Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3571/15.3T8VCT.G2
Relator: ANTERO VEIGA
Descritores: PENSÃO PROVISÓRIA
SENTENÇA ABSOLUTÓRIA
REEMBOLSO AO FAT
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/14/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
A norma do artigo 122º, 4 do CPT, que dispõe que na sentença final, se for condenatória, o juiz transfere para a entidade responsável o pagamento da pensão ou indemnização e demais encargos e condena-a a reembolsar todas as importâncias adiantadas; não impõe qualquer pronúncia oficiosa ao juiz sobre a pensão provisória, em caso de decisão absolutória.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães

AA, veio intentar a presente ação especial de acidente de trabalho contra, “EMP01..., S.A.”, pedindo a condenação da R. no pagamento:

- da pensão anual e vitalícia de €4.467,71, com início no dia 6/12/2016;
- da quantia de €8.899,00 de indemnização pelas incapacidades temporárias;
- da quantia de €5.922,29 de subsídio de elevada incapacidade;
- da quantia de €249,70 de despesas de transportes.
A R. apresentou contestação impugnando a factualidade relativa ao sinistro.
A chamada EMP02..., Lda., apresentou contestação.
*
- Por decisão de 6-12-2017 a chamada foi absolvida dos pedidos contra si formulados.
Em face de requerimento do autor, invocando encontrar-se sem trabalhar desde a data do sinistro, e sem rendimento mensal, e que o subsidio de doença foi indeferido, foi fixada pensão provisória a suportar pelo FAT, nos seguintes teros:

“Matéria de facto a considerar para a decisão deste incidente:
1 – O A. desempenhava as funções de oficial de 2ª da construção civil para a R. “EMP02...”, mediante a remuneração anual de 8.437,30.
2 – No dia 5/6/2015, quando se encontrava no exercício da atividade referida em 1), terá sofrido entorse do joelho esquerdo, o que lhe determinou uma incapacidade permanente absoluta para a profissão habitual e uma IPP de 14,76%.
3 - A sua entidade patronal havia transferido para a R. seguradora a sua responsabilidade civil, decorrente de acidente de trabalho verificado com aquele seu trabalhador, e pela totalidade da remuneração.
4 - O A. encontra-se sem trabalhar e sem qualquer rendimento mensal.

Assim:
As partes encontram-se de acordo quanto ao montante auferido pelo sinistrado e quanto ao montante da transferência da responsabilidade para a R. seguradora.
A única divergência consiste em se saber se efetivamente ocorreu o acidente dos autos.
Nestes termos, e de acordo com o disposto no artº. 122, nº. 1, da LAT, atenta a precária situação do A., entende-se ser de fixar pensão provisória a adiantar pelo F.A.T.
A pensão anual a fixar ao sinistrado terá que ser fixada num montante compreendido entre 50% e 70% da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade residual para o exercício de profissão compatível – artº. 48, nº. 3, b), da LAT.
Assim, no caso em apreço a pensão a atribuir será equivalente a €4.467,72.
Esta pensão vence-se no dia seguinte ao da alta – 6/6/2016.
A pensão será paga mensalmente até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, sendo os subsídios de férias e de Natal de valor igual, e pagos respetivamente nos meses de junho e de novembro – artº. 72 da LAT.
Assim, ao abrigo do disposto no artº. 122, nº. 1, do C.P.T, fixa-se a pensão provisória, com início em 6/6/2016, a adiantar pelo F.A.T. em €4.467,72…”
*
- No competente apenso foi decido que o A. se encontra curado, sem qualquer desvalorização, tendo tido ITA desde ../../2015 a 13/7/2015.
*
Realizado o julgamento foi proferida decisão nos seguintes termos:
“Julgar a presente ação totalmente improcedente, por não provada, e em consequência absolver a R. dos pedidos contra formulados.”
*
Inconformados recorreram autor e FAT.

