Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
7278/19.4T8GMR.G1
Relator: MARGARIDA ALMEIDA FERNANDES
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO
PERDA DE CHANCE
PROBABILIDADE DE CONCRETIZAÇÃO DA VANTAGEM
NEXO DE CAUSALIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/16/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- Quando o apelante omite, na motivação do recurso, a especificação dos concretos meios probatórios que impõem, no seu parecer, decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados é de rejeitar a impugnação da decisão relativa à matéria de facto ao abrigo do disposto no art. 640º n.º 1 b) do C.P.C.
II- O advogado não deve aceitar patrocínio de uma questão se souber, ou dever saber, que não tem competência ou disponibilidade para dela se ocupar prontamente, a menos que atue conjuntamente com outro advogado com competência e disponibilidade para o efeito (art. 93º nº 2 do E.O.A./05) e tem o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos do cliente (art. 92º do mesmo Estatuto).
III- A obrigação do mandatário forense é, em regra, uma obrigação de meios uma vez que aquele normalmente obriga-se a desenvolver uma atividade ou conduta diligente em direção ao resultado final, mas sem assegurar que o mesmo se produza, mas não é de excluir que este mandato possa conter uma concreta obrigação de resultado, um dever de concretizar um determinado objetivo.
IV- O S.T.J. tem vindo a aceitar a doutrina da perda de chance no caso da perda de chances processuais devido à violação dos deveres profissionais do advogado, admitindo, deste modo, a responsabilidade civil deste nas situações em que se prova que o lesado veria reconhecido com forte probabilidade, não fora a chance perdida, o seu direito face da doutrina e jurisprudência então existentes, o que pressupõe um “julgamento dentro do julgamento”.
V- Pratica um ato ilícito e culposo o advogado que demorou cerca de 5 anos a instaurar uma ação de responsabilidade civil com fundamento em erro médico no âmbito de cuidados de saúde prestados por estabelecimento público e na qual veio a ser proferida decisão transitada em julgado que considerou o direito prescrito. Contudo, não se provando que fosse altamente provável a procedência dessa ação, inexiste dano por perda de chance suscetível de ser imputado ao mandatário.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório

I. C., residente na Travessa …, Santo Tirso;
Instaurou a presente acção declarativa sob a forma comum contra
J. O., Advogado com a cédula profissional …, com domicílio profissional na Rua …., Guimarães; e
X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal en España, com sede na Plaza de la …, Madrid;

Pedindo:
a) A condenação solidária dos réus no pagamento da quantia de € 201.000,00 a título de danos patrimoniais, de € 30.000,00 a título de danos não patrimoniais, num total de € 231.000,00, acrescida de juros, à taxa legal em vigor, desde a citação até efectivo e integral pagamento;

Subsidiariamente,
b) A condenação da 2ª ré Seguradora X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal en España, a pagar à autora a quantia total de € 150.000,00 a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros, à taxa legal em vigor, desde a citação até efectivo e integral pagamento;
c) A condenação do 1º réu J. O. a pagar à autora a quantia total de € 81.000,00 a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros, à taxa legal em vigor, desde a citação até efectivo e integral pagamento;

Ou ainda subsidiariamente,
d) A condenação do 1º réu J. O. a pagar à autora a quantia total de € 231.000,00 a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros, à taxa legal em vigor, desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Alega, em síntese, que em 31/01/2000 foi-lhe diagnosticado um síndroma varicoso dos membros inferiores pelo Hospital da ..., tendo sido aconselhada a submeter-se a uma intervenção cirúrgica a fim de resolver o problema pelo que se inscreveu nos serviços competentes da Administração Regional de Saúde do Norte tendo ficado em lista de espera. Volvidos 3 anos recebeu uma notificação dando-lhe a possibilidade de a sua operação se realizar, sem qualquer tipo de encargo, no Hospital da Misericórdia da ..., o que aceitou.
Assim, no dia 19/05/2004 foi submetida a uma intervenção cirúrgica ao seu membro inferior direito, que consistiu na laqueação da veia safena interna ao nível da crossa e ao nível do maléolo interno, bem como na laqueação das comunicantes insuficientes. Após a intervenção queixou-se de dores na perna, não conseguindo levantar-se e segurar-se de pé sozinha. No dia seguinte continuou com dores e continuou a não conseguir levantar-se e manter-se de pé sozinha, mas apesar disso foi-lhe dada alta médica com uma carta para ser entregue no Centro de Saúde onde era acompanhada para posteriormente ser vista pelo médico de família respectivo e fazer os devidos curativos. Continuando muito queixosa dirigiu-se ao serviço de urgência, onde lhe foi prescrita a toma de “Ben-u-ron” e “Brufen”. Como as dores que sentia eram cada vez maiores dirigiu-se de novo ao serviço de urgência e em 01/07/2004 foi internada no serviço de angiologia e cirurgia vascular do Hospital ... com o diagnóstico de trombose venosa femoro-poplitea do membro inferior direito.
O médico especialista P. B. disse-lhe que houve erro médico e aconselhou-a a recorrer a um advogado, o que fez recorrendo aos serviços do 1º réu. Este comunicou-lhe que dispunham de elementos para intentar uma acção de responsabilidade civil pelo que outorgou a favor deste uma procuração forense no dia 15/01/2005 e entregou-lhe a provisão de € 1.250,00. Várias vezes entrou em contacto com o escritório do 1º réu tendo sido informada que o processo já estava no Tribunal e que iria ser marcada uma consulta no Hospital para ser examinada por peritos. O 1º réu deu-lhe a entender que o processo estava a decorrer com normalidade. Tendo recebido uma chamada telefónica anónima a dizer-lhe que o seu processo não estava intentado confrontou o 1º réu sobre o assunto, o qual, algumas semanas depois, lhe indicou que a acção estava a correr termos no Tribunal Judicial de Santo Tirso, sob o nº 2182/10.4TBSTS. Deslocou-se a esse Tribunal, onde obteve a informação de que o processo já se encontrava findo por força de uma declaração de incompetência material. Tendo confrontado o 1º réu este disse-lhe que o problema já estava resolvido e que o processo estava a correr os seus termos sob o n.º 762/11.0BEBRG no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga. Há cerca de 2 anos, continuando sem desenvolvimentos, deslocou-se ao TAF de Braga, onde lhe foi dito que a acção estava finda e que a tinha perdido, “porque foi metida fora de prazo”. Confrontou novamente o 1º réu, o qual não lhe deu qualquer explicação, remetendo-se ao silêncio. Ora, o 1º réu não tratou com zelo o assunto que lhe foi entregue, impedindo-a de ser indemnizada pelos danos que sofreu em consequência directa dos erros cometidos na intervenção cirúrgica.
Antes da cirurgia exercia a actividade profissional de costureira qualificada, auferindo o rendimento mensal de cerca € 550,00. Em virtude de erro ou má prática cometido na operação ficou a padecer de trombose venosa profunda do seu membro inferior direito, o que foi causa da sua reforma por invalidez profissional. Tornou-se uma pessoa triste e receosa sobre o seu estado de saúde. Se o 1º Réu tivesse proposto a acção de indemnização no devido tempo muito provavelmente teria sido indemnizada (pelos danos patrimoniais e não patrimoniais) no montante de € 200.000,00, que corresponde ao pedido que aquele lhe disse que iria formular contra o médico H. F.. A este valor acrescem as despesas de transporte que realizou para se deslocar ao escritório do 1º Réu (em quantia não inferior a € 1.000,00), assim como os danos não patrimoniais que experimentou em virtude da conduta deste (em montante nunca inferior a € 30.000,00).
A Ordem dos Advogados contratou com a 2ª ré o seguro de grupo de responsabilidade profissional de advogados para o ano civil de 2019, estando o 1º réu abrangido pelo mesmo, no pressuposto de ter a sua inscrição em vigor.
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O 1º réu não apresentou contestação.
A 2ª ré apresentou contestação invocando a ineptidão da petição inicial com o fundamento de que a Autora não alegou factos concretos que demonstrem a possibilidade da procedência da acção administrativa e a existência de “perda de chance” e, bem assim, a sua ilegitimidade uma vez que apurou que o 1º réu participou os factos alegados na petição inicial à seguradora Y – Seguros Gerais, S.A. para a qual, na data de 09/01/2017, se encontrava transferida a responsabilidade civil decorrente da sua actividade profissional.
Impugnou os factos alegados referentes à intervenção cirúrgica e à relação estabelecida com o 1º réu. Subsidiariamente alegou que, a haver condenação, o 1º réu será sempre responsável pelo valor da franquia contratada de € 5.000,00.
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A autora deduziu o incidente de intervenção principal provocada contra a Y – Seguros Gerais, S.A. invocando a existência de dúvidas sobre o titular da relação controvertida.
Por despacho de 26/05/2020 este chamamento foi deferido.
A Interveniente apresentou contestação admitindo a celebração de um contrato de seguro com a Ordem dos Advogados, com início a 01/01/2014 e termo a 31/12/2017. A título de excepção invocou a falta de cobertura temporal das apólices, atento o pré-conhecimento do sinistro por parte do 1º réu à data de início da apólice e a existência de franquia no montante de € 5.000,00 por sinistro.
Impugnou, por desconhecimento, os factos narrados na petição inicial acerca da intervenção cirúrgica e da conduta do 1º réu e sustentou que aqueles são insuficientes para demonstrar a probabilidade séria de sucesso da pretensão da autora, não fora o comportamento do segurado.
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Por despacho de 24/09/2020 a autora foi convidada a aperfeiçoar a petição inicial explicitando as regras de arte da ciência médica que foram violadas no procedimento cirúrgico a que foi sujeita ou no período pós-operatório.
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A Autora esclareceu, em resumo, que a laqueação não terá sido bem executada, não tendo o médico cirurgião apertado suficientemente o pedaço remanescente da via safena e não tendo procedido a uma adequada dissecção da crossa da safena interna, e ainda que, após o acto cirúrgico, e apesar das queixas da autora, aquele não avaliou o seu estado clínico, nem procedeu à marcação de qualquer consulta pós-operatória. Mais referiu que o médico que a assistiu no serviço de urgência desvalorizou as queixas por si apresentadas limitando-se a prescrever-lhe “Ben-u-ron” e “Brufen” quando devia ter efectuado em eco-doppler para apurar a razão do estado em que se encontrava.
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A autora respondeu às excepções deduzidas nas contestações.
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A 2ª ré e a interveniente impugnaram a matéria com que a autora complementou a causa de pedir.
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Foi dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador no qual foram julgadas improcedentes as excepções de ineptidão da petição e de ilegitimidade, foi identificado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova.
A 2ª ré apresentou reclamação acerca dos temas da prova tendo esta sido indeferida.
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Procedeu-se à realização da audiência de julgamento através do aplicativo WEBEX por ter merecido a concordância de todos os sujeitos processuais, após a qual foi proferida sentença, cuja parte decisória, na parte que interessa, reproduzimos:
“Em face do exposto:
- Julga-se a ação totalmente improcedente, absolvendo-se os Réus J. O. e X INSURANCE e a Interveniente Y dos pedidos formulados. (…)”
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Não se conformando com esta sentença veio a autora dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:

“1- Sobe o presente recurso de apelação a V. Exas. para crítica e revogação da douta sentença recorrida, quer quanto ao respetivo julgamento de facto, quer especialmente no que diz respeito ao correspondente julgamento de direito.
2- É, pois, intenção da aqui recorrente impugnar a decisão de 1ª instância sobre a matéria de facto, suscitando a revisão no 2º grau de jurisdição desse excelso Tribunal da Relação de determinados pontos de facto que foram incorretamente julgados na 1ª instância, tudo com referência aos artigos 644º e 662º do Código de Processo Civil, pontos esses que, face à prova produzida deveriam de ter sido dados como provados, concretamente as alíneas 1, 5, 10, 12 a 17, 19 a 48 dos factos não provados, com as inevitáveis consequências quanto ao julgamento de direito e ao pedido formulado pelo autora.
3- Factos estes que aqui expressamente se especificam nos termos e para os efeitos da alínea a) do artigo 640º do Código de Processo Civil.
4- Porquanto os meios probatórios constantes do processo são suscetíveis, no modesto entender da recorrente, de fundamentar uma resposta positiva a esses pontos.
5- Atendendo á fundamentação do Tribunal a quo para descredibilizar os depoimentos das testemunhas apresentadas pela autora, nomeadamente o filho da autora, o marido, cunhada e E. J., entende o recorrente, com o devido e grande respeito pelo Tribunal a quo, que os factos/motivos apresentados para descredibilizar as testemunhas indicadas pela recorrente não são à luz do Homem Médio razoáveis, com todo o respeito que o Tribunal a quo nos merece e com o devido respeito e compreensão pelo princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador.
6- O Tribunal a quo na sua douta motivação quanto aos procedimentos médicos a que Autora foi/não foi sujeita, referiu, entre o mais, que a cirurgia realizada pela autora no dia 19.05.2005, consistiu numa cirurgia de natureza vascular na sequência de diagnóstico de síndrome varicoso dos membros inferiores. Consistindo essa cirurgia na laqueação da veia safena interna ao nível da crossa e ao nível do maléolo interno e na laqueação de comunicantes insuficientes ao longo do membro.
7- Quanto ao período pré-operatório entre o diagnóstico e a cirurgia, não foi efetuada novo eco-doppler de acordo com a autora, considerando o Tribunal a quo que apenas ficou provado que imediatamente antes do ato cirúrgico, o médico que a operou não solicitou a realização de novo exame. Referindo o Tribunal a quo que não se sabe se só foi na altura do diagnóstico da síndrome varicoso que a autora foi sujeita a esse exame.
8- Ora, com todo o devido respeito que o Tribunal a quo nos merece, não havendo nada em contrário que o contrariasse, o Tribunal a quo não poderia afirmar que “não se sabe se só foi na altura do diagnóstico da síndrome varicoso que a autora foi sujeita a esse exame”, isto porque o próprio médico que a operou admite que não prescreveu entre os exames pré operatórios que lhe recomendou e as consultas que teve antes da intervenção mais nenhum eco doppler.
9- Aliás, o único eco doppler que existe no processo é datado de 21/05/2005, ou seja, em data posterior à realização da cirurgia da recorrente, o que é confirmado pela testemunha H. F., que refere expressamente essa data, no entanto, também refere, sem dúvidas, que a autora apenas o contactou, diz inicialmente julho, depois acaba por dizer setembro de 2004. A este respeito vide o depoimento da testemunha H. F., gravado através do suporte digital, ficheiro 00:00:01 até 01:08:18, conforme ata do dia 03 de fevereiro de 2021, minutos 32:11 a 35:54, 41:01 a 42:16, 48:12 a 49:40.
10- A recorrente estranha o facto de o médico não ter na informação clínica da mesma a indicação da data do eco doppler efetuado previamente à cirurgia, tendo em conta que esse exame tinha necessariamente que ser efetuado antes da cirurgia, como foi referido quer pela testemunha H. F., quer pela testemunha P. B. e deveria ter sido visto pelo médico cirurgião que operou a recorrente.
11- Ora, é de todo incompreensível que se aluda a exames que, de acordo com os relatórios estariam normais, mas os mesmos pura e simplesmente não foram juntos aos autos como oficiosamente foi requerido.
12- Não obstante essa situação, de o referido exame não ter sido junto, que é por demais caricato, dir-se-ia mesmo estranho, a testemunha P. B. referiu convictamente que nos casos em que haja uma distância de 3/4 anos entre o exame e a cirurgia, como foi o caso da Autora, seria aconselhável realizar novo exame.
13- Atreve-se a recorrente dizer que, embora, não tenha havido parecer pericial nesta matéria, é digamos que difícil de conceber que decorridos 3 anos desde o exame, que não consta nos autos, exame importante e imprescindível para este tipo de operação, não seja efetuado um outro exame mais próximo da data da cirurgia.
14- Parece evidente à recorrente, que se considere aconselhável, tal como referido pelo médico P. B., realizar um novo exame quando o dito foi realizado há 3 anos atrás, á data da cirurgia.
15- Julga a recorrente que qualquer Homem Médio (médico) colocado na posição do Dr. H. F. Faria diria que seria aconselhável, mesmo podendo prescindir, realizar um novo exame, à luz dos critérios da prudência. A este respeito vide o depoimento da testemunha P. B., gravado através de suporte digital minuto 00:00:00 a 00:41:38, conforme ata do dia 03/02/2021, minuto 06:57 a 09:07
16- É no mínimo estranho que não tenham sido junto aos autos todos os exames que supostamente a recorrente terá feito, nomeadamente o eco doppler efetuado antes da cirurgia, o estudo trombofilático, atendendo a que oficiosamente o Tribunal a quo, solicita toda a informação clínica da recorrente!
17- O depoimento do médico que operou a recorrente, a testemunha H. F., é, no modesto entender da mesma, pouco coeso, alias, é, por vezes mesmo contraditório. O mesmo socorre-se sempre de “lembretes de memória”, para afirmar com toda a convicção, sendo que, em determinadas situações não são coerentes as suas afirmações.
18- Basta atentar logo quando o mesmo refere convictamente que viu o processo judicial, reportando-se á ação que a recorrente intentou no TAF fora de prazo e que, por isso, foi julgada prescrita, tendo visto no aludido processo que ficou provado que não houve qualquer negligência médica da sua parte! Minuto 08:48
a 15:22.
19- Quando na referida ação não se fez qualquer prova nesse sentido ou em outro, pura e simplesmente a ação PRESCREVEU, não tendo sido apreciados os fundamentos de facto e de direito nela alegados, conforme consta das certidões juntas aos autos.
20- A testemunha refere, sem dúvidas, que avisou a recorrente da consulta do pós-operatório no dia da alta, como faz habitualmente, pese embora não exista nenhum registo da marcação dessa consulta, atendendo, mais uma vez, a que foi solicitada toda a informação clínica referente à recorrente, nem tão pouco a informação que a recorrente faltou à consulta do pós-operatório.
21- Caricato a testemunha recordar-se perfeitamente de ter agendado a consulta à recorrente, e não se recordar de ter solicitado que o seu colega Dr. P. B. visse a autora.
22- Aliás, é incoerente o seu depoimento, pois o mesmo diz que a recorrente nunca mais lhe apareceu, só apareceu em setembro de 2004, inicialmente e espontaneamente refere julho, mas quando lhe é dito que no documento refere setembro o mesmo acaba por referir setembro, a questionar acerca se o mesmo tinha seguro, quando acaba por admitir que indicou que a recorrente fosse vista pelo Dr. P. B., o que aconteceu em 2005, tal como o eco doppler que a testemunha se refere é de janeiro de 2005.
23- Se apenas em setembro de 2004 a recorrente o procurou e especificamente para lhe perguntar do seguro, por que motivo a testemunha solicita que a recorrente seja vista pelo seu Colega P. B. e por que motivo menciona o eco doppler efetuado em janeiro de 2005?
24- Isto é normal de perceber, de acordo com as regras da experiência comum e, de acordo com o que é referido pela recorrente e pelo seu marido, que foram várias vezes à ... para falar com o médico e que a determinada altura o mesmo lhe terá solicitado que fosse vista pelo seu Colega Dr. P. B., já não é compreensível, no modesto entender da recorrente, que isso aconteça sem que a recorrente tivesse estado com o médico queixando-se ao mesmo da sua situação, ou seja, não é crível, no modesto entender da recorrente, que apenas estivesse com o médico no dia em que lhe foi questionar se o mesmo tinha seguro e que a mesma vá ter uma segunda opinião com a testemunha P. B. em 2005, por indicação da testemunha H. F.!
25- Caricato é, também, que a testemunha H. F. não se lembre de algumas coisas com relevância, mas se lembre muito bem que a recorrente andava, que saiu a andar quando teve alta.
26- Mais uma vez com o devido respeito, é do conhecimento geral, os médicos quando vão dar alta aos pacientes não ficam a aguardar a sua saída da enfermaria, como parece que aconteceu aquando da alta da recorrente, uma vez que a testemunha diz que viu a recorrente a sair pelo seu próprio pé, a andar, o que entra em contradição com o que é referido pela testemunha E. J., pelo marido da recorrente e pela própria recorrente.
27- Para a testemunha H. F. a recorrente à data da cirurgia era uma pessoa com “alguma idade”, sendo para a testemunha P. B. uma jovem. Ora daqui surge a dúvida se a recorrente era uma pessoa de alguma idade para a testemunha H. F. então o mesmo deveria atuar no sentido de diminuir os riscos e as possibilidades de posteriores complicações, nomeadamente repetindo o eco doppler, o que não terá acontecido. A este respeito vide os depoimentos das testemunhas – H. F. minuto 29:45 a 31:13 e P. B. minuto 31:50 a 32:00
28- Quanto ao pós-operatório entendeu o Tribunal a quo que não se provou que a Autora estivesse com dores de gravidade que a impedissem de segurar de pé, nem de se levantar, no próprio dia ou no dia seguinte à cirurgia, em contraste com as demais pacientes.
29- Socorrendo-se das notas de enfermagem e das notas clínicas, tendo a autora impugnado a letra, a assinatura, conteúdo e autoria dos registos constantes, fazendo alusão entre o mais que a letra e a cor da esferográfica utilizada seriam diferentes.
30- Pese embora, não tenha sido efetuado perícia à letra e à assinatura, que a recorrente reconhece que deveria ter sido solicitada tal perícia atenta a importância da questão em apreço, no entanto, também, oficiosamente o Tribunal a quo atendendo à grande discrepância do que é referido nos aludidos documentos com o alegado pela Autora, pelo marido e pela testemunha E. J. o poderia ter feito oficiosamente.
31- Aliás, não se percebe como é que o Tribunal a quo valoriza, sem margem para dúvidas, o depoimento do médico H. F. decorridos tantos anos, em que com toda a certeza depois da Autora operou centenas de pessoas, e portanto não é crível que se recordasse da cirurgia da Autora, a não ser que, de facto, essa cirurgia lhe tenha ficado na memória pelo facto de ter sido várias vezes procurado pela Autora e, de facto, a mesma, não ter sido devidamente efetuada e posteriormente acompanhada a sua evolução no período que se seguiu.
32- Até porque, entendeu o Tribunal a quo não ser relevante não existir registo autónomo da consulta, supostamente marcada dali a 8 dias da realização da cirurgia pelo Dr. H. F., e a que a mesma terá faltado.
33- O registo do Hospital onde a autora foi operada é totalmente omisso quanto a essa consulta, apenas sendo referido tal circunstância no relatório clínico do médico cirurgião que operou a Autora, o qual foi impugnado pela mesma.
34- Em contraposição a este entendimento, o Tribunal a quo desvaloriza o depoimento da testemunha E. J., pessoa que esteve em simultâneo com a Autora no período pós-operatório, com o fundamento de terem decorrido 17 anos e que a Autora não era uma pessoa significativa para a testemunha E. J..
35- Com todo o respeito pelo Tribunal a quo e atendendo às regras da experiência comum, entende a recorrente, que não foi de forma cabal e compreensível descreditado/desvalorizado o depoimento dessa testemunha. Refere o Tribunal a quo, que a Autora não era uma pessoa significativa para essa testemunha, pelo que a atenção que teria em relação à mesma não era justificada por um interesse direto.
36- Isso seria compreensível se estivéssemos a falar de outro tipo de situação que não uma operação cirúrgica com alguma seriedade, pois é de senso comum que as pessoas que estão na mesma enfermaria acabam por falar umas com as outras e por vezes até se entreajudarem, ficando na memória esses momentos. Por não serem factos banais e que são sempre situações de vital importância para as pessoas.
37- No caso da recorrente foi o que aconteceu, tendo no decorrer da conversa, em virtude das dores que a Autora sentia, ficado esta a saber que a dita testemunha era vizinha de uma sua ex cunhada, e como referiu a testemunha a recorrente, ao contrário das demais pessoas que estavam na enfermaria, era a única que tinha muitas dores e não se conseguia pôr de pé ao contrário das outras pacientes, porque sentia e queixava-se de muitas dores.
38- Estes factos deveriam servir, no modesto entender da recorrente, para credibilizar a testemunha e não o contrário, pois demonstrou claramente não ter nenhum interesse nesta ação e, por isso, deveria ter sido considerada idónea e o seu depoimento ter sido devidamente valorizado e creditado. A este respeito vide o depoimento da testemunha E. J., gravado no suporte digital minuto 00:00.00 a 00:08:54, conforme consta da ata de julgamento do dia 03 de fevereiro de 2021
39- As declarações da testemunha supra identificada foram corroboradas pelo marido da recorrente que foi ao hospital no dia da alta médica para ir buscar a recorrente e que constatou que a sua mulher não conseguia andar, se queixava de imensas dores e pela amiga S., que esteve com a recorrente, em casa desta, logo no fim se semana a seguir à cirurgia e, que também esta constatou que a recorrente se queixava de muitas dores na perna, que não conseguia andar. Vide a este respeito o depoimento da testemunha J. A., cujo depoimento se encontra gravado em suporte digital, minuto 00:00:00 a 00:18.26, conforme ata de julgamento do dia 03 de fevereiro de 2021 e o depoimento da testemunha S. P., cujo depoimento se encontra gravado em suporte digital, minuto 00:00:00 a 00:08.01, conforme ata de julgamento do dia 03 de fevereiro de 2021 Vide, ainda, o depoimento da testemunha M. R., cujo depoimento se encontra gravado em suporte digital, minuto 00:00:00 a 00:11.50, conforme ata de julgamento do dia 03 de fevereiro de 2021
40- Com o devido respeito pelo Tribunal a quo, e pelo princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador, entende o recorrente que na parte da fundamentação da sentença ora posta em crise, o Tribunal a quo no que se refere à descredibilização das testemunhas da autora, supra referidas não o fez de forma sustentada, pois não basta o Tribunal a quo dizer quanto ao marido da autora e cunhada não são credibilizadas porque não estiveram no período pós operatório e no momento da alta e quanto à testemunha E. J. por a mesma não ser uma pessoa significativa para testemunha.
41- Vide as declarações de parte da recorrente, gravadas em suporte digital, minutos 00:00:00 e 00:33:02, conforme ata de audiência de julgamento do dia 03 de fevereiro de 2021
42- Com o devido respeito que o Tribunal a quo nos merece, e que é muito, parece que o mesmo não está a fazer uma livre apreciação da prova de forma sustentada e razoável.
43- Entende, assim, a recorrente, com o devido respeito, que o Tribunal a quo não fez uma apreciação criteriosa da prova produzida, a qual conjugada com os vários depoimentos das testemunhas da autora teria que levar a uma decisão diferente daquela que foi proferida pelo Tribunal a quo.
44- Com a alteração da matéria de facto dada como não provada, como acima se indica, outra poderia ser, no modesto entender do recorrente, a decisão do Tribunal a quo.
45- Mas mesmo que, por hipótese, o que apenas se concebe para efeitos de raciocínio, que V.exas entendam não alterar a matéria de facto como a recorrente vos apela e sugere, atenta a argumentação expendida, sempre se dirá quanto ao primeiro réu o seguinte, o que aliás, para a recorrente deveria ser, no seu modesto entender a questão fulcral a apreciar:
46- O mesmo não apresentou contestação, o que não existindo outros réus na ação, que não é o caso em apreço, os factos seriam dados como provados.
47- Apresentou o réu, nas suas declarações em sede de audiência de discussão e julgamento a justificação de ser dispendioso para o facto de não ter apresentado contestação na ação.
48- Ouvido veio contrariar alguns/ poucos factos indicados pela Autora tendo o Tribunal a quo valorizado uma carta junta pelo mesmo aos autos. Ora, com o devido respeito, na aludida carta não refere que a autora tenha ido ao extinto Tribunal Judicial de Santo Tirso e que o tenha feito por indicação do mandatário, que lhe deu o número do processo quando ele já estava extinto, conforme referiu ao Tribunal a quo, mas também não refere o contrário.
49- A autora referiu nas suas declarações que se dirigiu ao Tribunal de Santo Tirso com o número do processo fornecido pelo seu Ilustre Mandatário e no mesmo lhe terem dito que não havia qualquer processo. Posto isto voltou ao seu escritório, tendo este dito que se enganara e fornecido o número do processo do TAF. Vide a este respeito as declarações da autora Minuto 16:08 a 16:49.
50- Ora isto é perfeitamente plausível de acontecer, estando o mesmo já arquivado é perfeitamente possível que o funcionário que tenha atendido a autora lhe tenha dito isso mesmo, que já não existia processo, mas podendo até ter dito que estava arquivado ou, indo mais longe, até poderia o Réu ter dado à autora o número incorreto do processo e efetivamente esse processo não existisse no Tribunal de Santo Tirso!
51- Pelo que não é razoável que o Tribunal a quo tivesse dado como provado que o 1º Réu deu a conhecer à autora a pendência do processo em Santo Tirso, ou seja, a alínea ff) .
52- Refere o Tribunal a quo que: “ … o se apurou foi, não que o primeiro Réu não tenha agido judicialmente em representação da Autora, mas que as ações intentadas terminaram com decisões de absolvição da instância e do pedido (por procedência da exceção de incompetência absoluta e de prescrição, respetivamente)”
53- Continuando o tribunal a quo: “ , de outro ângulo, não surpreende que ( negrito nosso), durante o tempo em que as ações estiveram pendentes ( cerca de 8 – oito – a meses no Tribunal de Santo tirso e cerca de 4- quatro- anos no TAF), o 1º Réu tenha dito à Autora que tudo estava a decorrer com normalidade, na medida em que, nesses autos, houve os articulados, a decisão e, no caso da ação administrativa, houve ainda o recurso, que se tratam de fases processuais normais em quaisquer ações…”
54- Com todo o respeito pelo Tribunal a quo, a recorrente sempre dirá que, no seu modesto entender e salvo melhor opinião em contrário, teria o Tribunal a quo que se surpreender que o 1º réu tenha referido que estava tudo a correr dentro da “normalidade” quando é mandatado a 15/01/2005, conforme consta dos factos provados e apenas em 13/05/2010 tenha dado entrada da primeira ação, já fora do prazo para o fazer!
55- Isto não é o normal de acontecer, ou seja, ter um processo, parado, durante mais de cinco anos sem dar entrada em juízo, quando não existem documentos ou diligências que se esteja a aguardar para avançar com o mesmo, é incompreensível e inadmissível, deveria surpreender o Tribunal a quo que o 1º Réu tenha dito à Autora que tudo estava a decorrer com normalidade! Pois, é evidente que não estava!
56- É compreensível para qualquer Homem Médio colocado na situação da recorrente, quando tendo fornecido todos os elementos solicitados ao primeiro Réu e quando o questionava acerca do processo, porque não é plausível, não é normal, não é razoável, que durante estes cinco anos a mesma não o tivesse feito, que o mesmo lhe tenha dito está tudo a decorrer dentro da normalidade, “está andar” e que a recorrente, em algum momento, admitisse por hipótese, que a ação ainda não tivesse sido intentada!
57- Não é o normal de acontecer, com o devido respeito, face às regras da experiência comum.
58- O “estar a andar” para recorrente significava, como para qualquer Homem Médio colocado na posição da recorrente que a ação já estava a andar em Tribunal!
59- Como, também, é evidente, que face às regras da experiência comum, que durante esse tempo, CINCO ANOS, o 1º réu teve que ir dando algumas informações à Autora, nomeadamente é perfeitamente credível que o mesmo lhe tenha referido que iria ser sujeita a uma junta médica, uma vez que é prática corrente de acontecer no tipo de processo que foi confiado ao 1º Réu pela recorrente, entendendo, também, por isso, a recorrente que a ação estava a decorrer.
60- Por isso, a recorrente não percebe, não concebe que á luz dos critérios da razoabilidade o tribunal a quo tenha entendido que:”…não se demonstrou, por falta de elementos de prova credíveis, que antes da instauração daquela, o 1º Réu tenha pré ordenado o seu comportamento no sentido de iludir a Autora sobre a existência de uma ação (ainda não intentada), até porque isso entra em contradição com a alínea z), dos factos provados.
61- Pelo que, na humilde opinião da recorrente, os sentimentos negativos por si alegados por o 1º réu lhe ter mentido acerca do desenvolvimento do processo, quer pelo facto de o 1º Réu a ter convencido do sucesso da ação deveriam ter sido provados pelo Tribunal a quo.
62- É certo que a recorrente se sentiu revoltada com a atuação do primeiro réu, pelos factos acima indicados, mas, também, e aqui tendo ficado provado pelo Tribunal a quo, por ter visto coartada a possibilidade de ver apreciada a sua pretensão e a indemnização a que poderia ter direito ter sido julgado prescrito, na sequência da inércia do réu, referindo o Tribunal a quo “. …: é que da perspetiva da Autora, foi o atraso verificado na propositura da ação que impediu a apreciação da ação, que, no seu modo ver, levaria à obtenção de uma indemnização…”
63- Dando o Tribunal a quo como não provado: ”… que, se intentada a ação, ela seria julgada procedente e a Autora receberia a indemnização de € 200.000,00 na medida em que o provimento dessa pretensão dependeria da demonstração de um erro médico, o que não se revelou ter existido, pelas razões que acima se enunciaram ..”
64- Também, aqui, pelos motivos já expostos a recorrente entende que o Tribunal a quo poderia ter dado como provada al. 36 dos factos não provados, isto é, poderia, no modesto entender da recorrente, o Tribunal a quo ter dado como provado que se o 1º réu tivesse intentado a devida ação, dentro do devido prazo legal e de acordo com as boas práticas do foro, seria admissível e razoável que a Autora seria indemnizada numa quantia, cujo montante poderia ascender a € 200.00,00 euros.
65- Foi, sem dúvida, pelo facto de a ação para a qual foi mandatado o 1º réu ter sido interposta fora do prazo que a pretensão da recorrente não pôde ser apreciada.
66- Como bem refere o Tribunal a quo, :”… Ou seja, não é por a Autora ter visto o seu direito prescrito que se pode concluir que ela obteria ganho de causa na ação intentada.”
67- Com o devido respeito, também, não poderia, o Tribunal a quo concluir o contrário. Até porque, não fosse a prescrição do direito da recorrente, o 1º réu poderia ter conduzido a ação de uma forma eventualmente diferente da Ilustre Colega que patrocinou a recorrente nos autos em apreço, com todo o devido respeito. Nomeadamente, entre o mais, poderia ter requerido prova pericial, prova importantíssima para se aferir do nexo causal entre o aparecimento de trombose venosa profunda e a cirurgia realizada à Autora, como poderia ter requerida efetivamente uma junta médica, entre outras.
68- Em consequência, no modesto entender da recorrente, a alínea 48) dos factos não provados teria que ser provado, atendendo que é manifesto, que à data de início da apólice do seguro celebrado com a Interveniente Y, o 1º réu não poderia deixar de ter conhecimento que a sua conduta podia ser potencialmente geradora da sua responsabilidade civil.
69- Pelo que, alterando a matéria de facto conforme a recorrente sugere outra teria que ser a decisão dos autos.
70- Não obstante toda a argumentação expendida e, caso V.exas não entendam alterar a matéria de facto da forma como a recorrente alega e sugere, sempre a recorrente entende que não foi aplicado devidamente o Direito.
71- A recorrente entende, com o devido respeito pelo Tribunal a quo, que tendo o mesmo dado como provados os factos u), w), x), y), z), jj), zz), sss), ttt), uuu), vvvv), a aplicação do direito na sentença, ora posta em crise, não foi a mais consentânea e assertiva.
72- Isto porque, apesar de o Tribunal a quo ter entendido que não é por a recorrente ter visto o seu direito prescrito que se poderia concluir que a recorrente obteria ganho de causa na ação intentada pelo 1º Réu em sua representação e, tendo em conta que entendeu, na sentença recorrida, que não ficaram provados os factos que pudessem provar a “chance” que a recorrente teria de ter ganho ou provimento na ação e, como tal, entendeu julgar improcedente o pedido de indemnização efetuado pela recorrente contra o 1º réu e, julgando inverificados os pressupostos da responsabilização do 1º Réu, determinado, por isso, a improcedência da ação e, em consequência, a inutilidade da apreciação do âmbito temporal dos seguros de responsabilidade civil profissional, a recorrente entende que existiu violação clara dos princípios deontológicos do Estatuto da Ordem dos Advogados e, como tal o dano perda de chance pela violação dessas normas.
73- Nestes casos, entende a recorrente que, como é o caso em apreço, existe um ato ou uma omissão negligente do advogado, em que a possibilidade de sucesso no litígio ficou irremediavelmente perdida. No caso dos autos, o que é primordial e fulcral é que a recorrente viu-se na impossibilidade de discutir o assunto entregue ao primeiro réu, porque o mesmo deixou passar o prazo em que deveria ter intentado a referida ação, prescrevendo, assim, o direito da recorrente.
74- Apesar do 1º réu, não ter contestado o que foi peticionado pela recorrente, nos autos em apreço, em audiência de discussão e julgamento veio dizer que se baseou num estudo em que o prazo prescricional para a ação que lhe fora confiada seria de 20 anos, ou seja, aplicável à responsabilidade contratual, estudo esse da autora Claúdia Monge.
75- No entanto, jamais poderia o 1º réu optar por uma corrente minoritária, em detrimento da maioritária, que estabelece para a questão que lhe foi confiada pela recorrente um prazo de 3 anos, correndo o grande risco, como correu, de o direito da recorrente prescrever, como prescreveu! Tendo inclusive, sendo este facto importantíssimo, sido mandatado com muito tempo para o fazer, não tendo existido qualquer impedimento para que o fizesse dentro do prazo de 3 anos, nem este o alegou!
76- Aliás, o primeiro réu sempre transmitiu à recorrente que o processo “estava a andar”, quando conforme se verifica pela 1ª ação intentada no extinto Tribunal de Santo Tirso estava parado!
77- Não poderia ignorar o 1º réu, como ignorou, a corrente maioritária da jurisprudência e da doutrina, devendo, no modesto entender da recorrente, ter sido prudente, consciencioso e cauteloso, interpondo a ação dentro do prazo mais curto de prescrição.
78- O 1º réu assumiu perante a recorrente uma obrigação de meios, não podendo ser responsabilizado pela perda da causa a não ser que tenha atuado de forma negligente, ou seja, se não tiver agido com a máxima prudência ou não tiver usado todos os esforços possíveis para obter sucesso da causa, que é, no modesto entender da recorrente, o que se passou, indubitavelmente, com o 1º Réu. Desta forma incumbiria a este o ónus de provar que tudo foi feito da sua parte, empregando todos os esforços possíveis para obter o resultado esperado pela Autora, ao não fazê-lo, como não fez, pelos factos dados como provados pelo Tribunal a quo, presume-se a sua culpa. O 1º réu será culpado pelo defeito do serviço, salvo prova em contrário, por ser a presunção júris tantum.
79- O próprio Tribunal a quo entende na sua motivação que o 1º réu não foi prudente, seguindo uma doutrina minoritária, que estabelecia um prazo de prescrição de 20 anos, quando já estava mandatado muito a tempo de se respeitar o prazo de prescrição afeto à responsabilidade contratual (3 anos), evitando-se, assim, riscos desnecessários.
80- É manifesto que o 1º réu não conseguiu demonstrar perante o Tribunal a quo que o não cumprimento (atempadamente) ou o cumprimento defeituoso (porque fora de prazo) não resultou de culpa sua. Pois é manifesto que o 1º Réu deveria ter atuado de forma diligente e preventiva, acautelando todas as eventualidades, mormente quando segue uma tese minoritária da doutrina que estabelece um prazo de prescrição de 20 anos e a maioritária estabelece um prazo de 3 anos.
81- Tendo o 1ª réu sido mandatado muito a tempo de intentar a ação seguindo a tese maioritária que estabelece 3 anos de prescrição.
82- O 1º Réu não ilidiu a sua culpa, demonstrando que efetivamente foi diligente, consciencioso, encetando todos os esforços e diligências adequadas para que a causa tivesse sucesso, mormente propondo a ação respetiva antes que tal direito se mostrasse prescrito, como foi o caso em apreço.
83- Aliás, o 1º réu em declarações prestadas ao Tribunal a quo refere que ainda ponderou interpor recurso para o STA. No entanto, com o devido respeito, não se percebe porque o faria, uma vez que no processo que intentou no TAF de Braga quando é notificado para se pronunciar acerca das exceções o mesmo nada disse, não tendo apresentado qualquer articulado. Vide o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 23/02/2010, cujo relator é Ema Almeida e publicado em www.dgsi.pt; e o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 31-01-2012 e cujo relator é Rosário Barbosa, publicado em www.dgsi.pt
84- O Tribunal a quo, como refere na sua motivação faz um julgamento dentro do julgamento para aferir, em abstrato, no caso do 1º réu ser diligente, se haveria ganho na causa.
85- Ora com o devido respeito, não tendo o 1º réu intentado a ação dentro do prazo precludiu o direito da recorrente de ver apreciada, no tempo devido, a sua pretensão.
86- Ora, questiona-se a recorrente, com o devido respeito pelo Tribunal a quo, que não tendo sido intentada a ação dentro do prazo, mas admitindo por hipótese que o 1º réu o tivesse feito, qual seria o desfecho da ação? Que diligências efetuaria ou requeria o 1º réu se tivesse podido discutir a ação? Teria requerido perícia judicial? Teria a mesma estabelecido um nexo causal entre a operação efetuada pela recorrente com a trombose venosa profunda que teve passado pouco tempo da intervenção cirúrgica? Teria impugnado certos documentos, como os relatórios de enfermagem? Teria requerido prova pericial à letra e assinatura nos relatórios médicos que foram impugnados? Teria a autora sido sujeita a uma junta médica?
87- Entende, por isto, a recorrente que numa lógica de razoabilidade o resultado poderia não ter sido a improcedência da ação, caso a mesma não fosse julgada improcedente com base na prescrição e pudesse ter sido apreciada. Fazendo um juízo de prognose póstuma como fez o Tribunal a quo, será, no modesto entender da recorrente, difícil demonstrar qualquer tipo de decisão, uma vez que o 1º réu não teve a possibilidade, por sua inércia, de conduzir/litigar a ação. Desconhecendo-se, por isso, no modesto entender da recorrente, se a mesma, caso fosse intentada dentro do prazo, teria sido julgada procedente.
88- A forma de conduzir ação pelo 1º réu poderia, não ser de todo, coincidente com a forma como a Ilustre Patrona da Autora a conduziu que, atendendo ao lapso de tempo entretanto decorrido da cirurgia a prova é sem dúvida mais difícil. Não sendo, aliás, no modesto entender da recorrente, o objetivo principal da ação de que ora se recorre.
89- Existe, assim, uma aleatoriedade que dificulta a formulação de um juízo de condicionalidade para definir o que seria caso a ação tivesse sido proposta atempadamente, pois a decisão final decorre de um juízo da prova requerida e produzida, das orientações doutrinais e jurisprudenciais vigentes no momento da decisão, do entendimento do julgador (…) Pelo que, no modesto entender da recorrente, a perda de chance processual, e conforme refere Pedro, Rute Teixeira, ob.cit.,p.190,.”..foram consequência direta do ato ou omissão do causídico, ou seja, a impossibilidade de determinar o nexo causal, em termos de causalidade adequada, alguns autores advertem para a possibilidade de “(..) considerar a perda de oportunidade um dano em si, como que antecipando o prejuízo relevante em relação ao dano final(…)”
90- A contratação de um advogado para representação em juízo no âmbito de um processo judicial pretenderá acautelar, em hipótese, a prescrição do direito. As partes elevam a “chance” a um bem jurídico protegido pelo contrato, ou seja, o constituinte quando contrata o advogado pretende precisamente acautelar os danos imediatamente produzidos pela inércia processual do mesmo, em contrapartida o advogado aceita praticar os atos necessários e indispensáveis ao aproveitamento da chance de intentar uma ação, pelo que, a inércia o inadimplemento do advogado, no modesto entender da recorrente, gera responsabilidade civil do Advogado pela perda de chance.
91- Além de que, sendo a procuração outorgada ao 1º réu em 15-01-2005, tendo-lhe sido liquidada provisão de honorários e o mesmo afirmado que iria dar seguimento à ação não é, no modesto entender da recorrente, admissível que o mesmo só intente a ação decorridos mais de cinco anos., violando de forma grosseira e negligente os mais elementares deveres deontológicos do EOA, nomeadamente as normas consagradas dos artigos 97 a 103 do EOA.
92- Por aqui, desde logo, ressalta a importância da confiança que deve existir entre as partes (advogado e cliente) e a função primordial que o advogado tem em defender os interesses dos Clientes.
93- Logo por aqui entende a recorrente que o 1º réu não defendeu o seu interesse, pois não acautelou que o prazo do assunto que lhe foi confiado fosse cumprido, deixando-o prescrever, precludindo o seu direito, violando a confiança da recorrente ao não lhe transmitir o que realmente se passava.
94- Referindo o artigo 98º do EOA, artigo por demais, no modesto entender da recorrente, importante e cuja violação acarreta ou implicará que o advogado possa incorrer em responsabilidade civil, que estabelece que o advogado não deve aceitar patrocínio de uma questão se souber, ou dever saber, quer não tem competência ou disponibilidade para dela se ocupar prontamente!
95- Com o devido respeito, é manifesto que o 1º réu não se ocupou prontamente do assunto que lhe foi confiado pela recorrente, pois o mesmo não alegou ou referiu, no Tribunal a quo, que demorou 5 anos a intentar a ação, porque estava a aguardar algum documento ou informação por parte da recorrente e a que a sua inércia era por exemplo imputada á recorrente.
96- Pelo que, no modesto entender da recorrente, a Teoria da Perda de Chance terá que ser aplicável, de forma a possibilitar a tutela dos danos à recorrente, provocados pelo 1º réu em função das normas deontológicas aplicáveis na relação que contratualizou com a recorrente e por não ter ilidido a sua culpa, como lhe competia. A este respeito vide o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/09/2010, publicado em www.dgsi.pt.”
Pugna pela revogação da sentença que deve ser substituída por outra que condene o 1º réu a indemnizar a recorrente pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.
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A 2ª ré apresentou contra-alegações pugnado pela rejeição da reapreciação da matéria de facto.
Em caso de procedência do recurso da autora requereu a ampliação do objecto do recurso defendendo que sempre caberia ao réu segurado, Dr. J. O., liquidar o montante da franquia contratualmente estabelecido (€ 5.000,00) atenta a sua intervenção nos presentes autos na qualidade de parte e ficando a responsabilidade desta Seguradora limitada ao capital seguro no valor de € 150.000,00.
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O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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Tendo em atenção que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (art. 635º nº 3 e 4 e 639º nº 1 e 3 do C.P.C.), sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, observado que seja, se necessário, o disposto no art. 3º nº 3 do C.P.C., as questões a decidir são:
A) Apurar se ocorreu erro na apreciação da matéria de facto;
B) E/ou erro na subsunção jurídica;
C) Eventual apreciação da ampliação do objecto do recurso.
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II – Fundamentação

