Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
23200/22.8YIPRT.G1
Relator: MARIA GORETE MORAIS
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/01/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- O objetivo do 2º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto não é (nem pode ser) pura e simples repetição das audiências perante a Relação mas a deteção e correção de concretos, pontuais e claramente apontados e fundamentados erros de julgamento, sem prejuízo de aquando da apreciação dos meios probatórios colocados à sua disposição formar uma convicção autónoma sobre a materialidade impugnada.
II- Como assim, os poderes para alteração da matéria de facto conferidos ao tribunal de recurso constituem apenas um remédio a utilizar nos casos em que os elementos constantes dos autos imponham inequivocamente (em termos de convicção autónoma) uma decisão diversa da que foi dada pela 1ª instância.
III- A parte que pretenda impugnar validamente a decisão da matéria de facto não pode limitar-se a fazer uma súmula de alguns dos depoimentos prestados e depois concluir, sem mais, que com base neles se devem alterar determinados pontos factuais, a par disso terá de fazer a sua análise crítica.
IV- Na apreciação da matéria de facto o decisor de 1ª instância é livre de dar credibilidade a determinados depoimentos, em detrimento de outros, desde que essa opção seja explicitada e convincente.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I- RELATÓRIO

EMP01... Ldª. intentou a presente ação declarativa com processo comum (que se iniciou como procedimento injuntivo) contra AA, na qual conclui pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de €26.670,46, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos até efetivo pagamento.
Para substanciar tal pretensão alegou, em síntese, que no exercício da sua atividade profissional na área da construção civil prestou serviços à ré, mostrando-se ainda por liquidar a aludida importância.
A ré deduziu oposição alegando que solicitou à autora a prestação de serviços de mão-de-obra para reabilitação de uma moradia destinada à sua própria habitação, serviços esses que não incluíram, contudo, todas as diligências, deslocações e trabalhos necessários à reabilitação dessa moradia.
Refere que os serviços que foram solicitados à autora ficaram concluídos em outubro de 2017, tendo a ré passado a habitar com o seu agregado familiar a moradia a partir de 13.11.2017.
Aceita que a autora lhe remeteu a fatura com o nº ..., em 10.02.2021 e que lhe solicitou o seu pagamento, contudo argumenta que tal fatura não é devida, uma vez que, quando foi emitida, a ré já havia pago a totalidade dos serviços prestados.
Dispensada a audiência prévia, realizou-se o julgamento, vindo a ser proferida sentença na qual se decidiu julgar a ação improcedente, absolvendo a ré do pedido.
Não se conformando com o assim decidido, a autora interpôs recurso, admitido como apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes

CONCLUSÕES:
(I) O objeto do presente recurso versa sobre a decisão proferida pelo Tribunal a quo, que julgou improcedente a ação declarativa proposta pela Recorrente, na qual pediu a condenação da Recorrida ao pagamento de 26.670,46€, correspondente a 24.600,00€ de capital, 1.764,46€ de juros de mora, 153,00€ relativo a outras quantias e 153,00€ de taxa de justiça.
(II) O ponto 3. do elenco dos factos provados, encontra-se parcialmente mal julgado, nomeadamente no que respeita ao termo dos trabalhos realizados pela Recorrente.
(III) Resulta da oposição apresentada pela Recorrida e pelo facto 5. do elenco dos factos provados que os trabalhos terminaram em outubro de 2017 e a última fatura foi emitida, pela Recorrente à Recorrida, em março de 2018, a qual, aliás, em sede de depoimento de parte confessou que os trabalhos terminaram apenas em 2018 e ter-se-ão iniciado no ano de 2013.
(IV) Em consequência da confissão da Recorrida e da conjugação da matéria factual, haveria o Tribunal a quo de ter dado como provado que “Os serviços prestados pela Autora à Ré iniciaram-se em 2013 e terminaram de 2018 e consistiram na reabilitação de habitação familiar, nomeadamente planificação, construção, pintura e acabamento das paredes mestras do imóvel”.
(V) O Tribunal a quo fundou a sua decisão neste facto concreto, julgando não ser crível que a Recorrente tenha aguardado entre 2016 e 2021 para cobrar as faturas em dívida, falecendo todo argumentativo decisório, em resultado da impugnação da matéria de facto alegada, cabendo, pois, revogar a decisão proferida, julgando procedente o pedido da A., porquanto é perfeitamente plausível, de acordo com as regras da experiência comum e da lógica que – tanto mais em contexto de pandemia e no seio de relações societárias e familiares – a Recorrente possa ter aguardado entre 2018 e 2021 para cobrar os serviços que prestou à Recorrida, no âmbito do contrato de empreitada celebrado com a mesma.
(VI) O hiato temporal foi, aliás, cabalmente esclarecido em sede de depoimento de parte do legal representante da Recorrente, que o esclareceu como consequência das relações familiares e do facto de a obra nunca ter sido dada como terminada, o que se percebeu apenas em decorrência de ação proposta pela Recorrida contra a Recorrente.
(VII) O ponto 1. do elenco dos factos não provados encontra-se erradamente julgado, porquanto resulta manifestamente da prova produzida nos autos, nomeadamente testemunhal, que, no âmbito do contrato de empreitada celebrado entre Recorrente e Recorrida, foram prestados os serviços descritos no ponto 3. do requerimento injuntivo.
(VIII) Acresce que a Recorrida não impugnou, de modo algum, a prestação dos serviços por parte da Recorrente.
(IX) Encontrando-se amplamente demonstrado nos autos que a Recorrente prestou todos os serviços necessários à remodelação de uma moradia unifamiliar a solicitação da Recorrida, que nenhuma fatura relativa a mão de obra havia sido liquidada, que não existia autos de medição da obra, que a prestação de serviços pela Recorrente não foi impugnada pela Recorrida, que os trabalhos decorreram até 2018 e que a última fatura emitida reporta a março de 2018, não existe razão para que o Tribunal a quo considere não provado que a “A fatura referida em 47., n.º ... no valor de 24.600,00€, respeita aos serviços prestados pela Autora à Ré e descritos em 3”, com fundamento no hiato temporal decorrido entre a prestação dos serviços e emissão da fatura, importando considerar tal facto provado e condenar a Recorrida ao pagamento da referida fatura, conforme peticionado nos autos.
(X) Do elenco dos factos provados haveria ainda de constar, face à confissão da Recorrida, conforme assentada, que os trabalhos efetuados na piscina da sua habitação e a execução de uma laje de piso no mesmo imóvel não foram pagos à Recorrente, o que sempre importaria o pagamento de tais valores, cujo o valor, em sede de liquidação de sentença, se apuraria.
(XI) Nos termos do preceituado no art.º 342.º, n.º 1, do Cód. Civil, “àquele que invocar um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado”. A prestação do serviço/empreitada, por parte da Recorrente, é um facto constitutivo do seu direito, alegado nos presentes autos e cuja tutela requereu.
(XII) A prestação do serviço por parte da Recorrente, no âmbito do contrato de empreitada celebrado com a Recorrida, é fonte da obrigação de pagamento do preço por parte da Recorrida, facto esse que se encontra amplamente provado nos autos.
