Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2506/13.2TBGMR-G.G1
Relator: HELENA MELO
Descritores: DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA
ADMINISTRADOR DE INSOLVÊNCIA
INCUMPRIMENTO POR PARTE DO ADMINISTRADOR
RECUSA DE CUMPRIMENTO
DIREITO DO CREDOR
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/30/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I- Não é pacífico se o direito do credor se constitui no momento da declaração da insolvência ou se se constitui apenas no momento em que o administrador da insolvência manifesta a recusa de cumprir.
II- Considerando que o cumprimento fica suspenso até à comunicação do administrador da insolvência, altura em que fica definido se o AI vai ou não cumprir o acordado com a falida, afigura-se que o crédito da contra parte apenas se constitui quando o administrador manifesta expressa ou tacitamente a intenção de não cumprir.
III- Os efeitos da recusa do cumprimento pelo administrador da insolvência encontram-se regulados no n.º 2 do artigo 106º, o qual manda seguir, com as necessárias adaptações, o regime do n.º 5 do artigo 104º - do que resulta ser aplicável o n.º 3 do artigo 102º-, salvo quanto ao direito previsto na sua alínea c). Assim, o promitente-comprador, perante a recusa de cumprimento, apenas tem direito à indemnização pela diferença, se esta, calculada nos termos do n.º 5 do artigo 104º for positiva , sem prejuízo de poder exigir uma indemnização em montante superior, fazendo prova dos danos sofridos, nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 102º.
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães:

