Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
56731/23.2YIPRT.G1
Relator: ANIZABEL SOUSA PEREIRA
Descritores: PLURALIDADE DE DÍVIDA
IMPUTAÇÃO DO CUMPRIMENTO
ESCOLHA TÁCITA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/04/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- Se um devedor tiver diversas dívidas para com o mesmo credor e realizar uma prestação que não permite extinguir todas elas, o devedor pode escolher aquela que pretende extinguir.
II- O devedor encontra-se, pois, dispensado, de obter a anuência do credor.
III- No caso, tratando-se de uma sucessão de dívidas da ré, da mesma espécie ( obrigações pecuniárias), oriundas de diversos contratos de prestação de serviços e relativamente ao mesmo credor – a autora/recorrida – em primeira linha tem aplicação o estatuído no citado nº 1 do art. 783º do C. Civil e, consequentemente, estando provado que a ré ao efetuar aquele pagamento indicou expressamente a dívida em causa, com referência à fatura respetiva, a que o mesmo se destinava, a autora, enquanto credora, não podia imputá-lo a outras dívidas ainda que mais antigas, como fez.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:
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I- Relatório ( que se transcreve):

“EMP01..., S.A., pessoa coletiva n.º ...19, com sede em ..., intentou contra EMP02..., S.A., pessoa coletiva n.º ...57, com sede em ..., injunção para cumprimento de obrigações pecuniárias, destinada a obter a condenação desta no pagamento da quantia de 73.677,40 € discriminada em faturas, acrescida de juros de mora que ascendiam a 14.852,56 € e 40 € de despesas de cobrança, referente a prestação de serviços de consultoria e gestão.
A Ré deduziu oposição, alegando a ineptidão do requerimento de injunção, com consequente limitação do contraditório, pelo que impugna tudo o alegado, prestação de serviços e valores em dívida, acrescentando que os sucessivos contratos celebrados entre as partes foram incumpridos.
Foram remetidos os autos aos Juízos Centrais, por incompetência dos Juízos Locais de Vila Nova de Famalicão, atendendo ao valor da ação. Seguindo a forma do processo comum e sendo declarada improcedente a invocada nulidade, foi determinada a concretização da matéria de facto.
Pela Autora foi concretizado o âmbito dos serviços prestados e a emissão das faturas peticionadas, que ocorreram na sequência de vários contratos ali identificados, a saber, contrato de assessoria, contrato IAPMEI de Produção Nacional, Contrato Inovação Covid, Contrato SIFIDE e Contrato SIQPME.
 Em oposição, veio a Ré reiterar que os factos são ininteligíveis, impugnando-os, mas acrescentando que a Autora não prestou os serviços ou fê-lo defeituosamente, mais concretamente:
- no contrato de assessoria, as faturas de 2022 (09, 37, 66, 91, 110, 152, 177, 214) não foram pagas por os serviços não terem sido feitos - não atualização correta dos dados financeiros, falta de disponibilidade para as reuniões mensais acordadas, falta de envio de relatórios trimestrais dos serviços prestados, e inclusão de horas indevidas (referentes a Due Diligence e SIFIDE) e constantes queixas relativas ao Power BI;
- no Programa Apoio à Produção Nacional (PAPN), a Autora deveria ter emitido nota de crédito, depois de admitidas as candidaturas dos clientes;
- no Contrato SI Inovação Covid-19, o pagamento só era devido depois do último pagamento do IAPMEI, que ainda não veio a acontecer;
- no Contrato SIFIDE (Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial), a Autora não fez o trabalho para que foi contratada, por falha do seu serviço, tendo apenas remetido a candidatura feita internamente pela Ré;
- no Contrato SIQPME, o serviço foi prestado e a fatura foi paga (imputada pela Autora a uma fatura mais antiga ainda não devida relativa ao SI Inovação).
Deduz ainda RECONVENÇÃO, pedindo a condenação da Reconvinda no pagamento da quantia global de 301.059,24 € (trezentos e um mil e cinquenta e nove euros e vinte e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora calculados à taxa legal em vigor até efetivo e integral pagamento, alegando que com os sucessivos incumprimentos contratuais e cumprimentos muito defeituosos por parte da Autora/reconvinda, a Ré sofreu prejuízos.
