Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1510/18.9T8VRL.G1
Relator: ESPINHEIRA BALTAR
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL –MANDATO FORENSE
SIGILO PROFISSIONAL
DEPOIMENTO DE PARTE
ABUSO DE DIREITO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/28/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1. o sigilo profissional do advogado não deve obstar ao exercício do seu direito ao contraditório, dos seus direitos de defesa, quando é réu numa ação em que o seu cliente é autor. O facto de não levantar o sigilo profissional, não pode ser prejudicado por isso, como se depreende dos acórdãos do STJ de 27/02/2008 (Rodrigues dos Santos)) e de 2/02/1995 (Sousa Guedes), publicados em www.dgsi.pt., sendo o tribunal autónomo na ponderação do depoimento.
Decisão Texto Integral:
Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães (1)

M. M.
intentou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra:
1ª – M. J.,
2º - F. M.,
3ª – X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal em Espanha,
4ª – Y INSURANCE COMPANY (Europe), LDA.
formulando a seguinte pretensão:
a) Serem todos os Réus solidariamente condenados a pagar ao Autor os prejuízos patrimoniais pelo mesmo sofridos em consequência da descrita conduta dos 1.ª e 2.º Réus, os quais, na data de 23-07-2018, ascendem ao valor de € 249 553,64 (€ 229 901,76 capital+ € 19.651,88 juros, calculados desde 03-06-2016 até 23-07-2018);
b) Serem, ainda, todos os Réus condenados nos juros vincendos, calculados à taxa legal em vigor, sobre a importância em dívida, desde a data de 23-07-2018 até efetivo e integral pagamento;
c) serem, por último, todos os Réus condenados nas custas e encargos do processo e no mais de lei.

Como fundamentos, o autor alegou, em síntese:
- que o autor, por discordar do despedimento de que foi alvo, contratou a ré M. J., advogada, à qual outorgou procuração para intentar e o representar no processo de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, contra a sua entidade empregadora;
- que em virtude de tencionar pedir a suspensão da sua inscrição como advogada, a ré M. J. lhe sugeriu o réu F. M., também advogado, para dar continuidade à sua defesa, a favor do qual emitiu substabelecimento sem reserva, após aceitação do autor;
- que quer um quer outro dos dois advogados violaram as obrigações inerentes à relação contratual de mandato forense estabelecida com o autor, quer por ação quer por omissão, na prática dos atos necessários à defesa do mesmo, nomeadamente, porque não peticionaram para o autor todos os créditos laborais a que tinha direito em virtude da ilicitude do despedimento, não tendo, concretamente, peticionado as retribuições vincendas desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença, ou seja, os salários intercalares;
- que tal falha constitui uma violação da relação de mandato celebrado entre o autor e os réus, uma vez que a primeira ré incumpriu o dever de formular tal pedido e o segundo réu também não apresentou alteração/aditamento ao pedido, o que deveria ter feito, uma vez que assumiu o mandato ainda antes do início da audiência de discussão e julgamento;
- que ao não peticionarem o referido crédito laboral, os réus violaram as leges artis, incumprindo os deveres deontológicos e violando a atuação objetiva de cuidado que lhes era exigível;
- que com a descrita atuação, os réus causaram danos ao autor, que quantifica, por cujo ressarcimento são responsáveis os referidos réus, bem como as duas Seguradoras demandadas, por via dos contratos de seguro que celebraram com a Ordem dos Advogados de Portugal.
Regularmente citados, cada um dos réus contestou a ação.
A ré M. J. começa por invocar exceção perentória, alegando que a sua hipotética responsabilidade cessou com a possibilidade de o segundo réu ultrapassar a sua alegada falha. No mais, impugna a factualidade tal como foi alegada pelo autor, alegando, por sua vez, que o autor se apresentou sempre como alguém perfeitamente esclarecido, tendo solicitado cópia do articulado da contestação/reconvenção, que lhe entregou, tendo sido o autor que não quis que fossem reclamados os créditos relativos aos ordenados que se vencessem na pendência da ação, o que disse expressamente à ré M. J., referindo que já tinha projetos e não queria que fosse vasculhada a sua vida e rendimentos.
Alega a ré, ainda, que o autor se mostrou muito agradecido e feliz com o resultado do processo, quando tomou conhecimento da decisão do STJ.
Concluiu pela improcedência da ação, para além de pedir a condenação do autor como litigante de má fé, em multa e indemnização a seu favor.

O réu F. M., por sua vez, para além de se defender por exceção, arguindo a ineptidão da petição inicial por falta de causa de pedir e por contradição entre o pedido e o alegado na petição inicial, a ilegitimidade passiva e o abuso de direito sob várias formas, impugna também a factualidade tal como foi alegada pelo autor, invocando que o autor participava ativamente na estratégia processual, agradeceu o desfecho da lide que considerou um êxito, sempre manifestou agrado pelo trabalho do réu, para além de que o autor, sempre exerceu uma atividade profissional lucrativa na pendência da ação, nomeadamente explorando uma agência de seguros, nunca tendo requerido subsídio de desemprego.
Conclui pela procedência das exceções arguidas, pela condenação do autor como litigante de má fé, em multa e indemnização, e pela improcedência da ação.

A ré X Insurance Company SE, Sucursal em Espanha, no essencial, invocou a sua ilegitimidade quanto ao pedido formulado contra a primeira ré, alegando que a ré M. J., nunca foi segurada no contrato de seguro que a ré contestante celebrou com a Ordem dos Advogados. Quanto ao réu F. M., invoca a exclusão, por este réu, alegadamente, ter conhecimento, à data da celebração e vigência do contrato, dos factos que lhe são imputados e de que o autor tinha intenção de o responsabilizar, e nada comunicou à ré contestante, o que constitui causa de exclusão da cobertura. Invoca, ainda, que não foram alegados pelo autor, todos os pressupostos da responsabilidade civil e que a indemnização sempre seria limitada à “perda de chance”.

Finalmente, a ré Y Insurance Company (Europe), Ltd., veio arguir a exceção perentória de inexistência de contrato de seguro, a limitação da responsabilidade e, ainda, a irresponsabilidade dos réus advogados, por falta de verificação dos pressupostos da irresponsabilidade dos réus advogados, por falta de verificação dos pressupostos da responsabilidade civil, para além de alegar que o pedido de condenação solidária dos réus se funda em causas de pedir incompatíveis e que o autor não prova a verificação de danos.

O réu F. M. respondeu à contestação da ré X Insurance, quanto à invocada exclusão da cobertura, alegando que é a data da reclamação que conta para verificação da vigência do contrato e que comunicou a situação, logo que teve conhecimento.

O autor, por sua vez, respondeu às exceções e pedidos de condenação por litigância de má fé, concluindo pela respetiva improcedência e formulou pedido de litigância de má fé dos réus Dra. M. J. e Dr. F. M.

Realizada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, no qual se julgaram improcedentes as exceções de ineptidão da petição inicial e de ilegitimidade passiva, tendo também sido julgada improcedente a exceção de exclusão de cobertura da apólice, e remetida para e decisão final, a apreciação da restante matéria excecional invocada.

Foi fixado o objeto do litígio e os temas de prova.

Realizou-se o julgamento, com observância das formalidades legais.

Foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
“Por tudo quanto exposto fica, julgo a presente ação totalmente improcedente, pelo que absolvo os réus dos pedidos.
Condeno o autor como litigante de má fé em multa que fixo em 5 (cinco) UC, bem como em indemnização aos réus, sendo à ré M. J., no valor de € 7 500,00(sete mil e quinhentos euros), e ao réu F. M., no valor de € 15 000,00 (quinze mil

Inconformado com o decidido, o autor interpôs recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:

“A - Vem o presente recurso interposto da sentença final que julgou
improcedente a acção intentada por M. M. e o condenou, além do mais, como litigante de má-fé, em multa e indemnizações aos Réus, abrangendo o recurso a matéria de facto (reapreciação da prova gravada) e de direito.
B – A acção devia ter sido julgada procedente ao contrário do decidido pela sentença recorrida, que não interpretou e não aplicou correctamente os preceitos legais aplicáveis quer relativamente à matéria de facto quer à matéria de direito.
C – Pelas razões expostas nos números 6 a 6.65 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, devem ser dados como não provados os factos constantes dos itens 141, 142, 143, 144, 145, 146, 147, 148, 149, 150, 151, 152, 153, e 154 dos FP, que a sentença recorrida considerou provados.
D – Pelas razões expostas nos números 7 a 7.10 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, devem ser dados como não provados os factos constantes dos itens 84 (no segmento “porquanto foi o último dia de inscrição em vigor na AO por parte da Ré M. J.”), 85, 86, 87 e 88 dos FP, que a sentença recorrida considerou provados.
E - Pelas razões expostas nos números 8 a 8.16 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, devem ser dados como não provados os factos constantes dos itens 56, 58, 81, 82, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 97, 98 e 99 dos FP, que a sentença recorrida considerou provados.
F - Pelas razões expostas nos números 9 a 9.12 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, devem ser dados como não provados os factos constantes dos itens 66 e 70 dos FP, que a sentença recorrida considerou provados.
G - Pelas razões expostas nos números 10 a 10.08 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, devem ser dados como não provados os factos constantes dos itens 55, 57, 67, 68, 69, 83 e 98 dos FP, que a sentença recorrida considerou provados.
H - Pelas razões expostas nos números 11 a 11.08 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, os itens 103, 104, 105, 106, 110 e 111 dos FP, que foram dados como provados na sentença recorrida, devem em matéria de prova ser considerados da seguinte forma:
- seja dado como não provado o seguinte segmento do item 103: “formando uma sociedade para o efeito”;
- seja dado como não provada a matéria do item 104;
- seja dado como não provado o seguinte segmento do item 105: “sendo que o Autor, apesar de ser sócio de pleno direito, não figurava o seu nome na sociedade, o que foi feito a pedido do Autor, porque iria impugnar o despedimento da W”;
- que a matéria do item 106 seja considerada apenas provada com os seguintes dizeres: “O sócio da K, J. T., e o Autor, este após a sua saída da W, e nomeadamente após ter adquirido a quota ao Manuel, receberam rendimentos até à venda das quotas da sociedade no ano 2018.”
- seja dado como não provado o seguinte segmento do item 110: “mas cujo valor era muito superior.”;
- seja dado como não provado o seguinte segmento do item 111: “no entanto, o valor da venda foi muito superior.”.
I - Pelas razões expostas nos números 13 a 13.6 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, devem ser dados como provados os factos constantes dos itens f, g, h, i, k, l, m, o, p e q, que a sentença recorrida considerou não provados.
J - Pelas razões expostas nos números 14 a 14.2 supra, incluindo a remissão feita para as razões expendidas nos números 6.52 a 6.63 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, devem ser dados como provados os factos constantes dos itens f, g, h, i, k, l, m, o, p e q dos FNP, que a sentença recorrida considerou não provados.
K - Pelas razões expostas nos números 15 a 15.3 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, devem ser dados como provados os factos constantes dos itens a, b, d, j e r dos FNP, que a sentença recorrida considerou não provados.
L - Pelas razões expostas nos números 16 a 16.14 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, deve o item 109 dos FP ser alterado e ficar a conter a seguinte matéria dada como provada:
- - Depois do seu despedimento, o Autor, trabalhando por conta própria, como trabalhador independente, mas em ligação com K, auferiu, a título de comissões pela actividade de mediador de seguros, actividade já antes por ele exercida enquanto trabalhador subordinado ao serviço da W, as importâncias a seguir referidas e como tal declaradas em sede de IRS:
ANOS Valores recebidos e declarados em sede de IRS por trabalho independente, conforme os respectivos documentos juntos aos autos.
2010 €1.120,43 – (neste ano o A. Recebeu da sua ex entidade patronal, W, a quantia de €7.177,89, que se encontrava em debito pela cessação do contrato de trabalho)
2011 €7.000,00
2012 €3.000,00
2013 €5.400,00
2014 €7.500,00
2015 €8.400,00
M - Pelas razões expostas nos números 17 a 17.4 supra - que aqui se dão, por brevidade e na íntegra, como integralmente reproduzidas -, deve ser dado como provado o seguinte facto e, como tal, acrescentado à matéria dada como provada (FP):
- O Autor, antes e durante o julgamento da 1.ª Instância, foi alertado por um seu colega de Coimbra, que intentara contra a mesma entidade patronal idêntica acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, para o direito que lhe assistia de pedir as retribuições salariais vincendas, ou seja, aquelas que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença.
N - Não obstante o acerto de não ter sido considerada provada a matéria dos itens dd, ee e ff (que aqui se dá por integralmente reproduzida) dos factos não provados (NP), a verdade é que esta matéria está em franca contradição com a matéria dos itens 142 e 143 (que igualmente se dá por integralmente reproduzida) dos factos provados (FP), contradição que é reveladora não só da insuficiente ponderação na apreciação da prova mas também do desacerto de ter sido considerada provada esta última matéria.
O - Não obstante o acerto de não ter sido considerada provada a matéria do item kk (que aqui se dá por integralmente reproduzida) dos factos não provados (NP), a verdade é que esta matéria está em franca contradição com a matéria dos itens 67, 68, 69 e 98 (que igualmente se dá por integralmente reproduzida) dos factos provados (FP), contradição que é reveladora não só da insuficiente ponderação na apreciação da prova mas também do desacerto de ter sido considerada provada esta última matéria.
P - Não obstante o acerto de não ter sido considerada provada a matéria do item qq (que aqui se dá por integralmente reproduzida), a verdade é que esta matéria está em franca contradição com a matéria do item 87 e também em contradição parcial com a matéria do item 86 (cujas matérias se dão igualmente por integralmente reproduzidas), ambos dos factos provados (FP), sendo certo que esta contradição parcial diz respeito ao segmento do item 86 que se inicia com a frase “mas não corresponde”.
Também aqui as contradições apontadas revelam não só a insuficiente ponderação na apreciação da prova mas também o desacerto de ser considerada provada a referida matéria dos itens 86 e 87 dos FP.
Q – Ainda em sede de matéria de facto – lamenta-se sinceramente ter de o dizer –, a sentença recorrida, em sede de fundamentação, viola objectivamente o princípio da imparcialidade e, consequentemente, o princípio da igualdade, sendo certo que o princípio da igualdade das partes no pleito é um princípio fundamental do ordenamento jurídico-processual, que assume particular relevo em sede da aplicação da lei pelos tribunais (vd. os arts. 13º e 20º da CRP, bem como o art. 4º do CPC actual, e, ainda, J.J. Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa, Anotada, Coimbra Editora, 1978, comentário ao art. 13º, p. 68-69).
R – Sintetizando as razões adrede expendidas nos n.ºs 19 a 19.10 supra, salienta-se que apesar da falta de credibilidade e das manifestas faltas de verdade produzidas pelos Réus, como atrás se crê ter demonstrado, a Mma. Juiz não só não valorou negativamente, como devia, aquelas atitudes como aceitou de forma indiscutível e indiscutida os depoimentos/declarações daqueles Réus, por mais absurdos e contrários que foram à deontologia profissional, ao senso comum e às regras da experiência, nomeadamente do exercício da advocacia.
E foi ao ponto de considerar credíveis as versões da 1ª e do 2º Réus, considerando que depuseram de forma clara ao contrário do Autor, e descredibilizando injusta e sistematicamente quer o depoimento/declarações do próprio Autor como os depoimentos das testemunhas favoráveis à posição do Autor deste.
S – Esclarecedor do que se deixa afirmado é a circunstância da Mmª Juiz para fundamentar aquela descredibilização se ter socorrido a argumentos respeitantes a factos de somenos, falhos de verdade provada e totalmente irrelevantes para a decisão do pleito [é o caso, entre outros: referir a primeira audiência de julgamento como aquela em que efetivamente se iniciou e não como a primeira das duas anteriores em que o julgamento foi adiado sem se ter iniciado; o momento em que e como o Autor tomou conhecimento da omissão dos Réus em pedir as prestações vincendas; a altura dos contactos que o Autor teve com o 2.º Réu; a altura em que o Autor confrontou este com a referida omissão; o facto secundaríssimo de o Autor se ter referido ao despacho saneador como o meio pelo qual tomou conhecimento daquela omissão, como se tivesse a obrigação de saber distinguir as peças processuais; o absurdo de atribuir ao Autor conhecimentos técnico – jurídicos que o habilitassem a instruir e a impor a sua versão aos seus advogados, conhecimentos esses fortalecidos com o absurdo e fantasmagórico relacionamento do Autor com imaginários juízes e advogados especialistas de direito laboral, sem que tivesse havido o mínimo apuramento desse conhecimento e suas fontes; o facto do Autor não ter dado justificação considerada plausível para intentar a presente acção dois anos depois do trânsito em julgado da sentença condenatória proferida no tribunal do trabalho, como se lhe fosse exigível explicação para ter utilizado apenas 10% do tempo para propor a acção (o prazo de prescrição da responsabilidade contratual é de 20 anos), produzindo a Mm.ª Juiz, talvez sem o pretender, uma crítica implícita à estipulação daquele prazo prescricional; a imaginada falta de coincidência daquelas testemunhas no que se refere a terem ouvido o Autor chamar a atenção do 2.º Réu para a omissão do pedido das prestações vincendas e de este ter afirmado que “estavam sempre a tempo de pedir”; a questão de “lana caprina” do contentamento do Autor com o resultado das decisões dos tribunais superiores; o encenado dramatismo do choque sofrido pelo 2.º Réu com a notícia da propositura da presente acção].
T – Sendo a advocacia uma profissão que lida habitualmente com assuntos de alto risco de produção de danos, além de complexos a demandar o estudo do vastíssimo ordenamento jurídico e saberes conexos, a que se soma a preocupante premência dos prazos e a habitual urgência dos clientes, compreende-se a frequência (como profusamente se indica em 20.18 e 20.19 supra) em que é debatida
nos tribunais a responsabilidade civil contratual resultante de alegado incumprimento ou cumprimento defeituoso do mandado forense, tantas vezes derivado de omissões ou lapsos involuntários.
Por isso, se afigura excessiva e, como tal, injustificável a afirmação produzida na sentença pela Mm.ª Juiz de que a presente acção é altamente atentatória da honra e dignidade profissional do 2º Réu!
Posto isto,
U- O Autor, ora recorrente, esteve vinculado por contrato de trabalho por tempo indeterminado ao serviço da W – Companhia de Seguros, S.A. para exercer, como exerceu, as funções correspondentes à categoria profissional de chefe de serviços, nível XIV, desde 01-01-1986 até 04-01-2010, data em que foi despedido. (itens 1 e 8 dos FP).
V – Por discordar do despedimento de que foi alvo, o Autor interpôs contra a W processo especial de acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, o qual sob o n.º 44/10.4TTVRL correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real para defesa dos seus direitos e interesses resultantes do seu despedimento. (ibidem, item 4).
X – Para o patrocinar nessa acção, o Autor celebrou contrato de mandato forense com a 1ª Ré M. J., outorgando-lhe para esse efeito procuração com poderes forenses gerais em direito permitidos e com a faculdade de substabelecer. (ibidem, itens 4 e 5).
Y – Em virtude de a Ré M. J. tencionar pedir a suspensão da inscrição como advogada, em inícios do mês de Junho de 2011, informou o Autor de tal facto e transmitiu-lhe que tinha um colega da sua confiança, o Réu F. M., que lhe recomendava para dar continuidade ao tratamento do assunto e à respectiva defesa nos autos do referido processo n.º 44/10.4TTVRL, recomendação esta que o Autor aceitou (ibidem, item 6).
Z – Na sequência da aceitação por parte do Autor, a 1ª Ré emitiu a favor do 2.º Réu, com data de 30-06-2011, substabelecimento sem reserva, que o 2.º Réu juntou ao referido processo n.º 44/10.4TTVRL, em 06-11-2011 (ibidem, item 7).
AA – No uso daquela procuração forense, a 1.ª Ré apresentou, em nome do ora Recorrente, contestação à acção proposta pela referida entidade empregadora para fundamentar o despedimento, deduzindo, também, reconvenção e formulando o respectivo pedido (ibidem, item 17).
BB - Na contestação/reconvenção, a 1.ª Ré não peticionou a totalidade das prestações intercalares, ou seja, as prestações salariais a que o ora Recorrente tinha direito desde a data do despedimento – 04-01-2010 - até à data do trânsito em julgado da decisão do tribunal que declarou a ilicitude do despedimento – 03-06-2016 -, limitando-se a peticionar as prestações vencidas desde a data do despedimento até à data da apresentação da contestação/reconvenção (ibidem item 17 e 42);
CC - Ou seja, a 1.ª Ré não peticionou as prestações salariais desde 04-01-2010 até 03-06-2016, o que vale dizer, as prestações salariais referentes a 6 anos e cinco meses.
DD – Dispõe o artigo 390.º, n.º 1 do Código do Trabalho que “Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do número 1 do artigo anterior (indemnização ao trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais), o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento”.
EE - Porque não foram peticionadas tais prestações salariais, o ora Recorrente não recebeu a referida importância, sofrendo um prejuízo de montante equivalente, como adiante se concretizará.
FF – O 2.º Réu, F. M., que prosseguiu o patrocínio do Autor na referida acção laboral após a junção do substabelecimento, não ampliou até ao final da audiência de discussão e julgamento na 1.ª Instância, o pedido inicialmente formulado no sentido deste abarcar as prestações intercalares em falta.
GG – Com essa não ampliação, o Autor não recebeu a importância correspondente às prestações vincendas em falta, sofrendo, por isso, um prejuízo equivalente.
HH – Dispõe o artigo 273.º, n.º 2, do CPC (vigente à data) que “O pedido pode também ser alterado ou ampliado na réplica; pode, além disso, o autor, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1.ª Instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.” (sublinhado e negrito nossos).
II – Desta sorte, quer a não inclusão no pedido inicial das referidas prestações intercalares por parte da 1.ª Ré, quer a não ampliação do pedido por parte do 2.º Réu, são causas directas e necessárias do mencionado prejuízo sofrido pelo ora Recorrente.
JJ – O artigo 95.º, n.º 1, al. b) do EOA aplicável ao tempo, (cujo comando se mantém actualmente) impõe expressamente ao advogado “estudar com cuidado e tratar com zelo a questão a que seja incumbido, utilizando, para o efeito, todos os recursos da sua experiência, saber e actividade, sendo também nesse sentido a jurisprudência unânime dos nossos tribunais (cfr., por todos, o Acórdão do STJ, de 21-01-2021, extraído por unanimidade – www.dgsi.pt).
KK – O mesmo é dizer que o estudo conveniente da questão e o desempenho activo, conforme aos interesses do Autor, bem como uma actuação idónea e diligente, impunham, a cada um dos Réus, na respectiva fase do seu desempenho na referida acção laboral, a formulação desse pedido (cfr., além de muitos outros, o Acórdão do T. R. Lisboa, de 19-04-2018, proc. 2319/08.3TBVFX.L1-2, disponível em www.dgsi.pt).
LL – Nos termos do artigo 799.º-1, do Código Civil, incumbia aos Réus fazer a prova – que não fizeram – que a falta de cumprimento ou cumprimento defeituoso não procedia de culpa sua (confronte, por todos, Acórdão da Relação de Lisboa, de 29-03-2012, disponível em www.dgsi.pt).
MM – Como acima se referiu, é notório, em termos de relação Advogado cliente, que este, quando procura os serviços daquele para determinada questão, deposita nele a confiança de ser defendido com zelo e competência relativamente a todos os interesses e direitos que a lei lhe concede.
NN – Como se deixou referido, o 2.º Réu tinha a obrigação de requerer a ampliação do pedido inicial durante todo o período em que durou a audiência de julgamento na 1.ª instância (de 14-11-2011 a 10-04-2014), ou seja, durante um período de dois anos, três meses e vinte e nove dias, e teria de tê-lo feito ao abrigo do n.º 2 do art.º 273.º do CPC (e não ao abrigo do artigo 28.º, do Código de Processo do Trabalho, como erradamente consta da sentença recorrida).
OO – À data da cessação do contrato de trabalho que celebrou com a W, o Autor auferia uma retribuição base mensal no valor de €2.275,82 (item 11 dos FP), à qual acrescia o subsídio de férias e o subsídio de Natal, pagos anualmente, cada um deles em igual montante de €2.275,82, o que em termos de contabilidade remuneratória equivalia a 14 prestações mensais por ano.
PP – Como consta do item 39 dos factos dados como assentes pelo Acórdão do Tribunal da Relação, no âmbito do processo laboral n.º 44/10.4TTVRL, o Autor recebia com regularidade anual, no final do mês de Maio, um prémio de produtividade no valor de €8.000,00 (cfr. item 35 dos FP da sentença recorrida).
QQ – Significa isto que a retribuição salarial mensal do Autor, incluindo aquele prémio, correspondia ao montante de €2.942,48 (€2.275,82 + €8.000,00 : 12).
RR – Em termos de cálculo de prestações vincendas, a partir da data da apresentação em juízo da contestação/reconvenção na mencionada acção laboral – 26-05-2010 (cfr. certidão judicial junta aos autos como doc. 1) - até à data do trânsito em julgado do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, que julgou em definitivo a referida acção laboral – 03-06-2016 -, o Autor tinha direito, pelo menos, a 82 prestações salariais do montante de €2.942,48, no total de €241.283,90.
SS – Nos termos do artigo 390.º, n.º 2, al. a) do Código do Trabalho, àquela importância há que deduzir a quantia de €11.382,14 que confessadamente (cfr. arts.º 88.º e 89.º da petição inicial), embora por excesso de zelo, o Autor referiu como dedutível ao montante de indemnização a que tinha direito após o seu despedimento.
E diz-se por excesso de zelo porque essa prestação de trabalho não era incompatível com a permanência do contrato de trabalho que o ligara à W.
TT – Assim, o Autor, na sua petição, deduziu todo o rendimento dedutível por ele auferido após o despedimento, pelo que o montante da indemnização pelas prestações vincendas em falta ascende à quantia de €229.901,76 (€241.283,90 -€11.382,14), acrescida dos respetivos juros a partir das datas de 10-09-2018 em relação à 1.ª Ré e de 05-09-2018 em relação ao 2.º Réu, datas das respectivas citações para a acção dos presentes autos.
UU – E assim é, porque não são dedutíveis àquela indemnização as importâncias referidas na alínea L supra, que o Autor auferiu após o seu despedimento, pelo seu trabalho independente como mediador de seguros, actividade essa que já desempenhava antes do despedimento e em simultâneo com a sua actividade remunerada de trabalho subordinado na W.
VV – Como também ficou provado, o Autor após o seu despedimento não desempenhou qualquer outra actividade e, portanto, não teve qualquer outra fonte de rendimentos.
XX – No caso dos autos, afigura-se extremamente simples e directo o apuramento do prejuízo sofrido pelo Autor com o incumprimento contratual dos Réus: basta subtrair ao montante das prestações vincendas que o Autor deixou de receber a importância de €11.382,14 referida na alínea SS supra.
ZZ – Por isso que, diferentemente do que sucede com a maioria dos casos de responsabilidade civil dos advogados nos quais o prejuízo é calculado pelo sistema da perda de chance, no caso dos autos esse cálculo, ou seja, a avaliação concreta do dano sofrido pelo Autor deve operar-se com o recurso à teoria da diferença, estabelecida no artigo 566.º, n.º 2 do Código Civil, nos termos da qual haverá que proceder ao apuramento da “diferença” entre a situação real e a situação hipotética actuais do património do lesado, devendo o montante da indemnização apagar ou compensar a exacta separação entre elas.
AAA – Nesta conformidade, afigura-se claro que o prejuízo sofrido pelo Autor com o incumprimento contratual dos Réus é do montante de €229.901,76, que representa a diferença entre a quantia de €11.382,14 referida na alínea SS supra e a importância total das prestações vincendas a que o Autor tinha e tem direito -€241.283,90 -, além dos juros devidos, como foi peticionado.
BBB – Sem conceder, se tal não for entendido, então o apuramento daqueles prejuízos deverá ser efectuado com o recurso à figura jurídica da perda de chance, sendo certo poder afirmar-se estar demonstrada, no caso dos autos, a existência de uma segura, consistente e séria probabilidade de que o tribunal do trabalho, onde correu a mencionada acção n.º 44/10.4TTVRL, teria julgado inteiramente procedente o pagamento das prestações vincendas devidas ao Autor, no montante de €229.901,76.
CCC – Sempre sem conceder – o que só por cautela se formula – mesmo que fossem dedutíveis às prestações vincendas devidas ao Autor as importâncias referidas na alínea L supra no valor total de €32.420,43, o montante da indemnização devida ao Autor pelas referidas prestações vincendas seria de €197.481,33.
DDD – Ao mesmo resultado se chegaria, se o tribunal a quo tivesse julgado equitativamente (cfr. n.º 3 do cit. art.º 566.º do CC) os danos sofridos pelo Autor no caso de, contra tudo o que se espera, ser entendido não estar averiguado o valor exacto dos mesmos.
EEE – Como é sabido, um dos requisitos da obrigação de indemnizar, no contexto da responsabilidade civil ex contractu ou ex delictu (a nossa lei oferece a inovação de concentrar na disciplina genérica desse instituto os aspectos relacionados com os efeitos da responsabilidade civil, enquanto se apresentam comuns a todas as suas modalidades) é que exista nexo de causalidade entre a conduta do responsável, por acção ou omissão, e os danos sofridos pelo lesado por essa actuação culposa (cfr.: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Uniformizador de Jurisprudência, de 01.07.2014, extraído por unanimidade (www.dgsi.pt).
FFF – Por outro lado, não oferece qualquer dúvida que há uma relação de causalidade directa e necessária entre o incumprimento contratual dos Réus em terem omitido, cada um deles, o pedido das retribuições vincendas devidas ao Autor por virtude do seu despedimento e os danos por este sofridos com aquele incumprimento, os quais acima se deixaram objectivamente calculados.
GGG – Não assiste razão à Mma. Juiz a quo quando afirma, em sede da questão no nexo de causalidade, que “seria de levar em conta a demora excepcional do processo, demora à qual os demandados são alheios”.
HHH – Com tal afirmação, a Mma. Juiz aparenta ter desconhecido, e como tal desconsiderado, o preceituado nos artigos 98.º-N e 98.º-O do CPT, (aplicáveis à data, mas cuja redacção se manteve na íntegra até ao CPT actual), preceitos aqueles aditados pelo DL n.º 295/2009, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 86/2009, de 23 de Novembro.
III – Com estes preceitos quis o legislador responsabilizar o Estado, através da Segurança Social, pelos pagamentos salariais que fossem além dos referentes ao período de 12 meses (feitas as deduções referidas no citado artigo 98.º-O), assim eximindo a entidade patronal accionada do pagamento do que fosse além daquele período.
JJJ – Os preceitos referidos não retiram ao Autor, enquanto trabalhador, o direito de receber todas as prestações vincendas devidas, de harmonia com o citado artigo 390.º, n.º 2, do Código do Trabalho, por maior que fosse a demora do processo.
Pelo contrário, asseguram esse pagamento à custa do Estado na parte em que excede as prestações vencidas além do referido período de 12 meses.
KKK – Significa isto que do ponto de vista dos direitos do trabalhador, este tem direito à plenitude das prestações salariais vincendas após o seu despedimento, seja qual for a demora do processo, havendo para o ressarcir duas entidades: a sua ex empregadora e o Estado no excedente ao período de 12 meses.
LLL – É inadmissível, por ilegal, pôr em causa, como faz a Mma. Juiz, a relação causal entre o incumprimento dos Réus e o montante das prestações vincendas, cujo direito, fosse qual fosse a demora do processo, a lei lhe reconhece plenamente ao trabalhador ilicitamente despedido.
A exclusão da relação causal naquelas circunstâncias significaria, ao fim e ao cabo, o absurdo de responsabilizar o Autor pelo facto da demora do processo laboral, imputando-lhe o custo das consequências patrimoniais da omissão dos Réus.
MMM - É sintomático do tratamento desigual das partes no presente processo o modo como a Mmª Juiz a quo se refere à questão do abuso de direito:
- “Aliás, ainda que se considerasse provado que o autor teria direito aos créditos em causa, caso tivessem sido peticionados, sempre estaria a actuar em abuso de direito nos termos da previsão do artº 334.º do Código Civil, nas várias vertentes referidas pelo réu F. M., que nos abstemos de apreciar mais detalhadamente, por termos considerado que ao autor não assiste o direito que invoca.”.
NNN – Quer dizer: a Mmª Juiz a quo não se limita a, na sua óptica, dar por prejudicada a questão do abuso de direito e abster-se dela conhecer. Fez questão de afirmar duas coisas no mínimo insólitas:
a) – que o Autor, ao peticionar as prestações vincendas que lhe eram concedidas pelo art.º 390.º-2 do Código do Trabalho, estava a exceder manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito!
b) – que, mesmo sem analisar detalhadamente, considerava, a priori, fundamentado esse abuso de direito nas várias vertentes referidas pelo Réu F. M., sem criticar ou sequer referir a prolixa, inconsistente, irrelevante e impertinente especulação que sobre esse tema o 2.º Réu se espraia na sua contestação.
OOO – Como é por demais evidente, o Autor, ora Recorrente, não litiga com abuso de direito, bem pelo contrário, peticiona o que lhe pertence por direito, fazendo-o de uma forma inteiramente de boa-fé, de harmonia com os bons costumes e com o fim social desse direito.
PPP - A sentença recorrida, pelo simples facto de entender que o Autor alega na sua petição factos que não logrou provar, considera que ele agiu com dolo e condena-o em multa como litigante de má-fé.
E com o espantoso argumento de que uma acção de responsabilidade civil contra Advogado, ainda que sem fundamento ou sem fundamento provado, se mostra altamente atentatória da honra e dignidade profissional do Advogado visado!
E esta afirmação é feita, apesar de ser notória a imensidade de processos em que se discute a responsabilidade civil contratual do Advogado, como acima se evidenciou.
QQQ – Como é sabido e confirmado unanimemente pela doutrina e jurisprudência, a defesa convicta de uma perspectiva jurídica dos factos, diversa daquela que a decisão judicial acolhe, não implica, por si só, litigância censurável a despoletar a aplicação do artigo 456.º, n.ºs 1 e 2 do CPC (cfr., por todos, Acórdão do STJ, de 11-09-2012, disponível em www.dgsi.pt, e Acórdão da Relação de Lisboa, de 23-03-2010, também disponível em www.dgsi.pt).
RRR – Dado o exposto, é também por demais evidente a injustiça e a ilegalidade manifestas, cometidas pela sentença recorrida quando condena o Autor como litigante de má-fé, além da multa acima referida, ao pagamento das indemnizações de €7.500,00 e €15.000,00, respectivamente, à 1.ª e 2.º Réus.
SSS – O mesmo não se dirá relativamente quer à 1.ª Ré, quer ao 2.º Réu, que manifestamente litigaram contra a verdade deles bem conhecida, carreando para o processo factos que sabiam não corresponder à verdade e, por conseguinte, fazendo do processo um uso manifestamente indevido.
TTT – Na verdade, em lugar dos Réus assumirem a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso do mandato forense que lhes conferiu o Autor, ou seja, em vez de assumirem que tinham omitido o pedido das prestações vincendas em causa e, consequentemente, terem chamado à colação as respectivas seguradoras, optaram conscientemente por mentir, alegando que fora o Autor quem lhes pediu para não peticionarem tais prestações.
UUU - Pode, pois, dizer-se com toda a verdade que ambos os Réus pleitearam com a consciência de não ter razão, tanto mais que, sendo Advogados, lhes era exigido nessa matéria um comportamento mais atento e cumpridor.
VVV – Os Réus, ao pleitearem com a consciente inobservância dos deveres de probidade, de cooperação e de boa-fé, patenteiam inequivocamente a má-fé com que litigam.
Por isso, tal como foi pedido nos autos, devem ser condenados em
multa e em indemnização ao Autor em quantia a fixar ponderadamente pelo tribunal.
XXX – Ao julgar como julgou, a sentença recorrida enfermou de erro na apreciação da prova produzida e não fez correcta interpretação e aplicação do direito atinente, sendo proferida com violação dos seguintes artigos: 9.º, 364.º, n.º 1, 483.º, n.º 1, 566.º, n.ºs 1 e 2, 798.º e 799.º do Cód. Civil; 44.º do CPC actual, e 272.º, 273.º, n.º 2, 456.º, n.ºs 1 e 2, 498.º, n.º 4, 506.º, n.ºs 1 e 2, 618.º, n.º 3 do CPC, vigente à data; 85.º, n.º 1, 87.º, n.ºs 1, a) e 7, 92.º, n.º 2, 95.º, n.º 1-a) e 99.º, do Estatuto da Ordem dos Advogados; 28.º, 98.º-N e 98.º-O do Código de Processo do Trabalho vigente à data; 41.º e 52.º do Código das Sociedades Comerciais; 9.º do Código do Registo Comercial; e 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
ZZZ – Deve, pois, a sentença recorrida ser revogada e julgada a acção procedente por provada, sendo certo que a condenação das Rés X INSURANCE COMPANY e Y INSURANCE COMPANY (Europe), LDA. está assegurada pelos respectivos contratos de seguros juntos aos autos.
AAAA – Em cumprimento do preceituado no n.º 2 do artigo 637.º do CPC, indica-se que o fundamento específico da recorribilidade in casu é a violação pela sentença recorrida das normas legais acima referidas em ZZZ.