Foram considerados provados os seguintes factos:
a) A Autora nasceu em -.03.1972 (art. 1º da p.i. primitiva).
b) Por volta do ano de 2000, a Autora começou a verificar o aparecimento de varizes nos seus membros inferiores (art. 2º da p.i. primitiva).
c) Para melhor diagnosticar o problema e alcançar uma solução, a Autora submeteu-se a consultas médicas dessa especialidade (art. 3º da p.i. primitiva).
d) Até que, em 31.01.2001, no Hospital da ..., em Guimarães, foi-lhe diagnosticado uma síndrome varicoso dos membros inferiores (art. 4º da p.i. primitiva).
e) No seguimento desse diagnóstico, e após a realização de vários exames, a equipa médica do Hospital da ... aconselhou a Autora a submeter-se a uma intervenção cirúrgica, a fim de corrigir tal problema (art. 5º da p.i. primitiva).
f) A Autora inscreveu-se para o efeito junto dos serviços competentes da ARSNorte, tendo ficado em lista de espera (art. 6º da p.i. primitiva).
g) Volvidos 3 (três) anos, em abril de 2004, a Autora recebeu uma notificação da ARSNorte, dando-lhe conta da possibilidade de a sua operação se realizar até ao final daquele ano, sem qualquer tipo de encargo, no Hospital da Misericórdia da ..., ao abrigo do Programa PEPLEC, e que, em breve, para o efeito, seria contactada por esse hospital para uma consulta pré-operatória (art. 7º da p.i. primitiva).
h) E assim sucedeu, tendo a Autora sido chamada para uma consulta pré-operatória (art. 8º da p.i. primitiva).
i) Em 19.05.2004, foi submetida à intervenção cirúrgica, ao seu membro inferior direito, com o objectivo de curar a síndrome varicoso, no Hospital da Santa Casa da Misericórdia da ..., pelo médico cirurgião H. F. (art. 9º da p.i. primitiva).
j) Tal intervenção cirúrgica consistiu na laqueação da veia safena interna ao nível da crossa e ao nível do maléolo interno, bem como na laqueação de comunicantes insuficientes ao longo do mesmo (art. 10º da p.i. primitiva).
k) A Autora não foi submetida a eco-doppler, a título de exame pré-operatório, nem nos minutos que antecederam a intervenção cirúrgica (parte do art. 4º da p.i. aperfeiçoada).
l) Após a cirurgia, pelo médico que realizou a intervenção à Autora não lhe efetuou exames (complementares), nomeadamente um eco-doppler venoso (art. 13º da p.i. aperfeiçoada).
m) Foi dada alta médica à Autora no dia seguinte à cirurgia (20.05.2004) (parte do art. 15º da p.i. primitiva).
n) Entre essa alta médica e o dia 28.05.2004, a perna direita da Autora começou a inchar e a ficar muito vermelha, junto da virilha, obrigando-a a dirigir-se ao serviço de urgência do Hospital de Guimarães, onde foi assistida pelo médico A. M., o qual lhe prescreveu a toma de “Brufen” (parte dos art. 16º e 17º da p.i. primitiva).
o) Entre os dias 28.05.2004 e 01.07.2004, como as dores que a Autora sentia eram cada vez maiores, dirigiu-se novamente ao serviço de urgência do Hospital de Guimarães em 01.07.2004, onde foi assistida pelo médico A. M. (parte dos art. 18º e 19º da p.i. primitiva).
p) Em 01.07.2004, a Autora foi internada no Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular do Hospital da ..., em Guimarães, com o diagnóstico de trombose venosa profunda femoro-poplitea do membro inferior direito (art. 21º da p.i. primitiva).
q) Tendo obtido alta no dia 05.07.2004, com hipocoagulação oral e contenção elástica classe 2 no membro inferior direito (art. 22º da p.i. primitiva).
r) A Autora conseguiu uma consulta externa com o médico que realizou a intervenção cirúrgica no Hospital da Santa Casa da Misericórdia da ..., em 22.09.2004 (parte do art. 23º da p.i. primitiva).
s) Algum tempo depois, apesar de usar contenção elástica, a Autora continuava com dores e edema no membro inferior direito, que se agravava quando ficava em pé durante algum tempo e/ou exposta a temperaturas elevadas, tendo consultado o médico P. B. (parte dos art. 25º e 26º da p.i. primitiva).
t) Em janeiro de 2005, por indicação de pessoa próxima, a Autora procurou o 1º Réu, a quem expôs a sua situação (narrada nos art. 1º a 26º da p.i. primitiva), solicitando aconselhamento jurídico (art. 29º e 30º da p.i. primitiva).
u) O 1.º Réu, após analisar a exposição e a documentação apresentada pela aqui Autora, afirmou-lhe que tinha elementos e fundamentos para intentar uma ação de responsabilidade civil, peticionando uma indemnização a ressarcir os danos que lhe haviam sido causados (parte do art. 31º da p.i. primitiva).
v) Para esse efeito, confiando no 1.º Réu, a Autora solicitou ao mesmo que tratasse de tudo o que fosse necessário (parte do art. 32º da p.i. primitiva).
w) No dia 15.01.2005, outorgou procuração forense a favor do 1º Réu, a quem conferiu poderes forenses gerais bem como para receber custas de parte e taxas de justiça (art. 33º da p.i. primitiva).
x) Entregou-lhe a quantia de € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros), em numerário, relativamente à provisão para honorários e despesas que o 1º Réu lhe tinha solicitado (art. 34º e 35º da p.i. primitiva).
y) A Autora, para conseguir entregar tal quantia ao 1º Réu, teve de solicitar um empréstimo (parte do art. 36º da p.i primitiva).
z) Perante a entrega da quantia referida, o 1º Réu afirmou à Autora que iria dar início ao processo, dizendo-lhe ainda para ficar descansada que lhe daria novidades (parte do art. 37º da p.i. primitiva).
aa) Nos meses que se seguiram, sempre que a Autora contactava telefonicamente o escritório do 1º Réu, a fim de saber o ponto da situação, este ou o seu funcionário, informava que estava tudo em andamento e solicitava mais documentos para instruir o processo, os quais sempre tentou obter e entregou ao 1º Réu (art. 38º e 39º da p.i. primitiva).
bb) O tempo ia passando, e, umas vezes, a Autora ligava para o escritório do 1º Réu a solicitar informações sobre o processo (parte do art. 40º da p.i. primitiva).
cc) O 1º Réu solicitou a comparência da Autora no seu escritório, agendando consultas jurídicas (art. 41º da p.i. primitiva).
dd) O 1º Réu sabia que a Autora não tinha conhecimento das práticas forenses (parte do art. 44º da p.i. primitiva).
ee) A Autora tinha dificuldades económicas, as quais lhe impossibilitavam iniciar todo o processo com outro advogado (art. 49º da p.i. primitiva).
ff) A Autora foi informada que a ação tinha sido intentada e estava a correr termos no 4º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Santo Tirso sob o nº 2182/10.4TBSTS (parte do art. 50º da p.i. primitiva).
gg) Mais tarde, o 1º Réu informou a Autora de que o processo estava a correr os seus termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga sob o n.º 762/11.0BEBRG (parte do art. 57º da p.i. primitiva).
hh) Afirmando-lhe que só tinha de aguardar os trâmites normais do processo, pois tudo estava a correr bem, no que a Autora acreditou e confiou (art. 58º e 59º da p.i. primitiva).
ii) Os anos continuaram a avançar, e a Autora continuou a aguardar desenvolvimentos do processo (parte do art. 60º da p.i. primitiva).
jj) Sempre que perguntava o estado do processo ao 1º Réu (e até à data da decisão tomada em 1.ª Instância pelo TAF), aquele informava-a de que estava a correr os seus
trâmites normais, e a Autora acreditava (parte dos art. 61º e 62º da p.i. primitiva).
kk) Antes de ser submetida à intervenção cirúrgica supra referida, a Autora exercia a atividade profissional de costureira (parte do art. 88º da p.i. primitiva).
ll) Auferindo, naquela altura, um rendimento mensal de cerca de 500,00€ (quinhentos euros) (parte do art. 89º da p.i. primitiva).
mm) A Autora sofreu trombose venosa profunda do seu membro inferior direito, tendo ficado a padecer de dor e claudicação da marcha associadas (parte do art. 90º da p.i. primitiva).
nn) Tendo ficado totalmente incapacitada para o seu trabalho habitual (parte do art. 91º da p.i. primitiva).
oo) Bem como para outras atividades profissionais que exijam a permanência de períodos prolongados de pé (parte do art. 91º da p.i. primitiva).
pp) Devido ao seu estado de saúde, a Autora esteve na situação de incapacidade temporária absoluta para o trabalho até 25.01.2006 (parte do art. 92º da p.i. primitiva).
qq) Data em que, com fundamento nessa incapacidade absoluta, veio a ser colocada na situação de reforma por invalidez, sendo-lhe atribuída uma pensão mensal de € 256,72 (duzentos e cinquenta e seis euros e setenta e dois cêntimos) (art. 93º da p.i. primitiva).
rr) A Autora é casada e tem 2 filhos, os quais, à data da cirurgia, eram crianças (parte do art. 95º da p.i. primitiva).
ss) A Autora viu alterada a sua vida (parte do art. 97º da p.i. primitiva).
tt) A Autora era uma pessoa integrada profissionalmente, com normal relacionamento familiar e com esperança de um futuro próspero (parte do art. 98º da p.i. primitiva).
uu) Tornou-se numa pessoa incapacitada para parte das lides domésticas (parte do art. 99º da p.i. primitiva).
vv) A Autora viu goradas todas as perspetivas e ambições que tinha em conseguir alcançar desafogo económico, bem com de conseguir proporcionar uma boa formação escolar e profissional aos seus dois filhos (art. 100º da p.i. primitiva).
ww) A Autora tornou-se numa pessoa “apagada”, triste, e sempre receosa de que o seu estado de saúde agrave ainda mais (art. 101º da p.i. primitiva).
xx) Por força das sequelas da trombose venosa profunda, a Autora teve de fazer tratamentos de fisioterapia, bem como teve de usar uma meia de contenção elástica (parte do art. 101º da p.i. primitiva).
yy) Em virtude da trombose venosa profunda do membro inferior direito, a Autora tem de se submeter regularmente a exame de controlo de sangue (parte do art. 102º da p.i. primitiva).
zz) O 1º Réu afirmou à Autora que ia intentar uma ação judicial contra o médico H. F., pois tinha os fundamentos para tal, e iria solicitar o pagamento de uma indemnização nunca inferior a € 200.000,00 (duzentos mil euros) (art. 106º da p.i. primitiva).
aaa) Sendo a quantia de € 150.000,00, para a ressarcir pela diminuição da sua capacidade de ganho, e a quantia de € 50.000,00, a título de danos não patrimoniais (parte dos art. 107º e 108º da p.i. primitiva).
bbb) Entre a outorga da procuração e o ano de 2015, a Autora deslocou-se ao escritório do 1.º Réu – o qual se situa a cerca de 15km de distância da sua área de residência – por variadas vezes, a fim de realizar consultas acerca do processo (parte do art. 113º da p.i. primitiva).
ccc) Para comparecer nessas consultas, a Autora tinha de solicitar o acompanhamento do seu marido, o qual, por sua vez, necessitava faltar ao trabalho (art. 114º da p.i. primitiva).
ddd) Sempre que se deslocava ao escritório do 1º Réu, a Autora tinha despesas com essa deslocação (art. 115º da p.i. primitiva).
eee) A Autora sente revolta e angústia, prejudicando a sã convivência do agregado familiar (art. 122º e 123º da p.i. primitiva).
fff) A Ordem dos Advogados, na qualidade de tomador do seguro, acordou com a seguradora 2.ª Ré X INSURANCE COMPANY a celebração do seguro de grupo de responsabilidade civil profissional dos advogados para o ano civil de 2019, com o limite de indemnização de € 150.000,00 (art. 137º da p.i. primitiva).
ggg) No artigo 9º das condições particulares do seguro de responsabilidade civil profissional celebrado com a 2.ª Ré X INSURANCE COMPANY, consta, sob a epígrafe “Âmbito temporal”, o seguinte:
“O segurador assume a cobertura da responsabilidade do segurado por todos os sinistros reclamados pela primeira vez contra o segurado ou contra o tomador do seguro ocorridos na vigência das apólices anteriores, desde que participados após o início da vigência da presente apólice, sempre e quando as reclamações tenham fundamento em dolo, erro, omissão ou negligência profissional, coberta pela presente apólice, e mesmo ainda, que tenham sido cometidos pelo segurado antes da data de efeito da entrada em vigor da presente apólice, e sem qualquer limitação temporal da retroatividade. (…)