Acrescenta que é ainda credora da comissão de 10% sobre o valor da fatura da Autora a cada cliente dos indicado pela Ré e por cada projeto PAPN, e que ascende a 9.465,78 €. Neste âmbito a Autora ainda prejudicou a Ré, não lhe dando conhecimento da evolução das candidaturas dos clientes e colocando as faturas de venda dos equipamentos depois das faturas dos próprios serviços, ao contrário do acordado, e que levou a que, dado o lapso temporal, os clientes tivessem desistido da compra e as máquinas já obsoletas tivessem que ir para abate.
A Autora apresentou RÉPLICA, onde concluir pela extemporaneidade e inadmissibilidade da reconvenção, impugnando o alegado e concluindo como na petição inicial.
Realizada AUDIÊNCIA PRÉVIA, foi proferido SANEADOR, com não admissão da reconvenção, por intempestividade, e determinado o prosseguimento dos autos, com o agendamento da audiência de julgamento, que se realizou de acordo com os trâmites legais.”

Foram ainda enunciados os seguintes temas da prova e objeto do litígio nos seguintes termos:
“ o objeto do litígio é o cumprimento do contrato, havendo de apurar, como temas da prova:
- se acordado que tranches da candidatura seriam devidas com a utilização;
- se acordado ulterior emissão de nota de crédito (fatura ...56);
- se relativamente aos honorários de assessoria a Autora não cumpriu o acompanhamento devido e horas indicadas;
- se a fatura ...62 já está paga;
- litigância de má fé.”
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Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo, conforme se alcança da respetiva ata.
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Após a competente audiência de julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “ Face ao exposto, julgo a ação procedente, e em consequência, condeno a Ré EMP02..., S.A. a pagar à Autora EMP01..., S.A., a quantia de 73.677,40 € (setenta e três mil seiscentos e setenta e sete euros e quarenta cêntimos), acrescida de juros moratórios desde a data de vencimento das faturas até efetivo e integral pagamento, às taxas legalmente e supletivamente estabelecidas para as obrigações comerciais e da quantia de € 40 (quarenta Euros) relativa a indemnização legalmente prevista.
Custas pela Ré (artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil).
Registe e notifique.”.
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É desta decisão que vem interposto recurso pela R., a qual terminou o seu recurso formulando as seguintes conclusões ( que se transcrevem):

1ª É nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto que justifiquem a decisão.
2ª Na sentença não estão, nem dela constam, especificados factos provados que permitam concluir que, também em 2022, a recorrida prestou os serviços a que se obrigou no âmbito do contrato de avença, logo, a sentença não especifica factos pelos quais pudesse decidir condenar a recorrente no pagamento à recorrida de todas as facturas identificadas nas alíneas v) a xii) do facto 1º dos provados, o que a torna nula.
3ª Na sentença também não estão, nem dela constam, especificados factos provados que permitam concluir que o valor facturado pela recorrida corresponda ao acordado quanto às facturas referidas nas alíneas ii), xiii) e xiv), do facto 1º dos provados.
4ª Porquanto, num caso e no outro, uma coisa é a facturação de serviços, mero tratamento contabilístico  de uma     relação jurídica,    outra bem diferente é  a concreta realização/execução/cumprimento, até adequado, desses  serviços, que  deve  ser circunstanciada de facto e como suporte daquela facturação, da alegada dívida e da respectiva condenação ao pagamento.
5ª Pelo que, impõe-se a conclusão, a sentença revidenda é nula por violação do disposto no artº 615º, nº 1, al. b), do CPC.
6ª É também nula a sentença cujos fundamentos estejam em oposição com a decisão, ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, nos termos do disposto no artº 615º, nº 1, al. c), do CPC.