Conclusões do autor:
1 O Recorrente não se conforma com a douta decisão proferida, porque se lhe afigura que a não condenação da Ré Seguradora constitui um julgamento injusto e por considerar que houve erro de julgamento na apreciação da matéria facto.
2 No âmbito dos presentes autos já havia sido proferida sentença em 16.04.2018 a fls… (Ref.ª Citius ...31), a qual foi anulada, porquanto se alicerçou no resultado de perícia por junta médica insuficientemente fundamentada.
3 A perícia foi repetida e os peritos prestaram novos esclarecimentos.
4 Constam do processo todos os elementos probatórios que, nos termos dos artigos 640º e 662º, nº 1 do Código do Processo Civil, justificam uma alteração da factualidade dada como não provada pela 1ª instância nos seus artigos 1º e 2º da base instrutória, uma vez que a decisão sobre a matéria de facto faz uma errada apreciação e valoração da prova produzida.
5 Os factos constantes dos artigos 1º e 2º da base instrutória devem ser dados como provados.
6 Dão-se aqui por inteiramente reproduzidas as Alegações de Recurso já apresentadas nestes autos pelo Recorrente, em 16.05.2018 (Ref.ª Citius ...96), as quais deverão ser novamente alvo de apreciação, uma vez que o Tribunal a quo deu como não provados exatamente os mesmos factos.
7 A perícia por junta médica a que foi submetido o Sinistrado e os novos esclarecimentos dos peritos padecem, novamente, de falta de fundamentação, clareza, congruência e completude, sobressaindo, antes, a forma acintosa nas respostas aos respetivos quesitos, não se coibindo de pôr em causa a seriedade, honestidade, caráter e boa-fé do Autor e da própria entidade patronal.
8 Pelo que, a junta médica não pode ser valorizada, nem considerada como meio de prova idóneo, pois repetem que a lesão do menisco do joelho esquerdo do Autor é anterior à data de 05.06.2015, mas continuam sem clarificar qual é a dinâmica do acidente considerada para concluir pela impossibilidade de a lesão ser resultante desse acidente.
9 Os Senhores Peritos justificam o facto de terem fixado uma ITA desde ../../2015 a 13.07.2015 pela necessidade de avaliar o nexo de causalidade entre a lesão e o acidente.
10 Ora, se, por um lado, afirmam que a lesão é anterior ao acidente, não podem, por outro, avaliar qualquer nexo de causalidade entre essa lesão e o acidente dos autos, pois, nesse caso, não existiria.
11 Donde se conclui que o laudo de junta médica padece, mais uma vez, de um conjunto de insuficiências, contradições e incompletudes.
12 Devem ser atendidos todos os relatórios do Gabinete Médico-Legal e Forense do ..., onde o Autor foi avaliado pelo menos quatro vezes!
13 O parecer do perito singular do Gabinete Médico-Legal e Forense do ..., que acompanhou a evolução clínica do Autor durante mais de um ano, é o único que responde de forma cabal e sustentada a todas as questões médicas colocadas, avaliando as lesões e sequelas do sinistrado de forma fundamentada e com respaldo em toda a prova existente nos autos.
14  Se assim não se entender – o que de todo não se concebe, afigura-se-nos que é deficiente a matéria de facto, dada a falta de fundamentação do exame por junta médica e nos termos do disposto no artigo 662º do Código do Processo Civil, deverá o processado ser anulado desde o exame, por junta médica, o qual deverá ser novamente repetido, seguindo-se depois a normal tramitação legal, devendo o Tribunal a quo, previamente, diligenciar pelo cumprimento do disposto nas Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades.
Conclusões do FAT:
1. O Fundo de Acidentes de Trabalho foi notificado para proceder ao pagamento de uma pensão provisória ao sinistrado AA.
2. Liquidou o recorrente a esse título a quantia de 29 669,40€, no período compreendido entre 06-06-2016 e 31-01-2023.
3. A nova sentença final proferida em 12-09-2023 julgou a ação improcedente e absolveu a Ré EMP01..., SA do pagamento das quantias peticionadas pelo sinistrado.
4. Contudo, a sentença não só não faz qualquer referência ao adiantamento da pensão provisória pelo FAT e valor pago a esse título como não é apreciada a possibilidade de restituição ao Fundo de Acidentes de Trabalho, das quantias por este adiantadas a título de pensões provisórias.
5. Dispõe o art. 122º, n.º 4 do CPT que, se a sentença final for condenatória, o juiz deverá condenar a entidade responsável no reembolso das importâncias adiantadas. Apesar de nada estabelecer em caso de sentença absolutória, sempre terá o pedido de restituição ser apreciado.
6. Por se tratar de uma norma imperativa, de conhecimento oficioso, deveria o Meritíssimo Juiz ter dela apreciado.
7. Não o tendo feito, terá a sentença de se considerar nula por omissão de pronúncia (art. 615º, n.º 1, al. d) do CPC), devendo a decisão ser alterada.
8. Deverá, pois, a sentença recorrida ser considerada nula por omissão de pronúncia e ser apreciada a possibilidade de restituição do pagamento do montante global de 29 669,40€, efetuado pelo recorrente a título de pensões provisórias ao Autor AA.
*
Em contra-alegações sustenta-se o julgado. Refere-se o incumprimento do artigo 640º do CPC.
Neste tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência dos recursos, invocando a jurisprudência quanto à questão colocada pelo FAT.
***
Factualidade:

1 – O A. nasceu a ../../1962.
2 – Desempenhava a atividade de oficial de 2ª da construção civil, sob as ordens, direção e fiscalização da sociedade “EMP02..., Ltª.”, mediante a retribuição anual de €8.437,30.
3 – A sociedade “EMP02...” havia transferido para a R. seguradora a sua responsabilidade civil decorrente de acidente de trabalho, através de contrato de seguro, o qual abrangia o A. em 5/6/2015 pela totalidade da remuneração referida em 2).
Factos não provados
- Que, no dia 5/6/2015, quando se encontrava no exercício da atividade referida em B), numa obra em ..., ..., o A., quando descarregava um saco de cimento de uma carrinha, tenha dado um mau jeito na perna esquerda, sofrendo entorse do joelho esquerdo;
- Que, em consequência, o A. tenha gasto a quantia de €174,70 em transportes, portagens e estacionamento para deslocações a médicos e tratamentos, em veículo próprio; e ainda €75,00 em deslocações obrigatórias ao GML e a este Tribunal.
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Conhecendo do recurso:
Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.
Recurso do autor:
- Impugnação da matéria de facto no que respeita ao grau de incapacidade e aos pontos considerados não provados.
- Falta de fundamentação, e contradições do laudo.
Recurso do FAT:
- Omissão de pronuncia relativamente à restituição da pensão provisória.
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Quanto à matéria de facto:

Quanto ao grau de incapacidade o recorrente chama a atenção de todos os relatórios do Gabinete Médico-Legal e Forense do ..., relembrando que o Autor foi lá avaliado pelo menos quatro vezes, considerando, que essas mesmas lesões traumáticas são a causa de incapacidade permanente absoluta para o exercício da atividade profissional habitual por carecerem de tratamento cirúrgico e atribuiu-lhe uma incapacidade parcial permanente de 14,76%, fixando a data da alta em 05.06.2016 – um ano depois do acidente.”
A decisão deverá ancorar-se, refere, no parecer do perito singular do Gabinete Médico-Legal e Forense do ... que acompanhou a evolução clínica do Autor durante mais de um ano e que responde de forma cabal e sustentada a todas as questões médicas colocadas.
Porque relevando para a questão, importa ainda apreciar a invocada contradição e falta de fundamentação do laudo pericial.
Refere o recorrente Senhores Peritos afirmam novamente e veementemente que a lesão do menisco do joelho esquerdo do Autor é anterior à data de 05.06.2015, continuando sem clarificar qual é a dinâmica do acidente considerada para concluir pela impossibilidade de a lesão ser resultante desse acidente. justificam o facto de terem fixado uma ITA desde ../../2015 a 13.07.2015 pela necessidade de avaliar o nexo de causalidade entre a lesão e o acidente. Ora, se afirmam, por um lado, que a lesão é anterior ao acidente, não podem, por outro, avaliar qualquer nexo de causalidade entre essa lesão e o acidente dos autos, pois, nesse caso, não existiria.