(XIII) A prestação de serviços por parte da Recorrente, no âmbito do contrato de empreitada celebrado, não foi impugnada pela Recorrida. A Recorrida limitou-se a alegar que todos os serviços prestados se encontravam pagos, sem que, contudo, tenha logrado provar o pagamento da fatura cujo pagamento a Recorrente requereu.
(XIV) O Tribunal a quo considerou não provado que “A fatura referida em 47., n.º ... no valor de 24.600,00€, respeita aos serviços prestados pela Autora à Ré e descritos em 3”. Sucede que não decorre da prova produzida, ou foi invocada que a referida fatura cujo pagamento se requer importe a quaisquer outros serviços ou que a mesma constitua, de algum modo, um erro.
(XV) Em consequência, provada a prestação de serviços – facto constitutivo do direito invocado pela Recorrente – não se perceciona de que modo pode o Tribunal a quo considerar que a referida fatura não importa aos serviços alegados.
(XVI) O Tribunal a quo funda tal entendimento no alegado tempo decorrido entre a prestação dos serviços e a emissão da fatura (2016 a 2021). Sucede que, conforme supra se deixou impugnado, por um lado, os trabalhos decorreram até outubro de 2017 e, por outro, a última fatura emitida corresponde a março de 2018. Se a tal raciocínio acrescentarmos o contexto de pandemia vivido entre março de 2020 e a data da emissão da fatura, claudica o raciocínio lógico dedutivo, alicerçado nas regras da lógica e da experiência comum efetuado pelo julgador em 1.ª instância.
(XVII) Acresce a tal contexto o âmbito familiar dos sujeitos da relação jurídica em causa nos autos. A sociedade Recorrente é detida pela própria Recorrida, pela sua irmã e pela sua mãe e gerida pelo seu pai, o que sempre justificaria a demora na emissão da fatura à Recorrida e que o gerente, em sede de depoimento de parte esclareceu.
(XVIII) Não tendo sido acordado um preço global pela prestação dos serviços, no âmbito do contrato de empreitada celebrado entre Recorrente e Recorrida, não existe fundamento para que, provados os trabalhos efetuados pela Recorrente no âmbito de tal contrato, se pugne pela não obrigação de pagamento da Recorrida da fatura emitida.
(XIX) Decorre da prova documental junta aos autos pela própria Recorrida que as demais faturas relativas aos trabalhos prestados na sua habitação, contam com o descritivo “trabalhos efetuados em reabilitação de habitação unifamiliar”. A fatura cujo pagamento se reclama tem como descritivo “Mão de obra referente a trabalhos efetuados em reabilitação de habitação unifamiliar” e os trabalhos minuciosamente descritos pela prova testemunhal, pelo que é notória a identidade entre ambas, não havendo razão para considerar não provado que tal fatura importe aos trabalhos efetuados por conta da Recorrida.
(XX) Acresce que o ónus da prova de que tal fatura não dizia respeito aos serviços reclamados impendia sobre a Recorrida, nos termos do n.º 2, do art.º 342.º, do Cód. Civil. A Recorrida não produziu qualquer prova nesse sentido, quer documental, quer testemunhal, quer pericial.
(XXI) O grau de convicção do julgador tem de ter suporte objetivo, em resultado de um percurso lógico. Sucede que o percurso lógico efetuado pelo Tribunal de 1.ª instância assenta num pressuposto inexistente, o de que entre a prestação dos serviços e a emissão da fatura decorreram mais de 4 anos, quando, na verdade, decorreram cerca de 3 anos, 1 deles em contexto de pandemia, pelo que a convicção do julgador tem, necessariamente, de ser abalada e repensada, de acordo com o suporte objetivo presente nos autos.
(XXII) Sucede ainda que o facto constitutivo do direito invocado pela Recorrente encontra-se amplamente demonstrado.
(XXIII) A Recorrida não logrou demonstrar o pagamento alegado.
(XXIV) O entendimento preconizado pelo Tribunal a quo, opera, na realidade como se de uma prescrição do Direito invocado pela Recorrente se tratasse, entendimento, totalmente extravagante face às normas em vigor, cabendo, pois, revogar a decisão proferida e substitui-la por decisão que condene a Recorrida ao pagamento à Recorrente do valor peticionado na fatura n.º ....
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A ré apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso, requerendo outrossim a condenação da apelante por litigância de má-fé.
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Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO MÉRITO DO RECURSO

1. Definição do objeto do recurso
 
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil[1].
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, são as seguintes as questões solvendas:
. determinar se o tribunal a quo incorreu num error in iudicando, por deficiente avaliação ou apreciação das provas;
. decidir em conformidade face à alteração, ou não, da matéria factual, mormente apurar se, na sequência do contrato firmado entre as partes, a ré se encontra constituída no dever de proceder ao pagamento do preço que a demandante considera que ainda não se mostra liquidado;
. Aferir se a apelante assumiu comportamento subsumível à figura da má fé processual.
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2. Recurso da matéria de facto
2.1. Factualidade considerada provada na sentença

O tribunal de 1ª instância considerou provados os seguintes factos:
1. A Autora é uma sociedade comercial que desempenha a sua atividade no âmbito da construção civil, com sede na comarca ... (...), conforme resulta da morada indicada como sede profissional;
2. A Ré solicitou à Requerente a prestação de serviços de mão-de-obra para reabilitação de uma moradia unifamiliar sita no Caminho ..., n.º ..., na freguesia ..., concelho ..., destinada à sua própria habitação;
3. Os serviços prestados pela Autora à Ré iniciaram-se em 2011 e terminaram em 2016 e consistiram na reabilitação de habitação familiar, nomeadamente planificação, construção, pintura e acabamentos das paredes mestras do imóvel;
4. Concluída a obra (por uma terceira empresa) em março de 2018, a Ré passou a habitar com o seu agregado familiar a moradia a partir dessa data;
5. Por conta da obra mencionada em 3., foram emitidas pela Autora as seguintes faturas:
5.1. FA 2016/10 (2016-02-11)… 9.695,17€;
5.2. FA 2016/2 (2016-01-13) …. 6.919,52€;
5.3. FA 2016/22 (2016-03-15) … 3.556,19€;
5.4. FA 2016/34 (2016-04-19) … 2.662,91€;
5.5. FA 2016/70 (2016-09-12) … 6.935,48€;
5.6. FA 2017/4 (2017-01-12) … 17.368,61€;
5.7. FA 2017/12 (2017-02-22) … 3.994,95€;
5.8. FA 2017/19 (2017-03-20) … 15.487,89€;
5.9. FA 2017/44 (2017-06-14) … 12.082,44€;
5.10.FA 2017/72 (2017-09-29) … 5.131,08€;
5.11.FA 2018/19 (2018-03-02) … 1.660,96€;
5.12.FA 2018/3 (2018-03-02) .... 7.180,53€;
No valor total de ………………… 92.675,73€.
6. Os valores constantes das faturas descritas em 5. foram pagos pela Ré;
7. A Autora remeteu à Ré carta registada com aviso de receção em 10.02.2021, enviando a fatura com o n.º ... no valor de 24.600,00€ (vinte e seis mil e seiscentos euros) e solicitando o seu pagamento.