Para os fins supra indicados, entende-se por reclamação a primeira das seguintes comunicações:
a) Notificação oficial por parte do sinistrado, do tomador do seguro ou do segurado, ao segurador, da intenção de reclamar ou de interposição de qualquer ação perante os tribunais;
b) Notificação oficial do tomador do seguro ou do segurado, ao segurador, de uma reclamação administrativa ou investigação oficial, com origem ou fundamento em dolo, erro, omissão ou negligência profissional, que haja produzido um dano indemnizável à luz da apólice;
c) Por outra via, entende-se por reclamação, qualquer facto ou circunstância concreta, conhecida “prima facie” pelo tomador do seguro ou segurado, da qual resulte notificação oficial ao segurador, que possa razoavelmente determinar ulterior formulação de um pedido de ressarcimento ou acionar as coberturas da apólice” (art. 33º e 34º da contestação da 2ª Ré).
hhh) No n.º 12 do artigo 1º, das condições especiais da apólice de seguro celebrado com a 2.ª Ré X INSURANCE, sob a epígrafe “Definições”, consta o seguinte:
“Reclamação: Qualquer procedimento judicial ou administrativo iniciado contra qualquer segurado, ou contra o segurador, quer por exercício de ação direta, quer por exercício de direito de regresso, como suposto responsável de um dano abrangido pelas coberturas da apólice;
Toda a comunicação de qualquer facto ou circunstância concreta conhecida por primeira vez pelo segurado e notificada oficiosamente por este ao segurador, de que possa:
i)Derivar eventual responsabilidade abrangida pela apólice;
ii) Determinar a ulterior formulação de uma petição de ressarcimento, ou
iii) Fazer funcionar as coberturas da apólice (…)” (artigo 35º, da contestação da 2.ª Ré).
iii) No artigo 4º, das condições especiais da apólice de seguro celebrado com a 2.ª Ré X INSURANCE, sob a epígrafe “Delimitação temporal”, consta o seguinte:
“É expressamente aceite pelo tomador do seguro e pelos segurados que a presente apólice será competente exclusivamente para as reclamações que sejam apresentadas pela primeira vez no âmbito da presente apólice:
a) Contra o segurado e notificadas ao segurador, ou
b) Contra o segurador em exercício de ação direta;
c) Durante o período de seguro, ou durante o período de descoberto, com fundamento em dolo, erro, omissão ou negligência profissional cometidos pelo segurado, após a data retroativa” (art. 36º da contestação da 2ª Ré).
jjj) No artigo 3º/a), das condições especiais da apólice de seguro celebrado com a 2.ª Ré X INSURANCE, sob a epígrafe “Exclusões”, consta o seguinte:
“Ficam, expressamente excluídas da cobertura da presente apólice, as reclamações:
a) Por qualquer facto ou circunstância já anteriormente conhecido(a) do segurado, à data de início do período de seguro, e que já tenha gerado, ou possa razoavelmente vir a gerar, reclamação” (art. 47º da contestação da 2.ª Ré).
kkk) No artigo 9º, das condições particulares do seguro de responsabilidade civil profissional celebrado com a 2.ª Ré X INSURANCE COMPANY, consta, sob a epígrafe “Franquia”, o seguinte:
“Estabelece-se uma franquia de 5.000,00 Euro por sinistro, não oponível a terceiros lesados” (art. 65º da contestação da 2.ª Ré).
lll) Entre a Ordem dos Advogados e a seguradora Y foi celebrado o seguro de responsabilidade civil obrigatória, titulado pela apólice n.º …….58/6, a qual teve início em 01.01.2014 e termo a 01.01.2018, com o limite de indemnização de € 150.000,00 (por sinistro) (parte dos art. 2º e 3º da contestação da Interveniente).
mmm) No artigo 3º, da condição especial de responsabilidade civil profissional (n.º ...) celebrado com a Y, consta, sob a epígrafe “Exclusões”, o seguinte:
“Ficam expressamente excluídas da cobertura da presente apólice, as reclamações:
a)Por qualquer facto ou circunstância já anteriormente conhecido(a) do segurado, à data de início do período de seguro, e que já tenha gerado, ou possa razoavelmente vir a gerar, reclamação” (art. 6º da contestação da Interveniente).
nnn) No artigo 4º, da condição especial de responsabilidade civil profissional (n.º ...) celebrado com a Interveniente Y, consta, sob a epígrafe “Delimitação temporal”, o seguinte:
“É expressamente aceite pelo tomador de seguro e pelos segurados que a presente apólice será competente exclusivamente para as reclamações que sejam pela primeira vez apresentadas no âmbito da presente apólice:
a) Contra o segurado e notificados ao segurador;
b) Contra o segurador em exercício de ação direta;
c) Durante o período de seguro, ou durante o período de descoberto, com fundamento em dolo, erro, omissão ou negligência profissional cometidos pelo segurado, após a data retroativa” (art. 8º da contestação da Interveniente).
ooo) No artigo 9º, das condições particulares do seguro de responsabilidade civil profissional celebrado com a Interveniente Y, consta, sob a epígrafe “Franquia”, o seguinte:
“Estabelece-se uma franquia de 5.000,00 Euro por sinistro, não oponível a terceiros lesados.” (art. 45º da contestação da Interveniente).
ppp) À data de início da apólice referida em hhh), o 1.º Réu tinha conhecimento de que a sua conduta podia ser potencialmente geradora da sua responsabilidade civil (parte do art. 57º da contestação da 2.ª Ré).
qqq) O 1.º Réu participou parte dos factos alegados na petição inicial à Interveniente Y em data anterior a 28.01.2017, mas posterior à data de início da apólice referida em mmm) (parte do art. 39º da contestação da 2.ª Ré).
rrr) Foi o médico H. F. que efetuou os registos que constam de fls. 248, tendo sido elaborados ao tempo e com referência aos factos a que se encontram reportados (incidente de impugnação quanto à genuinidade do documento suscitado em audiência pela Autora).
sss) O 1.º Réu propôs a ação com o n.º 2182/10.4TBSTS, em representação da Autora, no dia 13.05.2010, contra o Centro Hospitalar do ..., o médico H. F. e o Estado Português, com base nos fundamentos que constam da petição inicial cuja cópia está a fls. 187 a 195 (facto considerado nos termos do art. 607º/4 do CPC).
ttt) A ação referida na al. anterior findou com a prolação de decisão a julgar verificada a exceção de incompetência material, proferida a 26.11.2010 e transitada em julgado em 31.12.2010 (facto considerado nos termos do art. 607º/4 do CPC).
uuu) O 1.º Réu propôs a ação com o n.º 762/11.0BEBRG no TAF de Braga, em representação da Autora, no dia 14.04.2011, contra o Centro Hospitalar do ..., o médico H. F., o Hospital da Misericórdia da ... e o Estado Português (facto considerado nos termos do art. 607º/4 do CPC).
vvv) A ação referida na al. anterior findou com a prolação de Acórdão pelo Tribunal Central Administrativo (TCA) Norte, no dia 23.09.2015, que confirmou a decisão proferida em 1.ª Instância (pelo TAF de Braga), a julgar procedente a exceção de prescrição (facto considerado nos termos do art. 607º/4 do CPC).
*
Não se provou:

1)Após o diagnóstico referido em d), a Autora nunca mais se submeteu a outro eco-doppler até à cirurgia realizada a 20.05.2004 (art. 4º/1.ª parte da p.i. aperfeiçoada).
2) Para a patologia em causa, o procedimento habitual pré-operatório era o indicado em k) (art. 5º da p.i. aperfeiçoada).
3) O médico cirurgião não apertou suficientemente bem o pedaço remanescente da veia safena e não procedeu a uma adequada dissecção da crossa da safena interna (art. 8º da p.i. aperfeiçoada).
4) Após a retirada da veia safena deve ser efetuada uma forte compressão no local por onde a veia passava para evitar o acumular de sangue, o que não se verificou (art. 9º e 10º da p.i. aperfeiçoada).
5) Razão pela qual a Autora, após a cirurgia, sentiu tantas dores e ficou com a perna direita inchada e vermelha junto da virilha (art. 10º da p.i. aperfeiçoada).
6) Após a intervenção cirúrgica, a Autora queixava-se de imensas dores na perna, não conseguindo sequer levantar-se e segurar-se de pé sozinha, ao contrário das restantes pacientes que tinham sido submetidas à mesma espécie de cirurgia, as quais levantavam-se e andavam normalmente, com poucas ou nenhumas queixas (art. 13º da p.i. primitiva).
7) No dia seguinte ao da cirurgia, 20.05.2004, a Autora continuava cheia de dores, não conseguindo levantar-se e manter-se de pé sozinha, nem sequer para se deslocar à casa de banho (art. 14º da p.i. primitiva).
8) Apesar das queixas, o médico não avaliou o estado clínico da Autora, não retirou as ligaduras para ver o que se passava, tendo-lhe apenas sido dada uma carta para ser entregue no Centro de Saúde onde era acompanhada, para posteriormente ser vista pelo médico de família respetivo e fazer os devidos curativos (art. 15º da p.i. primitiva, e 19º a 21º da p.i. aperfeiçoada).
9) O médico cirurgião não procedeu à marcação de uma consulta pós-operatória (art. 16º da p.i. aperfeiçoada).
10) A Autora teve alta sem lhe retirarem as ligaduras, nem as substituírem pelas meias elásticas, nem tão-pouco lhe deram qualquer indicação relativamente a isso (art. 19º da p.i. aperfeiçoada).
11) A primeira ida da Autora à urgência do Hospital ... ocorreu 2 (dois) dias após a cirurgia (parte do art. 16º da p.i. primitiva).
12) No dia 28.05.2004, o médico que observou a Autora na urgência prescreveu-lhe a toma de “Ben-u-ron”, não tendo efetuado um eco-doppler para apurar a razão do estado em que aquela se encontrava (parte dos art. 17º da p.i. primitiva e 23º da p.i. aperfeiçoada).
13) A Autora, entre os episódios de urgência de 28.05.2004 e 01.07.2004, acompanhada pelo seu marido, deslocou-se, por mais do que uma vez, ao Hospital da Santa Casa da Misericórdia da ..., para falar com o médico H. F., sem sucesso (art. 20º da p.i. primitiva).
14) No dia 22.09.2004, o médico H. F. disse-lhe que não havia mais nada a fazer e que a aconselhava a obter opinião do médico Álvaro P. B., cirurgião vascular, com consultório em Braga (art. 24º da p.i. primitiva).
15) Várias foram as vezes em que o 1º Réu solicitou a comparência da Autora no seu escritório, agendando consultas, no âmbito das quais afirmava à Autora que o processo já estava no tribunal (antes de tal ter acontecido) e que, em determinado dia, estava marcada uma consulta no Hospital para ser examinada por peritos (art. 42º da p.i. primitiva).
16) E, dias depois, o funcionário do escritório do 1.º Réu ou o próprio, contactava a Autora telefonicamente dando-lhe conta que tal consulta tinha sido desmarcada e depois o tribunal informaria uma nova data (art. 43º da p.i. primitiva).
17) Muitas vezes foram as vezes que o 1.º Réu agendou consultas com a Autora, mostrando-lhe documentos, dando-lhe a entender que se tratava do seu processo e de que tudo estava a desenrolar-se com normalidade (parte do art. 44º da p.i. primitiva).
18) Por volta do ano de 2010, a Autora recebeu um contacto telefónico, alegadamente anónimo, alertando-a para o facto de o 1.º Réu lhe estar a mentir, pois ainda não tinha intentado nenhuma ação judicial para fazer valer a sua pretensão (art. 46º da p.i. primitiva).
19) Antes da propositura da ação no extinto Tribunal Judicial da Comarca de Santo Tirso, a Autora deslocou-se ao escritório do 1º Réu, confrontou-o e solicitou-lhe que lhe entregasse toda a documentação, de forma a poder contactar outro advogado (art. 47º da p.i. primitiva).
20) Perante tal confronto, o 1º Réu, afirmou à Autora que fazia questão de ser ele a tratar daquele caso, até mesmo por uma questão de honra, e que podia ficar mesmo descansada pois, dentro de dias, lhe provaria que tinha dado entrada da devida ação judicial (art. 48º da p.i. primitiva).
21) Com a obtenção da informação referida em f), e após confirmar a veracidade da mesma, a Autora relaxou e voltou a depositar toda a sua esperança e confiança no trabalho do 1.º Réu (art. 51º da p.i. primitiva).
22) A dada altura, no ano de 2011, a Autora, aproveitando a ida à cidade de Santo Tirso, deslocou-se ao Tribunal Judicial, com o intuito de confirmar o estado do seu processo e conseguir perceber o porquê de tanta demora (art. 54º da p.i. primitiva).
23) Tendo aí tomado conhecimento de que o processo já se encontrava findo, visto que o Tribunal se tinha considerado materialmente incompetente (art. 55º da p.i. primitiva).
24) Munida de tal informação, contactou de imediato o escritório do 1º Réu e confrontou este (art. 56º e parte do art. 57º da p.i. primitiva).
25) A Autora nunca obteve informações sobre o desenvolvimento do processo (parte do art. 60º da p.i. primitiva).
26) Por mais do que uma vez, chegou a deslocar-se ao TAF de Braga e confirmou a veracidade da informação mencionada em gg) (art. 63º da p.i. primitiva).
27) Há cerca de 2 (dois) anos, continuando sem desenvolvimentos, e não se satisfazendo com as respostas do 1º Réu, deslocou-se novamente ao TAF de Braga, tendo constatado que já havia sentença proferida em 2014 e que o processo já se encontrava findo (art. 64º da p.i. primitiva).
28) Tendo solicitado que lhe explicassem o sucedido, foi dito à Autora que “perdeu a ação porque foi metida fora de prazo” (art. 66º e 67º da p.i. primitiva).
29) Naquele momento, a Autora ficou “sem chão” (art. 68º da p.i. primitiva).
30) Juntamente com o seu marido, deslocou-se, de imediato, ao escritório do 1º Réu, o qual, confrontado com a veracidade dos factos, não deu qualquer explicação à Autora, remetendo-se ao silêncio (art. 69º da p.i. primitiva).
31) A Autora ficou sem possibilidade de se dedicar profissionalmente a qualquer outra atividade, salvo as referidas na al. oo) (parte do art. 91º da p.i. primitiva).
32) O estado (atual) de saúde da Autora e a alteração verificada na sua vida é consequência de erro médico e/ou má pratica cometidos na cirurgia (parte do art. 90º e art. 97º da p.i. primitiva).
33) A Autora tinha um excelente relacionamento e ambiente familiar (parte do art. 98º da p.i. primitiva).
34) A Autora, na data atual e no futuro, necessita de fazer tratamentos e de usar meia de contenção (parte do art. 91º da p.i. primitiva).
35) Ainda hoje é real e séria a possibilidade de a Autora poder vir a amputar a sua perna direita (art. 102º da p.i. primitiva).
36) Se o 1º Réu tivesse intentado a devida ação, dentro do devido prazo legal, muito provavelmente, a Autora seria indemnizada no montante de € 200.000,00, quantia em que ficou prejudicada (art. 111º da p.i. primitiva).
37) O 1º Réu criou na Autora a expectativa de que a sua pretensão tinha total procedência (art. 118º da p.i. primitiva).
38) Apesar de bem saber o sofrimento pelo qual a Autora estava a passar, o 1º Réu, fazendo uso da sua ingenuidade, fê-la crer de que tudo corria na sua normalidade, de forma a que a mesma continuasse a depositar, no trabalho que ele alegava estar a desenvolver, confiança e esperança na procedência daquela ação (art. 119º da p.i. primitiva).
39) Quando, ao fim de 12 anos, a Autora tomou conhecimento de que, afinal, não havia processo nenhum a decorrer contra o médico que a prejudicou, em virtude da conduta do 1º Réu, “o mundo desmoronou” sobre si (art. 120º da p.i. primitiva).
40) A Autora não consegue esquecer aquele dia em que se deslocou ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em que o funcionário judicial olhou para ela com sentimento de pena e a informou que o processo tinha findado (art. 124º da petição inicial primitiva).
41) Naquele momento, a Autora sentiu-se completamente humilhada, e ainda hoje assim se sente (art. 125º da p.i. primitiva).
42) Durante anos, o 1º Réu manipulou a Autora fazendo-a acreditar numa causa, que ao fim de algum tempo, já sabia que não teria qualquer provimento, por sua culpa (art. 128º da p.i. primitiva).
43) Após ter sido “desmascarado”, não teve a hombridade de lhe dar uma explicação, nem de a querer ressarcir de alguma forma, pelo prejuízo que lhe causou (art. 129º da p.i. primitiva).
44) Abordado pela Autora, para o efeito, o 1º Réu não quis resolver o assunto, remetendo-se ao silêncio (art. 130º da p.i. primitiva).
45) O 1º Réu fez com que a Autora se deslocasse ao seu escritório, por variadas vezes, a fim de realizar consultas acerca do processo, bem sabendo, a partir de determinada altura, já não haver qualquer viabilidade (parte do art. 113º da p.i. primitiva).
46) A Autora sente-se desprezada e gozada pelo 1.º Réu em virtude do referido em 36) a 45) (art. 127º da p.i. primitiva).
47) A participação a que se alude em qqq) ocorreu a 09.01.2017 (parte do art. 39º da contestação da 2.ª Ré).
48) À data de início da apólice do seguro celebrado com a Interveniente Y, o 1.º Réu tinha conhecimento de que a sua conduta podia ser potencialmente geradora da sua responsabilidade civil (art. 30º da contestação da Interveniente).
*
A) Reapreciação da matéria de facto