Nos termos expostos e nos do douto suprimento de V. Excias., que sempre se espera, deve ser concedido provimento ao presente recurso, ser revogada a sentença recorrida e ser julgada a acção procedente por provada e, em consequência:
a) – serem os Réus solidariamente condenados a pagar ao Autor os prejuízos patrimoniais pelo mesmo sofridos em consequência
do incumprimento ou cumprimento defeituoso do mandato forense por parte da 1.ª e do 2.º Réus, no valor de €229.901,76 (€241.283,90 - €11.382,14), acrescido de juros desde a citação dos Réus (10-09-2018 e 05-09-2018, 1.ª e 2.º Réus, respectivamente) até efectivo e integral pagamento;
b) – sem conceder, para o caso de assim se não entender, devem, na hipótese figurada na alínea CCC das conclusões, ser todos os Réus condenados solidariamente a pagar ao Autor os prejuízos patrimoniais pelo mesmo sofridos em consequência do incumprimento ou cumprimento defeituoso do mandato forense por parte da 1.ª e do 2.º Réus, os quais na data de 23-07-2018 ascendem ao valor de €197.481,33 (€241.283.90 + €32.420,43 -€11.382,14), acrescido de juros desde a citação até efetivo e integral pagamento;
c) – serem os 1.ª e 2.º Réus condenados como litigantes de má-fé, em multa e indemnização a fixar pelo Tribunal.
d) - serem, ainda, em qualquer dos casos, todos os Réus condenadas solidariamente ao pagamento dos juros vincendos sobre a importância em dívida, calculados à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento;
d) – serem, finalmente, todos os Réus condenados nas custas e encargos do processo e no mais de lei.
ASSIM SE FARÁ A DEVIDA JUSTIÇA.

Houve contra-alegações de três réus/apelados que pugnaram pelo decidido.

Das conclusões do recurso ressaltam as seguintes questões:

1. Se devem ser revertidas as respostas positivas para negativas aos pontos 141 a 154 da matéria de facto provada, ao abrigo do disposto no artigo 87 n.º 1 al. a), 2 e 5 do Estatuto da Ordem dos Advogados e artigo 618 n.º 3 do CPC, por violação do sigilo profissional.
1.a Subsidiariamente, se devem ser revertidas as respostas positivas para negativas aos pontos 141 a 154 da matéria de facto provada por descrédito do depoimento de parte da 1ª ré M. J. e errada interpretação do artigo 390 do Código do Trabalho, e das funções do advogado no exercício do seu mandato, tuteladas pelo Estatuto da Ordem dos Advogados.
2. Se devem ser revertidas as respostas positivas para negativas aos pontos 84 a 88 da matéria de facto provada.
3. Se devem ser revertidas as respostas positivas para negativas aos pontos 56, 58, 81, 83, 91 a 99 da matéria de facto provada.
4. Se devem ser revertidas as respostas positivas para negativas aos pontos 66 e 70 da matéria de facto provada.
5. Se devem ser revertidas as respostas positivas para negativas aos pontos 55, 57, 67, 68, 69, 83 e 98 da matéria de facto provada.
6. Se é de alterar as respostas aos pontos 103 a 106, 110 e 111 da matéria de facto provada, nos termos seguintes:
seja dado como não provado o seguinte segmento do item 103: “formando uma sociedade para o efeito”;
- seja dado como não provada a matéria do item 104;
- seja dado como não provado o seguinte segmento do item 105: “sendo que o Autor, apesar de ser sócio de pleno direito, não figurava o seu nome na sociedade, o que foi feito a pedido do Autor, porque iria impugnar o despedimento da W”;
- que a matéria do item 106 seja considerada apenas provada com os seguintes dizeres: “O sócio da K, J. T., e o Autor, este após a sua saída da W, e nomeadamente após ter adquirido a quota ao Manuel, receberam rendimentos até à venda das quotas da sociedade no ano 2018.”
- seja dado como não provado o seguinte segmento do item 110: “mas cujo valor era muito superior.”;
- seja dado como não provado o seguinte segmento do item 111: “no entanto, o valor da venda foi muito superior”.
7. Se devem ser revertidas as respostas negativas para positivas aos pontos das alíneas f, g, h, i, k, l, m, o, p e q da matéria de facto não provada.
8. Se devem ser revertidas as respostas negativas para positivas aos pontos das alíneas a, b, d, j e r da matéria de facto não provada.
9. Se deve ser alterada a resposta ao ponto 109 da matéria de facto provada para os termos seguintes:
“- - Depois do seu despedimento, o Autor, trabalhando por conta própria, como trabalhador independente, mas em ligação com K, auferiu, a título de comissões pela actividade de mediador de seguros, actividade já antes por ele exercida enquanto trabalhador subordinado ao serviço da W, as importâncias a seguir referidas e como tal declaradas em sede de IRS:
ANOS Valores recebidos e declarados em sede de IRS por trabalho independente, conforme os respectivos documentos juntos aos autos.
2010 €1.120,43 – (neste ano o A. Recebeu da sua ex entidade patronal, W, a quantia de €7.177,89, que se encontrava em debito pela cessação do contrato de trabalho)
2011 €7.000,00
2012 €3.000,00
2013 €5.400,00
2014 €7.500,00
2015 €8.400,00”
10 Se deve ser aditado à matéria de facto provada o seguinte:
“- O Autor, antes e durante o julgamento da 1.ª Instância, foi alertado por um seu colega de Coimbra, que intentara contra a mesma entidade patronal idêntica acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, para o direito que lhe assistia de pedir as retribuições salariais vincendas, ou seja, aquelas que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença.
11. Se há contradição entre as respostas negativas aos pontos das alíneas dd), ee) e ff) da matéria de facto não provada com as respostas positivas aos pontos 142 e 143 da matéria de facto provada.
12. Se há contradição entre a resposta negativa ao ponto da alínea kk) da matéria de facto não provada e as respostas positivas aos pontos 67, 68, 69 e 98 da matéria de facto provada.
13. Se há contradição entre a resposta negativa ao ponto da alínea qq) da matéria de facto não provada e as respostas aos pontos 86 e 87 da matéria de facto provada.
14. Se os réus/apelados violaram o contrato de mandato forense ao não peticionarem, a 1ª ré, os salários vincendos entre os despedimentos e o trânsito em julgado da sentença, e o 2º réu por não ter ampliado o pedido até ao encerramento da discussão em 1ª instância no que concerne aos salários vincendos desde o despedimento e o trânsito em julgado da sentença.
15. Se agiram com culpa.
16. Se é de deduzir à indemnização as importâncias que o autor recebeu após o despedimento, pelo seu trabalho independente, como mediador de seguros, atividade que já desempenhava antes do despedimento e em simultâneo com a sua atividade remunerada como trabalhador na W.
17. Se o autor/apelante litigou de má fé.
18 Se os réus/apelados litigaram de má fé.