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2.2. Factualidade considerada não provada na sentença
O Tribunal de 1ª instância considerou não provado o seguinte facto:
1. A fatura referida em 7., n.º ... no valor de 24.600,00€, respeita aos serviços prestados pela Autora à Ré e descritos em 3.
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2.3. Apreciação da impugnação da matéria de facto
Nas conclusões recursivas veio a apelante requerer a reapreciação da decisão de facto, em relação a um conjunto de factos julgados provados e não provados, com fundamento em erro na apreciação da prova.
Como é consabido, o art. 640º estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos:
1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes”.
O presente regime veio concretizar a forma como se processa a impugnação da decisão, reforçando o ónus de alegação imposto ao recorrente, prevendo que deixe expresso a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação em sede de reapreciação dos meios de prova.
Recai, assim, sobre o recorrente, face ao regime concebido, um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar – delimitar o objeto do recurso -, motivar o seu recurso através da transcrição das passagens da gravação que reproduzem os meios de prova, ou a indicação das passagens da gravação que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto - fundamentação - e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação.
No caso concreto, realizou-se o julgamento com gravação dos depoimentos prestados em audiência e a apelante impugnou a decisão da matéria de facto, com indicação dos pontos de facto impugnados, prova a reapreciar e decisão que sugere.
Tal como dispõe o nº 1 do art. 662º a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto “ […] se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, o que, na economia do preceito, significa que os poderes para alteração da matéria de facto conferidos ao tribunal de recurso constituem apenas um remédio a utilizar nos casos em que os elementos constantes dos autos imponham inequivocamente (em termos de convicção autónoma) uma decisão diversa da que foi dada pela 1ª instância.
No presente processo, como já referido, a audiência final processou-se com gravação da prova pessoal prestada nesse ato processual.
A respeito da gravação da prova e sua reapreciação, haverá que ter em consideração, como sublinha ABRANTES GERALDES[2], que funcionando o Tribunal da Relação como órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto, nessa reapreciação tem autonomia decisória, devendo consequentemente fazer uma apreciação crítica das provas, formulando, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova.
Assim, competirá ao Tribunal da Relação reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações do recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados.
Decorre deste regime que o Tribunal da Relação tem acesso direto à gravação oportunamente efetuada, mesmo para além dos concretos meios probatórios que tenham sido indicados pelo recorrente e por este transcritos nas alegações, o que constitui uma forma de atenuar a quebra dos princípios da imediação e da oralidade suscetíveis de exercer influência sobre a convicção do julgador, ao mesmo tempo que corresponderá a uma solução justificada por razões de economia e celeridade processuais[3].
Cumpre ainda considerar a respeito da reapreciação da prova, que neste âmbito vigora o princípio da livre apreciação, conforme decorre do disposto no art. 396º do Cód. Civil.
Daí compreender-se o comando estabelecido na lei adjetiva (cfr. art. 607º, nº 4) que impõe ao julgador o dever de fundamentação da materialidade que considerou provada e não provada.
Esta exigência de especificar os fundamentos decisivos para a convicção quanto a toda a matéria de facto é essencial para o Tribunal da Relação, nos casos em que há recurso sobre a decisão da matéria de facto, poder alterar ou confirmar essa decisão.
É através dos fundamentos constantes do segmento decisório que fixou o quadro factual considerado provado e não provado que este Tribunal vai controlar, através das regras da lógica e da experiência, a razoabilidade da convicção do juiz do Tribunal de 1ª instância.
Atenta a posição que adrede vem sendo expressa na doutrina e na jurisprudência, quando o Tribunal da Relação é chamado a pronunciar-se sobre a reapreciação da prova, no caso de se mostrarem gravados os depoimentos, deve considerar os meios de prova indicados pelas partes e confrontá-los com outros meios de prova que se mostrem acessíveis, a fim de verificar se foi cometido ou não erro de apreciação que deva ser corrigido[4].
Tendo presentes estes princípios orientadores, cumpre agora dilucidar se assiste razão à apelante, neste segmento recursório da impugnação da matéria de facto, nos termos por ela preconizados.
Como emerge das respetivas conclusões recursivas, a recorrente advoga que: (i) deve ser dada como provada a afirmação de facto vertida na conclusão 3 do recurso quanto ao términus das obras (outubro de 2017), alterando-se, deste modo, a redação do facto dado como provado sob o nº 3; (ii) devem transitar para o elenco dos factos provados as afirmações de facto constantes do ponto 1 dos factos não provados; iii) deve ser aditado à matéria de facto provada um novo facto[5].
Resulta do exposto que a impugnação da decisão da matéria de facto diz essencialmente respeito aos concretos trabalhos que foram realizados pela autora em execução das obrigações para si advenientes do contrato que firmou com a ré (trabalhos esses levados a cabo para reabilitação de uma moradia unifamiliar da ré destinada à sua própria habitação) e bem assim dos pagamentos que esta última terá efetuado.