Referiu-se no Ac. RG de 20-10-2022, processo nº 2758/20.1T8VCT.G1:
“A junta médica constitui prova pericial, que, nos presentes autos, havendo desacordo, é obrigatória, conforme artigo 138º e 140º do CPT. Conquanto sujeita à livre apreciação do juiz (art. 389º do CC), este, em qualquer peritagem (mas com especial relevo nos casos em que esta é obrigatória, o que implica de si uma especial ponderação do legislador no sentido da sua utilidade e pertinência), dada a falta das habilitações técnicas que demandam a peritagem, em caso de discordância deverá fundamentar devidamente a mesma, designadamente com base em elementos de igual valia técnico/científica.
O resultado dos exames é expresso em ficha elaborada nos termos do modelo anexo, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões”.
Resulta daqui que a atribuição da incapacidade pelos peritos, deve encontrar justificação na fundamentação a constar do laudo, podendo tal justificação resultar das respostas dadas aos quesitos formulados pelas partes.
Tal obrigação de fundamentação assume particular relevo, no enquadramento das lesões, na concretização do grau de incapacidade dentro do range previsto nas alíneas (de acordo co extensão, gravidade do deficit e particulares condições do caso, ponto 6 das instruções), na aplicação ou não de fatores de bonificação ou correção, nos casos de disfunções ou sequelas não previstas na tabela (5, f; e 7), comtemplando os aspetos profissionais, do posto de trabalho do sinistrado e outros que relevem ao caso.
As exigências de fundamentação variam naturalmente em função da complexidade que envolvam, designadamente o tratar-se de matérias em que constem opiniões diversas no processo e diversas conclusões “periciais”, implicará naturalmente uma maior exigência de fundamentação aos Srs. Peritos da junta médica”.

