alegações de recurso e respectivas conclusões vir suscitar e requerer a apreciação de questões ou excepções novas. Atentas as conclusões do recurso de agravo, a questão a decidir é a seguinte: III - FUNDAMENTOS DE FACTO Para a apreciação deste recurso tem interesse e está assente a seguinte factualidade: 1 - B..., SA, propôs contra C..., D... e mulher, E..., a presente acção de divisão de comum relativa aos prédios a seguir descritos: 2 - A requerente e os requeridos são comproprietários dos prédios acima descritos, nas seguintes proporções: 3 – Nos autos principais foi proferida decisão, já transitada em julgado, no sentido da indivisibilidade dos supra referidos prédios e realizou-se a conferência de interessados (prevista no artº 1056° nº2 do Código de Processo Civil), na qual as partes não chegaram a acordo sobre a adjudicação. 4 - Os autos prosseguiram para a venda dos prédios, mediante propostas em carta fechada, podendo os consortes concorrer à venda. 5. Em 18/09/2009 realizou-se diligência de abertura de propostas em carta fechada, tendo sido recebidas e abertas as seguintes propostas: 6 - Na sequência foi proferido o seguinte despacho: 7 - Seguidamente os ora recorrentes, por intermédio do respectivo mandatário, apresentaram o seguinte requerimento: III. FUNDAMENTOS DE DIREITO Dispõe o artº 1409º nº 1 do Código Civil que o comproprietário goza do direito de preferência e tem o primeiro lugar entre os preferentes legais no caso de venda, ou dação em cumprimento, a estranhos da quota de qualquer dos seus consortes. Trata-se de preferência na venda da quota e não na venda da coisa objecto da compropriedade, no caso prédios. Assim, é de liminar clareza que os agravantes não têm razão quanto à pretensão de exercer o direito de preferência que invocam, com base no artigo 1409º, nº 1, do Código Civil. Efectivamente, a Lei, ao conferir ao preferente a faculdade de, em igualdade de condições, se substituir ao adquirente de uma coisa, em certas formas de alienação, afecta significativamente o poder de disposição que integra o direito de propriedade, já que retira ao proprietário o direito de escolha do outro contraente. A sua atribuição resulta, por isso, da verificação da existência de razões de interesse público que se sobrepõem àquela liberdade de escolha, enquanto integrante dos poderes do proprietário. Tais razões de interesse público visam, essencialmente, a protecção da mesma plenitude do direito de propriedade, considerada, agora, do ponto de vista da situação resultante do acto de alienação. Assim, ressalvando o direito de preferência atribuído a proprietários de terrenos confinantes de área inferior à unidade de cultura (cfr. artigo 1380º do Código Civil), cuja razão é a de permitir uma mais eficiente exploração agrícola, o exercício dos direitos legais de preferência leva à concentração numa só pessoa, ou num número mais restrito de pessoas, dos poderes que integram o direito de propriedade plena sobre uma determinada coisa. Efectivamente, nos casos da preferência conferida ao proprietário do prédio onerado com uma servidão de passagem (artigo 1555º do Código Civil), com o direito de superfície (artigo 1535º do Código Civil) ou com um arrendamento, o objectivo é o de reunir numa mesma pessoa as faculdades que, contidas no direito de propriedade plena, se encontravam divididas entre diversos titulares: entre o proprietário e o titular do direito real menor, nas duas primeiras hipóteses, entre aquele e o arrendatário na terceira. No caso da compropriedade, que é o dos autos, a atribuição do direito de preferência aos comproprietários, em caso de venda ou dação em cumprimento a terceiros (artigo 1409º do Código Civil), tem em vista a redução progressiva do número de comproprietários, de acordo com a ideia de que a propriedade singular permite o melhor aproveitamento da coisa, desde logo porque elimina diversos conflitos que frequentemente se travam entre comproprietários. Não tem qualquer apoio, nem na letra do nº 1 do artigo 1409º do Código Civil, nem na sua razão de ser, a extensão do direito de preferência aos comproprietários, em caso de alienação da totalidade do prédio a terceiros. Não só não procedem, aqui, as razões que determinam a atribuição do direito de preferência em caso de alienação de quotas a estranhos, como não se retira do regime da preferência qualquer indicação no sentido de que se pretendeu, com a limitação que ele implica, beneficiar um comproprietário em relação a terceiros (ou a um deles que se propôs adquirir a totalidade) apenas pelo facto de ser comproprietário. Por todos ver o douto Acórdão do STJ relatado pela Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza de 10-07-2008 (in www.dgsi.pt), de cujo sumário passamos a citar: «A atribuição do direito de preferência aos comproprietários, em caso de venda ou dação em cumprimento a terceiros da quota de qualquer dos seus consortes, tem como objectivo a redução do número de proprietários, de acordo com a ideia de que a propriedade singular permite o melhor aproveitamento da coisa; Não tem apoio, nem na letra, nem no espírito da lei, a extensão do direito de preferência aos comproprietários em caso de alienação total a terceiros de prédio em regime de compropriedade». V- DELIBERAÇÃO Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente o agravo, mantendo a decisão recorrida. Custas pelos agravantes. Notifique Guimarães, 02.03.2010 |