A autora insurge-se contra os factos não provados nas alíneas 1, 5, 10, 12 a 17, 19 a 48 e contra a al. ff) dos factos provados.
A interveniente pugnou pela rejeição da reapreciação da matéria de facto alegando que a autora não cumpriu o disposto no art. 640º nº 1 b) do C.P.C..
Ora, vejamos.
Nos termos do art. 662º nº 1 do C.P.C., diploma que pertencerão os preceitos a citar sem menção de origem, A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Antes de mais, o Tribunal da 1ª Instância, ao proferir sentença, deve, em sede de fundamentação, (…) declarar quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas de factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência (art. 607º nº 4) e O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes (art. 607º nº 5).
Sendo certo que o julgador aprecia a prova de acordo com a sua livre convicção, salvo algumas limitações, a análise crítica da prova é da maior importância do ponto de vista da fundamentação de facto da decisão. Com efeito, esta deve ser elaborada por forma a que, através da sua leitura, qualquer pessoa possa perceber quais os concretos meios de prova em que o Tribunal se baseou para considerar determinado facto provado ou não provado e a razão pela qual tais meios de prova foram considerados credíveis e idóneos para sustentar tal facto. Esta justificação terá de obedecer a critérios de racionalidade, de lógica, objectivos e assentes nas regras da experiência.
A exigência de análise crítica da prova nos termos supra referidos permite à parte não convencida quanto à bondade da decisão de facto tomada pelo tribunal da 1ª instância interpor recurso contrapondo os seus argumentos e justificar as razões da sua discordância. Contudo, o recorrente deve cumprir os ónus previstos na lei processual.
Nos termos do nº 2 do art. 637º O requerimento de interposição do recurso contém obrigatoriamente a alegação do recorrente, em cujas conclusões deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade; (…). O ónus de alegar e formular conclusões está previsto no art. 639º nº 1. Assim, as alegações são a exposição de argumentos pelos quais se sustenta a alteração da decisão e as conclusões proposições claras e sintéticas que condensem o exposto na motivação do recurso e que delimitam o âmbito deste.

E dispõe o art. 640º, sob a epígrafe Ónus a cargo do recorrente que impugna a matéria de facto:
1 – Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2– No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; (…).
Acompanhando de perto o Ac. do S.T.J. de 29/10/2015 (Lopes do Rego), in www.dgsi.pt, endereço a que pertencerão os acórdãos a citar sem menção de origem que, em sede de pressupostos do exercício do duplo grau de jurisdição sobre a matéria de facto, distingue dois ónus:
- um ónus primário ou fundamental de delimitação do objecto e de fundamentação minimamente concludente da impugnação, que se traduz na indicação dos pontos de facto questionados, dos meios probatórios que impõem decisão diversa sobre eles e do sentido decisório que decorreria da correcta apreciação destes meios de prova – a), b) e c) do nº 1 do art. 640º do C.P.C.. A falta de cumprimento deste ónus conduz à imediata rejeição do recurso por indiciar uma falta de consistência e seriedade na impugnação da matéria de facto;
- e um ónus secundário tendente a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida, que se traduz na indicação exacta das passagens da gravação em que se funda o recurso – a) do nº 2 do art. 640º do C.P.C.. A falta desta indicação conduz à imediata rejeição do recurso, contudo esta falha da parte deve ser avaliada de forma mais cautelosa e casuisticamente tanto mais que o conteúdo prático deste ónus tem oscilado ao longo dos anos e das várias reformas. Com efeito, a jurisprudência do S.T.J. tem entendido, face ao carácter algo equívoco da expressão “exacta indicação”, em nome do princípio da proporcionalidade e da adequação e ainda da prevalência do mérito sobre os requisitos puramente formais, que não se justifica a liminar rejeição do recurso quando não existe dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado. No mesmo sentido vide, entre outros, Ac. do S.T.J. de 19/01/2016 (Sebastião Póvoas), 28/04/2016 (Abrantes Geraldes), 31/05/2016 (Roque Nogueira), 08/11/16 (Fonseca Ramos).

Tem-se entendido, designadamente Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª ed., Almedina, p. 158-159, que o recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto será, total ou parcialmente, rejeitado quando se verificar alguma das seguintes situações:
“a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (arts. 635.º, nº 4, e 641º, nº 2, al. b));
b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art. 640.º nº 1, al. a));
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exacta, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação.”