Vejamos.
No anterior laudo, de 16-1-2018, os peritos responderam aos quesitos da seguradora nos seguintes termos:
Laudo de 16-1-2018:
1. Digam os senhores peritos quais as lesões que o sinistrado apresenta ao
nível do joelho esquerdo?
«Referiu entorse do joelho esquerdo.»
2. Digam os senhores peritos se o sinistrado era portador de tais lesões no dia 31 de maio de 2016?
«Foi ao serviço de urgência a 31.05.2015 por gonalgia esquerda, referindo ainda traumatismo com dor intensa naquele joelho 4 dias antes.»
3. Digam os senhores peritos se o A. esteve afetado de incapacidade
temporária? Em caso afirmativo em que percentagem e períodos? «Sim; ITA desde ../../2015 a 13.07.2015.»
4. Digam os senhores peritos se o A. ficou afetado de IPP?
«Do acidente não.»
Quesitos apresentados pelo sinistrado:
1. O demandante anteriormente ao acidente que se discute nos presentes autos padecia de alterações degenerativas ao nível do joelho esquerdo?
«Admite-se que sim face à RMN a fls. n. o 20.» 2
1.1. Quais? -
«As descritas no relatório da RMN.»
1.2. A existirem alterações degenerativas que sintomas poderiam desencadear
no sinistrado?
«Gonalgia e alguma instabilidade, derrame articular.»
2. Em consequência do acidente de trabalho o demandante sofreu lesão do
menisco do joelho esquerdo com laceração do tipo "Asa de Cesto"? «É de admitir que não.»
2.1. Como e quando foi feito o seu diagnóstico? «Pela RMN de 28/06/2015.»
3. Esta lesão já atingiu a consolidação médico-legal ou necessita ainda de
tratamento médico?
«Não, mas necessita de tratamento cirúrgico.» 3.1. E qual?
«Prejudicado. Tratamento no SNS.»
4. Essa lesão poderá resultar de agravamento de doença anterior ou lesão sofrida em acidente de trabalho anterior ou poderá a doença ou lesão anterior ter sido agravada pelo acidente de trabalho dos autos?
«Trata-se de patologia anterior ao acidente e não se insere na dinâmica/mecanismo descrito deste acidente.»
5. O demandante apresenta atualmente como sequelas do acidente de trabalho dos autos:
5.1. Laceração meniscal em "Asa de Cesto"?
5.2. Rotura ligamentar com instabilidade ligamentar para o ligamento cruzado
anterior e ligamentos lateral externa a 45% de flexão? 5.3. Lesão osteocondral?
5.4. Edema subcutâneo pré-patelar? 5.5. Amiotrofia da coxa em 1,5 cm?
5.6. Fenómenos dolorosos ao nível do joelho esquerdo, diários e constantes, em
descanso que exigem a toma de analgésicos?
5.7. Muita dificuldade em permanecer em ortostatismo mais de I hora seguida? 3
5.8. Dificuldade intensa em subir e descer escadas? --
5.9. Impossibilidade em transportar pesos acima de 5 Kgs?
5.10. Impossibilidade em caminhar por períodos superiores a meia hora,
sobretudo em piso inclinado ou irregular? 5.11. Muita dificuldade em se aninhar?
5.12. Impossibilidade em permanecer de cócoras? 5.13. Diminuição da força muscular?
«Não. As alterações de que é portador não estão relacionadas com o acidente.»
6. Tais sequelas inscrevem-se em que Capítulo da TNI?
«Prejudicado. »
6.1. Qual o coeficiente a atribuir e justifique a sua inscrição no respetivo valor
mínimo médio ou máximo?
«Prejudicado. »
7. A IPP do sinistrado deverá ser corrigida pelo fator de bonificação 1.5? «Prejudicado.»
*
Por acórdão de 10-1-2019 foi determinada a anulação do julgamento a fim de a junta médica efetuar nova perícia para responder aos quesitos sanando irregularidades. Consta deste:
 “ Ora, efetivamente, compulsado o auto de perícia por junta médica, acima transcrito no Relatório, constata-se que:
- não se explicita qualquer razão para se divergir do resultado do exame singular, do relatório do médico assistente do sinistrado e até dos registos clínicos da seguradora, de fls. 20 e 21, que apontam para a natureza traumática das lesões no joelho que o sinistrado apresenta;
- Extrapola-se o que consta dos registos clínicos, relativos à assistência prestada em 31.05.2015, posto que o que deles consta não é o que se responde ao quesito 2.° da seguradora (naqueles registos não há qualquer referência ao mencionado «traumatismo com dor intensa naquele joelho 4 dias antes», antes se aludindo a dor moderada e a gonalgia esquerda desde há 4 dias, após ter feito um esforço - v. fis. 171;
- Toma-se posição sobre matéria de direito excluída do seu conhecimento apreciação da existência de acidente de trabalho e de nexo de causalidade entre as lesões e o acidente - como pressuposto de não fixação de incapacidade permanente;
- afirma-se, em resposta ao quesito 4.° da seguradora, que a lesão do menisco do joelho esquerdo, com laceração, se refere a «patologia anterior ao acidente e não se insere na dinâmica/mecanismo descrito deste acidente», sem que se clarifique qual a dinâmica do acidente considerada para se concluir pela impossibilidade de ser dele resultante;
- Ao mesmo tempo que se responde não ter havido lesão do acidente, ou sequer agravamento de lesão pré-existente, conclui-se, contraditoriamente, na resposta ao quesito 3.° da seguradora, que sim e que esteve com «ITA desde ../../2015 a 13.07.2015», o que só se pode entender como período de incapacidade temporária resultante das lesões de acidente;
- Não é proferida pronúncia sobre a sequela ou sequelas que' o sinistrado atualmente apresenta, sejam ou não resultantes das lesões de acidente ou de agravamento de lesão pré-existente, e qual o coeficiente de desvalorização que poderão acarretar…. Deste modo, tendo sido proferida decisão final alicerçada no resultado da perícia por junta médica, importa anular e repetir tal exame, a fim de pronunciar-se, fundamentadamente, sobre as incapacidades temporária e permanente a fixar ao sinistrado, em consequência das sequelas que o mesmo apresenta - que constitui o objeto da perícia, independentemente do nexo de causalidade que exista ou não, matéria esta que cabe decidir no processo principal - face ao exame objetivo, aos meios auxiliares de diagnóstico, aos registos clínicos existentes, ao relatório da perícia singular, ao relatório do médico assistente do sinistrado, etc ..