I - Relatório
B…veio intentar a presente acção de verificação ulterior de créditos, nos termos do disposto no artigo 146º do C.I.R.E., contra ainsolvente C…, SA., a massa insolvente e os demais credores, alegando ser detentora de um crédito no valor global de € 48.180,60 sobre a insolvente, garantido por direito de retenção.
O credor Banco…, SA, apresentou contestação, tendo invocado a extemporaneidade da acção, a inexistência do direito de retenção, e a invalidade do contrato promessa, pugnando pela improcedência da acção.
Realizou-se audiência prévia e proferiu-se despacho saneador, no qual se afirmou a validade e regularidade da instância, tendo ainda sido identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.
Realizado o julgamento foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, julgou reconhecido o crédito da Autora sobre a insolvente C…, SA, no valor de € 47.349,20 (quarenta e sete mil trezentos e quarenta e nove euros e vinte cêntimos), por força do incumprimento do contrato promessa de compra e venda celebrado entre a A. e a insolvente, a fim de ser graduado, como crédito garantido por direito de retenção relativamente ao imóvel aludido no ponto 1. dos factos provados, no lugar que lhe competir.
O credor Banco…, S.A. não se conformou e interpôs o presente recurso que concluiu do seguinte modo:
I – A acção de verificação ulterior de créditos, instaurada pela ora Recorrida, é manifestamente extemporânea, pois deu entrada no dia 18/02/2016, quase dois anos após o prazo legalmente previsto, 17/03/2014.
II - O Meritíssimo Juiz a quo considera que a acção é tempestiva porque entendeu que o crédito da Recorrente só se constituiu no dia 29/12/2015, com uma carta do AI na qual alegadamente se pronunciava nos termos do artigo 102.º do CIRE, o que não faz qualquer sentido.
III - A verdade é que a missiva enviada pelo AI não configurou nenhuma comunicação nos termos do artigo 102.º do CIRE, mas apenas uma resposta à missiva que a Recorrida lhe enviou no dia 23/12/2015.
IV - A Recorrida que tinha ficado em total silêncio durante todo o processo, que teve início em agosto de 2013, muito convenientemente, enviou no dia 23/12/2015, uma carta ao AI a perguntar-lhe se este iria notificá-la nos termos do artigo 102.º do CIRE.
V - Esta conduta é claramente reveladora de uma má fé processual da Recorrida que obviamente não pode retirar vantagens da sua total inércia e ficar numa situação mais favorecida em relação aos outros credores que, em tempo e sem subterfúgios, reclamaram devidamente os seus créditos!
VI - A verdade é que foi numa fase embrionária do processo que o Administrador de Insolvência decidiu que não iria cumprir este contratopromessa mas não o transmitiu, por escrito, à promitente-compradora, nem tinha que o fazer!
VII – Quando foi entregue uma cópia do contrato promessa ao AI, logo no início do processo, este foi interpelado tacitamente, dessa forma, e, por sua vez, decidiu não cumprir o contrato, quando optou por não incluir qualquer crédito da promitente compradora na lista definitiva de créditos.
VIII - Aliás, foi provado na tentativa de conciliação realizada, no dia 17 de junho de 2014, no âmbito do incidente de reclamação de créditos que segue os seus termos pelo apenso D – vide primeiro parágrafo na décima terceira página da sentença recorrida – o seguinte: “Quanto a B…, trata-se também de credora que não figura entre os credores reconhecidos ou não reconhecidos, e, como confirmado pelo Sr. AI nesta diligência, a mesma não reclamou a verificação de qualquer crédito.”
IX – Em suma, o crédito da Recorrida não foi reclamado, nem foi reconhecido, nos termos do artigo 129.º do CIRE, ou seja, era inexistente, neste processo de insolvência.
X – Do que se depreende que o facto de o AI não ter graduado o crédito da promitente-compradora, ora Recorrida, tal significa uma manifestação tácita de recusa do contrato-promessa.
XI - Neste sentido, vide o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no dia 21/05/2013, processo n.º 3307/08.5TBVCT-M.G1 – “A recusa de cumprimento dos contratos a que se refere o artigo 102, n.º 1 do CIRE não exige declaração expressa, nem forma especial, aplicando-se-lhe os princípios dos arts. 217.º 219.º doC.Civil, pelo que a inclusão pelo Administrador de Insolvência dos créditos dos promitentes compradores no elenco dos créditos reconhecidos, sem o subordinar a qualquer condição, deve corresponder à declaração de recusa de cumprimento dos invocados contratos promessa” (sublinhado nosso) e ainda o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22/02/2011, processo n.º 1548/06.9TBEPS-D.G1.S1 que decidiu exactamente da mesma maneira.
XII - A jurisprudência é unânime ao entender que a declaração que o AI tem que fazer, nos termos do artigo 102.º do CIRE, é no contexto da liquidação, ou seja, depois de já ter recebido as competentes reclamações de crédito e saber exactamente o montante que o alegado promitente-comprador pagou, averiguar o valor do imóvel prometido comprar e à luz de todas essas informações, analisar o que será mais benéfico para a massa insolvente.
XIII - Contudo, a Recorrida apresenta a tese peregrina, em toda a jurisprudência, de acordo com a qual, a declaração nos termos do artigo 102.º é requisito constitutivo do seu crédito! Nada mais falacioso, sob pena de violação do princípio da igualdade dos credores, ínsito no artigo 128.º do CIRE, que exige que todos os credores têm que reclamar no processo de insolvência o seu crédito, acompanhado de todos os documentos comprovativos da sua existência, mesmo que tenham o seu crédito reconhecido por sentença!
XIV - A Recorrida, numa ostensiva postura de litigante de má fé, ousa alegar que o seu crédito foi constituído com a carta de 29/12/2015 do AI, quando foi a própria que provocou o envio da referida carta, talvez para tentar ter uma base de sustentação para a acção de verificação ulterior de créditos.
XV - Na hipótese meramente teórica, mas que não se concede, de ainda assim se considerar que a acção foi tempestiva, o crédito da Recorrida nunca poderia gozar de direito de retenção, por dois motivos que a seguir se exporão.
XVI - Por um lado, “os promitentes compradores que vêem a celebração do contrato prometido ser recusada pelo administrador de insolvência, na pendência do respectivo processo, não beneficiam do direito de retenção sobre o imóvel objecto desse contrato e apenas têm direito à restituição do sinal em singelo”. – neste sentido, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no dia 13-12-2012, processo n.º 1092/10.0TBLSD-G.P1.
XVII - Esta conclusão alicerça-se no facto do direito de resolução nos termos do artigo 102.º do CIRE pelo AI estar condicionado à inexistência, na data da declaração da insolvência, de cumprimento total pela contra parte.
XVIII - Na verdade, a alínea f) do n.º 1 do referido artigo apenas é aplicável quando estejamos perante “(...) o não cumprimento imputável à outra parte nos termos do artigo 442.º”, o que, conforme já foi dito, aqui não se verifica, uma vez que o AI actua no exercício de um direito potestativo, que não reveste carácter ilícito.