7ª Não obstante dos 15º e 16º factos provados na sentença resultar que a recorrente, na sua qualidade de devedora, imputou à factura ...62, de ../../2021, vencida a 30/07/2021 o pagamento que efectuou a 30/09/2021, imputação essa que a recorrente, naquela sua qualidade, fez com a emissão do documento referido em 16º dos factos provados, o tribunal “a quo”, contraditoriamente ao direito aplicável a esses factos, mormente o artº 783º, nº 1, do CC, condenou a recorrida no pagamento da factura ...62, de ../../2021, apesar de já anteriormente paga.
8ª Com tais fundamentos de facto provados, ao tribunal “a quo” não restava senão aplicar o respectivo direito, mormente o indicado em 22. supra das alegações, mas, porque (mal) impressionado com o facto não provado 5 da sentença, decidiu em frontal oposição aos factos provados por si próprio, o que torna a sentença nula.
9ª Sem prescindir das nulidades da sentença invocadas, acresce que o tribunal “a quo” errou no julgamento de factos que considerou provados e não provados na sentença que proferiu, mormente quanto aos serviços a prestar e prestados (ou não) pela recorrida à recorrente ao abrigo dos diversos contratos que celebraram, factos esses constantes dos 1º, 3º, 5º, 7º, 10º, 11º, 12º e 13º dos factos provados, e dos 4 primeiros pontos dos factos não provados (que devem ser considerados provados).
10ª Porém, o processo contém provas, quer por depoimento de testemunhas inquiridas em julgamento, quer por documentos, que impõem a modificação/alteração da decisão de facto proferida sobre aqueles factos.
11ª Da reapreciação da prova gravada, mormente as declarações de parte do legal representante da recorrida, AA, prestado na audiência de julgamento de 22/01/2025, gravado no sistema H@bilus Media Studio em uso pelo tribunal “a quo”, no intervalo de tempo 00:00:00 a 01:13:20, e os depoimentos das testemunhas BB, prestado na audiência de julgamento de 26/02/2025, gravado no sistema H@bilus Media Studio em uso pelo tribunal “a quo”, no intervalo de tempo 00:00:00 a 00:36:36; CC, prestado na audiência de julgamento de 10/04/2025, gravado no sistema H@bilus Media Studio em uso pelo tribunal “a quo”, no intervalo de tempo 00:00:00 a 02:30:23 e ..., prestado na audiência de julgamento de 10/04/2025, gravado no sistema H@bilus Media Studio em uso pelo tribunal “a quo”, no intervalo de tempo 00:00:00 a 01:00:14, transcritos supra no corpo das alegações e que, por razões de brevidade, aqui se dão por reproduzidos, que justificam/impõem a alteração da decisão sobre a matéria de facto, resulta evidente que, no ano de 2022, a recorrida não prestou à recorrente os serviços que se obrigou prestar-lhe também nesse ano, no âmbito do contrato de avença descrito em 2º e 3º dos factos provados na sentença, tal qual detalhado nas alegações supra que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
12ª Razão pela qual tais provas impõem, ao abrigo das regras da experiência comum e do normal devir das coisas e do comportamento humano, como demonstrado nas alegações supra, a modificação/alteração, respectivamente, da decisão de facto proferida nos 1º e 3º factos provados e no 1º ponto dos factos não provados, que, com a redacção adequada ao que se provou, deverá passar a ser o 17º facto provado na sentença:
“1.º No desenvolvimento da sua atividade comercial de consultoria de gestão, a Autora prestou serviços à Ré, até agosto de 2022, no âmbito de vários contratos e emitiu faturas, mostrando-se por liquidar as seguintes:
...” (devendo manter-se as alíneas i) a xiv), relativas às facturas emitidas)
“3.º Tal contrato pressupunha a afectação de 360 horas de trabalho por ano, numa média de 30 horas mensais, com reporte trimestral das horas despendidas tarefa a tarefa, um banco de horas onde até agosto de 2022 foram imputadas pela Autora 678 horas de serviço.”
“17.º No ano de 2022 a Autora não prestou à Ré a assessoria contabilístico-financeira regular acordada como consta em 2.º, nem despendeu, no âmbito desse contrato, as horas acordadas de trabalho por ano numa média de 30 horas mensais, nem reportou trimestralmente as horas despendidas tarefa a tarefa.”