Vejamos, antes do mais, em que termos o juiz a quo fundamentou o sentido decisório referente à descrita materialidade, sendo que na respetiva motivação se escreveu que «[ii] Prova por confissão e declarações de parte
- Depoimento de parte da Ré – filha do sócio-gerente da Autora com quem disse estar de relações cortadas desde 2017, tendo pendente neste Tribunal outros processos em que são litigantes (em síntese, confirmou a celebração do negócio jurídico com a autora nos termos alegados por esta última, que consistiram na reabilitação de uma moradia onde a Ré reside atualmente, referindo que as obras iniciaram em meados de 2011 e terminaram em 2016 – depois desta data outra empresa quem continuou/terminou a reabilitação, tendo a Autora apenas procedido à instalação de uma piscina em 2019, admitindo que nada pagou por este serviço; afirma que todas as faturas emitidas foram pagas; com relevância, prestou depoimento no sentido de não ter sido acordado um preço global, pois que “à medida que iam fazendo iam apresentando faturas”, que pagou na totalidade, para IBAN da autora; confessa que recebeu a interpelação nos termos julgados provados em 7.; que entre 2018 e 2021 não foi nunca interpelada para proceder ao pagamento de qualquer valor em dívida);
- Declarações de parte da Autora - na pessoa do legal representante BB, pai da Ré e com quem está de relações cortadas desde 2017 (sobre os factos, em sentido idêntico à Ré, confirmou que o inicio da obra ocorreu em 2011 e terminou no ano de 2016, sendo que após esta data apenas em meados de 2018/2020 abriram o buraco da piscina acrescentando que este trabalho não está a ser cobrado; descreveu em que consistiram os trabalhos, descrevendo-os de forma espontânea, designadamente os seguintes: demolição e alargamento dos portões da entrada principal, 3 funcionários, levantamento dos muros de pedra onde eram as cortes que estavam caídos, toda a limpeza do piso, aproveitada madeira outra queimada, telhas aproveitadas, no interior toda a demolição madeira aproveitada e outra queimada, cortada pasta divisória entre adega e dispensa para colocar laca, picada a pedra por dentro e fora, abastecimento da água, 1.ª placa; mais admite que apesar de os trabalhos terem sido concluídos em 2016, a fatura apenas foi emitida em 2021, pois o que motivou a sua emissão passados tantos anos foi o facto de a Ré ter dado entrada de uma ação judicial contra a Autora, e que foi desde esta altura que cortaram relações; justifica o sucedido – ou seja, o referido lapso temporal - ora dizendo que a Autora apenas realizou os trabalhos iniciais, mas que depois entraram trabalhos de acabamentos que foi outra empresa, e que “não sabíamos se era para continuar a fazer mais trabalhos” ora mencionado que não emitiu logo a fatura por causa do pagamento do IVA, na medida em que apenas emitia quando fosse pago pela Ré; que todas as faturas foram emitidas pela Dr.ª CC (escriturária);
iii. Prova testemunhal
1. CC (nascida em .../.../1963, casada, contabilista, residente em ...) – aos costumes disse ter sido funcionária da autora de 2015 a 2021, exercendo as funções de escriturária/contabilista, sendo a depoente quem emitia as facturas (sobre os factos, prestou depoimento no sentido de que a Ré desempenhava funções na empresa da Autora, que emitia as facturas referentes aos trabalhos na habitação da Ré consoante o que lhe era pedido/transmitidos; confrontada com a factura de fls. 54, no valor de 24.400€, diz que essa factura ...21 foi já na fase de saída; que não estranhou o valor da factura (“valor redondo”) porque se tratava de trabalhos a prestar a um familiar; houve um desentendimento entre a Ré e o Pai (Sócio gerente da Autora); não é habitual as empresas demorarem 4 anos a emitir uma factura);
2. DD (nascido .../.../1963, casado, operador de máquinas/encarregado de obra, residente em ...) – aos costumes disse ser funcionário da Autora há 26 anos (confirmou os trabalhos efectuados na moradia da Ré, onde desempenhou as funções de Encarregado de Obra, iniciaram em 2011 e em 2016 foi o último serviço que fez, com excepção da piscina que foi depois de 2016; descreveu os trabalhos que foram feitos (alargamento dos portões, demolidos depois reconstruídos; demolição da parte interior da casa; picou-se a pedra da fachada; recolha do entulho e material que saiu de lá, instalação caixas de água, instalação da parte eléctrica, fizeram as ramadas de vinha, fizeram duas lajes – de piso e de tecto; piscina); que na obra estavam a trabalhar cerca de seis funcionários assim como eram utilizadas máquinas; sabe que andou lá outra empresa a fazer um acrescento/alteração na habitação; todas as horas são registadas e depois comunicou à direcção da empresa);
3. EE (nascido em .../.../1965, divorciado, operador de máquinas, residente em ...) – aos costumes disse ser funcionário da autora há 32 anos (em síntese, confirmou a realização de obras na moradia da ré, de 2011 até 2016; os trabalhos que desempenhava era na qualidade de manobrador de máquinas; (picar os muros de pedra, alargamento do portão de entrada; lajes em pedra à moda antiga; e ajudava no que podia; foi abrir um buraco para uma piscina e espalhar a terra para o jardim; levou material (areias e …); as máquinas utilizadas eram da autora; a piscina foi dos últimos trabalhos;
4. FF (nascido em 4-4-78, casado, empresário/administrador de uma empresa, residente em ...) – aos costumes disse ser marido da Ré (sobre os factos, o que sabe foi-lhe dito ela Ré, designadamente que a Autora prestou trabalhos na casa onde residem, que a Ré ia pagando os trabalhos consoante era facturado, encontrando-se tudo pago; que esta última factura apresentada “surgiu devido aos litígios”);
5. GG (nascida em .../.../1952, casada, funcionária da autoridade marítima nacional aposentada, residente em ...) – aos costumes disse ser sogra da Ré (em síntese, referiu que habitam a residência onde foram efetuadas as obras desde 2017);
6. HH (nascido em .../.../1990, solteira, comercial, residente em ...) – aos costumes disse ser prima e funcionária da Ré (em síntese, disse que a Ré vive na moradia sub judice desde 2017/2018, e que a Autora prestou trabalhos de construção civil na mesma);
Todos os referidos meios de prova analisados de forma crítica, de acordo com as regras da experiência e da lógica, respeitando as regras de funcionamento e distribuição do ónus da prova (nos termos do artigo 342.º e ss do CC), e o princípio consagrado no art. 414.º do CPC.
Desta forma, tendo presente os meios de prova referidos, isoladamente ou conjugados entre si, conforme infra se explicitará, cumpre concretizar em que precisos termos se formou a convicção do tribunal.
(…)
FACTOS PROVADOS 3

Resultam das declarações da Ré e do Autor nesse sentido, corroboradas pelos depoimentos isentos, sinceros e com conhecimento direto dos factos das testemunhas DD e EE, funcionários da autora que trabalharam na obra, o primeiro na qualidade de encarregado de obra e o segundo operador de máquinas.
(…)
Os factos não provados resultam da ausência de prova sobre os mesmos, e funcionamento das regras de distribuição do ónus da prova, bem como da prova do contrário.
A Autora não logrou demonstrar, cujo ónus da prova sobre si recaía, que dos trabalhos acordados entre as partes, realizados entre 2011 e 2016, e que consistiram em obras de restauração de habitação, tenham ficado valores por pagar, e explicaremos porquê.
Desde logo, não se afigura de acordo com as regras da experiência comum e da lógica que, estando em dívida a quantia aqui peticionada, a autora tenha esperado de 2016 até 10-02-2021 (data da interpelação, cfr. 7.º facto provado) para exigir o seu crédito. Nem é credível que tal se tenha ficado a dever à Autora estar a aguardar pela informação, por parte da Ré, se pretendia prosseguir com mais trabalhos, quando é a própria autora, através do seu legal representante, que admite que os trabalhos terminaram em 2016 e desde esta data quem continuou com a execução da obra foram outras empresas. É igualmente a própria contabilista da Autora (a testemunha II) que presta depoimento no sentido de que não é habitual as empresas demorarem cerca de 4 anos para emitir uma factura, que foi o que sucedeu na situação em apreço.
Dito isto, nenhuma prova se produziu. Vejamos.
A Ré em declarações, admitindo a celebração do dito negócio jurídico, referiu – de forma coincidente com a Autora e as testemunhas que trabalharam nessa obra – que os trabalhos prestados pela Autora iniciaram-se em 2011 e terminaram em 2016. A Autora, através do legal representante, admite que após saírem da obra em 2016 apenas voltaram em meados de 2019/2020 por causa de um trabalho numa piscina, mas que “não é isso que está a ser cobrado nos autos”.
Assim, a única prova produzida, além das declarações da autora – contraditadas pela Ré – é a factura de fls. 54, que consiste em documento particular.
A factura é um documento comercial, contabilístico, correspondente a actos comerciais de venda e entrega de produtos, documento esse que é passado pelo vendedor.
As facturas não são livros de escrituração comercial e, portanto, não se lhes aplica o regime probatório do art. 44º do CCom.