XIX - Assumindo este entendimento – sufragado por Catarina Serra, in” Novo Regime Português de Insolvência, 4.º edição, Almedina, Coimbra – concluiu-se que os promitentes compradores que vêm a celebração do contrato recusada na pendência do processo de insolvência não beneficiam do direito de retenção sobre o objecto do contrato e apenas têm direito à restituição do sinal em singelo.
XX - Por outro lado, no que diz respeito ao conceito de consumidor, entendemos que o tribunal fez uma interpretação demasiado restritiva da qualidade de consumidor, tal como vem definida no n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 24/96 de 31/07, como a seguir se demonstrará.
XXI - A promitente compradora, ora Recorrida, é uma pessoa singular que alegadamente pretendia adquirir o imóvel para segunda habitação.
XXII - Isto posto, cremos que é importante analisar devidamente a aplicação da supra referida Lei, ao caso em apreço, segundo o acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça 4/2014, o qual, salvo o devido respeito por opinião por opinião contrária, teve como motivação proteger apenas a casa de morada de família do promitente comprador e não qualquer promitente comprador que seja pessoa singular!
XXIII - Caso contrário, correr-se-ia o risco da lei permitir serem protegidos particulares que adquirissem imóveis, para segunda habitação (potencialmente para posterior revenda, tendo em vista apenas o investimento) e dessa forma numa situação de insolvência do promitente vendedor, ficariam sempre garantidos pelo direito de retenção, apenas porque tinham comprado o imóvel para uso não profissional.
XXIV - Para se chegar a esta conclusão, é essencial atender à problemática da protecção de casa de “morada de família”, nomeadamente nos tempos mais recentes, e pelas respostas que têm sido dadas quanto ao direito à habitação, como um direito fundamental com consagração constitucional, justificado também à luz do princípio da dignidade humana.
XXV - Se analisarmos a legislação em conjunto com a jurisprudência recentemente proferida sobre esta matéria, verificamos que a preocupação é sempre proteger a casa de morada de família e não os particulares investidores ou meros particulares que comprem casa para segunda habitação.
XXVI - Ficou claramente demonstrado que a Recorrida não iria usar o apartamento para sua habitação própria e permanente e portanto, não é consumidor, para efeitos do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2014, pelo que deveria sempre o tribunal a quo ter aplicado nos presentes autos aquele Acórdão Uniformizador!
A parte contrária contra-alegou e concluiu nos seguintes termos:
1-O objeto do litígio insere-se no âmbito de uma ação de verificação ulterior de créditos, respeitante ao incumprimento de um contrato promessa.
2- Cumprindo verificar ou aferir se a presente ação foi tempestivamente intentada; se tal contrato promessa é nulo, por não observância da forma legalmente estipulada; se houve incumprimento de tal contrato promessa, nos termos invocados pela A.; se, por força de tal eventual incumprimento, esta terá direito à restituição do montante liquidado a título de sinal e despesas efetuadas; se assiste à A. o direito de retenção por si invocado.
3- Realizada a audiência de discussão e julgamento foram dados como provados os factos supra referidos nos pontos 1 a 29 dos “FACTOS PROVADOS”.
4- Os factos não provados foram os seguintes:
“a. À data aludida em 1., o imóvel aí referido estava concluído, b. bem como as áreas comuns do prédio a que a fracção está afecta no regime de propriedade horizontal.
c. Com a operação de mudança aludida em 18., a A. despenderá um montante não inferior a € 750,00.”
5- Como se alcança a matéria dada como não provada é de absoluta irrelevância para a decisão da causa.
6- O Tribunal a quo proferiu decisão que julgou a ação acima em referência parcialmente procedente, por provada e em consequência, julgou “reconhecido o crédito da Autora sobre a insolvente C…, S.A., no valor de € 47.349,20 (quarenta e sete mil trezentos e quarenta e nove euros e vinte cêntimos), por força do incumprimento do supra mencionado contrato promessa de compra e venda, a fim de ser graduado, como crédito garantido por direito de retenção relativamente ao imóvel aludido no 1. dos factos provados, no lugar que lhe competir..”.
7- A Credora / Reclamante, ora Apelante Banco …, S.A., não se conformando com a douta decisão veio interpor o presente recurso de apelação, pelo qual alega que a ação de verificação ulterior de créditos instaurada pela ora recorrida é manifestamente extemporânea;
8- A este propósito, a Apelante alega ainda que o Mº Juiz ao ter considerado que a ação é tempestiva, pelo facto de entender que o crédito da Recorrida só se constituiu no dia 29.12.2015, fê-lo sem qualquer sentido.
9- Fundamentando a Apelante a sua posição quanto a esta questão ao longo do ponto I. a XV. das suas conclusões, com as quais não se concorda, antes e pelo contrário se impugnam por falta de credível fundamentação.
10-A Apelante ainda alega que o crédito da Recorrida nunca poderia gozar de direito de retenção fundamentado a sua tese nos pontos XV a XIX das suas conclusões, tese não credível e incongruente, pelo que se impugna.
1-A Apelante nos pontos XX a XXVI veio invocar que a Recorrida não beneficia do conceito de consumidor, baseando-se em argumentação infundada, pelo que também se impugna.
12- Na verdade, a Recorrida anui integralmente à decisão proferida no âmbito desta ação pelo Tribunal “a quo”.
13-A Apelada entende que a decisão da matéria de facto nos presentes autos está devidamente fundamentada.
14- Nesta esteira, a mesma ainda alega que o Tribunal “a quo”, cumpriu o dever de fundamentação no que respeita à decisão proferida, descriminando os factos que considerou provados e quais os factos não provados, bem como as razões ou fundamentação de direito aplicável aos mesmos, tendo procedido a uma análise criteriosa das provas prestadas.
15- No mesmo sentido, o Tribunal “a quo” procedeu à “motivação”, seja, esclareceu como formou a sua convicção, designadamente com base, em primeiro lugar, na posição das partes vertidas nos seus articulados, depois nos documentos constantes dos autos, e, por último nos depoimentos prestados pelas testemunhas em sede de julgamento.
16- O Tribunal a quo, também procedeu de forma exemplar à fundamentação de direito;
17-À qual a Apelada anui integralmente, e o que levou a que o Tribunal a quo proferisse a douta sentença condenatória como proferiu, e com o que fez inteira e sã justiça.
II – Objecto do recurso
Considerando que:
. o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e,
. os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido,
as questões a decidir são as seguintes:
. se a reclamação é tempestiva;
. se a A. goza do direito de retenção sobre a quantia correspondente ao valor do sinal entregue, acrescida das obras e benfeitorias que efectuou na fracção prometida vender.