13ª Em consequência impõe-se também a alteração da decisão condenatória da recorrente quanto ao pagamento das facturas referidas em v) a xii), do 1º facto provado na sentença, revogando-a e proferindo decisão que absolva a recorrente desse pedido.
14ª Da reapreciação da prova documental e da prova gravada, mormente as declarações das testemunhas CC, prestado na audiência de julgamento de 10/04/2025, gravado no sistema H@bilus Media Studio em uso pelo tribunal “a quo”, no intervalo de tempo 00:00:00 a 02:30:23, e DD, prestado na audiência de julgamento de 06/05/2025, gravado no sistema H@bilus Media Studio em uso pelo tribunal “a quo”, no intervalo de tempo 00:00:00 a 01:12:42, transcritos supra no corpo das alegações e que, por razões de brevidade, aqui se dão por reproduzidos, que justificam/impõem a alteração da decisão sobre a matéria de facto, bem como das regras da experiência comum e do normal das coisas, resulta evidente que o denominado contrato PAPN celebrado entre as partes teve, como condições acordadas entre as partes, que a recorrente apresentaria clientes seus à recorrida para que esta elaborasse projectos elegíveis para o programa PAPN e que pretendessem adquirir os seus equipamentos com recurso a financiamentos desse programa, que, por isso, a recorrente se responsabilizava pelo pagamento do valor de €1.000,00 a título de componente fixa dos honorários da recorrida, devidos se o projecto não fosse aprovado, creditados se fosse porque, neste caso, a recorrida englobaria os seus honorários na componente variável de honorários a cobrar aos clientes em função do valor da candidatura, devendo, neste caso, a recorrida pagar à recorrente uma comissão de 10% a título de angariação de clientela, calculada sobre o valor da componente variável dos honorários da recorrida, tal qual detalhado nas alegações supra que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
15ª Razão pela qual tais provas impõem, também ao abrigo das regras da experiência comum e do normal devir das coisas e do comportamento humano, como demonstrado nas alegações supra, a modificação/alteração, respectivamente, da decisão de facto proferida nos 5º e 7º factos provados, e no 2º ponto dos factos não provados, cuja matéria deve incluir-se no novo facto 7º dos provados, factos estes que deverão passar a ter a seguinte redacção:
“5.º Desde janeiro de 2021 foi acordado pelas partes que a Ré apresentava determinados clientes seus à Autora, que fossem elegíveis para o Programa de Apoio à Produção Nacional (PAPN) e que pretendessem adquirir os seus equipamentos de impressão de etiquetas com recurso a financiamentos daquele programa, acordando um preço mais baixo do que os honorários fixos normais da Autora, de 2.000 €.”
“7.º Foi ainda acordado que a Ré pagaria os custos iniciais dos projetos dos seus clientes à Autora, correspondente à submissão da candidatura, com um valor de €1.000,00, por cada cliente (reduzindo para 750 € a partir da 5ª candidatura), nos projetos que não tivesse aprovação, e que esse valor deveria, posteriormente, ser creditado pela Autora à Ré nos projetos que fossem aprovados, relativamente aos quais a Autora ainda pagaria à Ré uma comissão de 10% a título de angariação de clientela, calculada sobre o valor dos honorários variáveis cobrados pela Autora a cada um dos clientes da Ré.”
16ª Em consequência impõe-se também a alteração da decisão condenatória da recorrente quanto ao pagamento da factura referida em iv), do 1º facto provado na sentença, revogando-a e proferindo decisão que absolva a recorrente desse pedido, nomeadamente por a mesma estar paga.
17ª Por outro lado, à evidência dos 15º e 16º factos provados, a recorrente, devedora, escolheu pagar a dívida contabilizada por meio da factura ...62 (al. iv) do 1º facto provado) e deu-o a conhecer à recorrida, pelo que, nos termos do disposto no nº 1, do artº 783º, do CC e nos termos legais supra expostos, é totalmente irrelevante se a recorrida concordou ou não com tal imputação de pagamento (5 facto não provado na sentença).