Vamos conhecer das questões enunciadas.

1. Se devem ser revertidas as respostas positivas para negativas aos pontos 141 a 154 da matéria de facto provada, ao abrigo do disposto no artigo 87 n.º 1 al. a), 2 e 5 do Estatuto da Ordem dos Advogados e artigo 618 n.º 3 do CPC, por violação do sigilo profissional.

O autor/apelante suscita a violação do segredo profissional por parte da 1ª Ré, uma vez que, no seu depoimento de parte, relatou factos cujo conhecimento lhe advieram das reuniões que teve com o autor no desenvolvimento da resposta à nota de culpa, e depois na apresentação da contestação/reconvenção ao processo não tendo formulado o pedido de levantamento do respetivo sigilo perante os órgãos competentes da Ordem do Advogados. E, em consequência, os factos em causa deverão ser considerados não provados.

A 1ª ré/apelada, na resposta ao recurso, suscita o abuso de direito na vertente do “venire contra factum proprium” porque foi o autor que requereu, na petição inicial e na Audiência Prévia, o depoimento de parte da 1ª Ré para obter a confissão de factos fundamentais da causa de pedir, nunca se opondo, no desenrolar do julgamento, para além de a jurisprudência da Ordem dos Advogados ser no sentido que a violação do sigilo profissional ser relevante apenas quando o advogado é testemunha e não parte.

O autor, logo na sua petição inicial, requereu o depoimento de parte da 1ª ré, indicando os artigos da petição inicial a cujos factos deveria responder (1 a 16, 17 a 33, 34 e 47, 48 a 57, 62 a 93), que estão em conexão com factos vertidos na contestação da ré (artigos 5 a 11, 31 a 39, 41, 46, 48 a 51, 53, 57, 58.). E renovou esse pedido na Audiência Prévia, tendo sido deferido pelo tribunal, sem reclamação do autor, vindo a ser prestado em audiência de julgamento, dirigido pelo tribunal, tendo a mandatária do autor pedido esclarecimentos sobre o depoimento.

Com este depoimento o autor/apelante pretendia provar os factos que indicou, por confissão. O certo é que os factos referidos consubstanciavam a essência da causa de pedir e estavam conexos com factos que a 1ª Ré tinha alegado na sua contestação, de natureza explicativa dos alegados pelo autor, e que a ré tinha de responder no seu depoimento de parte. Como estamos no domínio de uma confissão, não se pode exigir ao confitente que apenas relate uns factos e esconda a realidade de outros em obediência ao sigilo profissional. E isto, porque o advogado, quando é parte, e neste caso depoente, tem o direito de defender a sua honra e dignidade, para que seja compreensível a sua atitude, para além de que a confissão terá de ser analisada e aceite como um todo (artigo 360 do C. Civil).

O sigilo profissional do advogado tem com fundamento, a tutela dos interesses dos clientes e da confiança gerada no exercício da profissão. Destacam-se um interesse privado e um público que se completam.

Neste caso, não se questiona que não foi requerido o levantamento do sigilo profissional por parte da 1ª ré nos termos do artigo 92 n.º 4 da Lei 145/2015 de 9/9. Está em causa, apenas, se é legítimo ao autor suscitar a violação do sigilo profissional por parte da ré, porque não requereu o seu levantamento, para obter um benefício, quando foi ele que requereu o depoimento de parte, e na Audiência Prévia já sabia qual era a posição da 1ª Ré, plasmada na sua contestação, em que refere que a não formulação do pedido das retribuições vincendas deveu-se à vontade do autor e não a simples lapso da 1ª ré.

Estamos perante um depoimento de parte, que tem como função primordial a obtenção de uma confissão judicial. E esta, segundo o artigo 360 do C. Civil, terá de ser indivisível, no sentido de que o beneficiário da confissão terá de aceitar o que lhe for prejudicial. E, no caso em apreço, o depoimento abarcou toda a matéria de facto que o autor indicou e a que lhe estava conexa alegada pela 1ª ré na sua contestação. E o tribunal deu como provada matéria de facto alegada pelo autor e pela ré, que estava sob sigilo profissional, na medida em que foi obtida durante a execução do mandato.

O exercício do direito, por parte do autor é abusivo, na medida em que fere o sentimento jurídico da generalidade das pessoas, uma vez que abarca os factos que lhe são prejudiciais e não a totalidade dos factos a que a ré respondeu e estavam sob sigilo profissional. E isto, porque não está interessado que um conjunto de factos que foram dados como provados fossem, também revertidos.

Além disso, o sigilo profissional do advogado não deve obstar ao exercício do seu direito ao contraditório, dos seus direitos de defesa, quando é réu numa ação em que o seu cliente é autor. O facto de não levantar o sigilo profissional, não pode ser prejudicado por isso, como se depreende dos acórdãos do STJ de 27/02/2008 (Rodrigues dos Santos)) e de 2/02/1995 (Sousa Guedes), publicados em www.dgsi.pt., sendo o tribunal autónomo na ponderação do depoimento.

Em face do exposto é de manter a matéria de facto questionada.

1.a Subsidiariamente, se devem ser revertidas as respostas positivas para negativas aos pontos 146, 147, 148, 149 e 154 da matéria de facto provada por descrédito do depoimento de parte da 1ª ré M. J..

Transcrição:
141- Quando o Autor se reuniu com a Ré M. J. com vista a habilitá-la à elaboração da contestação/reconvenção junta aos autos, abordaram todas as pertinentes questões, nomeadamente os seus potenciais direitos.
142- O Autor apresentou-se sempre como um indivíduo perfeitamente esclarecido sobre todas as questões que a sua situação, o seu processo disciplinar/despedimento e o seu processo judicial suscitavam.
143- O Autor sempre se vangloriou de ter grandes e bons conhecimentos, que conhecia e tinha confiança com um Senhor Juiz que o aconselhava, acompanhava o seu processo e a quem entregava cópias das peças, que se dava muito bem com o Senhor Advogado, especialista em Direito do Trabalho.
144- Antes da Ré M. J. dar entrada judicial da contestação/reconvenção, o Autor, à semelhança do que já tinha feito no processo disciplinar, solicitou-lhe uma cópia do articulado.
145- E, volvidos 2, 3 dias aproximadamente, e só depois de o Autor ter anuído, é que a Ré deu entrada judicial da contestação/reconvenção.
146- Quando questionado pela ré M. J. se já tinha tratado do subsídio de desemprego, o Autor respondeu que não, e que nem iria tratar, pois já tinha «projetos» que lhe iriam garantir rendimentos.
147- Não tendo concretizado esses «projetos», a Ré informou o Autor – o que ele já sabia, como referiu -, que, na parte dos ordenados que se fossem vencendo na pendência do processo, o Autor teria, mais tarde ou mais cedo, de fazer um encontro de contas, pois a sua entidade patronal não iria deixar de o requerer.
148- Nessa mesma altura, o Autor referiu expressamente à Ré M. J., que não pretendia reclamar aquelas retribuições pois não desejava que a W viesse “vasculhar a sua vida, os seus rendimentos, não querendo nada com o fisco”.
149- No seguimento, a Ré esclareceu o Autor que, não obstante, iria reclamar, pelo menos, os vencimentos desde o despedimento até à data da entrada em juízo da contestação/reconvenção dado que ainda não estava a receber quaisquer rendimentos.
150- O Autor, nos contactos que manteve com a Ré, sempre se apresentou como um individuo muito seguro, atento e firme naquilo que eram as suas pretensões, no que fazia e dizia.
151- O Autor acompanhou de perto e com interesse, tudo o que respeitava ao seu processo, sendo constantes as solicitações dirigidas à Ré, reuniões, que se realizaram para preparação e estudo de estratégias processuais, mails, etc.
152- Ao longo do período temporal em que a Ré prestou os seus serviços para o Autor, nunca este lhe manifestou qualquer desagrado, por mais pequeno que fosse, algum descontentamento com o cuidado e qualidade do trabalho desenvolvido.
153- Uma das últimas vezes que a Ré se cruzou com o Autor, foi por altura em que o mesmo tinha tido conhecimento da decisão do STJ, tendo, então, se manifestado muito agradecido, feliz com o resultado, e reconhecendo a qualidade do trabalho desenvolvido por ambos os Réus.
154- Foi o próprio Autor que deu instruções à Ré para não reclamar o pagamento dos créditos em causa.

O tribunal fundamentou as respostas positivas aos pontos questionados pelo autor/apelante com a conjugação dos depoimentos de parte da 1ª ré M. J. e do Autor, em que deu crédito à 1ª ré e desvalorizou as do autor, nos pontos agora questionados.

O autor/apelante insurge-se contra estas respostas com razões jurídicas sobre a interpretação do artigo 390 do Código do Trabalho, da violação dos deveres de patrocínio da 1ª ré e das regras de experiência.

Julgamos que os fundamentos apresentados pelo autor/apelante não se enquadram nos ónus de impugnação da matéria de facto consubstanciados no artigo 640 do CPC, uma vez que faz uma mera crítica genérica à motivação apresentada pelo tribunal recorrido, e não ataca, de forma concreta, a credibilidade do depoimento de parte da 1ª ré. Pois, o que está em causa é saber se o que a 1ª ré disse e convenceu o tribunal, e consta da matéria de facto questionada, é verdadeiro ou não. O autor apenas se limitou a dizer que não se enquadra nas regras da experiência e das funções do patrocínio forense. Pois, num processo laboral como o que foi patrocinado pela 1ª ré deveria ter sido formulado o pedido de retribuições vincendas desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença.

O normal seria assim. Porém pode haver exceções, no caso de não haver interesse por parte do patrocinado, como referido pela 1ª ré na sua contestação e no seu depoimento. E é esta questão excecional que é o centro da discussão.
O autor refere que iria continuar a trabalhar como mediador de seguros, que já estava autorizado a fazê-lo durante a vigência do contrato de trabalho com a W, pelo que os rendimentos que auferisse não seriam descontados, pelo que não havia razões para ter dito à 1ª ré que não queria que não peticionasse os créditos vincendos ou intercalares.

O certo é que não foi esta a realidade provada em audiência de julgamento. Na verdade, após a suspensão do trabalho em junho de 2009, em outubro/novembro foi constituída a sociedade K pelas testemunhas Manuel e J. T., em que o autor, a partir de janeiro de 2010 entregou a sua carteira de seguro a esta sociedade e começou a trabalhar auferindo uma retribuição de 500€, no início e depois 700€. Não era sócio por razões do processo de despedimento, mas exercia a atividade para a respetiva sociedade como se fosse sócio de facto. E a sociedade em causa tinha relações comerciais com várias seguradoras, e o autor tinha entregue o seu número de mediador ao ASF, para trabalhar na K. Daí as razões porque terá dito à 1ª ré que não queria que os créditos vincendos fossem peticionados para não se expor às investigações da W e do fisco.

Assim julgamos que o depoimento da 1ª ré é credível e o do autor não é convincente, pelo que é de manter as respostas questionadas.

(…)

11. Se há contradição entre as respostas negativas aos pontos das alíneas dd), ee) e ff) da matéria de facto não provada com as respostas positivas aos pontos 142 e 143 da matéria de facto provada.
12. Se há contradição entre a resposta negativa ao ponto da alínea kk) da matéria de facto não provada e as respostas positivas aos pontos 67, 68, 69 e 98 da matéria de facto provada.
13. Se há contradição entre a resposta negativa ao ponto da alínea qq) da matéria de facto não provada e as respostas aos pontos 86 e 87 da matéria de facto provada.

O autor/apelante suscita a contradição entre as respostas negativas aos pontos das alíneas da matéria de facto não provada e as respostas positivas aos números dos pontos da matéria de facto provada identificadas nas questões 11, 12 e 13. A contradição revela-se na incompatibilidade entre duas respostas existentes juridicamente. O certo é que as respostas negativas não têm qualquer valor jurídico, uma vez que foram sanadas da discussão jurídica. O julgador, na decisão de direito apenas pode contar com as respostas positivas e nunca com as negativas. Daí que estas não interfiram na subsunção jurídica.

Assim, julgamos que não há contradição entre as respostas negativas e as positivas, porque o julgador, na análise da prova, considerou umas provadas e outras não provadas, afastando qualquer contradição que pudesse haver. Isso aconteceria se respondesse positivamente a todos os pontos de facto das alíneas que julgou como não provados, o que não aconteceu.