As faturas, enquanto documentos particulares gozam, nos termos do disposto no artigo 376º, nº 1, do Código Civil, de força probatória plena quanto à materialidade das declarações atribuídas ao seu autor, se apresentados contra este. Se é o autor dos documentos a utilizá-los ficam sujeitos à livre apreciação do Tribunal, cabendo-lhe produzir livremente prova sobre a exatidão do respetivo conteúdo
Ou seja, cabia à Autora a prova de que os serviços constantes na referida factura foram prestados, localizá-los tempo espacialmente, descrever os mesmos, o que não se logrou (… )».
Colocada perante a transcrita motivação da decisão de facto, a apelante argumenta fundamentalmente que os pontos factuais que consubstanciam o objeto da impugnação foram alvo de errónea apreciação pelo juiz a quo já que não ponderou devidamente os meios de prova que carreou para os autos.
Assim, no concernente ao ponto nº 3 da matéria de facto provada, considera que o mesmo se encontra “parcialmente mal julgado”, designadamente no que respeita ao termo dos trabalhos realizados pela recorrente, advogando que a sua redação deve ser alterada de molde a que dele conste que “Os serviços prestados pela autora à ré iniciaram-se em 2013 e terminaram em 2018 e consistiram na reabilitação de habitação familiar, nomeadamente planificação, construção, pintura e acabamento das paredes mestras do imóvel”.
No sentido de justificar a referida alteração de redação sustenta que na oposição apresentada pela recorrida, a mesma confessa que os trabalhos terão durado até outubro de 2017, sendo certo que aquando da sua audição na audiência final a mesma declarou ter contratado os serviços da autora, para reabilitar a sua casa de morada onde reside e sempre residiu, os quais se iniciaram em 2013 e terminaram em 2018.
Não lhe assiste, contudo, razão.
Com efeito, ouvidas as declarações produzidas pela ré em sede de audiência final, resulta que a mesma menciona que o termo das obras realizadas na sua habitação e aludidas no requerimento injuntivo ocorreu em 2016. Aliás, realce-se que foi o próprio gerente da autora, ora recorrente, que balizou em 2016 o fim dos serviços prestados à ré, no âmbito da empreitada em discussão nos autos. E tal facto foi reiterado pelos próprios trabalhadores da recorrente, que confirmaram a data referida pelo gerente da recorrente.
Consequentemente, nenhuma censura nos merece a decisão recorrida, quando dá como provada a afirmação de facto plasmada no ponto 3 nos concretos moldes em que o fez, mostrando-se igualmente acertada a respetiva motivação quando, no que tange a esta concreta questão, se ancora quer no depoimento de parte da ré, quer nas declarações de parte do representante legal da autora, os quais efetivamente referiram em uníssono que o termo das obras realizadas na habitação da ré e aludidas no requerimento injuntivo ocorreu em 2016.
Registe-se, de qualquer modo, que também não se antolha um efetivo relevo da impugnação da aludida proposição factual para a decisão do presente pleito.
Como é consabido, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, visa, em primeira linha, alterar o sentido decisório sobre determinada materialidade que se considera incorretamente julgada. Mas este instrumento processual tem por fim último possibilitar alterar a matéria de facto que o tribunal recorrido considerou provada ou não provada, para, face à nova realidade a que por esse caminho se chegou, se possa concluir que, afinal, existe o direito que foi invocado, ou que não se verifica um outro cuja existência se reconheceu. O seu efetivo objetivo é, portanto, conceder à parte uma ferramenta processual que lhe permita modificar a matéria de facto considerada provada ou não provada, de modo a que, por essa via, obtenha um efeito juridicamente útil ou relevante.
Se, por qualquer motivo, o facto a que se dirige aquela impugnação for irrelevante para a decisão a proferir, então torna-se inútil a atividade de reapreciar o julgamento da matéria de facto, pois, nesse caso, mesmo que, em conformidade com a pretensão do recorrente, se modifique o juízo anteriormente formulado, sempre o facto que agora se considerou provado ou não provado continua a ser juridicamente inócuo ou insuficiente.
Quer isto dizer - conforme vem sendo entendido[6] -, que não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objeto da impugnação não for suscetível de, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente.
Alinhando por igual visão das coisas, entendemos que a preconizada alteração da redação da proposição factual em crise é concretamente inócua, posto que da mesma não se extrai qualquer consequência jurídica com reflexo na decisão das concretas questões que delimitam objetivamente o âmbito do presente recurso, porquanto o que se discute nos autos é saber se os serviços a que se reporta a fatura nº ... foram ou não prestados e se respeitam ao contrato de empreitada em análise nos autos, sendo completamente irrelevante para o contexto da ação se os mesmos tiveram o seu términus em 2016, 2017 ou mesmo em 2018.
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A apelante defende ainda que o ponto 1. dos factos não provados deverá transitar para o elenco dos factos provados, porquanto, na sua perspetiva, resulta manifestamente da prova produzida nos autos, nomeadamente testemunhal, que, no âmbito do contrato de empreitada celebrado entre recorrente e recorrida, foram prestados os serviços descritos no ponto 3. do requerimento injuntivo.
Com o desiderato de comprovar essa materialidade, limita-se praticamente a transcrever excertos dos depoimentos que as testemunhas EE, DD e CC prestaram na audiência final, bem como no depoimento de parte da ré AA.
Vejamos, então, se lhe assiste razão.
Como vem sendo defendido na doutrina e na jurisprudência, para este efeito impugnatório, não basta a mera indicação, sem mais, de um determinado meio de prova, e também se revela insuficiente no que respeita à prova pessoal, a transcrição de alguns dos depoimentos produzidos em julgamento.
Com efeito, na motivação de um recurso, para além da alegação da discordância, é outrossim fundamental a alegação do porquê dessa discordância, isto é, torna-se mister evidenciar a razão pelo qual o recorrente entende existir divergência entre o decidido e o que consta dos meios de prova invocados.
Nesse sentido tem sido interpretado o segmento normativo “impunham decisão diversa da recorrida” constante da 2ª parte da al. b) do nº 1 do citado art. 640º, acentuando-se que o cabal exercício do princípio do contraditório pela parte contrária impõe que sejam conhecidos de forma clara os concretos argumentos do impugnante[7].
Daí que, da mesma maneira que ao tribunal de 1ª instância é atribuído o dever de fundamentação e de motivação crítica da prova que o conduziu a declarar quais os factos que julga provados e não provados (art. 607º, nº 4), devendo especificar, por razões de sindicabilidade e de transparência, os fundamentos que concretamente se tenham revelado decisivos para formar a sua convicção, facilmente se compreende que, em contraponto, o legislador tenha imposto à parte que pretenda impugnar a decisão de facto o respetivo ónus de impugnação, devendo expor os argumentos que, extraídos de uma apreciação crítica dos meios de prova, determinem, em seu entender, um resultado diverso do decidido pelo tribunal a quo.