III - Fundamentação
Na 1ª instância foram considerados provados e não provados os seguintes factos:
A - FACTOS PROVADOS:
Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:
1. Por escrito datado do dia 28 de Setembro de 2012 denominado “Contrato de Promessa de Compra e Venda” (constante de fls. 17, verso, a 19, verso, e que aqui se dá por integralmente reproduzido), a C…, SA, prometeu vender à autora B… que, por sua vez, lhe prometeu comprar, a fracção autónoma designada pelas letras “BG”, do Bloco 3, entrada I, com a área de 113,50 m2, com garagem, designada por “G3.13” com a área de 18.40 m2 e arrecadação com identificação A3.22 com a área de 5.20 m2, correspondente ao nível 3 esquerdo, afecto ao regime de propriedade horizontal, sito na Rua Dr. Moreira Pinto, freguesia de Fão, concelho de Esposende, descrito na Conservatória do Registo Predial de Esposende sob o n.º xxx, da referida freguesia, com o alvará de obras de construção e edificação n.º xxx/2008, emitido pela Câmara Municipal de Esposende em 18.11.2008.
2. As partes outorgantes ou intervenientes no supracitado acordo convencionaram o preço de € 115.000,00 (cento e quinze mil euros) para o contrato de compra e venda prometido.
3. A autora B… entregou à C…, S.A., a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de € 35.000,00 (trinta e cinco mil euros), por cheque bancário sacado sob o Banco … com o n.º 6193695696, datado de 30.11.2012.
4. Mais ficou acordado que o pagamento da parte restante do preço fosse deferido para a data da celebração da escritura pública,
5. a qual deveria, nos termos da cláusula quarta do dito acordo, ser celebrada “em nome do Promitente Comprador ou pessoa por este a nomear no prazo de trintas dias contados da data de emissão da competente licença de utilização/habitabilidade da fracção objecto da presente promessa, competindo à Primeira Outorgante a sua marcação.”.
6. Na cláusula oitava do dito acordo, consta que “O presente contrato promessa de compra e venda fica expressamente subordinado à cláusula de execução específica no artigo 830º, do código civil.”.
7. E, na cláusula sétima, estatuiu-se que “O Segundo Outorgante toma, na presente data, posse efectiva da fracção autónoma identificada na cláusula primeira, podendo desde já utilizá-la para os fins a que se destina, nomeadamente habitando-a, realizar benfeitorias e contratar em seu nome fornecimentos de água, luz, telecomunicações e outros, sendo da sua inteira responsabilidade todos os custos a estes inerentes, bem como o pagamento dos impostos a que haja lugar, nomeadamente IMI.”.
8. Na cláusula nona vem estipulado que “Ambos os outorgantes prescindem mutuamente das formalidades exigidas pelo artigo 410º, n.º 3, do código civil, pelo que nenhum deles poderá vir a invocar a nulidade deste contrato pela omissão de tais requisitos.”.
9. A partir da data aludida em 1., autora recebeu as chaves do dito imóvel
10. e, sem oposição de quem quer que fosse, no mesmo substituiu as fechaduras no acesso privado às fracções,
11. executou obras de adaptação aos seus gostos e conforto pessoais, nomeadamente tendo substituído louças e torneiras e aplicado vidros nas duas casas de banho, efectuou reparações e alteração nos estores eléctricos, substituiu o isolamento cerâmico nas paredes da cozinha, adquiriu e aplicou cilindro de aquecimento de águas e pintou todo o apartamento, procedendo às respectivas limpezas de acabamento,
12. mobilou o espaço a seu gosto,
13. solicitou e acordou os fornecimentos de água, gás, luz e pacote de telecomunicações,
14. destinou aquele espaço para sua segunda habitação e gozo de férias e fins de semana, alturas em que ali fez as suas refeições e passou a dormir,
15. ali recebeu amigos e familiares, a quem chegou a ceder o gozo temporário do espaço,
16. e passou a guardar, na fracção de garagem, a sua viatura automóvel, servindo-se dela ainda para arrecadação e arrumos.
17. As obras acima aludidas em 10. a 12. tiveram o custo global de, pelo menos, € 12.349,20.
18. A A. terá de proceder à mudança de localização do mobiliário, utensílios e bens colocados no imóvel aludido em 1.
19. No dia 27/08/2013, a dita C…, SA, foi declarada insolvente,
20. tendo a sentença transitado em julgado no dia 17/09/2013.
21. Na dita sentença foi fixado o prazo de 30 dias para os credores, querendo, reclamarem os seus créditos.
22. No decurso do Processo Especial de Revitalização que constitui o apenso A do processo principal de insolvência, ainda durante o ano de 2013, o Sr. Administrador da Insolvência teve conhecimento do dito acordo escrito.
23. Por carta datada de 23 de Dezembro de 2015, dirigida ao Sr. Administrador da Insolvência, cujo teor, constante de fls. 20, verso, e 21, aqui se dá por integralmente reproduzido, a aqui A. questionou-o sobre se a iria notificar para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 102º do CIRE, fixando-lhe o prazo de cinco dias para que se pronunciasse de forma escrita e a enviar para a residência da autora.
24. Em resposta à missiva aludida em 23., o Sr. Administrador da Insolvência remeteu à A. uma carta, datada de 29 de Dezembro de 2015, cujo teor, constante de fls. 28 e 29, aqui se dá por integralmente reproduzida, dando conhecimento à A. da posição do credor Banco …, SA, quanto ao eventual cumprimento do disposto no artigo 102º, n.º 1, do CIRE e referindo que do teor da sentença de graduação de créditos resulta a impossibilidade de cumprimento do dito contrato promessa pela massa insolvente.
25. Antes da data aludida em 24., o Sr. Administrador da Insolvência nunca havia comunicado à aqui A. se era sua intenção executar o contrato promessa acima referido ou recusar o seu cumprimento.
26. A presente acção deu entrada em tribunal no dia 18 de Fevereiro de 2016.
27. Na diligência de tentativa de conciliação realizada em 17 de Junho de 2014, no âmbito do incidente de reclamação de créditos que segue os seus termos pelo apenso D, foi proferido o seguinte despacho: “Quanto a B…, trata-se também de credora que não figura entre os credores reconhecidos ou não reconhecidos, e, como confirmado pelo Sr. AI nesta diligência, a mesma não reclamou a verificação de qualquer crédito. Como tal, inexiste objeto a apreciar no que respeita a eventual crédito titulado por B…”.
28. Por escritura pública de compra e venda, outorgada em 31 de Dezembro de 2015, no Cartório Notarial da Dr.ªxxx, o imóvel aludido em 1. foi adjudicado à credora reclamante Banco…, SA, pelo preço de € 110.000,00.
29. À data aludida em 1., a C…, SA, era uma sociedade comercial anónima que, com carácter profissional e visando a obtenção de benefícios, tinha por objecto, além do mais, a construção e compra de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim.