Os Peritos prestaram a 19-3-2019 os seguintes esclarecimentos:
1 – Os peritos verificaram a quando do exame anterior a disparidade entre o que o sinistrado referiu ao longo da sua vigilância (?) desde ../../2015 - sin. (?) onde já referia gonalgia esquerda por ter feito um esforço e lhe foi recomendada ecografia. Resposta do seu médico de família a 1-6-2015 refere que “… deu um mau jeito ao joelho esquerdo” sic. Os Peritos referem ainda que o sinistrado na participação refere o acidente a 5-6-2015, ao descarregar cimento.
 2 – Quer pela narrativa do examinado quer pelos registos de urgência e médico de família que a gonalgia esquerda é anterior a 5-6-2015.
3- Pelo histórico clinico e exame físico do sin.  Conclui-se que a dinâmica ou o traumatismo que provocaram a lesão são anteriores aquela data e não se agravaram se existir algum evento a 5-6-2015.
4 – Este período de ITA foi necessário e apropriado para avaliar o nexo causal da lesão que referiu a 5-6-2015.
Formulados quesitos os Srs. Peritos prestaram esclarecimentos e responderam aos quesitos no laudo de 28-10-2022:
“… 3 Esteve com ITA…. Por agravamento temporário do seu quadro sintomatológico descrito desde ../../2015…”
responderam aos quesitos do seguinte modo:
1.O demandante anteriormente ao acidente que se discute nos presentes autos padecia de alterações degenerativas ao nível do joelho esquerdo?
Havia queixas de gonalgia esquerda descrita em relatórios clínicos hospitalares e centro de saúde desde ../../2015.
1.1. - Quais?
Prejudicado.
1.2. A existirem alterações degenerativas que sintomas poderiam desencadear no sinistrado?
Prejudicado.
2. Em consequência do acidente de trabalho o demandante sofreu lesão do menisco do joelho esquerdo com laceração do tipo “Asa de Cesto”?
Não.
2.1. – Como e quando foi feito o seu diagnóstico?
Diagnóstico posterior, mas não do acidente.
3. Esta lesão já atingiu a consolidação médico-legal ou necessita ainda de tratamento médico?
Tem consolidação médico-legal, mas sem relação com episódio de 5-6-2015.
3.1.- E qual?
Repouso e analgesia de 5-6-2015 a 13-7-2015.
4. Essa lesão poderá resultar de agravamento de doença anterior ou lesão sofrida em acidente de trabalho anterior ou poderá a doença ou lesão anterior ter sido agravada pelo acidente de trabalho dos autos?
Pode ter sido uma agudização da patologia anterior cuja etiologia desconhecemos e que não foi agravada.
5.O demandante apresenta atualmente como sequelas do acidente de trabalho dos autos:
5.1. – Laceração meniscal em “Asa de Cesto”?
Não
5.2. – Rotura ligamentar com instabilidade ligamentar para o ligamento cruzado anterior e ligamentos lateral externa a 45%de flexão?
Prejudicado
5.3. – Lesão osteocondral?
prejudicado
5.4. – Edema subcutâneo pré-patelar?
prejudicado
5.5. – Amiotrofia da coxa em 1,5 cm?
prejudicado
5.6. – Fenómenos dolorosos ao nível do joelho esquerdo, diários e constantes, em descanso que exigem a toma de analgésicos?
prejudicado
5.7. – Muita dificuldade em permanecer em ortostatismo mais de 1 hora seguida?
Não
5.8. – Dificuldade intensa em subir e descer escadas?
Não
5.9. – Impossibilidade em transportar pesos acima de 5 Kgs?
Não
5.1.1. – Impossibilidade em caminhar por períodos superiores a meia-hora, sobretudo, em piso inclinado ou irregular?
Não
5.1.2. – Muita dificuldade em se aninhar?
Não
5.1.3.– Impossibilidade em permanecer de cócoras?
Não
5.1.4.– Diminuição da força muscular?
Não
6. Tais sequelas inscrevem-se em que Capítulo da TNI?
Prejudicado
6.1. - Qual o coeficiente a atribuir e justifique a sua inscrição no respetivo valor mínimo médio ou máximo?
prejudicado
7. A IPP do sinistrado deverá ser corrigida pelo fator de bonificação 1.5?
Não uma vez que não resultaram sequelas do evento de 5-6-2015.
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Aludem os Srs. Peritos a agravamento temporário do seu quadro sintomatológico descrito desde ../../2015, para justificar a ITA.
Conquanto insistam em tomar posição sobre o evento traumático, esclarecimento 3, das restantes respostas e esclarecimentos resulta o entendimento de que, pressupondo o evento invocado, dele não resultaram sequelas, nem agravamento da situação que fora reportada desde ../../2015, e descrita pelo médico de saúde a 1-6. Apenas se poderá considerar, no entendimento dos peritos, um agravamento temporário da sintomatologia. Após os esclarecimentos não resulta que as respostas sejam contraditórias, e a fundamentação do laudo é adequada para se perceber as razões da posição tomada no sentido de não atribuir incapacidade. O evento, pressupondo a sua verificação, não é de molde a causar as lesões referenciadas, nem as agravou. Fundaram os peritos as suas respostas nos elementos clínicos documentais constantes nos autos e observação do sinistrado. Consequentemente nesta improcede o recurso, e não se vendo razões para discordar do laudo unânime é de manter o decidido.
***
Quanto à impugnação restante da matéria de facto.