Vamos fixar a matéria de facto provada, que passamos a transcrever:
“1- O Autor esteve vinculado por contrato de trabalho por tempo indeterminado ao serviço da W – Companhia de Seguros, S.A., desde 01-01-1986 até 30-12-2009, para exercer, como exerceu as funções correspondentes à categoria profissional de chefe de serviços, nível XIV.
2- A Ré, Dra. M. J., que também usa o nome profissional abreviado de M. J., pelo menos, à data dos factos, exercia a atividade profissional de advogada, atividade que exerceu desde 10-04-2003, data em que se inscreveu no Conselho Regional do Porto da Ordem dos Advogados, com a cédula profissional 9809p e domicílio profissional no Largo do …, em Vila Real, até meados do ano de 2011, data em que suspendeu aquela inscrição como advogada.
3- O Réu, Dr. F. M., que também usa o nome profissional abreviado de F. M., exerce a atividade profissional de advogado desde, pelo menos, 21-12-2001, data em que se encontra inscrito no Conselho Regional do Porto da Ordem dos Advogados, com a cédula profissional …, com domicílio profissional na Rua …, Edifício … Vila Pouca de Aguiar, mantendo-se a sua inscrição ativa.
4- O Autor, por discordar do despedimento de que foi alvo, o qual ocorreu na sequência de procedimento disciplinar laboral e implicou a cessação do respetivo contrato de trabalho por tempo indeterminado que o vinculava à sua, então, entidade empregadora,
W – Companhia de Seguros, S.A., estabeleceu uma relação profissional com os 1.ª e 2.º Réus, de forma individual e sucessiva, tendo os 1.ª e 2.º Réus sido mandatários do Autor em processo especial de Ação de Impugnação da Regularidade e Licitude do Despedimento, ação que intentou contra a aludida empregadora, W, e que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, Juízo do Trabalho – J1, sob o n.º de processo 44/10.4TTVRL.
5- A relação contratual estabelecida pelo Autor com a Ré M. J. ocorreu, pelo menos, em 03-02-2010, data em que lhe outorgou procuração com poderes forenses gerais em direito permitidos, com a faculdade de substabelecer.
6- Em virtude de a Ré M. J. tencionar pedir a suspensão da inscrição como advogada, em inícios do mês de junho do ano de 2011, informou o Autor de tal facto e transmitiu-lhe que tinha um Colega da sua confiança, o Réu F. M., que lhe recomendava para dar continuidade ao tratamento do assunto e à respetiva defesa nos autos de processo n.º 44/10.4TTVRL, recomendação esta que o Autor aceitou.
7- Na sequência da aceitação por parte do Autor, a 1ª Ré emitiu a favor do 2º Réu, com data de 30-06-2011, substabelecimento sem reserva, substabelecimento que o 2º Réu juntou ao referido processo n.º 44/10.4TTVRL, em 06-11-2011.
8- Conforme resulta da Contestação/Reconvenção, o Autor esteve ao serviço da ex-empregadora W – Companhia de Seguros, S.A., através de contrato de trabalho subordinado, por tempo indeterminado, desde 01-01-1986 até 04-01-2010, data em que foi despedido, para exercer, como exerceu as funções correspondentes à categoria profissional de chefe de serviços, nível XIV.
9- Durante a vigência do contrato de trabalho, o Autor esteve ao serviço da Empregadora W, sob a autoridade, direção e fiscalização desta, exercendo as referidas funções correspondentes à categoria profissional de chefe de serviços, nível XIV, tendo dirigido a delegação da Empregadora situada na cidade de Vila Real.
10- As funções correspondentes à categoria exercida pelo Autor consistiam em gerir a delegação, controlar a qualidade dos serviços prestados pela delegação e os resultados obtidos, face ao plano de ação da mesma, gerir a equipa da Delegação, garantindo os processos administrativos inerentes e visar os processos de caixa.
11- O Autor auferia, à data da cessação do contrato de trabalho, uma retribuição base mensal no valor de € 2.275,82.
12- Em 25-06-2009, o Autor foi notificado da nota de culpa, com vista ao seu despedimento, na sequência do procedimento disciplinar instaurado pela sua então empregadora, W.
13- O Autor apresentou resposta à nota de culpa e foi despedido por decisão proferida pela W, em 15-12-2009, e recebida pelo Autor em 04-01-2010.
14- A relação contratual de mandato estabelecida pelo Autor com a Ré M. J. ocorreu, pelo menos, em 03-02-2010, data em que lhe outorgou procuração com poderes forenses gerais em direito permitidos, com a faculdade de substabelecer, sendo que a Ré já era sua procuradora forense desde a data da resposta à nota de culpa, tendo acompanhado o procedimento disciplinar desde essa fase.
15- Em 04-02-2010, o Autor deu entrada no Tribunal do Trabalho de Vila Real, através de formulário, do processo especial de Impugnação da Regularidade e Licitude do Despedimento, dando origem aos autos de processo n.º 44/10.4TTVRL.
16- No âmbito desses autos, foi marcada audiência de partes para o dia 19-04-2010, com vista à conciliação das partes, o que não foi possível, tendo sido determinada a notificação da Ré W para os termos do disposto no artigo 98.º-I, n.º 4, al. a), ou seja, para apresentar articulado a fundamentar o despedimento, o que fez.
17- Em 26-05-2010, a Ré M. J., na qualidade de mandatária do Autor, apresentou a contestação com reconvenção, culminando com o seguinte pedido:
“Nestes termos e nos demais de direito invocados e aplicáveis e pelo que será doutamente suprido por V. Excia., deverá a presente contestação ser julgada totalmente procedente por provada e, consequentemente:
1. Devem as exceções deduzidas ser julgadas procedentes, por provadas, porquanto se verifica a prescrição do direito de a Ré exercer o poder disciplinar relativamente factos e omissões que imputa ao Autor, bem como a caducidade do respetivo procedimento disciplinar, nos termos do vertido no n.º 1 do artigo 382.º combinado com os n.ºs 1 e 2 do artigo 329.º do Código do Trabalho;
2. Declarar-se a ilicitude do despedimento do Autor efetuado pela Ré, no dia 04 de janeiro de 2010, porque sem justa causa, em conformidade com o artigo 381.º alínea b);
3. Condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia global de € 163.556,38 (cento e sessenta e três mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e trinta e oito cêntimos), pelas indemnizações devidas de danos patrimoniais e não patrimoniais causados e créditos laborais vencidos e não pagos como melhor descritos nos artigos 77.º a 92.º, acrescida dos respetivos juros legais, à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento;
4. Condenar a Ré nas custas e demais encargos processuais e em tudo o mais que for legal”.
18- Não obstante o substabelecimento sem reserva estar datado de 30-06-2011, o Réu F. M. apenas procedeu à respetiva junção aos autos de processo n.º44/10.4TTVRL, junto do Tribunal do Trabalho de Vila Real, em 06-11-2011.
19- Em 19-04-2010, a Ré M. J. assegurou a realização da audiência de partes, com vista à conciliação ou acordo, o que não foi possível.
20- Em 05-01-2012, o Réu F. M. esteve presente na audiência de discussão e julgamento, com a inquirição das testemunhas L. D. e A. E..
21- Em 03-05-2011, a Ré M. J. esteve presente, sendo que a audiência não se realizou por impedimento do Tribunal.
22- Em 14-11-2011, o Réu F. M. assegurou a defesa do mandato na audiência de discussão e julgamento, que se iniciou com a inquirição das testemunhas da Ré, J. R. e A. P..
23- Em 21-11-2011, o mesmo Réu assegurou o patrocínio na audiência de julgamento, com inquirição das testemunhas da Ré E. L. e V. H..
24- Em 12-12-2011, o mesmo Réu assegurou mais uma audiência, tendo sido feita a inquirição da testemunha da Ré, P. J..
25- Em 07-02-2012, o Réu assegurou a continuação da audiência, tendo sido feita a inquirição das testemunhas do Autor, J. C. e Manuel .
26- Em 28-02-2012, foi realizada a resposta à matéria de facto, a que o Réu F. M. faltou.
27- Em 04-11-2013, o Réu F. M. assegurou a realização da audiência de discussão e julgamento, tendo sido feita a inquirição da testemunha da Ré, V. H..
28- Em 16-12-2013, o mesmo Réu assegurou a nova realização de audiência de julgamento, com a inquirição da testemunha da Ré, P. J..
29- Em 17-02-2014, o Réu assegurou, também, a realização da audiência de julgamento, tendo sido feita a inquirição da testemunha da Ré A. P..
30- Em 25-03-2014, o Réu F. M. assegurou o patrocínio forense na audiência, tendo sido feita a inquirição das testemunhas do Autor, L. D., J. C. e Manuel.
31- Em 03-09-2012, foi proferida sentença pelo Tribunal do Trabalho de Vila Real, a qual julgou o despedimento lícito, e julgou a ação: “parcialmente procedente por provada e em consequência, condena-se a Ré a pagar ao Autor o montante de € 4.551,64, a título de férias e subsídio de férias, acrescida dos respetivos juros de mora, vencidos à taxa legal, férias e subsídio de férias, acrescida dos respetivos juros de mora, vencidos à taxa legal, improcedentes por não provados, absolvendo-se a Ré dos mesmos.”.
32- Inconformado com esta decisão, em 24-10-2012, o Autor apresentou as suas alegações de recurso, dirigido ao Tribunal da Relação do Porto, sendo que o recurso foi apreciado pelo Tribunal da Relação de Guimarães, alegações nas quais foram invocando os seguintes vícios à sentença de 1.ª instância:
1.ª - a nulidade do despacho de 12-06-2013, que havia recusado o pedido de inquirição de 36 testemunhas arroladas pelo Autor, tendo o Tribunal indeferido esse pedido na parte em que excede as 10 testemunhas;
2.ª – o despacho de 08-01-2014, por violação do princípio do contraditório;
3.ª – o Tribunal a quo não cumpriu a determinação da Relação do Porto no acórdão proferido nos autos;
4.ª – o Tribunal omitiu a pronúncia sobre elementos de prova;
5.ª - O Tribunal errou no julgamento da matéria de facto (quesitos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º a8.º, 9.º a 11, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º a 19.º, 20.º, 27.º, 28.º, 29.º, 34.º, 35.º, 36.º, 37.º, 40.º);
6.ª – caducou o procedimento disciplinar;
7.ª – O procedimento disciplinar é anulável;
8.ª – está em dívida o prémio de produtividade;
9.ª – a ação deve proceder.
33- O Tribunal da Relação, através de acórdão proferido em 22-10-2015, não deu razão ao Autor nas 1.ª, 2.ª, 3.ª, 4.ª, 6.ª e 7.ª questões assinaladas, mas, todavia, deu-lhe razão nas 5.ª, 8.ª e 9.ª questões.
34- A súmula da decisão do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães foi a seguinte:
“Julgar:
A) A apelação interposta pelo trabalhador parcialmente procedente e, em consequência:
1 – modificar a matéria de facto;
2 – modificar a sentença declarando a ilicitude do despedimento e condenando a Reconvinda a pagar ao reconvinte a quantia de € 46.949,12, acrescida de juros de mora à taxa anual de 4% desde a notificação da reconvenção até integral pagamento.”.
35- Quanto à 5.ª questão levantada no recurso, que foi objeto de análise pelo Tribunal da Relação, questão na qual o Autor teve provimento, a matéria de facto que, com relevo para estes autos, foi modificada e fixada pelo Tribunal da Relação foi a seguinte:
“2. O A. entrou ao serviço da R. em ..-01-1986.
3. Ao A. foi instaurado processo disciplinar, com vista ao respetivo despedimento com justa causa, em consequência de relatório de auditoria interna terem sido indicados factos suscetíveis de constituírem justa causa de despedimento.
4. O A. respondeu à nota de culpa, pugnando pelo arquivamento do processo e requerendo diligências que foram realizadas.
5. O A auferia a retribuição mensal base de €2.275,82.
(…)
17. O A. utilizou fundos da R., através do levantamento de valores em numerário no caixa da delegação, mediante “vales de caixa” que, posteriormente, eram regularizados com a apresentação dos documentos de recebimento por conta de despesas de viagem e, uma vez, através do valor do resgate parcial da sua apólice n.º 69/005306 (…). (…)
28. No dia 08-05-2009 a R. suspendeu o A. do exercício de funções.
29. O A. foi notificado da nota de culpa em 25-06-2009.
30. O A. esteve privado de ocupar o seu posto de trabalho e causou ao mesmo e à sua família grande instabilidade emocional, angústias e arrelias.
31. No dia em que o A. foi suspenso de funções pela R., esta retirou-lhe o computador sem lhe conceder qualquer prazo para que o mesmo pudesse retirar quaisquer elementos de natureza profissional ou pessoal.
32. A delegação de Vila Real foi anualmente auditada, tendo sido objeto de outras auditorias nos anos anteriores.
33. Os serviços centrais da R. têm acesso diário aos movimentos do caixa, seja através da consulta da aplicação informática existente na empresa, seja porque no dia seguinte parte da documentação e suporte físico é enviada através do correio para a sede da R.
34. O A. desempenhava as funções de chefe de serviços da R., na delegação de Vila Real, onde trabalhavam os funcionários P. C., J. C. e R. P., respetivamente, com as categorias profissionais de gestor de negócios e de escriturários.
(…)
36. Em 2002 a R. criou uma conta para realizar o pagamento das despesas de deslocação e representação dos seus trabalhadores ao serviço da primeira, apelidando-a de “conta de viagens”.
37. Para o efeito a R. criou um formulário nele estando inscrita a possibilidade de pagamentos em numerário ou em cheque.
38. O A. sempre manifestou uma conduta cumpridora ao serviço da R.
39. O A. recebia com regularidade anual, no final do mês de maio, um prémio de produtividade no valor de €8.000,00 quantia que em 2009 não recebeu.
40. No ano de 2009 o A. não gozou as férias vencidas no dia 1 de janeiro desse ano, nem recebeu o correspondente subsídio de férias.
41. Os factos acima descritos no ponto 28 supra determinaram uma situação de stress emocional ao A. que perdeu peso de forma manifesta.
42. O A. foi despedido por decisão proferida em 15-12-2009, recebida em 04-01-2010.
36- Outra das questões levantadas, em que o Tribunal da Relação concedeu provimento, foi a 8.ª questão – prémio de produtividade, tendo aquele Venerando Tribunal decidido o seguinte (fls. 202 v e 203):
“Provou-se que o Autor recebia com regularidade anual, no final do mês de maio, um prémio de produtividade no valor de € 8.000,00, quantia que em 2009 não recebeu.
A sentença considerou ser compreensível a omissão de pagamento dada a instauração do procedimento disciplinar, não fazendo parte da remuneração do A. E estando na livre disposição da R. atribuí-lo ou não. O poder disciplinar, sendo um poder punitivo, está sujeito à regra da proporcionalidade entre a culpa e a sanção (art.º 330.º/1 do CT), bem como sujeito aos princípios “ne bis in idem” (art.º 330/1 do CT), igualdade (por força do art.º13.º da CRP), tipicidade e taxatividade das sanções (art.º 328.º do CT).
De tudo decorre que a sujeição do trabalhador a um procedimento disciplinar não implica senão a submissão a alguma das sanções disciplinares legalmente previstas. Nunca a existência do procedimento pode condicionar a atribuição de alguma parcela remuneratória. Donde, não é por eventualmente ter sido alvo de um procedimento ou mesmo sancionado que pode o trabalhador ver-se privado de uma componente salarial.
A atribuição do prémio de produtividade depende exclusivamente da circunstância de se verificarem as condicionantes previamente estabelecidas para a mesma.
Ora, não decorrem dos autos (designadamente da reconvenção e da resposta) nem as concretas condições de atribuição do prémio, nem o incumprimento de alguma delas por parte do A.
Nestas circunstâncias, em presença da factualidade provada, e cabendo à R. o ónus de alegação e prova do cumprimento ou de algum fator impeditivo da atribuição, não resta senão concluir que é devida a quantia de €8.000,00 relativa ao mencionado prémio.”.
37- Quanto à 9.ª e última questão – licitude ou ilicitude do despedimento - levantada pelo Autor na sua alegação/conclusão, considerada procedente pelo Tribunal da Relação, foi decidido julgar o despedimento ilícito, com as seguintes consequências, assinaladas no acórdão:
“A ilicitude do despedimento tem como consequência a condenação do empregador em indemnização por todos os danos causados, na reintegração e em compensação salarial (salários intercalares) (art.º 389.º e 390º).
A reintegração pode ser substituída por indemnização de antiguidade nos termos do disposto no art.º 391.º do CT ou quando, nos termos do art.º 392.º do CT, o empregador a pretenda excluir.
O reconvinte reclama indemnização em substituição da reintegração, no valor de €139.280,19, o salário devido desde a data do despedimento até à data de entrada em juízo da contestação e indemnização por danos morais no valor de €5.000,00.
Auferia €2.275,82 por mês. Fora admitido ao serviço em 01-01-86 e o contrato cessou, por despedimento, em 04-01-2010.
(…)
Considerando estas variantes – elevada retribuição mensal e ilicitude diminuta – entendemos por bem fixar a indemnização substitutiva à razão de 20 dias por cada ano de antiguidade ou fração.