B) Factos não provados:
Discutida a causa, não resultaram provados os seguintes factos:
a. À data aludida em 1., o imóvel aí referido estava concluído,
b. bem como as áreas comuns do prédio a que a fracção está afecta no regime de propriedade horizontal.
c. Com a operação de mudança aludida em 18., a A. despenderá um montante não inferior a € 750,00.

Da alegada extemporaneidade da reclamação
Veio o apelante pugnar pela extemporaneidade da acção de verificação ulterior de créditos instaurada pela Autora, ora apelada.
No entendimento do apelante, tendo a sentença que declarou a insolvência da promitente vendedora transitado em julgado em 17/09/2013, o prazo para dar entrada de uma acção de verificação ulterior de créditos terminou em 17/03/2014 (artº 146º, nº 2, alínea b) – 1ª parte do CIRE, diploma a que pertencem todos os preceitos que venham a ser citados sem indicação da fonte), sendo que a recorrida só a veio instaurar em 18.02.2016.
Mais defende que a carta remetida pelo Administrador da insolvência (doravante designado por AI) não configurou qualquer comunicação nos termos do artº 102º, mas apenas uma resposta à missiva que a recorrida lhe enviou no dia 23.12.2015. E o AI não estava obrigado a transmitir à apelada que não pretendia cumprir o contrato. O facto do AI não ter graduado (quereria certamente dizer reconhecido)o crédito da apelada, tal configura uma manifestação de recusa de cumprimento do contrato promessa.A lei não exige a comunicação da recusa do administrado da insolvência em cumprir o contrato para que o crédito da apelada nasça.
O Mmo Juiz a quo entendeu que após a declaração de insolvência o cumprimento do contrato promessa ficou suspenso até à data em que o AI informou a ora apelada que não pretendia cumprir o contrato promessa, pelo que o direito de crédito desta só se constituiu quando recebeu a carta do Administrador da Insolvência a recusar o cumprimento. E assim,a ação, interposta dentro do prazo de três meses subsequente à constituição, era tempestiva nos termos do artº 146º, nº 2, al. b) do CPC.
Será assim?