Isso mesmo é sublinhado por ANA LUÍSA GERALDES[8], quando refere que o recorrente ao enunciar os concretos meios de prova que devem conduzir a uma decisão diversa, “deve fundar tal pretensão numa análise (crítica) dos meios de prova, não bastando reproduzir um ou outro segmento descontextualizado dos depoimentos”. Exige-se, pois, o confronto desses elementos com os restantes que serviram de suporte para a formulação da convicção do Tribunal de 1ª instância (e que ficaram expressos na decisão), com recurso, se necessário, aos restantes meios probatórios, v.g., documentos, relatórios periciais, etc., apontando as eventuais disparidades e contradições que infirmem a decisão impugnada e é com esses elementos que a parte contrária deverá ser confrontada, a fim de exercer o contraditório, no âmbito do qual poderá proceder à indicação dos meios de prova que, em seu entender, refutem as conclusões do recorrente.
Certo é que a apelante não realizou esse exercício de confronto entre (todos) os meios de prova produzidos sobre a materialidade impugnada, limitando-se, como se referiu, a transcrever excertos dos depoimentos prestados pelas testemunhas por si arroladas, não evidenciando em que medida os mesmos possam abalar o sentido decisório que quanto a essa factualidade foi acolhido pelo decisor de 1ª instância, sendo que, como se enfatizou, não basta para tal efeito reproduzir excertos esses depoimentos, alguns deles de forma descontextualizada.
Resulta do exposto que a apelante não deu integral cumprimento ao mencionado ónus, o que, per se, motiva a improcedência do recurso no seu segmento de impugnação da matéria de facto.
Como quer que seja, depois de se proceder à audição integral dos registos fonéticos dos depoimentos produzidos no decurso da audiência final verifica-se que as mencionadas testemunhas, de útil, referiram que a autora, durante vários anos, prestou trabalhos na obra da ré, desconhecendo, contudo, se nas faturas emitidas em data anterior à fatura em que a demandante se filia para reclamar o pagamento “de mão de obra” foram ou não levados em consideração tais serviços, nada de concreto sabendo adiantar quanto aos concretos serviços (“mão de obra”) a que se reporta tal fatura.
Neste conspecto, não será despiciendo sublinhar que a fatura em crise (com o nº ...) não tem um especial préstimo quanto a definição dos serviços efetivamente nela mencionados, face à sua manifesta genericidade (onde apenas consta na descrição “mão de obra referente a trabalhos efetuados em reabilitação de habitação familiar”), não indicando nem descriminando quais os serviços executados, momento da sua realização, trabalhadores envolvidos na sua execução, tempo despendido, etc., o que consubstancia uma clara inobservância das determinações legais estabelecidas no nº 6 do art. 35º do Código do IVA para que um suporte documental como o que foi apresentado possa relevar para efeitos probatórios.
A este propósito será outrossim de ressaltar que, ao invés do que parece ser entendimento da apelante, a ela competiria, como prius, o onus probandi da execução dos serviços cujo pagamento reclama e somente na hipótese de lograr essa prova seria então imposto à demandada o ónus da prova do respetivo pagamento.
Resulta do exposto que quer a prova documental quer a prova pessoal que a apelante convoca no sentido de justificar a emissão de um juízo probatório positivo sobre a afirmação de facto em questão não se revela bastante para legitimar a alteração do sentido decisório adrede acolhido na sentença recorrida.
Será igualmente de registar que o que ressuma da motivação da decisão sub iudicio tecida pelo juiz de 1ª instância sobre a factualidade controvertida nos autos e da motivação do recurso sub specie é, na essência, uma divergente valoração da prova pessoal que a apelante convoca em arrimo da sua impugnação, mormente dos depoimentos prestados pelas testemunhas por si arroladas.
Portanto, tribunal recorrido e recorrente não divergem na leitura das provas, divergem na respetiva valoração, sendo que, neste particular – tal como deflui das considerações tecidas na motivação da sentença recorrida - a manifestação desse convencimento pelo julgador revela uma tomada de posição clara e inequívoca, aí se indicando, de forma que reputamos adequada e coerente, as razões que fundaram a sua convicção, sendo certo que o tribunal é livre de dar credibilidade a determinados depoimentos, em detrimento de outros, desde que essa opção seja explicitada e convincente. Tal é o caso, posto que na sentença recorrida, no segmento em que procedeu à motivação da decisão de facto, o julgador exteriorizou o percurso lógico que o conduziu à formulação do juízo probatório negativo que recaiu sobre o enunciado fáctico vertido no ponto 1 dos factos não provados, expondo com clareza os motivos essenciais que o determinaram a decidi-lo no sentido aí acolhido.
Inexiste, assim, fundamento probatório bastante que imponha (tal como se estabelece no nº 1 do art. 662º) decisão diversa relativamente à proposição factual em crise.
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Resta, pois, apreciar se, tal como preconizado pela recorrente, deve ser levada à matéria de facto provada um novo facto com o seguinte teor: “os trabalhos efetuados na piscina da sua habitação e a execução de uma laje de piso no mesmo imóvel não foram pagos à Recorrente”.
A apelante justifica esse seu propósito na circunstância de a ré, aquando da sua audição em julgamento, ter declarado que os trabalhos efetuados na piscina da sua habitação e a execução de uma laje de piso no mesmo imóvel não foram pagos, declaração essa que, aliás, consta de assentada documentada na ata da sessão realizada em 17 de outubro de 2022.
Também neste ponto não assiste razão à recorrente.
Com efeito, trata-se de materialidade que sequer foi alegada na peça com que a autora deu início ao presente processo, sendo certo que não houve válida alteração/ampliação dos elementos objetivos da instância, seja à luz do disposto no art. 265º, seja ao abrigo do art. 588º, surgindo, assim, como novo pedido apenas aduzido agora em sede de alegações recursivas, consubstanciando, nessa medida, uma questão nova cuja apreciação não cabe nos poderes de cognição deste tribunal ad quem sabido como é que o presente recurso de apelação assume natureza de recurso de reponderação.
Aliás, mesmo que se considerasse tais factos como complemento ou concretização de materialidade que a autora alegou na sua petição inicial (o que, quanto a nós, não é o caso por se estar antes em presença de factos essenciais nucleares que não serviram à densificação da causa de pedir e ao pedido que a demandante formulou – tanto assim que, como o seu legal representante expressamente reconheceu aquando da sua audição em julgamento, os trabalhos de abertura da piscina não estão a ser cobrados nestes autos), sempre estaria vedado a este Tribunal de 2º instância considerá-los por inverificação do condicionalismo estabelecido no art. 5º.
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3. FUNDAMENTOS DE DIREITO

3.1. Do pedido de condenação da ré no pagamento do valor constante da fatura nº ...21/7com base na celebração do ajuizado contrato de empreitada entre as partes

A apelante pugna pela revogação da decisão recorrida e pela procedência da pretensão que formulou no requerimento injuntivo em consequência da alteração factual por que pugnou e não porque sustente que a sentença recorrida enferme de qualquer erro de interpretação ou de aplicação do direito aos factos que julgou provados.
Contudo, a impugnação da decisão da matéria de facto improcedeu totalmente, mantendo-se, por isso, intocado o quadro factual que serviu de apoio à solução jurídica do caso pelo tribunal recorrido e que, como se viu, se traduziu na improcedência do pedido que a autora direcionou contra a ré por falta de demonstração por parte daquela de que os serviços constantes na referida factura foram prestados, sendo que ali se considerou que a autora não logrou sequer localizar no tempo espacialmente, nem descrever os mesmos.