Deste modo, é devida a quantia de € 36.413,12.
A este valor acresce o salário reclamado.
(…)
Resumindo, o A. tem direito ao montante de €46.949,12.
Sobre esta quantia incidem juros de mora, à taxa legal de 4% desde a notificação da reconvenção até efetivo e integral pagamento.”
38- Inconformados com esta decisão, quer o Autor quer a Ré, naqueles autos de impugnação de despedimento, apresentaram recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo este Supremo Tribunal proferido acórdão em 12-05-2016, negando as revistas e mantendo integralmente a decisão recorrida.
39- Nesse recurso de revista, o Autor, por intermédio do seu mandatário, o ora Réu F. M., rematou a sua alegação com as conclusões que estão transcritas no referido acórdão, de fls. 213 a 218, e que aqui, por razões de brevidade e economia processual, se dão por integralmente reproduzidas.
40- Nessas conclusões, o 2º Réu abordou pela primeira vez desde que assumiu a relação contratual de mandato com o Autor, na 9.ª questão levantada nesse recurso (em27.ª conclusão - fls. 217), a questão dos créditos laborais respeitantes às retribuições vincendas, devidas ao Autor desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença, apresentando a seguinte alegação quanto à matéria:
“Dos créditos laborais:
Como supra, referido deve ser aplicada a convenção coletiva de trabalho celebrada entre a APS – Associação Portuguesa de Seguradores e os Sindicatos da Atividade Seguradora, Publicado no BTE, 1.ª série, n.º 32 de 29-08-2008.
25. Está dado como provado que o aqui Recorrente auferia a retribuição salarial mensal base de €2.275,82.
26. Assim, nos termos da alínea b) do artigo 381.º, do n.º 1 do artigo 382.º, conjugado com os n.ºs 1 e 2 do artigo 329.º e 391.º do CT e em conformidade com o disposto na Cláusula 75.ª da CCT aplicável, supra identificada, devia o trabalhador ter fixado a indemnização, em substituição da reintegração, em 45 dias de retribuição base, e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, acrescido de 70%(€2.275,82 x 24 anos x 1,5 x 70%), pelo que o aqui recorrente tem direito a uma indemnização de €139.280,19.
27. O Tribunal da Relação de Guimarães devia ter condenado a recorrida a pagar a quantia correspondente às retribuições que o Autor deixou de auferir desde a data do despedimento e o trânsito em julgado da sentença nos termos do art.º 390.º-1, e n.º 2, alínea b) do CT, a título de compensação, sem prejuízo das deduções previstas no n.º 2, alíneas a) e c) do mesmo preceito legal, a liquidar em execução de sentença, que neste momento se cifram em cerca de €150.204,12 (€2.275,82 x 66 meses)”.
41- A revista foi negada, sendo que, quanto à questão das retribuições vincendas que o Autor tinha direito a receber desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença, o Supremo Tribunal decidiu o seguinte:
“Sustenta o trabalhador que o Tribunal da Relação devia ter condenado a recorrida a pagar a quantia correspondente às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento e o trânsito em julgado da sentença, nos termos do artigo 390.º, n.º 1, e n.º 2 da alínea b), do Código do Trabalho, sem prejuízo das deduções previstas no n.º 2, alíneas a) e c), do mesmo preceito legal, tudo a liquidar em execução de sentença.
Não tem razão, pois não o pediu no seu articulado.
Efetivamente, e conforme se colhe de fls. 126 dos autos, este apenas pediu que a R. fosse condenada no pagamento da indemnização de antiguidade, tendo omitido o pagamento das retribuições vencidas e vincendas até ao trânsito em julgado da decisão final.
Por outro lado, estando-se perante uma situação em que terminou o estado de subordinação e dependência do trabalhador, os direitos resultantes do despedimento são disponíveis, pelo que não é aplicável a disciplina do artigo 75.º do CPT, pois não estamos perante a aplicação de normas inderrogáveis de leis ou provenientes de instrumentos de regulamentação coletiva.
Improcede assim a revista do Autor nesta parte.”.
42- Nem a Ré M. J., nem o Réu F. M. peticionaram para o Autor o crédito laboral relativo às retribuições vincendas desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença.
43- Entre o Autor e a Ré M. J., as relações sempre se pautaram por grande cortesia, correção e respeito mútuos, sendo que o Autor sempre confiou no profissionalismo da Ré e, por essa razão, confiou-lhe a proteção dos seus interesses na relação de mandato entre ambos celebrada.
44- O Autor transmitiu à Ré toda a informação necessária para a elaboração da resposta à nota de culpa, bem como, depois, para a impugnação judicial do despedimento, entregou-lhe toda a documentação relacionada com o assunto, desde o contrato celebrado com a sua empregadora bem como os recibos de vencimento, e-mails trocados, e demais documentos que lhe foram solicitados e que eram pertinentes para a ação.
45- A 1ª Ré questionou o Autor sobre se queria optar pela indemnização de antiguidade ou pela reintegração no seu posto de trabalho, tendo o Autor respondido que optava pela indemnização, pois não queira ir trabalhar para um sítio onde não era bem-vindo.
46- O Réu F. M. aceitou estabelecer com o Autor a relação de mandato, e obrigou-se perante o mesmo a, daí em diante, tratar com zelo, empenho e competência do seu assunto.
47- O Autor foi despedido em 04-01-2010 e a sentença transitou em julgado em 03-06-2016.
48- O Autor auferia um vencimento mensal base no valor de € 2.275,82, acrescido, caso se verificassem as condições fixadas, de um prémio de desempenho anual no valor de€ 8.000,00.
49- O autor teria direito, desde 27-05-2010 até 03-06-2016, a retribuições, no valor mensal de € 2.275,82.
50- Foram celebrados entre a Ordem dos Advogados de Portugal e a Ré Y Insurance Company (Europe), Lda., dois contratos de seguro, referentes a responsabilidade civil profissional, para o ano de 2011, a que foram atribuídos, os números de apólice n.º .........C e n.º ........./C, que se encontravam vigentes, pelo menos, desde 01/01/2011 até 31-12-2011, relativa à atividade profissional dos advogados, sendo segurados todos os membros da Ordem dos Advogados de Portugal, com a inscrição em vigor.
51- O período de seguro acordado foi de 12 meses.
52- O limite de indemnização por sinistro por segurado é de, pelo menos, €150.000,00, sendo fixada eventualmente uma franquia de € 5.000,00 que pode ser inferior ou até dispensada no caso de se aumentar o capital segurado.
53- Entre a Ordem dos Advogados de Portugal e a Ré X Insurance Company SE, Sucursal em Espanha, foi celebrado um contrato de seguro, referente a responsabilidade civil profissional, para o ano de 2018, a que foi atribuída, a apólice n.º ES00013615EOA18A, que se encontra vigente desde 01/01/2018 e permaneceu em vigor até 01-01-2019, relativa à atividade profissional dos advogados, sendo segurados todos os Advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados que exerçam a atividade em prática individual ou societária, por dolo, erro, omissão ou negligência profissional.
54- O limite de indemnização por sinistro é de € 150.000,00.
55- O Réu F. M. assumiu o mandato com o Autor, por substabelecimento, no dia 4 de novembro de 2011.
56- Nunca se colocou a questão de ser pedida a alteração/aditamento do pedido pelo 2.º Réu, pois nunca lhe foi pedido, referido ou comentado os termos da petição inicial, mormente o pedido nela formulado, ou os termos em que tal foi acordado com a anterior mandatária, quer antes, quer durante, quer depois das sessões de julgamento.
57- O Réu F. M. recebeu o processo e assumiu o mandato depois dos articulados e quando já estava saneado (despacho saneador de 9/09/2010); quando já tinham sido designadas duas audiências de julgamento (23/11/2010 e 03/05/2011; e teve a1ª intervenção na 3ª marcação da audiência julgamento (datada de 14/11/2011), para acompanhar o processo a partir dessa data.
58- Nunca os termos do pedido ou da causa de pedir foram discutidos entre Autor e o Réu, ou sequer equacionada a sua falta, a sua alteração ou o que quer que fosse.
59- Aquando da sua inscrição como Advogado, a Ordem dos Advogados, disponibiliza ex officio, a cada um dos seus membros, um seguro de responsabilidade civil profissional, de modo a cumprir a correspondente obrigação estatutária.
60- O facto de qualquer advogado beneficiar, de modo automático, deste seguro de responsabilidade civil profissional por parte da AO, não o impede de contratar outro seguro, com outra seguradora, ou ainda reforçar o capital mínimo indemnizatório, mediante a respetiva apólice individual reforço.
61- O Réu F. M., no âmbito da sua atividade profissional, é titular do seguro de responsabilidade civil com a apólice n.º …………-3502, celebrado com a N PORTUGAL – Corretores de Seguros, S.A. como Mediador, com sede na Avenida … LISBOA, que contratou o seguro com a Ré X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal en España.
62- Com um limite máximo de responsabilidade no valor de 100.000€.
63- Ao abrigo do qual transferiu para aquela companhia de seguros a responsabilidade emergente da sua profissão, bem como eliminou o valor da franquia constante da apólice e da apólice de grupo infra referida.
64- Da mesma forma, a Ordem dos Advogados, na qualidade de tomador do seguro, celebrou com a Seguradora X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal em Espanha, o Seguro de Grupo de Responsabilidade Civil Profissional dos Advogados, figurando a Corretora de Seguros N PORTUGAL – Corretores de Seguros, S.A. como mediador, com sede na Avenida … LISBOA, o qual transferiu para aquela companhia de seguros, aqui Ré, a responsabilidade civil emergente da atividade profissional de todos os Advogados, o aqui Réu incluído, com a Apólice n.º ............18A.
65- Com um limite máximo de responsabilidade no valor de 150.000€.
66- O Autor participou ativamente na estratégia processual.
67- O Autor, no final do processo, muito agradeceu ao Réu o desfecho da lide, tendo ficado satisfeito com a atribuição e receção da indemnização, que nunca esperou, e que classificou de sucesso.
68- Referiu ter sido um êxito conseguir uma indemnização tão avultada por parte da seguradora sua entidade patronal, quando mais nenhum dos seus colegas que também foram despedidos, não o lograram e ainda foram alvo de um inquérito crime.
69- Razão pela qual ainda mais agradecido ficou ao Réu, liquidando parcialmente a conta de honorários, no valor de 12.500,00 €.
70- O Autor ativamente impunha a sua visão, verificando o teor das peças que lhe eram remetidas pelo Réu F. M., e que controlava previamente antes de serem enviadas para o Tribunal, que alegava estar a ser aconselhado pelos conhecimentos de juízes, que eram seus amigos, e que apreciavam o desenrolar do processo
71- O Autor sempre exerceu uma atividade profissional lucrativa.
72- Durante o período em que decorreu o processo nos Tribunais, superior a 6 anos, o Autor trabalhou como mediador e agente de seguros para diversas companhias de seguros.
73- Explorando uma agência de seguros em conjunto com os seus sócios, denominada K – MEDIAÇÃO DE SEGUROS, LDA., NIPC ………, com sede na Rua … Vila Real.
74- Sendo que o Autor era e é agente ou mediador de seguros, quer diretamente, quer através da referida sociedade, de pelo menos as seguintes companhias:
1. W, S.A., com sede na Rua … Lisboa.
2. Companhia de Seguros AL., Portugal S.A., com sede na Rua … Lisboa.
3. L. Seguros, S.A., com sede na Rua … Lisboa.
75- O Autor não requereu o subsídio de desemprego ou o RSI durante todo esse período de mais de 6 anos de decurso do processo, e não se inscreveu no Centro do Emprego e Formação Profissional na qualidade de desempregado.
76- Foram adiadas duas audiências de julgamento (23/11/2010 e 03/05/2011, em virtude de impossibilidade do tribunal.
77- Foram tomadas decisões judiciais, que depois foram alteradas, tais como as duas sentenças proferidas pela 1.ª instância.
78- Foi decidido quem era o Tribunal da Relação competente para apreciar o recurso, tendo sido necessário dirimir um conflito de competência.
79- O processo 44//10.4TTVRL era um processo urgente, mas que demorou cerca de 6 anos e meio a ter uma decisão definitiva.
80- Como consta da movimentação processual do referido processo 44//10.4TTVRL:
1- Foi proferido saneador em 14/09/2010;
2- Foi agendado julgamento para o dia 23-11-2010 às 09:45 horas, e notificadas as testemunhas e partes;
3- Decorreram mais de 9 meses até que o tribunal agendasse nova data;
4- Foi agendado julgamento para o dia 03-05-2011, às 09:45 horas, que foi adiado por impossibilidade do tribunal;
5- Decorreram mais 6 meses até ao conhecimento de nova data de julgamento;
6- Foi agendado julgamento para dia 14/11/2011;
7- Foi dada a resposta à matéria de facto em 28/02/2012;
8- Decorreram mais 7 meses até ser proferida sentença;
9- A sentença de 04/09/2012 foi alterada pelo Tribunal da Relação;
10- Decorreram mais 20 meses até nova sentença de 1ª instância;
11- A sentença da 1.ª Instância foi proferida em 07/05/2014;
12- O processo em recurso chegou à Relação de Guimarães em 05/01/2015;
13- Decorreram mais 9 meses para determinar qual o Tribunal da Relação competente;
14- Após o que foi proferido acórdão do Tribunal da Relação, recurso para o STJ, e decisão final em maio de 2016.
81- O Réu F. M. manteve o Autor sempre informado de todos os desenvolvimentos ocorridos ao longo de todo o processo em apreço.
82- O Réu atuou, ao longo de todo o referido período em que representou o Autor, no estrito cumprimento das instruções do seu mandante, aqui Autor, e tendo em conta todas as informações e elementos por estes transmitidos.
83- O Réu não falou com o Autor em junho de 2011, apenas se tendo encontrado em novembro desse ano, altura em que o Réu aceitou representar o Autor, e este aceitou ser representado pelo Réu.
84- O substabelecimento está datado de 30/06/2011, porquanto foi o último dia de inscrição em vigor na OA por parte da Ré M. J..
85- A 1ª Ré, nesse ano de 2011, entregou 4 processos ao Réu, à medida que eram marcadas diligências judiciais, sendo que marcava reunião com os clientes para ver se aceitavam ou não passarem a ser representados pelo Réu, se estes aceitassem (como foi nesses 4 processos), a 1.ª Ré entregava então o substabelecimento ao Réu, que o juntava ao processo.
86- Todos, os substabelecimentos estavam datados de 30/06/2011, em virtude de ser o último dia de inscrição em vigor da 1ª Ré na OA, mas não corresponde ao dia em que o último dia de inscrição em vigor da 1ª Ré na OA, mas não corresponde ao dia em que foram entregues ao aqui Réu, e muito menos ao dia em que os clientes aceitaram ser representados pelo Réu, e este os aceitou representar.
87- No caso do Autor, uma vez que estava marcada, pela 3ª vez, para o dia 14 de novembro de 2011, a audiência de julgamento, foi agendada reunião com o Autor para o dia4 de novembro, uma sexta-feira, data em que o Réu F. M. aceitou representar o Autor, e este aceitou ser representado por aquele.
88- E foi agendada e realizada numa sexta-feira, pelo facto de, segundo a organização da agenda que o Réu mantém há vários anos, ser esse o dia da semana que o Réu
89- E, na sequência da aceitação desse mandato, o Réu iniciou a preparação do julgamento logo nesse fim-de-semana, tendo inclusive nesse domingo juntado o substabelecimento aos autos, ou seja, no dia 6 de novembro de 2011.
90- O Réu trabalhou, desde dezembro de 2011 até ao final de maio de 2016, com o seu colega Dr. J. S., como é público e notório, com escritório na Rua ..., em Vila Pouca de Aguiar.
91- No seguimento do acórdão do Tribunal da Relação, foram pela 1ª vez falados os termos da condenação, dado que até a esse momento não se tinha colocado qualquer questão, uma vez que ação tinha sido sempre julgada improcedente.
92- Foi analisado esse acórdão de 22/10/2015 em conjunto pelo Autor e o Réu e foi visto o voto de vencido.
93- Os termos do pedido foram acordados entre o Autor e a Ré M. J..
94- Nunca o Autor questionou o Réu F. M. sobre os termos do pedido, nem nunca falaram sobre os créditos laborais reclamados, sendo falso que tivesse existido qualquer pedido por parte do aqui Autor sobre o aditamento de qualquer pedido, ou qualquer conversa onde isso tivesse sido falado ou aflorado.
95- O Autor recebeu todas as peças processuais elaboradas pelo Réu F. M. no decurso do processo, que lhe eram enviadas por e-mail, para que o Autor as analisasse e desse a sua concordância, e durante todos esses anos de 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016 e 2017 nada disse.
96- O Autor recebeu o acórdão da Relação em 2015, com a condenação e os termos da mesma, e nada disse sobre qualquer pedido, sendo que manteve o mandato.
97- Depois, o Autor recebeu o acórdão do STJ em 2016, com a sua confirmação, e nada disse sobre qualquer pedido.
