Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ANTERO VEIGA | ||
Descritores: | REINTEGRAÇÃO DE TRABALHADOR SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 12/15/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | SECÇÃO SOCIAL | ||
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Sumário: | A sanção pecuniária compulsória constitui uma forma de coerção privada visando coagir o devedor inerte. Não pode haver sanção pecuniária compulsória sem despacho a cominá-la, o que quer dizer que a penalidade apenas tem efeito pleno, podendo justificar o efetivo sancionamento por incumprimento, a partir do momento em que a própria comunicação ao devedor se consolidou na ordem jurídica pelo respetivo trânsito em julgado sem prejuízo de o julgador fixar um termo inicial diverso, mas sempre posterior à data em que dá a conhecer ao visado a solene advertência. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães: Banco …, S.A., na ação de execução de sentença em que é exequente Augusto…, interpôs recurso do despacho proferido a 7/7/2016 que fixou a sanção pecuniária compulsória devida em € 250,00 por cada dia de atraso no cumprimento da ordem de reintegração do exequente contados desde 20/01/2016 até à data em que proceda à referida reintegração. Questiona o termo inicial para aplicação da sanção solicitada apenas em sede executiva, alegando em síntese que atenta a ratio da medida, não poderá ter efeitos retroativos. O recorrido contra alegou sustentando o decidido e invocando a intempestividade do recurso, referindo tratar-se de decisão depois da decisão final. Quanto à tempestividade do recurso louvamo-nos no decidido em primeira instância, para que se remete, sendo o recurso tempestivo, já que ocorre em ação executiva, não sendo o despacho recorrido, despacho proferido depois da decisão final. * A factualidade é a que resulta do precedente relatório e ainda: - Por sentença proferida no âmbito da ação de impugnação judicial de regularidade e licitude do despedimento com o nº 1039/11.6TTBCL, a recorrente/executada foi condenada além do mais a reintegrar o autor / exequente no mesmo estabelecimento sem qualquer prejuízo da sua categoria e antiguidade. - Tal decisão transitou em julgado a 20/1/2016 - Na referida decisão não foi fixada, nem fora pedido no processo, qualquer sanção pecuniária compulsória. - A 18/5/2016 o recorrido intentou a ação executiva para prestação de facto tendo como título a aludida sentença, requerendo a aplicação de sansão pecuniária compulsória por cada dia de atraso na sua readmissão, vindo a ser proferido o despacho recorrido. Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos há que conhecer do recurso. *** Conhecendo do recurso: Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente. Importa no essencial saber a sanção pecuniária compulsória pode ser aplicada para ter efeito sobre período temporal decorrido antes da respetiva condenação, e no caso antes de ter sido requerida. Consta do 74.º-A do CPT: Condenação na reintegração do trabalhador 1 - A reintegração deve ser comprovada no processo mediante a junção aos autos do documento que demonstre o reinício do pagamento da retribuição. 2 - Transitada em julgado a sentença, sem que se mostre efetuada a reintegração, pode o trabalhador requerer também a aplicação de sanção pecuniária compulsória ao empregador, nos termos previstos no Código de Processo Civil para a execução de prestação de facto. O do preambulo do D.L. n.º 295/2009, de 13/10 que aditou esta norma consta: “Esclarece-se agora que o trabalhador pode obter, no âmbito da própria execução, a condenação do empregador em sanção pecuniária compulsória, mesmo nos casos em que esta não tivesse sido previamente estabelecida no processo declaratório. A solução consagrada vem, assim, uniformizar a prática jurisprudencial e reforçar as garantias do trabalhador.” Não se pretendeu pois qualquer alteração do regime normal da sanção pecuniária compulsória antes e apenas uniformizar prática Jurisprudencial. Sobre a sanção dispõe o artigo 829-A do CC: (Sanção pecuniária compulsória) 1 - Nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infração, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso. 2 - A sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior será fixada segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar. 3 - O montante da sanção pecuniária compulsória destina-se, em partes iguais, ao credor e ao Estado. 4 - Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indemnização a que houver lugar. A norma foi aditada pelo D.L. n.º 262/83, de 16/6, constando do preâmbulo deste: “ … 5. Autêntica inovação, entre nós, constituem as sanções compulsórias reguladas no artigo 829.º-A. Inspira-se a do n.