Na verdade, a sentença recorrida decidiu, em face das declarações negociais proferidas pelas partes (cfr. 2º, 3º e 5º factos provados) estar-se perante a celebração de um contrato de empreitada, na forma verbal – sem que tal tenha qualquer influência sobre a validade do mesmo (art. 219º do Código Civil). E que por conta desta obra a ré pagou à autora a quantia de €92.675,73, não se tendo provado estar em falta o pagamento de quaisquer quantias referentes a esses trabalhos (cfr. facto não provado).
Desta feita, também neste aspeto não nos merece qualquer censura a sentença recorrida na medida em que perante a aludida factualidade, foi feita a respetiva subsunção às normas jurídicas que ali foram analisadas, concluindo-se que não se encontra a ré obrigada ao pagamento de quaisquer valores, tendo-se julgado a acção totalmente improcedente, por não provada.
Neste circunstancialismo, dada a vinculação deste tribunal na sua esfera de cognição à delimitação objetiva resultante das conclusões do recurso, deve concluir-se, sem mais, pela improcedência do recurso na parte em que era pedida a procedência do aludido pedido condenatório tendo por base a mencionada causa petendi.
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3.2. Da litigância de má-fé

Como resulta das contra-alegações de recurso, a apelada suscita a questão da má-fé instrumental da apelante.
Cumprido o contraditório, a apelante pronunciou-se sobre a imputação de litigância de má-fé que lhe foi direcionada na aludida peça processual, rejeitando-a veemente.
Apreciando.
Como é sabido, o instituto da litigância de má-fé, tal como se mostra configurado no art. 542º, visa sancionar comportamentos contrários ao princípio da boa-fé processual, embora exija que tais comportamentos sejam acompanhados por um específico animus da parte do agente.
Na verdade, se atentarmos ao teor literal das diversas alíneas do nº 2 do citado normativo – que comportam ou descrevem o elemento objetivo da litigância de má-fé – verificamos que estas se tratam de verdadeiras concretizações do princípio da boa-fé.
As mesmas, procurando traduzir o sentido negativo da boa-fé processual, elencam os comportamentos que as partes se devem abster de praticar de molde a não prejudicarem o decurso da relação jurídica processual, que deve ser pautado por um espírito de cooperação intersubjetiva e consentâneo com o dever de verdade, tendo em vista a justa resolução do litígio. Contudo, a lei não se basta com o mero preenchimento do elemento objetivo tal como se mostra descrito nas referidas alíneas, impondo outrossim que na inobservância desses deveres a parte aja com dolo ou negligência grave.
Estabelece-se nas als. a) e b) do nº2 do art. 542º, que “diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar” (al. a)) [ou] “tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa” (al. b)).
No que tange à alínea a), nela se tipifica um comportamento contrário aos ditames da boa-fé processual, impondo às partes um dever de cuidado aquando da propositura da ação ou dedução da oposição, para que se não coloque em funcionamento a máquina judiciária em casos em que a manifesta falta de fundamento poderia ser conhecida a priori.
Como salienta ABRANTES GERALDES[9], por mor desta determinação legal, é imposto ao autor que, antes de instaurar uma ação, pondere a sua razoabilidade, evitando-a se não houver fundamento sério para a dedução da pretensão, sendo ilegítima uma atitude irrefletida ou sem qualquer base mínima de apoio.
Já no concernente à alínea b), a mesma sanciona a violação do dever de verdade a que as partes devem obedecer nas suas alegações fáticas, impondo-lhes que se abstenham de emitir falsas declarações ou omitir factos relevantes, dever esse que decorre ainda do princípio da boa-fé processual que se mostra plasmado no art. 8º.
No entanto, como se sublinhou, para que o comportamento abusivo, descrito em qualquer uma das referidas alíneas, seja considerado de má-fé, torna-se mister que tenha sido praticado na presença de um determinado elemento de ordem subjetiva, exigência que se justifica pela margem de liberdade que o processo necessariamente supõe. Se assim não fosse, sendo a litigância de má-fé dirigida à imposição de uma sanção ao litigante ímprobo, acabariam por se sancionar condutas processuais que se demonstrassem manifestamente infundadas ou dilatórias ainda que praticadas de modo desculpavelmente inconsciente. Em sede de litigância de má-fé exige-se, portanto, uma subjectivização do abuso, afastando o risco de eliminar ou restringir em demasia o direito fundamental de ação[10] ou defesa.
Assim, como refere PAULA COSTA E SILVA[11], a ilicitude pressuposta pela litigância de má-fé distancia-se da ilicitude civil (art. 483º Cód. Civil), não apenas porque se apresenta como um ilícito típico (descrevendo analiticamente as condutas que o integram), mas também porque, ao contrário do que sucede com o ilícito civil, se encontra dependente da verificação de um elemento subjetivo, sem o qual o comportamento da parte não pode ser tido como típico e, consequentemente, como ilícito, aproximando-se nesta medida muito mais do ilícito penal.
Efetivamente, quando no proémio do nº 2 do art. 542º, o legislador refere “quem, com dolo ou negligência grave” praticar o comportamento prescrito em qualquer das suas alíneas, parece pressupor que, para que se verifique o comportamento típico descrito em cada uma delas, o sujeito atue já imbuído de dolo ou culpa grave. Tal como sucede no âmbito penal, o tipo de ilícito do art. 542º será constituído não apenas por um elemento de natureza objetiva (que serve para dar a conhecer ao sujeito processual que aquele comportamento é proibido pelo ordenamento jurídico), mas também por um elemento de natureza subjetiva (no âmbito processual: o dolo ou a negligência grave), sendo que apenas quando ambos se verifiquem a conduta poderá ser considerada típica e, por conseguinte, ilícita.
Quanto a este elemento subjetivo a lei adjetiva[12] acolhe, assim, a máxima culpa lata dolo aequiparatur, considerando litigância de má-fé não apenas a lide dolosa, mas também a lide temerária, consagrando, deste modo, uma noção ética de boa-fé subjetiva[13], considerando de má-fé não apenas aquele que conhece o erro em que incorre, mas também aquele que o desconhece por não ter cumprido com os deveres de cuidado que lhe eram impostos. Todavia, esta eticização da má-fé processual não se afigura total, na medida em que se não compadece com qualquer desrespeito por esses deveres de cuidado, independentemente do grau de culpa. Pelo contrário, apenas estaremos perante má-fé processual quando se tenham desrespeitado os mais elementares deveres de cuidado e de prudência, atuando de forma gravemente negligente, isto é, com culpa grave.
Por conseguinte, apenas na presença de má-fé (subjetiva), isto é, da consciência de que lhe não assiste razão, ou quando – face às dificuldades em apurar a verdadeira intenção do litigante – tal consciência apenas se ausente por inobservância das mais elementares regras de prudência, o comportamento processual será reconduzido ao ilícito típico do art. 542º, nº 2, sendo sancionado como litigância de má-fé.