Não havendo motivo de rejeição procede este Tribunal à reapreciação da prova nos exactos termos requeridos procedendo ao controlo da convicção do julgador da primeira instância verificando se esta se mostra contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos e sindicar a formação da sua convicção. i.e., o processo lógico. Assim, nada impede que, fundado no mesmo princípio da livre apreciação da prova, o tribunal superior conclua de forma diversa da do tribunal recorrido, mas para o fazer terá de ter bases sólidas e objectivas. Contudo, não poderá deixar-se de ter presente que, por força da imediação, o tribunal da primeira instância é o que se encontra melhor colocado para apreciar a prova, designadamente a testemunhal.
Revertendo ao caso em apreço é por demais evidente que a apelante não cumpriu cabalmente o ónus previsto no art. 640º nº 1 do C.P.C..
Assim, começamos por verificar que a apelante indicou, nas conclusões, os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados – al. 1), 5), 10), 12) a 17), 19) a 48) dos factos não provados e al. ff) dos factos provados – e a decisão que devia ser proferida quanto a tais pontos – os primeiros deveriam ser considerados provados e o segundo não provado.
Como bem assinalou a Interveniente as dificuldades colocam-se quanto aos concretos meios probatórios que impunham decisão diversa sobre cada um dos pontos da matéria de facto impugnados.
Em relação à al. 1) dos factos não provados foram indicados os seguintes meios probatórios – depoimento das testemunhas H. F. e P. B. com indicação da passagem das gravações em que se funda. Em relação à al. 5) dos mesmos factos – notas enfermagem e notas clínicas, documentos impugnados pela autora, declarações da autora, depoimentos de J. A., E. J., sem indicação da passagem das gravações em que se funda, mas, atendendo ao facto de serem declarações e depoimentos relativamente curtos, admite-se tal desnecessidade. Quanto à al. ff) dos factos provados – carta da autora de 11/10/2016 dirigida ao 1º réu.
Já quanto aos demais pontos da matéria de facto, de modo algum, se pode dizer que a apelante tenha indicado os concretos meios probatórios em que se baseia. Com efeito, aquela limitou-se a impugnar genericamente tal matéria de facto “atacando” também genericamente a convicção do tribunal, o que impossibilita ou, pelo menos, dificulta enormemente o exercício do contraditório pelas apeladas e a apreciação por este tribunal, na certeza porém que não incumbe ao Tribunal da Relação fazer um novo e total julgamento da causa.
Pelo exposto, admite-se a reapreciação da matéria de facto apenas quanto às al. 1), 5) dos factos não provados e al. ff) dos factos provados e rejeita-se a referida reapreciação no que concerne à matéria de facto não provada sob as alíneas 10), 12) a 17), 19) a 48).
Importa referir que numa situação como a presente não há a obrigação por parte deste Tribunal de proferir despacho a convidar a recorrente a aperfeiçoar. Desde logo, resulta do art. 640º nº 1 do C.P.C. que a omissão de cumprimento dos ónus processuais aí referidos implica a rejeição da impugnação da matéria de facto impondo, deste modo, rigor e autorresponsabilidade à parte recorrente. Por outro lado, apenas pode ser aperfeiçoado o acto processual da parte que, tendo sido praticado, se apresente como deficiente, obscuro ou complexo e não o acto processual que pura e simplesmente não foi praticado. Neste sentido Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª ed., Almedina, p. 157 e Ferreira de Almeida, in Direito Processual Civil, II, Almedina, p. 462.
Não é aplicável ao caso em apreço o disposto no art. 655º do C.P.C. porquanto não nos encontramos perante um recurso não levado a julgamento, mas, pelo contrário, perante um recurso levado a julgamento, no qual apenas a impugnação da matéria de facto é parcialmente rejeitada. Acresce que tendo a questão do não cumprimento do ónus previsto no art. 640º nº 1 do C.P.C. sido suscitada nas contra-alegações podia o apelante, querendo, ter-se pronunciado ao abrigo do princípio do contraditório previsto no art. 3º nº 3 do C.P.C.
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Adiantamos, desde já, que a apreciação da matéria de facto pelo tribunal recorrido, que foi extensíssima e que abordou todos os meios probatórios de forma exaustiva, se mostra irrepreensível pelo que a acompanhamos.
Ainda assim, sempre se dirá que o facto do 1º réu não ter contestado não acarreta a admissão por acordo dos factos alegados uma vez que aquele foi demandado juntamente com a ré X INSURANCE Company SE e esta apresentou contestação pelo que se aplica o disposto no art. 568º a) e não o art. 567º nº 1 do C.P.C..
- alínea 1) dos factos não provados
Do depoimento da testemunha H. F. resulta que este, imediatamente antes da cirurgia, não solicitou à autora que realizasse outro eco-dopller, o que é consentâneo com a matéria que se fez constar na al. k) dos factos provados. Dos depoimentos desta testemunha, bem como das testemunhas P. B. e A. M., resulta que este exame serve para fazer o diagnóstico e dar (ou não) “indicação cirúrgica” e, por isso, não é necessária e obrigatória a sua repetição antes da cirurgia (independentemente de tal poder ser eventualmente aconselhável atento o lapso de tempo decorrido).
Como bem se refere na decisão recorrida, não se mostrando junto todo o processo clínico da autora junto do Hospital de Guimarães, não se pode afirmar peremptoriamente que aquela, depois da “indicação cirúrgica” por este Hospital, não tenha feito outro eco-dopller justificando-se deste modo o facto não provado sob a al. 1. E de modo algum ocorre contradição entre o facto constante da al. k) e este facto não provado.
- al. 5) dos factos não provados
É de manter este facto como não provado, desde logo, porque o mesmo vem no seguimento do referido na al 4) que igualmente não se provou. Com efeito, não resultou provado que, durante a cirurgia, não tenha sido feita uma forte compressão no local onde a veia passava para evitar a acumulação de sangue pelo que naturalmente não se pode afirmar que é por isso que a autora sentiu tantas dores e que ficou com a perna inchada e vermelha junto da virilha.
De qualquer modo, quer das notas enfermagem, quer das notas clínicas não consta que a autora, no pós-operatório e antes da alta, tenha tido dores excepcionais, constando até o contrário! É um facto que aquele segundo documento foi impugnado, contudo o tribunal recorrido julgou improcedente o incidente de impugnação quanto à genuinidade desse documento e considerou que os dizeres nele constante tinham sido apostos pelo médico cirurgião na data nele referida. Acresce que, analisando criticamente o conjunto da prova produzida, concluiu, e bem, que era de atender ao referido naqueles documentos clínicos prevalecendo sobre os frágeis e não credíveis depoimentos das testemunhas inquiridas – o filho da autora tinha apenas 9 anos e não é crível que, passados tantos anos, se recorde das queixas da mãe logo a seguir à alta; o mesmo se diga das declarações da testemunha E. J., além de que se estranha que a mesma se recorde muito bem das dores da autora, mas já não se a mesma se queixou das mesmas às enfermeiras, sendo que esta testemunha revelou forte animosidade contra o Dr. H. F.; o marido da autora, tendo um interesse, ainda que indirecto, no desfecho da acção, não merece igualmente credibilidade; as declarações da autora, que revelam um enorme sofrimento psicológico actual, não permitem concluir de outro modo uma vez que as mesmas são muito imprecisas, contraditórios acerca do alegado na petição e fortemente determinadas pela profunda convicção que todos os seus males tem a ver com uma negligência médica ocorrida durante a cirurgia.
Refira-se ainda que, se as dores da autora eram tão fortes como refere não se percebe por que razão a mesma só recorreu à urgência a 28 de Maio.
- al. ff) dos factos provados
É de manter igualmente este facto como provado uma vez que o mesmo foi admitido pela própria autora no art. 50º da petição inicial tendo esta acrescentado no artigo seguinte que foi confirmada a veracidade dessa informação. Assim sendo, não se percebe que a mesma venha agora pô-lo em causa!
É um facto que a autora não aludiu a este facto na carta datada de 11/10/2016 dirigida ao advogado, mas aquela omissão não tem a virtualidade de provar que à mesma não foi dada a informação aí referida.
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B) Subsunção jurídica

Defende igualmente a autora que a decisão recorrida não aplicou devidamente o direito, nomeadamente a “teoria da perda de chance”, mas, uma vez mais, sem razão.
Nos presentes autos a autora pede a condenação dos réus no pagamento de uma indemnização a título de danos patrimoniais (€ 200.000,00 correspondente ao valor peticionado na acção instaurada contra, entre outros, o médico cirurgião; € 1.000,00 de despesas de transporte) e de danos não patrimoniais (€ 30.000,00) com fundamento na responsabilidade civil contratual alegando, para tanto, ter celebrado com o 1º réu, Dr. J. O., um contrato de mandato forense e ter havido incumprimento culposo por parte deste que lhe causou danos.
Vejamos.
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I. Do contrato de mandato.

O contrato de mandato é O contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra (art. 1157º do C.C.). O mandato presume-se gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por profissão; neste caso presume-se oneroso (art. 1158º nº 1 do C.C.).
É mandato com representação quando o mandatário tiver recebido poderes para agir por conta, mas em nome do mandante (art. 1178º do C.C.).
Por mandato forense entende-se a outorga de poderes de representação em juízo a um profissional do foro: advogado, advogado estagiário ou solicitador (art. 62º nº 1 a) do E.O.A. aprovado pela Lei nº 15/2005 de 26/01, aplicável aos factos em apreço). O seu regime especial está previsto no anterior art. 35º e ss do C.P.C./art. 44º e ss do C.P.C./2013.
As obrigações do mandatário em geral estão previstas no art. 1161º do C.C., sendo estas designadamente praticar os actos compreendidos no mandato segundo as instruções do mandante; prestar as informações que este lhe peça; comunicar a execução do mandato e prestar contas.
E as obrigações do mandante estão previstas no art. 1167º do C.C. e consistem em fornecer ao mandatário os meios necessários à execução do mandato; pagar-lhe a retribuição; reembolsá-lo das despesas feitas e indemnizá-lo de prejuízo sofrido em consequência do mandato.
As obrigações específicas dos advogados, designadamente os deveres do advogado para com os seus clientes, encontram-se previstas no E.O.A., no Código Deontológico e na L.O.F.T.J..
Dispunha o art. 92º do E.O.A., em sede de princípios gerais: (…) 2 – O advogado tem o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos do cliente, sem prejuízo do cumprimento das normas legais e deontológicas.
No art. 93º nº 2 do Estatuto lê-se: O advogado não deve aceitar patrocínio de uma questão se souber, ou dever saber, que não tem competência ou disponibilidade para dela se ocupar prontamente, a menos que actue conjuntamente com outro advogado com competência e disponibilidade para o efeito.

E no art. 95º do E.O.A.: 1. Nas relações com o cliente, são ainda deveres do advogado:

a) Dar a sua opinião conscienciosa sobre o merecimento do direito ou pretensão que este invoca, assim como prestar, sempre que lhe for solicitado, informação sobre o andamento das questões que lhe forem confiadas, (…)
b) Estudar com cuidado e tratar com zelo a questão de que seja incumbido, utilizando para o efeito, todos os recursos da sua experiência, saber e actividade; (…).

Normalmente a obrigação do mandatário forense é uma obrigação de meios uma vez que aquele apenas se obriga a desenvolver uma actividade ou conduta diligente em direcção ao resultado final, mas sem assegurar que o mesmo se produza. Assim, exige-se ao mandatário que, face às instruções do cliente, analise a situação e decida agir da forma mais diligente e adequada do ponto de vista jurídico e de harmonia com os seus conhecimentos técnicos na defesa dos interesses do seu cliente, disso dando conta a este.
Contudo, não se exclui que este mandato possa conter uma concreta obrigação “de resultado” i.e., ser “susceptível de consubstanciar um particularizado dever de concretizar um identificado objectivo especificadamente descrito pelo mandante; neste caso a obrigação do mandatário só fica cumprida com a materialização da tarefa que nos termos pactuados lhe foi acreditada” cfr. Ac. do S.T.J. de 24/05/2011 (Silva Gonçalves).

No caso em apreço, da matéria de facto dada como provada resulta a prestação pelo 1º réu à autora, a pedido desta, de aconselhamento jurídico em face da sua situação de saúde após a cirurgia. Mais resulta a celebração de um acordo nos termos do qual o 1º ré instauraria uma acção de responsabilidade civil com fundamento em negligência médica sendo que, para tal, a autoria outorgou, em 15/01/2005, procuração forense.
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II. Da responsabilidade civil do mandatário

O advogado que falte culposamente aos deveres resultantes da assumpção do mandato pode incorrer em responsabilidade penal, disciplinar e civil.
Discute-se na doutrina e na jurisprudência qual a natureza da responsabilidade civil dos advogados no exercício de mandato judicial.
Para uns está em causa a responsabilidade contratual atento o contrato de mandato celebrado, com ou sem representação, entre advogado e cliente.
Para outros, que atendem ao carácter público da actividade forense e à observação de certos deveres legalmente exigidos a estes profissionais pelo Estatuto da Ordem dos Advogados (deveres para com a comunidade e para com o cliente), defendem a tese da responsabilidade extracontratual (designadamente António Arnault, in “Iniciação à Advocacia”, 11ª ed, p. 169).
Por fim, outros ainda defendem que tal responsabilidade tem uma natureza mista podendo coexistir ambas. Como refere L. P. Moitinho de Almeida, in “Responsabilidade Civil dos Advogados”, 2ª ed, p.13, “Se o advogado não cumpre ou cumpre defeituosamente as obrigações que lhe advém do exercício do contrato de mandato (ou outro) que firmou com o constituinte tacitamente ou mediante procuração, incorre em responsabilidade civil contratual para com ele; se o advogado praticou facto lesivo dos interesses do seu constituinte, já a sua responsabilidade civil para com o mesmo constituinte é extracontratual ou aquiliana”. A conclusão por uma responsabilidade ou outra dependerá dos factos concretos em apreço alegados pelo lesado. Esta tese é a defendida pela maioria da doutrina e aceite pela generalidade da jurisprudência por ser a “mais conforme ao Direito e às realidades da vida” como refere aquele autor na obra supra citada.
In casu encontramo-nos perante uma situação de eventual responsabilidade civil contratual uma vez que é alegada pela autora a violação da obrigação de instaurar prontamente uma acção com vista à efectivação de responsabilidade civil no âmbito de um contrato de mandato forense.
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III. Da responsabilidade civil contratual do 1ª réu.

Os pressupostos desta responsabilidade civil retiram-se dos art. 798º e 799º do C.C.: o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.