Pretende o autor seja considerado provado:
- que, no dia 5/6/2015, quando se encontrava no exercício da atividade referida em B), numa obra em ..., ..., o A., quando descarregava um saco de cimento de uma carrinha, tenha dado um mau jeito na perna esquerda, sofrendo entorse do joelho esquerdo;
- que, em consequência, o A. tenha gasto a quantia de €174,70 em transportes, portagens e estacionamento para deslocações a médicos e tratamentos, em veículo próprio; e ainda €75,00 em deslocações obrigatórias ao GML e a este Tribunal.
O autor e relativamente ao depoimento testemunhal não dá cumprimento ao comando legal do artigo 640º do CPC. Importaria apreciar a questão em face da prova documental indicada. Contudo desta, como resulta manifesto, não pode concluir-se se ocorreu o invocado sinistro e em que circunstâncias. De todo o modo o depoimento invocado também não é de molde a justifica censura quanto à decisão tomada.
Consta da fundamentação:
Nenhuma prova segura foi produzida quanto à matéria que se deu como não provada.
Na realidade, a testemunha BB, “patrão” do A., a nada assistiu, sabendo apenas o que o A. lhe transmitiu, mas tendo inclusive no seu depoimento manifestado as suas dúvidas quanto ao que este lhe contou.
A testemunha CC, colega do A., nada sabia quanto a qualquer “acidente” ou queixas do A.
Por último, a testemunha DD, mulher do A., também se limitou a transmitir o que lhe teria sido dito pelo marido; realce-se, porém, que esta testemunha confirmou que o A. já apresentava há vários ditos queixas naquele membro inferior, tendo aliás já recorrido a estabelecimento de saúde por essa razão.
Com estes elementos probatórios não foi possível criar uma convicção suficientemente segura quanto à ocorrência do episódio traumático.”
Invoca a prova documental junta aos autos e o depoimento de BB.
O depoente BB, patrão do autor, referiu que trabalhava para si como pedreiro, em 2015. Quanto ao acidente referiu que no dia foi com o autor, a uma obra nos Arcos. Mandou-o tirar um saco de cimento, 40 kg ou 30 Kg, sem certeza, para fazer umas caixitas de saneamento, e “depois ele disse que tinha dado um mau jeito ao pegar no saco de cimento, e eu assim, mas quer que chame alguma coisa ou…” e ele terá respondido, “não, não, eu dei mau jeito, mas…” Ao irmos embora… ao vir passava na Companhia de Seguros e fazemos a participação e assim já vai, já vai pro e foi assim que aconteceu”. Esclareceu que ele pegou no saquito, pousou-o no chão, “não vi mais nada de estranho”, dali a um bocadito é que ele referiu, “parece que dei mau jeito ao joelho”. Foi dia 5 de junho.
O depoente não se apercebeu de coisa alguma, referindo apenas ter-lhe o autor referido que tinha dada um jeito, em momento posterior ao da ocorrência. Por outro, do doc. ... junto com a contestação resulta que a 31/5/2015, data anterior ao invocado evento traumático, teve episódio de urgência por problemas nos membros, “gonalgia esquerda há 4 dias, apos ter feito um “esforço”, “sem sinais inflamatórios do joelho esquerdo”, à “observação”. Medicado e recomendada ecografia ao joelho.
Dos restantes elementos indicados, de natureza médica, e prova pericial do GML não resulta se a lesão é decorrente do evento referido, nem se vê como poderia. Os peritos podem referir tratar-se de consequência do sinistro, e pronunciar-se quanto ao nexo de causalidade, mas de um ponto de vista médico, pressupondo naturalmente a verdade do “evento”, que não presenciaram e sobre o qual não são “testemunho”.
É de manter o decidido.
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Recurso do FAT:
Refere omissão de pronuncia por não se ter determinado a devolução do montante já liquidado ao autor a título de pensão provisória, nos termos do artigo 122º, n.º 4 do CPT, referindo tratar-se de norma imperativa.