18ª Não obstante tal irrelevância, além da evidência da imputação do pagamento efectuado pela recorrente em 30/09/2021 à factura ...62 (al. iv) do 1º facto provado na sentença e, bem assim, doc. 10 junto com a oposição à PI), por e-mail de 08/02/2022, constante da pág. 3, do doc. 9, junto com a PI a recorrida aceitou e reconheceu esse pagamento de forma expressa e por escrito, o que infirma, em absoluto, o 5 facto não provado na sentença, pelo que, por mais um evidente err de julgamento e por no processo existir, mais uma vez, meio de prova que impõe decisão diversa da proferida, impõe-se também a alteração do 5 facto não provado na sentença, cuja redacção deverá passar a ser a seguinte e como 18º facto provado na sentença:
“18.º As partes acordaram a imputação nesta fatura do valor pago a 30/09/2021.”
19ª E porque está provado no processo que a factura, referida em iv) do 1º facto provado da sentença, está integralmente paga pela recorrente, deve a recorrente ser absolvida também deste pedido.
20ª Da reapreciação da prova documental e da prova gravada, mormente as declarações das testemunhas CC, prestado na audiência de julgamento de 10/04/2025, gravado no sistema H@bilus Media Studio em uso pelo tribunal “a quo”, no intervalo de tempo 00:00:00 a 02:30:23, e EE, prestado na audiência de julgamento de 10/04/2025, sessão das 14:00 horas, gravado no sistema H@bilus Media Studio em uso pelo tribunal “a quo”, no intervalo de tempo 00:00:00 a 01:11:56, transcritos supra no corpo das alegações e que, por razões de brevidade, aqui se dão por reproduzidos, que justificam/impõem a alteração da decisão sobre a matéria de facto, bem como das regras da experiência comum e do normal das coisas, resulta evidente que o denominado contrato Covid-19 celebrado entre as partes teve, como condições acordadas entre as partes, que a recorrida se obrigou a elaborar uma candidatura da recorrente ao programa SI Inovação Covid-19, e a acompanhar essa candidatura até final, isto é, até ao encerramento dessa candidatura junto do IAPMEI, nomeadamente elaborando, se necessário, como foi, alegações contrárias a uma decisão total ou parcialmente desfavorável (que ocorreu), acompanhamento e alegações contrárias essas que a recorrida não fez, e, ainda, que, a candidatura foi mal elaborada pela recorrida, o que deu causa a uma perda de cerca de €300.000,00 à recorrente, por redução do financiamento elegível nesse montante, tendo sido aprovado um financiamento de €950.386,39, que, atenta a inoperância da recorrida, apenas a recorrente “salvou” pela sua intervenção contra a intenção do IAPMEI de resolver todo o contrato de financiamento, razões pelas quais, não só não são devidos à recorrida os honorários que esta reclama da recorrente, inclusive pela excepção de não cumprimento que esta lhe opõe, como, ainda por cima, a recorrida, com sufrágio errado do tribunal “a quo”, calculou os seus honorários com base no investimento elegível, não não financiamento aprovado como contratado, tal qual detalhado nas alegações supra que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
21ª Razão pela qual tais provas impõem, também ao abrigo das regras da experiência comum e do normal devir das coisas e do comportamento humano, como demonstrado nas alegações supra, a modificação/alteração, respectivamente, da decisão de facto proferida nos 10º e 12º factos provados, e no 3º ponto dos factos não provados, cuja matéria deve considerar-se provada nos termos da redacção de um 19ª facto provado, factos estes que deverão passar a ter a seguinte redacção:
“10.º À Autora estavam adstritas as funções de elaboração (nomeadamente com entrega de check-list com informação necessária à elaboração da candidatura, identificação dos investimentos elegíveis) e submissão da candidatura, e numa segunda fase, de apoio na contratualização do inventivo junto do organismo coordenador, as funções de análise do documento de decisão emitido por este organismo, de apresentação de alegações contrárias (se aplicável) e de recolha dos elementos necessários para a contratualização.”