º 1 desse preceito no modelo francês das astreintes, sem todavia menosprezar alguns contributos de outras ordens jurídicas; ficando-se pela coerção patrimonial, evitou-se contudo atribuir-se-lhe um caráter de coerção pessoal (prisão) que poderia ser discutível face às garantias constitucionais. A sanção pecuniária compulsória visa, em suma, uma dupla finalidade de moralidade e de eficácia, pois com ela se reforça a soberania dos tribunais, o respeito pelas suas decisões e o prestígio da justiça, enquanto por outro lado se favorece a execução específica das obrigações de prestação de facto ou de abstenção infungíveis…” Estamos em face de uma forma de coerção privada, uma manifestação punitiva no direito civil, visando-se coagir o devedor inerte. A sanção está associada a uma sentença condenatória, transitada, e é, à definitiva definição das posições jurídicas. Mas não é automática, como resulta do nº 1 do artigo, onde se refere que “ o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia…”, ao invés do que se passa com a previsão do nº 4. Queremos com isto dizer que o facto de o interessado não formular o pedido na ação declarativa não há de ser indiferente. Não tendo formulado o pedido não foi proferida na sentença declarativa a respetiva condenação, não podendo já em fase executiva vir a proferir-se condenação como se o fora na ação declarativa. O julgador condenará sim, mas tendo como referência a decisão que condena. É que a sanção constitui na sua essência uma ameaça (equivalente, “cum grano salis”, à previsão penal quanto a determinado comportamento), devendo o visado ficar bem ciente das consequências do seu comportamento incumpridor. Assim como não há pena sem lei (em vigor, e é após os trâmites legais e a vacatio legis), não pode haver sanção pecuniária compulsória sem despacho a cominá-la, o que quer dizer que a penalidade apenas tem efeito pleno, podendo justificar o efetivo sancionamento por incumprimento, a partir do momento em que a própria comunicação ao devedor se consolidou na ordem jurídica pelo respetivo trânsito em julgado, sem prejuízo é claro do trânsito da própria decisão que fixa a obrigação. Isto sem prejuízo de o julgador fixar um termo inicial diverso, mas sempre posterior a tais datas. No sentido da impossibilidade de aplicação retroativa, mas defendendo a desnecessidade do trânsito, Ac. RC de 14/2/2014, processo nº 264/09.4TBILH-D.C1; Ressalve-se contudo que o que importa é a decisão que torna patente ao devedor que o incumprimento o fará incorrer no pagamento de uma sanção e não aquela eventual que posteriormente venha a fixar o valor, como no caso relatado no Ac. RP5/7/2006, processo nº de 0620782. E que neste caso, por despacho transitado, “foi ordenada a notificação dos devedores (executados) de que dispunham do prazo de 10 dias para desocuparem os caminhos, com a solene advertência de que a falta de cumprimento de desocupação dos caminhos nesse prazo implicaria a sua condenação em sanção pecuniária compulsória. No momento dessa notificação os executados tomaram plena consciência da situação em que passaram a estar, do que deles se esperava, do significado coercitivo e das consequências sancionatórias que sofreriam se a obrigação principal não fosse por eles acatada.” Na normalidade dos casos a cominação e a fixação constarão do mesmo despacho, que apenas após trânsito terá eficácia. Como meio judicial de constrangimento a sanção só tem sentido se se destinar a operar para o futuro, não pode constranger-se a alguém a cumprir num tempo que já passou. Como refere Calvão da Silva, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, Coimbra, 1987, pág. 255, estamos face a “ um meio de constrangimento judicial que exerce pressão sobre a vontade lassa do devedor, apto para triunfar da sua resistência, e para determiná-lo a acatar a decisão do juiz e a cumprir a sua obrigação, sob a ameaça ou compulsão de uma adequada sanção pecuniária…”. Sobre o termo inicial refere o mesmo autor a pág. 421 ss que ao juiz é confiado fixar o termo inicial, aludindo a que o juiz deve fixar tal termo inicial de forma a que “ respeite e até potencie a natureza e as finalidades da sanção”. Assim, nesta ótica, não poderá o tribunal fixar uma data anterior à própria decisão que a ordena. Tal equivaleria a fazer retroagir a sanção…o que estaria em total oposição ao caráter coercivo e preventivo de medida destinada a provocar o futuro cumprimento… “. Consequentemente procede a apelação. * DECISÃO: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente a apelação, revogando-se parcialmente o despacho e determinando-se que a sanção pecuniária compulsória fixada é devida a partir do trânsito em julgado do despacho que a fixou. Custas pelo recorrido. |