Dúvidas não há que entre a ora insolvente e a ora apelada foi celebrado um contrato-promessa tendo por objecto a fracção BG do prédio sitona Rua Dr. Moreira Pinto, freguesia de Fão, concelho de Esposende. A apelada, promitente compradora, não pagou a totalidade do preço, mas ocorreu a tradição do imóvel, tendo a apelada entregue à insolvente, a título de sinal, a quantia de euros 35.000,00.

De acordo com o disposto noart. 102º, nº 1, sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes, em qualquer contrato bilateral em que, à data da declaração de insolvência, não haja ainda total cumprimento nem pelo insolvente nem pela outra parte, o cumprimento fica suspenso até que o administrador da insolvência declare optar pela execução ou recusar o cumprimento.Trata-se de uma suspensão transitória, que tem como função conceder ao administrador da insolvência o período de tempo necessário à ponderação da conveniência do cumprimento do contrato para os interesses da massa. A opção pelo cumprimento ou pela recusa, concedida ao administrador não é uma opção livre, mas sim norteada pelos interesses da massa.A escolha do administrador da insolvência encontra-se ainda limitada pelo disposto no n.º 4 do artigo 102º, que dispõe que “a opção pela execução é abusiva se o cumprimento pontual das obrigações contratuais por parte da massa insolvente for manifestamente improvável.”

A lei faculta ao administrador da insolvência a possibilidade de escolha, o que bem se compreende. A declaração de insolvência é uma manifestação da impossibilidade geral de cumprimento das suas obrigações, pelo que só muito dificilmente poderiam ser cumpridos todos os contratos. Por outro lado, se o insolvente cumprisse todos os negócios em curso, tal traduzir-se-ia no pagamento privilegiado de todos esses credores. Assim, o administrador decidirá sobre o cumprimento dos contratos, cumprindo-os se tal for conveniente para os interesses da massa, procurando-se deste modo conciliar estes interesses com o princípio do tratamento igualitário de todos os credores.

Se o administrador decidir pelo cumprimento, qualquer das partes pode exigir o cumprimento das prestações ainda não cumpridas; o crédito da contraparte constitui crédito sobre a massa nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 51º.O período em que o contrato esteve suspenso, não confere qualquer indemnização à contraparte.

A faculdade de optar que é conferida ao AI constitui um direito potestativo (e não numa simples actuação ad libitum) do administrador, orientado pelo vector exclusivo do interesse da massa insolvente (e, em consequência, do interesse dos credores). Esta regra vale integralmente para o caso de se estar perante contrato-promessa com natureza meramente obrigacional, como é o caso, o que é confirmado pelo teor do art. 106º(cfr. se defende no AC do TRG de 14.12.2010 proc 6132/08).

No caso em análise, só por carta de Dezembro de 2015 é que o AI, na sequência da interpelação da apelada, veio informar que não ia cumprir o contrato. Esta carta constituiu a resposta à carta da apelada, de 23.12.2015, em que o questionava sobre se a iria notificar nos termos do nº 1 do artº 102º, e na qual lhe concedia o prazo de cinco dias para que se pronunciasse de forma escrita.

Entende o apelante que a apelada há muito que conhecia que não tinha sido reconhecido qualquer crédito garantido por direito de retenção sobre a fracção BG porque a sociedade D…, Lda, da qual a A. é sócia-gerente, impugnou a lista definitiva de créditos e em 12.10.2015 e foi notificada da sentença de verificação e graduação de créditos.

É certo que o Administrador da insolvência não está obrigado a transmitir a sua posição. A fixação de um prazo nos termos do nº 2 do artº 102º do CPC depende da iniciativa do outro contraente e a apelada optou por nada fazer até 23.12.2015, nem o interpelando, nem reclamando o seu crédito no prazo em que os demais credores o fizeram, só o vindo a fazer posteriormente, mediante a instauração da acção de verificação ulterior de créditos, instaurada em 18.02.2016.

Mas o facto do Administrador da insolvência não ter reconhecido o crédito da apelada,não pode ser interpretado como constituindo uma recusa tácita de cumprimento, como defende o apelante. Ainda que a apelada tenha tido conhecimento da lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos do AI (dos factos provados não consta que a A. seja sócia gerente da D…, mas ainda que o seja), não se poderia concluir nesse sentido. Pelo contrário, se o crédito constasse, é que faria presumir que o AI não pretenderia cumprir o contrato.

O apelante alega que foi numa fase embrionária do processo que o AI entendeu não ser de cumprir o contrato, mas se o entendeu, não o deu a conhecer nem praticou qualquer facto de onde se pudesse concluir nesse sentido.