Refere o artigo 122 aludido:
Artigo 122.º
Pensão ou indemnização provisória em caso de falta de acordo
1 - Quando houver desacordo sobre a existência ou a caracterização do acidente como acidente de trabalho, o juiz, a requerimento da parte interessada ou se assim resultar diretamente da lei aplicável, fixa, com base nos elementos fornecidos pelo processo, pensão ou indemnização provisória nos termos do artigo anterior, se considerar tais prestações necessárias ao sinistrado, ou aos beneficiários, se do acidente tiver resultado a morte ou uma incapacidade grave ou se se verificar a situação prevista na primeira parte do n.º 1 do artigo 102.º
2 - A pensão ou indemnização provisória e os encargos com o tratamento do sinistrado são adiantados ou garantidos pelo fundo a que se refere o n.º 1 do artigo 82.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, se não forem suportados por outra entidade.
3 - Pode o juiz condenar imediatamente na pensão ou indemnização provisória a entidade que considerar responsável, se os autos fornecerem elementos bastantes para se convencer de que a falta de acordo na tentativa de conciliação teve por fim eximir-se à condenação provisória; se no julgamento se confirmar essa convicção, o juiz condena o réu como litigante de má-fé.
4 - Na sentença final, se for condenatória, o juiz transfere para a entidade responsável o pagamento da pensão ou indemnização e demais encargos e condena-a a reembolsar todas as importâncias adiantadas.
A questão colocada remete, depreende-se, para as normas dos artigos 476º e 373º do CC.
A norma do artigo 122º, 4 do CPT, é clara no sentido de que o juiz transfere para a entidade responsável o pagamento da pensão provisória paga pelo FAT, em caso de decisão condenatória, veja-se a referência, “se for condenatória”.  A norma não impõe apreciação oficiosa da questão ora colocada, em caso de decisão absolutória. Isto claro, sem prejuízo do dever de pronúncia caso seja formulado pedido nesse sentido pelo interessado FAT, e cumprido o contraditório.
O FAT requereu a 4-9-2023 o seguinte:
“b) Requerer que, aquando da prolação da sentença final, se encontre prevista a restituição a este Fundo das quantias adiantadas ao sinistrado, pela entidade que vier a ser considerada responsável pelo acidente de trabalho em causa, conforme dispõe o artigo 122º, n.º 4, do CPT.”
O requerido não constitui mais que um alerta ao juiz da norma do nº 4, não constituindo requerimento a solicitar a devolução por parte do sinistrado, questão que como referimos não é de apreciação oficiosa, como liminarmente resulta do referido mandamento legal.
Não ocorre consequentemente qualquer omissão de pronúncia.

DECISÃO:

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedentes as apelações confirmando a decisão.
Custas pelo sinistrado quanto à apelação por si interposta, sem prejuízo do apoio judiciário.
14.3.2024

Antero Veiga
Leonor Barroso
Francisco Pereira