1. O facto
A conduta aqui em causa é o comportamento do 1º réu que, não obstante ter sido mandatado para instaurar acção de responsabilidade civil, pelo menos em 15/01/2005, data da outorga da procuração, apenas o veio a fazer em 13/05/2010 no Tribunal de Santo Tirso dando origem ao proc. nº 2182/10.4TBSTS e, como este tribunal se julgou incompetente em razão da matéria por decisão de 26/11/2010, o 1º réu instaurou nova acção no T.A.F. de Braga em 14/04/2011 sendo que este tribunal, por decisão transitada em julgado, considerou que o direito da autora em ver apreciada a sua pretensão se encontrava prescrito.
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2. A ilicitude
Em sede de responsabilidade contratual a ilicitude de um facto resulta da desconformidade entre o comportamento devido pelo seu autor e o comportamento observado.
Ora, ao demorar mais de 5 anos em instaurar a acção, o 1º réu não agiu de molde a defender os interesses legítimos da autora (art. 92º, nº 2 do E.O.A./05) uma vez que, se não tinha disponibilidade para se ocupar prontamente da acção a instaurar, não devia ter aceitado o patrocínio (art. 93º nº 2 do E.O.A./05).
Assim, o 1º réu cumpriu defeituosamente o contrato de mandato.
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3. A culpa.
A culpa traduz-se num juízo de reprovabilidade da conduta de alguém que, em face das circunstâncias específicas do caso, devia e podia ter agido de outro modo e assenta no nexo psicológico que existe entre o facto e a vontade do agente. Pode revestir a forma de dolo ou de negligência.
Em sede de responsabilidade contratual, nos termos do art. 799º nº 1 do C.C., existe uma presunção de culpa do devedor incumbindo a este ónus de a afastar.
A culpa é apreciada pela diligência de um bom pai de família em face das circunstâncias de cada caso (art. 799º nº 2 e 487º nº 2 do C.C.).
Galvão Teles, in Direito das Obrigações, p. 353, refere que esta referência às circunstâncias de cada caso significa “que o próprio padrão a ter em conta varia em função do condicionalismo da hipótese e designadamente do tipo de actividade em causa, não podendo o modelo ser o mesmo conforme se trata da construção de um imóvel ou a condução de um processo judicial; ali o paradigma será um tipo normal de construtor, aqui um tipo normal de advogado”.
Contudo, outra doutrina e jurisprudência exige uma diligência superior à do homem médio. Neste sentido vide Ac. do S.T.J. de 29/04/2010 (Sebastião Póvoas) onde, no sumário, se lê: “Ao mandatário forense não é apenas exigida diligência do homem médio (…) um paradigma de conduta a apreciar em abstracto mas tendo em atenção tratar-se de um profissional a quem é imposto muito maior rigor na investigação, actualização, adequação e aplicação dos conhecimentos da sua especialidade”.
In casu incumbia aos réus afastar a presunção de culpa do 1º réu, o que não foi feito.
Com efeito, tendo em atenção que a jurisprudência maioritária entende que, no caso de cuidados de saúde prestados por parte de estabelecimentos públicos, a eventual responsabilidade civil é de natureza extra-contratual e, consequentemente, o prazo de prescrição é de 3 anos nos termos do art. 498º nº 1 do C.C., devia o 1º réu, ainda que perfilhasse o entendimento de que a responsabilidade era contratual e que o prazo de prescrição era 20 anos (apoiado em alguma doutrina ou jurisprudência), ter sido prudente e instaurado a acção até 19/05/2007. É, assim, censurável a conduta do 1º réu.
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4. O dano
“O dano é a perda in natura que o lesado sofreu, em consequência de certo facto, nos interesses (…) que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar.” – Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, Vol. I, 7ª ed., Almedina, p. 591.
Uma das distinções possíveis é entre dano patrimonial (susceptível de avaliação pecuniária, podendo ser reparado através de restauração natural ou por meio de equivalente) e não patrimonial (insusceptível de avaliação pecuniária apenas pode ser compensado com uma obrigação pecuniária).

4.1. Dano patrimonial por perda de chance
A indemnização pela perda de chance - perda de oportunidade de obter uma vantagem patrimonial ou evitar um prejuízo – surgiu em França no Séc. XIX num acórdão da Cour de Cassation tendo depois passado a ser aceite de forma unânime naquele país. Também é aceite noutros países europeus e igualmente no direito europeu.
Em Portugal, em face do direito positivo, alguma doutrina não a aceita como dano autónomo por entender que contraria o princípio da certeza do dano e da causalidade adequada. Neste sentido vide Júlio Vieira Gomes, Sobre o dano da perda de chance, in Direito e Justiça, Vol. XIX, 2005, tomo II, p. 9-47 e Paulo Mota Pinto, in Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, Vol. II, Coimbra Editora, 2008, p. 1103-1106, nota 3103.
Já outros aceitam tal ressarcibilidade.
Carneiro da Frada, in Direito Civil, Responsabilidade Civil – O Método do Caso, Almedina, 2010, p. 101, refere:
“(…) o dano conhecido por “perda de chance”, praticamente por desbravar entre nós. Entre as suas áreas de relevância encontra-se a de responsabilidade médica: se o atraso de um diagnóstico diminui em 40% as possibilidades de cura do doente, quid iuris? Já fora deste âmbito, como resolver também o caso da exclusão de um sujeito a um concurso, privando-o da hipótese de o ganhar? (…)
Uma das formas de resolver este género de problemas é a de considerar a perda de oportunidade como um dano em si, como que antecipando o prejuízo relevante em relação ao dano final (apenas hipotético, v.g., ausência de cura, perda de concurso, do malograr das negociações por outros motivos), para cuja ocorrência se não pode asseverar um nexo causal suficiente. Mas então temos de considerar que a mera possibilidade de uma pessoa se curar, apresentar-se a um concurso ou negociar um contrato consubstancia um bem jurídico tutelável. Se, no plano contratual, a perda de oportunidade pode desencadear responsabilidade de acordo com a vontade das partes (que erigiram essa “chance” a bem jurídico protegido pelo contrato), no campo delitual esse caminho é bem mais difícil de trilhar: a primeira alternativa do art. 483º nº 1 não dá espaço e, fora desse contexto, tudo depende da possibilidade de individualizar a violação de uma norma cujo escopo seja precisamente a salvaguarda da “chance”.
Ainda assim surgem problemas, agora na quantificação do dano, para o qual um juízo de probabilidade se afigura indispensável. Derradeiramente, não podendo ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (art. 563º nº 3 do C.C.). (…)” (sublinhado nosso).
Rute Teixeira Pedro, in A Responsabilidade Civil do Médico – Reflexões sobre a Noção da Perda de Chance e a Tutela do Doente Lesado, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Centro de Direito Biomédico, Coimbra Editora, 2008, p. 221, qualifica a perda de chance como dano autónomo, “diverso do dano decorrente da perda do resultado por ela proporcionado”, actual, emergente, e certo por ter “(…) por objecto a perda da possibilidade actual de conseguir um resultado determinado” a provar com o grau de verosimilhança exigido em termos de consistência ou seriedade. (sublinhado nosso)
No que diz respeito à jurisprudência o S.T.J. esta começou por adoptar uma orientação muito restritiva no caso da perda de chances processuais devido à violação dos deveres profissionais do advogado por entender que essa figura contraria o princípio da certeza dos danos e as regras da causalidade adequada, só a atendendo em situações pontuais e residuais, como por exemplo em situações em que ocorre a perda de um bilhete de lotaria, em que se é ilicitamente afastado de um concurso ou do atraso de um diagnóstico médico que diminuiu substancialmente as possibilidades de cura de um doente. Neste sentido vide Ac. do S.T.J. de 26/10/2010 (Azevedo Ramos).
Contudo, tem havido por parte daquele alto Tribunal uma crescente, ainda que cuidadosa, aceitação daquela doutrina.
No Ac. de 29/05/2012 (João Camilo) lê-se: “A doutrina da perda de chance não tem, em geral, apoio na nossa lei civil que exige a certeza dos danos indemnizáveis e a existência de nexo de causalidade entre eles e a conduta do lesante. Apenas quando se prove que o lesado obteria, com forte probabilidade, o direito não fora a chance perdida, se pode fundamentar uma indemnização pelos respectivos danos.” (sublinhado nosso)

No Ac. de 09/07/2015 (Tomé Gomes) lê-se:
“(…) 3. (…) no campo da responsabilidade civil contratual por perda de chances processuais, em vez de se partir do princípio de que o sucesso de cada ação é, à partida, indemonstrável, mostra-se mais adequado questionar, perante cada hipótese concreta, qual o grau de probabilidade segura desse sucesso, pois pode muito bem acontecer que o sucesso de determinada ação, à luz de um desenvolvimento normal e típico, possa ser perspetivado como uma ocorrência altamente demonstrável, à face da doutrina e jurisprudência então existentes; o ónus de prova de tal probabilidade impende sobre o lesado.
4. Nessa linha, uma vantagem perdida por decorrência de um evento lesivo, desde que consistente e séria, deve ser qualificada como um dano autónomo, não obstante a impossibilidade absoluta do resultado tido em vista, reconduzindo-se a um dano autónomo existente à data da lesão, portanto qualificável como dano emergente, segundo um juízo de probabilidade suficiente, independente do resultado final frustrado.
5. A garantia dos princípios da certeza do dano e das regras da causalidade ficará, pois, assegurada pelo grau de consistência a conferir à vantagem ou prejuízo em causa, tal como sucede no domínio dos lucros cessantes ou dos danos futuros previsíveis.
6. No caso de perda de chances processuais, a primeira questão está em saber se o frustrado sucesso da ação assume tal padrão de consistência e seriedade, nomeadamente para efeitos de danos não patrimoniais, para o que releva ponderar, face ao estado da doutrina e jurisprudência então existente, ou mesmo já em evolução, se seria suficientemente provável o êxito daquela ação, devendo ter-se em linha de conta, fundamentalmente, a jurisprudência então seguida nessa matéria pelo tribunal daquela causa, impondo-se fazer o chamado “julgamento dentro do julgamento”, atentando no que poderia ser considerado como altamente provável por esse tribunal; tal apreciação traduz-se, enquanto tal, numa questão de facto, que não de direito.” (sublinhado nosso)
No mesmo sentido vide, entre outros, Ac. do S.T.J. de 15/11/2018 (Rosa Tching), 19/12/2018 (Fonseca Ramos); de 10/09/2019 (Graça Amaral)
Revertendo ao caso em apreço, e analisando os factos alegados nas duas acções instauradas pelo 1º réu, concluímos que não se prova a existência do denominado dano por perda de chance.
Com efeito, desde logo, os alegados erros médicos cometidos durante a cirurgia e referidos nessas acções – pedaço da veia safena não suficientemente apertado, não adequada dissecção da crossa da veia interna e não forte compressão no local por onde a veia passava – não se provaram (vide al. 3) e 4) dos factos não provados).
Se é verdade que a autora sofreu trombose venosa profunda e é sabido que esta complicação pode ocorrer num qualquer pós-operatório, de modo algum, se fez prova que a mesma tenha ocorrido na sequência da prática de erro médico por parte do cirurgião H. F.. Tendo a cirurgia tido lugar em 19/05/2004, apenas a 01/07/2004, na Urgência do Hospital de Guimarães, foi a referida trombose diagnosticada à autora (e nem se diga que a mesma não foi anteriormente diagnosticada por negligência deste serviço uma vez que do processo clinico da autora naquele hospital resulta que, aquando de uma primeira ída à urgência em 28/05/2004, aquela foi sujeita a um eco-dopller que teve um resultado normal!).
Ainda que nessas acções tivessem sido alegados os demais erros ora invocados a procedência das mesmas era igualmente altamente improvável. Como ficou dito em sede de reapreciação da matéria de facto, uma vez que o exame de eco-dopller visa tão só obter um diagnóstico, e este já estava feito pelo Hospital de Guimarães (que concluiu pela “indicação cirúrgica”), não estava o cirurgião obrigado a pedir um novo exame imediatamente antes da cirurgia ainda que tivesse decorrido aquele lapso de tempo e, de modo algum, a sua não realização é causa adequada ao desenvolvimento de uma trombose venosa profunda 40 dias depois.
No que concerne à fase pós-operatória não se provou que não tivesse sido agendada uma consulta cerca de 8 dias depois da cirurgia pelo que não se pode afirmar que a ausência da autora à mesma seja imputável ao médico.
Assim, deste julgamento dentro do presente julgamento não resulta minimamente indiciado qualquer acto ilícito e culposo por parte dos réus dessas acções a quem pudessem ser imputados os danos sofridos pela autora.
Em resumo, se por um lado a não instauração da acção antes do decurso do prazo de prescrição previsto no art. 498º nº 1 do C.C. acarretou para a autora a perda de oportunidade de ver a sua pretensão apreciada e, no caso de procedência, obter uma vantagem patrimonial, por outro, no caso concreto em análise, atenta a matéria alegada na petição e a avaliação da prova aqui efectuada, impõe-se a conclusão que seria altamente improvável que tal pretensão fosse procedente.
Daí que se conclua que a conduta pouco diligente do 1º réu não acarretou para a autora um dano patrimonial de perda de chance tal como este é aceite pela jurisprudência.
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5. Nexo de causalidade entre o facto ilícito e os danos
Face ao acima referido fica prejudicada a apreciação deste pressuposto da responsabilidade à luz da doutrina da causalidade adequada prevista no art. 563º do C.C..
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Pelo exposto, não incorreu o tribunal a quo em erro na subsunção jurídica e, assim, improcede a apelação.
*
Face ao decidido fica prejudicado o conhecimento da ampliação do recurso.
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As custas da apelação são da responsabilidade da apelante face ao seu decaimento (art. 527º, nº 1 e 2 do C.P.C.).
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Sumário – 663º nº 7 do C.P.C.:
I - Quando o apelante omite, na motivação do recurso, a especificação dos concretos meios probatórios que impõem, no seu parecer, decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados é de rejeitar a impugnação da decisão relativa à matéria de facto ao abrigo do disposto no art. 640º nº 1 b) do C.P.C..
II - O advogado não deve aceitar patrocínio de uma questão se souber, ou dever saber, que não tem competência ou disponibilidade para dela se ocupar prontamente, a menos que actue conjuntamente com outro advogado com competência e disponibilidade para o efeito (art. 93º nº 2 do E.O.A./05) e tem o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos do cliente (art. 92º do mesmo Estatuto).
III - A obrigação do mandatário forense é, em regra, uma obrigação de meios uma vez que aquele normalmente obriga-se a desenvolver uma actividade ou conduta diligente em direcção ao resultado final, mas sem assegurar que o mesmo se produza, mas não é de excluir que este mandato possa conter uma concreta obrigação de resultado, um dever de concretizar um determinado objectivo.
IV – O S.T.J. tem vindo a aceitar a doutrina da perda de chance no caso da perda de chances processuais devido à violação dos deveres profissionais do advogado admitindo, deste modo, a responsabilidade civil deste nas situações em que se prova que o lesado veria reconhecido com forte probabilidade, não fora a chance perdida, o seu direito face da doutrina e jurisprudência então existentes, o que pressupõe um “julgamento dentro do julgamento”.
V – Pratica um acto ilícito e culposo o advogado que demorou cerca de 5 anos a instaurar uma acção de responsabilidade civil com fundamento em erro médico no âmbito de cuidados de saúde prestados por estabelecimento público e na qual veio a ser proferida decisão transitada em julgado que considerou o direito prescrito. Contudo, não se provando que fosse altamente provável a procedência dessa acção, inexiste dano por perda de chance susceptível de ser imputado ao mandatário.
*
III – Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e consequentemente confirmam a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
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Guimarães, 16/09/2021
(processado em computador e revisto, antes de assinado, pela relatora)

Relatora: Margarida Almeida Fernandes
Adjuntos: Afonso Cabral de Andrade
Alcides Rodrigues