Considera ainda o apelante que ao ter sido entregue ao AI uma cópia do contrato promessa no início do processo, tal corresponde a uma interpelação para cumprir. Só que não se apurou se foi a apeladaquem entregou ao AI essa cópia e com que fim. Apurou-se apenas que no decurso do processo de insolvência, ainda durante o ano de 2013, o AI teve conhecimento do contrato-promessa.

Efectivamente, tal como se já referiu e é também o entendimento do apelante, é à contraparte que incumbe fixar um prazo razoável ao AI para este exercer a sua opção, mas a lei não estabelece uma data limite para o efeito, pelo que assistia à apelada o direito de interpelar o AI para a esclarecer e fixar-lhe um prazo, como fixou.

Ora, não tendo ocorrido factos de onde se possa concluir que o AI se iria recusar a cumprir o contrato promessa, essa recusa apenas é manifestada na carta de 29 de Dezembro de 2015.

Não é pacífico se o direito do credor se constitui no momento da declaração da insolvência ou se se constitui apenas no momento em que o administrador da insolvência manifesta a recusa de cumprir.

Não se desconhece posição doutrinária no primeiro sentido. Nuno Manuel Pinto de Oliveira (Efeitos da declaração de insolvência sobre os negócios em curso: em busca dos princípios perdidos, I Congresso de Direito da Insolvência coordenado por Catarina Cerra, Almedina, Coimbra, 2013, pp. 201 e ss) defende que o direito indemnização do promitente-comprador “parece resultar da declaração de insolvência, parece constituir-se exlege, parece não ser uma “dívida [resultante] da actuação do administrador da insolvência no exercício das suas funções”; - por isso é (só) uma dívida da insolvência [art. 102.º, n.º 3, als. c) e d), do CIRE]”, ao contrário do direito ao cumprimento que, esse sim, resultaria da declaração do administrador, sendo, por conseguinte, uma dívida da massa, pelo que a declaração do administrador pelo não cumprimento não teria valor constitutivo (cfr. se refere no Ac. do STJ de 21.06.2016, proferido no processo 3415/14). Neste acórdão, de onde foi retirado o extracto transcrito, parece resultar do sumário do mesmo que se defende que o direito à indemnização resultará da declaração da insolvência. No entanto, analisado o texto do acórdão, tal opção não resulta manifesta, afigurando-se-nos antes que se pretendeu dar a conhecer os entendimentos possíveis, mais do que tomar posição, até porque o objecto do recurso não o exigia.

Ora, considerando que o cumprimento do contrato se suspende nos termos do artº 102º do CIRE até que o administrador tome uma posição, quer por sua iniciativa quer na sequência de interpelação da contraparte, afigura-se-nos, com o devido respeito por posição contrária, que o direito à indemnização se constitui quando a contraparte conhece a posição do administrador no sentido do incumprimento.

A acção é pois tempestiva.

Não emerge dos factos provados que a apelada tenha actuado com má fé.

Do direito de retenção

Na acção que instaurou a apelada pede o reconhecimento do seguinte crédito;
.35.000,00 relativo ao sinal que entregou à insolvente correspondendo à data da instauração da acção a 35.081,40;
.12.349,20 relativo às obras que efectuou na fracção;
.750,00 que irá despender com a mudança e o dar destino ao recheio da casa,
num total de 48.180,60.
Na sentença recorrida reconheceu-se à recorrente um crédito de 47.349,20, correspondente ao montante do sinal entregue e das obras efectuadas na fracção.
Entende o apelante que a apelada não beneficia do direito de retenção para garantia do pagamento desta importância, tendo apenas direito à restituição do sinal entregue em singelo. Acresce que, também em seu entender, o acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça de 20.03.2014, publicado no DR nº 95 de, I série A, de 19.05.2014, pretendeu apenas proteger a residência permanente do consumidor e não também, como no caso, quando a coisa prometida vender se destina a 2ª habitação do promitente comprador.
Ora, lido o AUJ, em momento algum, transparece do mesmo a restrição reclamada pelo apelante. É referido que a opção do legislador do artº 755º nº1 al f) do CC foi proteger a parte mais fraca, o consumidor, mas nunca se refere que subjacente à norma está apenas a protecção da habitação permanente do comprador. Efectua-se uma interpretação restritiva do termo beneficiário empregue na alínea f), do nº 1 do artº 755º do CC, restringindo-o aos casos de beneficiário consumidor, “por ter sido a protecção dos promitentes compradores que sejam consumidores que motivou o legislador a introduzir aquele direito, tal como se pode ver do relatório do Decreto-Lei nº 379/86 de 11/11, nomeadamente no seu ponto 4 onde consta “Neste conflito de interesses, afigura-se razoável atribuir a prioridade à tutela dos particulares. Vem na lógica da defesa do consumidor”.