98- Após, no final do processo, muito agradeceu ao Réu o desfecho do processo, que nunca esperou, liquidando parcialmente a conta de honorários, num valor de 12.500,00€.
99- E desde essa altura, andou mais de 2 anos, de maio de 2016 até final de julho 2018, para intentar uma ação com a alegada e tão clamorosa falha do Réu.
100- O Autor trabalhou toda a vida na atividade dos seguros, grande parte do tempo exercendo funções de chefia.
101- O Réu encontrava-se com o Autor por diversas vezes no seu local de trabalho, a referida agência de seguros.
102- Desde a data do seu despedimento, no ano de 2009, até ao ano de 2018, o Autor Manuel Magalhães trabalhou nas instalações da K – Mediação de Seguros Lda., sociedade por quotas, com sede em Vila Real.
103- Aquando da sua saída da W, o Autor, em conjunto com J. T. e Manuel, decidiu explorar, em conjunto, as carteiras de clientes que possuíam, formando uma sociedade para o efeito.
104- Nessa altura, estas três pessoas decidiram que a empresa seria dividida entre os três sócios, em três partes iguais.
105- No entanto, a sociedade apenas ficou registada em nome dos sócios Manuel e J. T., sendo que o Autor, apesar de ser sócio de pleno direito, não figurava com o seu nome na sociedade, o que foi feito a pedido do Autor, porque iria impugnar o despedimento da W.
106- Os sócios da K, J. T. e o Autor, continuaram a receber rendimentos ao longo dos vários anos, até à venda das quotas da sociedade, no ano de2018.
107- Em fevereiro de 2018, o autor vendeu a carteira de clientes, que era o ativo mais valioso da sociedade K – Mediação de Seguros Lda., tendo cedido, juntamente com o seu sócio J. T., todas as quotas que possuíam na referida sociedade
108- Em 17 de setembro de 2015, o autor adquiriu a quota na sociedade, do sócio Manuel.
109- E, nessa data, assumiu também a gerência dessa sociedade (também de direito, pois já tinha a de facto), sendo que auferiu salário da mesma.
110- Ao comprar a quota a Manuel atribuiu à compra o valor de 2.500,00 €, mas cujo valor era muito superior.
111- Em fevereiro de 2018, o Autor vendeu à sociedade C – Corretora de Seguros, Lda., a sua quota, a que atribuíram o valor de 5.000,00 €, no entanto, o valor da venda foi muito superior.
112- Até 31 de Dezembro de 2011, a Ré Y Insurance Company (Europe), Lda. assumiu, perante o Tomador de Seguro (Ordem dos Advogados), a cobertura dos riscos inerentes ao exercício da atividade profissional desenvolvida pelos seus segurados (advogados com inscrição em vigor), garantindo, nos termos expressamente definidos nas condições especiais do contrato, o eventual pagamento de indemnizações resultantes da responsabilização civil dos seus segurados, em decorrência de erros e/ou omissões profissionais incorridas no exercício da sua atividade.
113- Encontravam-se abrangidos pelo referido contrato de seguro, todos os advogados com inscrição em vigor (cédula profissional passada pela Ordem, válida e não suspensa), os quais, na qualidade de segurados, beneficiam automaticamente das coberturas previstas pela correspondente Apólice.
114- - Deste modo, e nos termos previstos no n.º 3 do artigo 99.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (na versão fixada pela Lei n.º 15/2005 de 26 de janeiro, cuja disposição veio limitar a responsabilidade civil profissional dos advogados, quando esta se funde em mera culpa, ao montante de € 250.000,00, atualmente fixado pelo Conselho Geral), todos os advogados portugueses não suspensos beneficiavam do seguro de grupo contratado pela Ordem, cujo capital mínimo deverá ascender aos € 50.000,00.
115- Com base nesta disposição, a Ordem dos Advogados vinculou-se ao dever legal de manter em vigor um seguro de responsabilidade civil profissional, que garanta o efetivo pagamento de indemnizações, decorrentes de erros e/ou omissões profissionais dos seus membros (advogados com inscrição em vigor), cujo limite mínimo se fixou em € 50.000,00.
116- Trata-se de um seguro com período de vigência de 12 meses, automaticamente renováveis (por um ano e seguintes), pelo que se estabeleceu que, anualmente, seria determinado nas condições particulares da apólice, o limite máximo de indemnização assegurado pela Seguradora para cada “período de seguro” (definição prevista no artigo 1.º, n.º 7 das Condições Especiais), o qual, entretanto nunca poderia ser inferior aos €50.000,00.
117- Tendo, nas Apólices ........./C e .........C, sido estabelecida como data de inicio do período seguro 01 de janeiro de 2011 e data de vencimento 31 de dezembro de 2011, sendo os limites indemnizatórios máximos contratados para o seu período de vigência/ “período seguro” (de 01 de janeiro a 31 de dezembro de 2011) fixados em € 50.000,00 e € 100.000,00, respetivamente.
118- Encontrando-se em tal período os então segurados, ora Réus, na qualidade de advogados com inscrição em vigor, efetivamente abrangidos pelas coberturas previstas nas referidas apólices.
119- Em 31 de dezembro de 2011, as supra, referidas apólices chegaram ao seu termo, tendo a Ordem dos Advogados, celebrado novo contrato de seguro com a congénere Companhia de Seguros T. S.A., com o número de apólice .....9.
120- Em tal apólice foi aposta a data de início de 1 de janeiro de 2012 e data de termo31 de dezembro de 2012.
121- Nos termos da cláusula da 4.ª das Condições Especiais quer da apólice ........./C quer da apólice .........C, estas serão exclusivamente competentes “para as reclamações que sejam pela primeira vez apresentadas i) contra o segurado e notificadas à seguradora, ou ii) contra a seguradora em exercício da ação direta, durante o período de seguro, ou durante o período de ocaso”, revestindo assim tais apólices, a natureza de apólices “claims made”, correspondendo assim a data do sinistro, à data da reclamação.
122- Sendo estabelecido no artigo 5.º das condições especiais das supra, referidas apólices que “o período de ocaso não poderá ser contratado ou será nulo, se: Durante o dito período, a presente apólice se renove e/ou seja substituída por outra que abranja o mesmo risco coberto por esta”.
123- Estabelecendo a apólice .....9, relativa ao contrato de Seguro celebrado entre a Ordem dos Advogados Portugueses e a congénere Companhia de Seguros T. S.A., igual limitação, no seu artigo 4.º “esta apólice será competente exclusivamente para as reclamações que sejam pela primeira vez apresentadas i) contra o segurado e notificadas à seguradora, ou ii) contra a seguradora em exercício da ação direta, durante o período de seguro, ou durante o período de descoberto, resultantes de erro, omissão ou negligência cometidos pelo segurado após a data retroativa.”
124- Abrangendo o contrato de seguro celebrado com a congénere Companhia de Seguros T. S.A., as coberturas comtempladas pelas apólices números ........./C e .........C, cessou na data de contratação daquele seguro (01 de janeiro de 2012), o período de Ocaso previsto nestas apólices.
125- Nos termos expressamente previstos nas Condições Particulares das referidas Apólices de Seguro, o capital indemnizatório máximo garantido para o “período seguro” pretensamente em causa, ascende ao montante total de € 150.000,00.
126- Sendo a esta quantia, deduzidas as correspondentes franquias contratuais aplicáveis, igualmente previstas nas Condições Particulares da Apólice de Seguro principal(........./C), cujo valor ascenderá aos € 5.000,00 (por cada sinistro/segurado) e “será
sempre suportado pelo SEGURADO, sendo o mesmo dedutível ao valor de indemnização que à SEGURADORA couber pagar, quer por decisão judicial, quer por acordo extrajudicial.
127- Foi na qualidade de corretor de seguros que a N Portugal – Corretores de Seguros, S. A. interveio na celebração do contrato de seguro celebrado entre a Ordem dos advogados e a Ré X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal en España,
128- Entre a Ré X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal en España, e a Ordem dos Advogados foi celebrado um contrato de seguro de grupo, temporário, anual, do Ramo de responsabilidade civil, titulado pela Apólice n.º ............18A.
129- Através do referido Contrato de Seguro, a Ré X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal en España, segura a «Responsabilidade Civil Profissional decorrente do exercício da advocacia, com um limite de 150.000,00 € por sinistro (…)», entre outros riscos.
130- O Contrato de Seguro referido foi celebrado pelo prazo de 12 meses, com data de início às 0:00 horas do dia 1 de janeiro de 2018 e termo às 0:00 horas do dia 1 de janeiro de 2019 (ponto 10 das “Condições Particulares do Seguro de Responsabilidade Civil”).
131- Através do Contrato de Seguro contratado junto da Ré X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal en España, foi, ainda, acordada a franquia de € 5.000,00 por sinistro (ponto 9 das “Condições Particulares do Seguro de Responsabilidade Civil).
132- No caso dos autos, apenas o Réu F. M. contratou junto da Ré X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal en España, apólice de reforço, com o capital de €100.000,00 e eliminação da franquia acordada através do contrato de seguro titulado pela apólice n.º ............18A, com início no dia 01.01.2018.
133- À data da celebração do contrato de seguro com a Ré X INSURANCE COMPANY SE, Sucursal en España, a ré M. J. tinha sua inscrição junto da Ordem dos advogados suspensa.
134- Os contratos de seguro celebrados com a Ré X, preveem no ponto 7 (“ÂMBITO TEMPORAL”) das respetivas Condições Particulares o seguinte:
“O Segurador assume a cobertura da responsabilidade do segurado por todos os sinistros reclamados pela primeira vez contra o segurado ou contra o tomador do seguro ocorridos na vigência das apólices anteriores, desde que participados após o início da vigência da presente apólice, sempre e quando as reclamações tenham fundamento em dolo, erro, omissão ou negligência profissional coberta pela presente apólice, e mesmo ainda, que tenham sido cometidos pelo segurado antes da data de efeito da entrada em vigor da presente apólice e sem qualquer limitação temporal da retroatividade.”
135- Mais resulta que:
“Para os fins supra indicados, entende-se por reclamação a primeira das seguintes comunicações:
a) Notificação oficial por parte do sinistrado, do tomador do seguro ou do segurado, ao segurador, da intenção de reclamar ou de interposição de qualquer ação perante os tribunais;
b) Notificação oficial do tomador do seguro ou do segurado, ao segurador, de uma reclamação administrativa ou investigação oficial, com origem ou fundamento em dolo, erro, omissão ou negligência profissional, que haja produzido um dano indemnizável à luz da apólice;
c) Por outra via, entende-se por reclamação, qualquer facto ou circunstância concreta, conhecida prima facie pelo tomador do seguro ou segurado, da qual resulte notificação oficial ao segurador, que possa razoavelmente determinar ulterior formulação de um pedido de ressarcimento ou acionar as coberturas da apólice.” – ponto 7 das “Condições Particulares”
136- Consta do Artigo 4.º da “Condição Especial de Responsabilidade Civil Profissional” do contrato: «É expressamente aceite pelo tomador do seguro e pelos segurados que a presente apólice será competente exclusivamente para as reclamações que sejam apresentadas pela primeira vez no âmbito da presente apólice:
a) Contra o Segurado e notificadas ao segurador; ou
b) Contra o segurador em exercício de ação direta;
c) Durante o período de seguro, ou durante o período de descoberto, resultantes de dolo, erro, omissão ou negligência profissional cometidos pelo segurado após a data retroativa.»,
137- Acresce que, consta do mesmo contrato de seguro que, “Ficam expressamente excluídas da cobertura da presente apólice, as reclamações:
a) Por qualquer facto ou circunstância conhecidos do segurado, à data do início do período de seguro, e que já tenha gerado, ou possa razoavelmente vir a gerar, reclamação;
(…)”, - artigo 3.º da “Condição Especial de Responsabilidade Civil Profissional”.
138- E, ainda, que “O segurado, nos termos definidos no ponto 1. do artigo 8.º desta Condição Especial, deverá comunicar ao corretor ou ao segurador, com a maior brevidade possível, o conhecimento de qualquer reclamação efetuada contra ele ou de qualquer outro facto ou incidente que possa vir a dar lugar a uma reclamação.”
139- Comunicação essa que, “(…) dirigida ao corretor ou ao segurador ou seus representantes (…)”, deverá chegar ao conhecimento do segurador no prazo máximo e improrrogável de 8 dias. – artigo 10.º, n.º 2 da “Condição Especial de Responsabilidade Civil Profissional”.
140- No caso dos autos, os factos imputados aos Réus, ocorreram nos anos de 2010 e 2011.
141- Quando o Autor se reuniu com a Ré M. J. com vista a habilitá-la à elaboração da contestação/reconvenção junta aos autos, abordaram todas as pertinentes questões, nomeadamente os seus potenciais direitos.
142- O Autor apresentou-se sempre como um individuo perfeitamente esclarecido sobre todas as questões que a sua situação, o seu processo disciplinar/despedimento e o seu processo judicial suscitavam.
143- O Autor sempre se vangloriou de ter grandes e bons conhecimentos, que conhecia e tinha confiança com um Senhor Juiz que o aconselhava, acompanhava o seu processo e a quem entregava cópias das peças, que se dava muito bem com o Senhor Advogado, especialista em Direito do Trabalho.
144- Antes da Ré M. J. dar entrada judicial da contestação/reconvenção, o Autor, à semelhança do que já tinha feito no processo disciplinar, solicitou-lhe uma cópia do articulado.
145- E, volvidos 2, 3 dias aproximadamente, e só depois de o Autor ter anuído, é que a Ré deu entrada judicial da contestação/reconvenção.
146- Quando questionado pela ré M. J. se já tinha tratado do subsídio de desemprego, o Autor respondeu que não, e que nem iria tratar, pois já tinha «projetos» que lhe iriam garantir rendimentos.
147- Não tendo concretizado esses «projetos», a Ré informou o Autor – o que ele já sabia, como referiu -, que, na parte dos ordenados que se fossem vencendo na pendência do processo, o Autor teria, mais tarde ou mais cedo, de fazer um encontro de contas, pois a sua entidade patronal não iria deixar de o requerer.
148- Nessa mesma altura, o Autor referiu expressamente à Ré M. J., que não pretendia reclamar aquelas retribuições pois não desejava que a W viesse “vasculhar a sua vida, os seus rendimentos, não querendo nada com o fisco”.
149- No seguimento, a Ré esclareceu o Autor que, não obstante, iria reclamar, pelo menos, os vencimentos desde o despedimento até à data da entrada em juízo da contestação/reconvenção dado que ainda não estava a receber quaisquer rendimentos.
150- O Autor, nos contactos que manteve com a Ré, sempre se apresentou como um individuo muito seguro, atento e firme naquilo que eram as suas pretensões, no que fazia e dizia.
151- O Autor acompanhou de perto e com interesse, tudo o que respeitava ao seu processo, sendo constantes as solicitações dirigidas à Ré, reuniões, que se realizaram para preparação e estudo de estratégias processuais, mails, etc.
152- Ao longo do período temporal em que a Ré prestou os seus serviços para o Autor, nunca este lhe manifestou qualquer desagrado, por mais pequeno que fosse, algum descontentamento com o cuidado e qualidade do trabalho desenvolvido.
153- Uma das últimas vezes que a Ré se cruzou com o Autor, foi por altura em que o mesmo tinha tido conhecimento da decisão do STJ, tendo, então, se manifestado muito mesmo tinha tido conhecimento da decisão do STJ, tendo, então, se manifestado muito ambos os Réus.
154- Foi o próprio Autor que deu instruções à Ré para não reclamar o pagamento dos créditos em causa.
155- A mandatária do autor enviou ao réu F. M., em 25 de maio de 2018, por carta registada, comunicação formal a anunciar a intenção do autor intentar ação de responsabilidade civil, bem como a aceitação do patrocínio, nos termos do artigo 96.º do
responsabilidade civil, bem como a aceitação do patrocínio, nos termos do artigo 96.º do EOA.
156- Após a receção por parte do réu F. M., daquela carta, em 28-05-2018, o réu falou com o autor sobre o assunto, procurando o autor chegar a um entendimento com o réu, sendo que não foi possível as partes chegarem a acordo.
157- O autor é pessoa humilde, civilizada e educada.
158- Sempre tratou o réu, como todas as pessoas, com educação e elevação.
159- O Réu F. M., nos termos definidos no ponto 1. do artigo 8.º da Condição Especial, comunicou ao corretor ou ao segurador, com a maior brevidade possível, o conhecimento da reclamação efetuada contra ele.
160- Documentos de que a Ré X tem conhecimento e lhe foram enviados.
161- Os serviços da Ré X receberam a referida comunicação, bem como a corretora N.
162- A X respondeu ao Réu, via e-mail, solicitando diversas informações, a que o Réu respondeu de forma solícita, prestando total colaboração.”