No entanto, no referido preceito não se definiu o que se entende por dolo ou por culpa grave, pelo que, na falta de subsídios auxiliares de interpretação da norma extraídos do próprio Código de Processo Civil, não será de todo desajustado, de acordo com o elemento sistemático, recorrer a outros campos do sistema jurídico, com especial relevância para o direito civil e criminal, onde os conceitos de dolo e negligência têm sido objeto de particular estudo.
Sucede que, no caso em apreço, não se vislumbra que a recorrente tenha assumido com o presente recurso um comportamento subsumível a qualquer das alíneas do normativo citado supra e que seja merecedor de um juízo de censura em termos tais que justifiquem a sua condenação por litigância de má-fé, sendo que, neste particular, não será despiciendo salientar que a questão introduzida nas alegações recursórias referentes aos trabalhos na piscina construída na residência da demandada foram motivadas pelas declarações por esta prestadas na audiência final.
***
III- DISPOSITIVO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação interposta pela autora, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da apelante.
Guimarães, 01.02.2024


[1] Diploma a atender sempre que se citar disposição legal sem menção de origem.
[2] In Recursos no Novo Código de Processo Civil, pág. 225; no mesmo sentido milita REMÉDIO MARQUES (in A ação declarativa, à luz do Código Revisto, 3ª edição, págs. 638 e seguinte), onde critica a conceção minimalista sobre os poderes da Relação quanto à reapreciação da matéria de facto que vem sendo seguida por alguma jurisprudência.
[3] Isso mesmo é ressaltado por ABRANTES GERALDES, in Temas da Reforma de Processo Civil, vol. II, 3ª ed. revista e ampliada, pág. 272.  
[4] Assim ABRANTES GERALDES Recursos, pág. 299 e acórdãos do STJ de 03.11.2009 (processo nº 3931/03.2TVPRT.S1) e de 01.07.2010 (processo nº 4740/04.7TBVFX-A.L1.S1),ambos acessíveis em www.dgsi.pt. 
[5] Concretamente: “os trabalhos efetuados na piscina da sua habitação e a execução de uma laje de piso no mesmo imóvel não foram pagos à Recorrente.”
[6] Cfr., inter alia, acórdãos da Relação de Coimbra de 27.05.2014 (processo nº 1024/12) e de 24.04.2012 (processo nº 219/10), acórdão da Relação de Lisboa de 14.03.2013 (processo nº 933/11.9TVLSB-A.L1-2), acórdãos desta Relação de 15.12.2016 (processo nº 86/14.0T8AMR.G1) e de 13.02.2014 (processo nº 3949/12.4TBGMR.G1) e acórdão da Relação do Porto de 17.03.2014 (processo nº 7037/11.2TBMTS-A.P1), todos acessíveis em www.dgsi.pt. No mesmo sentido se pronuncia ABRANTES GERALDES, Recursos, pág. 297, onde escreve que “de acordo com as diversas circunstâncias, isto é, de acordo com o objeto do recurso (alegações e, eventualmente, contra-alegações) e com a concreta decisão recorrida, são múltiplos os resultados que pela Relação podem ser declarados quando incide especificamente sobre a matéria de facto. Sintetizando as mais correntes: (…) abster-se de conhecer da impugnação da decisão da matéria de facto quando os factos impugnados não interfiram de modo algum com a solução do caso, designadamente por não se visionar qualquer solução plausível da questão de direito que esteja dependente da modificação que o recorrente pretende operar no leque de factos provados ou não provados”.
[7] Cfr., neste sentido, acórdão do STJ de 15.09.2011 (processo nº 1079/07.0TVPRT.P1.S1), de 2.12.2013 (processo nº 34/11.0TBPNI.L1.S1) e de 22.10.2015 (processo nº 212/06), acórdãos da Relação do Porto de 5.11.2012 (processo nº 434/09.5TTVFR.P1) e de 17.03.2014 (processo nº 3785/11.5TBVFR.P1) e acórdãos desta Relação de 15.09.2014 (processo nº 2183/12.TBGMR.G1) e de 15.10.2015 (processo nº 132/14.8T8BCL.G1), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[8] Impugnação e reapreciação da decisão da matéria de facto, pág. 4 e seguinte, trabalho disponível em www.cjlp.org/materias/Ana_Luisa_Geraldes_Impugnacao_e_Reapreciacao_da_Decisao_da_Materia_de_Facto.pdf. Idêntico entendimento vem sendo acolhido na jurisprudência, de que constituem exemplo, inter alia, os acórdãos do STJ 15.09.2011 Processo nº 1079/07.0TVPRT.P1.S1de 2.12.2013 (processo nº 34/11.0TBPNI.L1.S1) e de 22.10.2015 (processo nº 212/06), acórdãos da Relação de Porto de 5.11.2012 (processo nº 434/09.5TTVFR.P1) e de 17.03.2014 (processo nº 3785/11.5TBVFR.P1) e acórdãos desta Relação de 15.09.2014 (processo nº 2183/12.TBGMR.G1) e de 15.10.2015 (processo nº 132/14.8T8BCL.G1), acessíveis em www.dgsi.pt.
[9]  In Temas Judiciários, pág. 320.
[10] Direito este que, conforme vem sendo entendido - cfr., inter alia, ANSELMO DE CASTRO, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. I, págs. 85 e seguintes; ANTUNES VARELA, O direito de acção e a sua natureza jurídica, in Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 125º, págs. 325 e seguintes e MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil, Vol. I, págs. 335 e seguintes -, surge, estruturalmente, como um direito potestativo cujo reverso é a sujeição à ação com todas as implicações que isso motiva na pessoa demandada, ressaltando os referidos autores que esse direito é totalmente independente da existência do direito substantivo feito valer e, por conseguinte, da prolação de sentença favorável ou desfavorável, configurando-se como um direito abstrato.
[11]  A litigância de má-fé, passim, especialmente págs. 379 e seguintes. Em análogo sentido militam ainda JÚLIO CUNHA, A propósito da responsabilidade processual, in Estudos em homenagem ao Prof. Doutor António Motta Veiga, págs. 696 e seguintes e PEDRO DE ALBUQUERQUE, Responsabilidade processual por litigância de má-fé, abuso de direito e responsabilidade civil em virtude de atos praticados no processo, pág. 92, enfatizando este último que o elemento subjetivo é pressuposto constitutivo da figura da litigância de má-fé.
[12] Que, como é sabido, sofreu uma relativa ampliação a partir do DL nº 329-A/95, de 12.12, posto que, para além do dolo, passou a ser considerado de má-fé também aquele que apenas desconhece a sua falta de razão porque grosseiramente não observou os mais elementares deveres de cuidado.
[13] Sobre o conceito de boa-fé subjetiva no sentido ético cfr., por todos, MENEZES CORDEIRO, Da boa-fé no Direito Civil, págs. 516 e seguintes, onde preconiza que para que o sujeito seja considerado de boa-fé, não basta o simples desconhecimento sendo necessário um desconhecimento desculpável, ou seja um desconhecimento que permaneça mesmo havendo sido cumpridos os deveres de diligência e cuidado.