Este entendimento já tinha sido sufragado por L. Miguel Pestana de Vasconcelos“Cadernos de Direito Privado”, nº33 – Janeiro/Março de 2011 – “Direito de Retenção, contrato-promessa e insolvência” que, a pág. 20 escreveu:

“ […] O direito de retenção só tutela o promitente-adquirente quando este for um consumidor (…).

O art. 755.°, n.°1, alínea f), é uma norma material de protecção do consumidor e deve ser interpretada restritivamente para o beneficiar somente a ele.

Quando a contraparte do promitente-vendedor não o seja, a ratio da protecção excepcional que a lei concede ao promitente-comprador não se verifica”.

E mais adiante – págs.25/26:

“É, pois, a teleologia da lei, centrada na tutela do consumidor (e das próprias valorações constitucionais, uma vez que a tutela do consumidor tem aí guarida, art. 60.°, n.° 1, da CRP (…) que nos permite detectar a existência da lacuna e conduz, em seguida, ao seu preenchimento com a atribuição dessa garantia ao promitente-adquirente, nos termos do art. 755.°, n.°1, alínea f) (sinal e tradição), face à recusa de cumprimento pelo administrador.

Recorremos aqui a uma extensão, por maioria de razão, da opção valorativa claramente expressa na lei: permite detectar e preencher, de seguida, a lacuna.

Por outras palavras: a ratio da lei é a tutela, na promessa sinalizada com tradição da coisa, da posição do promitente-adquirente (na nossa perspectiva, só quando ele seja um consumidor), ou seja, do seu crédito à restituição do sinal em dobro ou (verificados os seus pressupostos) à indemnização pelo aumento do valor da coisa, através de uma garantia, pelas razões apontadas particularmente robusta.

Essa carência de protecção, essa necessidade da tutela do promitente-adquirente/consumidor que a norma visa conceder, não existe só no caso de incumprimento imputável ao promitente-alienante, mas verifica-se igualmente, ou melhor, verifica-se principalmente, na insolvência, face ao caso de recusa (lícita) de cumprimento pelo administrador (a quem a lei atribui o poder de decidir o destino do contrato).

Dessa forma, podemos afirmar que aí procedem, por maioria de razão, “as razões justificativas de regulamentação do caso previsto na lei” (art. 10. °, n. ° 2), conclusão que é amparada também pela análise do regime insolvencial, acima realizada, de insolvência do promitente-adquirente” (apudAc. do STJ de 14.06.2011, proferido no proc.6132/08).

O apelante insurge-se também contra a atribuição da protecção adveniente do direito de retenção aos particulares investidores, mas os factos não permitem concluir que a apelada pretendeu destinar a fracção prometida vender a investimento. Pelo contrário, apurou-se no ponto 14. que a apelada destinou a fracção à sua segunda habitação e gozo de férias e fins de semana. Ainda que tal não se tivesse apurado, não é pelo facto da apelada viver em Amarante e a fracção se situar em Esposende, como refere o apelante, que se pode concluir que a fracção se destinaria a investimento, como defende o apelante.Os 60 kms que o apelante alega separar as duas localidades não se nos afiguram ser de modo a obstaculizar a fruição da fraçãonos momentos de lazer. Com as vias de transporte disponíveis actualmente o percurso de 60 kms é rápido. A escolha de uma 2ª habitação a apenas 60 kms, até reforça a ideia de que se pretendeu conferir-lhe uma frequente utilização.

Goza consequentemente a apelada do direito de retenção sobre a fracção BG.
E qual é o montante garantido?

Os efeitos da recusa do cumprimento pelo administrador da insolvência encontram-se regulados no n.º 2 do artigo 106º, o qual manda seguir, com as necessárias adaptações, o regime do n.º 5 do artigo 104º - do que resulta ser aplicável o n.º 3 do artigo 102º-, salvo quanto ao direito previsto na sua alínea c). Assim, o promitente-comprador, perante a recusa de cumprimento, apenas tem direito à indemnização pela diferença, se esta, calculada nos termos do n.º 5 do artigo 104º forpositiva,sem prejuízo de poder exigir uma indemnização em montante superior, fazendo prova dos danos sofridos, nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 102º . Prevê o legislador um regime que se nos afigura algo complexo e pouco claro.

O apelante alega que não assiste à apelada o direito à devolução do sinal em dobro, mas apenas em singelo, mas a apelada não o requereu, pelo que não há que discutir se o artº 106ºdeve ser interpretado restritivamente, aplicando-se apenas no casos em que não houve entrega de sinal, vigorando no caso de sinal, o nº 2 do artº 442º do CC.

Por força das regras do artº 106º, 104º, nº 5 e 102º, nº 3, alíneas d), assiste à A. o crédito reconhecido na sentença recorrida.

IV – Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em julgar improcedente a apelação e em confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo apelante.

Guimarães, 30 de Março de 2017