14. Se os réus/apelados violaram o contrato de mandato forense ao não peticionarem, a 1ª ré, os salários vincendos entre o despedimento e o trânsito em julgado da sentença, e o 2º réu por não ter ampliado o pedido até ao encerramento da discussão em 1ª instância no que concerne aos salários vincendos desde o despedimento e o trânsito em julgado da sentença.
15. Se agiram com culpa.

O tribunal, em face da matéria de facto provada, julgou improcedente a ação porque não se verificaram os pressupostos da responsabilidade civil contratual (mandato), uma vez que não ficou provado que os réus tenham violado as regras profissionais (não ter a ré M. J., na petição inicial, deduzido o pedido dos salários intercalares e o réu F. M. não ter ampliado o pedido, até à audiência de julgamento, apesar de alertado pelo autor), o nexo de causalidade, o dano e a culpa, uma vez que foi ilidida a presunção de culpa, traduzida no facto de ter sido provado que o autor não pretendia que fossem deduzidos os salários intercalares face à nova atividade que iria desenvolver após o despedimento.

Por sua vez o autor, nas alegações e conclusões do recurso, defende a procedência da apelação baseando-se na reversão das respostas aos pontos da matéria de facto questionados. O certo é que a reversão não se verificou, como acima ficou decidido, pelo que os fundamentos invocados não têm suporte factual. Na verdade, ficou provado que a ré M. J. só não formulou o pedido das retribuições vincendas ou intercalares, desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença, porque o autor lhe referiu que não queria, uma vez que iria desenvolver uma atividade, e não queria que a W e o fisco viessem “vasculhar a sua vida”. No que tange ao réu F. M. não ficou provado que o autor o alertou que faltava a dedução do pedido dos salários intercalares, na sua primeira intervenção em julgamento, e que este lhe teria referido que estava a tempo de o fazer.

Em face da prova e não prova, respetivamente, destes factos leva-nos a concluir que os réus não violaram os seus deveres no exercício do mandato forense, pelo que não se verifica a ilicitude, um dos elementos fundamentais da responsabilidade contratual. E não se concretizando um dos fundamentos desta responsabilidade fica prejudicado o conhecimento dos outros (culpa, nexo causal e dano), uma vez que são cumulativos.

Daí que possamos concluir que não se provou a responsabilidade civil contratual dos réus, pelo que é de manter a decisão recorrida, neste segmento.

16. Se é de deduzir à indemnização as importâncias que o autor recebeu após o despedimento, pelo seu trabalho independente, como mediador de seguros, atividade que já desempenhava antes do despedimento, e em simultâneo com a sua atividade remunerada como trabalhador na W.

Esta questão está dependente da procedência das questões formulados nos pontos 14 e 15, o que não ocorreu. Assim fica prejudicado o seu conhecimento.

17. Se o autor/apelante litigou de má fé.

O tribunal julgou o autor como litigante de má-fé porque alegou matéria que constitui a causa de pedir (de que sempre disse que queria receber tudo a que tivesse direito ou de que confrontou o réu F. M. com a falta do pedido dos créditos em causa, antes do início da audiência de julgamento) e que não provou, sabendo que não era verdade ou não podia desconhecer que não era verdadeira. E condenou-o na multa de 5 UC. e na indemnização à ré Dra. M. J. no montante de 7 500,00 e ao réu Dr. F. M. o montante de 15.000€.

O autor apelante insurge-se contra o decidido alegando, em síntese, que não litiga de má fé quem apresenta uma defesa convicta de uma perspetiva jurídica dos factos, diversa daquela que a decisão judicial acolheu.

O certo é que estamos no domínio de factos pessoais, que o autor/apelante não podia desconhecer. Daí que tenha atuado com consciência de que os factos alegados não correspondiam à verdade, atuando com dolo como o decidiu a sentença recorrida, sendo adequadas as indemnizações fixadas.

Assim, é de manter a decisão recorrida neste segmento.

18. Se os réus/apelados litigaram de má fé.

O tribunal, com base na matéria de facto provada, absolveu o réu Dr. F. M. do pedido de litigância de má fé formulado pelo autor.

Este, nas suas alegações e conclusões do recurso, insurge-se contra o decidido, e defende que o réu Dr. F. M. litigou de má fé, porque alegou factos no sentido de esconder a verdade dos factos alegados na petição e sua responsabilidade como advogado, o que ocorreu também com a ré Dra. M. J..

Quanto a esta, o autor, na sua resposta à contestação daquela, no que tange ao pedido de litigância de má fé contra si, deduziu um pedido de litigância de má fé, que o tribunal não conheceu na decisão recorrida, e não foi arguida a respetiva nulidade ao abrigo do disposto no artigo 615 n.º 1 al d) do CPC.

Daí que não possa conhecer deste pedido, porque não foi objeto de decisão, não podendo o tribunal de recurso substituir-se ao recorrido, porque não se verificam os pressupostos do artigo 665 n.º 1 e 2 do CPC.

No que concerne ao pedido deduzido contra o réu Dr. F. M. julgamos que, face à matéria de facto assente, é de concluir que não atuou de má fé. Na verdade, provou, na generalidade, a matéria de facto alegada que justificou a sua atuação no desenrolar do processo, não tendo o autor provado o facto que lhe imputou de não ter ampliado o pedido (os créditos intercalares) apesar do seu alerta para o efeito, e ter-lhe dito que estava a tempo de o fazer, elemento fundamental da sua causa de pedir.

Assim é manter a decisão recorrida neste segmento.

Concluindo: 1. o sigilo profissional do advogado não deve obstar ao exercício do seu direito ao contraditório, dos seus direitos de defesa, quando é réu numa ação em que o seu cliente é autor. O facto de não levantar o sigilo profissional, não pode ser prejudicado por isso, como se depreende dos acórdãos do STJ de 27/02/2008 (Rodrigues dos Santos)) e de 2/02/1995 (Sousa Guedes), publicados em www.dgsi.pt., sendo o tribunal autónomo na ponderação do depoimento.

Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Relação em julgar improcedente a apelação e, consequentemente, confirmam a decisão recorrida.

Custas a cargo do autor/apelante.
Guimarães,


1 - Apelação 1510.18.9T8VRL.G1– 2ª
Proc. Comum
Tribunal Judicial Comarca Vila Real – Vila Real
Relator Des. Espinheira Baltar
Adjuntos Des. Eva Almeida e Luísa Ramos