“12.º A candidatura foi apresentada a 24/04/2020 e aprovada pelo IAPMEI para concessão de investimento financiado e aprovado de €950.386,39 a executar entre 2020-05.31 e 2020-06.30, tendo sido remetido pedido de pagamento final em agosto de 2020 e emitida a fatura ...82, parcialmente por pagar.”
“19.º O valor da componente variável dos honorários para o contrato SI Inovação Covid-19 apenas se vence após o último pagamento efetuado pelo IAPMEI, pagamento este que já ocorreu, a Autora deveria ter feito alegações contrárias à decisão do IAPMEI mas não as fez, nem em 2020 nem no encerramento do projecto em finais de 2023, o que a Ré reclamou.”
22ª Em consequência impõe-se também a alteração da decisão condenatória da recorrente quanto ao pagamento da factura referida em i), do 1º facto provado na sentença, revogando-a e proferindo decisão que absolva a recorrente desse pedido.
23ª Por outro lado, da reapreciação da prova documental e da prova gravada, mormente as declarações das testemunhas EE prestado na audiência de julgamento de 10/04/2025, sessão das 14:00 horas, gravado no sistema H@bilus Media Studio em uso pelo tribunal “a quo”, no intervalo de tempo 00:00:00 a 01:11:56, e ..., prestado na audiência de julgamento de 10/04/2025, sessão das 14:00 horas, gravado no sistema H@bilus Media Studio em uso pelo tribunal “a quo”, no intervalo de tempo 00:00:00 a 01:00:14, transcritos supra no corpo das alegações e que, por razões de brevidade, aqui se dão por reproduzidos, que justificam/impõem a alteração da decisão sobre a matéria de facto, bem como das regras da experiência comum e do normal das coisas, resulta evidente que a recorrida não elaborou as candidaturas para os anos 2019, 2020 e 2021 do denominado contrato SIFIDE, apesar de se ter obrigado contratualmente a fazê-las, não apenas a corrigi-las e submete-las na respectiva plataforma, pelo que, é evidente que também neste caso não se tratou de um “incumprimento insignificante ou irrisório, tendo antes assumido um relevante cumprimento defeituoso”, razão pela qual a recorrente opôs à recorrida a excepção do não cumprimento do contrato e recusa o pagamento das 3 facturas em questão, o que, na correcta decisão sobre a matéria de facto e aplicação subsequente do direito, deverá ser decidido.
24ª Logo, dúvidas não podem restar da necessidade de também se alterar a redacção quer dos 13º e 14º factos provados, quer do 4º facto dos não provados na sentença que deve passar a ser considerado provado, acrescentando-o como o 20º facto provado, os quais que passarão a ter a seguinte redacção, respectivamente:
“13.º Depois de contratada durante o ano de 2020 para apresentação de contra-alegações referentes ao ano fiscal de 2018, a Autora foi contratada pela Ré para elaboração e submissão de candidaturas ao SIFIDE para o período fiscal de 2019 a 2021, desde o diagnóstico, planeamento e acompanhamento institucional, mediante o pagamento de honorários calculados sobre ganhos incrementais do crédito fiscal aprovado relativamente ao nível habitual de SIFIDE que a Ré vinha obtendo nos últimos anos, com um mínimo de €2.500 (dois mil e quinhentos euros) por candidatura, a pagar na aprovação (30%) e no usufruto (70%).”
14.º A Autora apresentou as candidaturas e, com a aprovação das três candidaturas, emitiu faturas iniciais – faturas ...02, ...41 e ...45.”
“20.º As candidaturas ao SIFIDE para o período fiscal de 2019 a 2021 foram feitas internamente por colaboradores da própria Ré, atenta a inoperância da Autora, que apenas as submeteu.”
25ª Note-se, ainda, que, pese embora o ónus da prova da factualidade relativa ao pretenso preenchimento dos requisitos para quantificação dos seus honorários relativos a este contrato SIFIDE, a recorrida nada provou, pelo que, tudo conjugado, impõe também a absolvição da recorrente quanto ao pagamento das 3 facturas referidas em ii), xiii) e xiv), do 1º facto provado na sentença.
26ª Impondo-se, como alegado e concluído anteriormente e de acordo coma imperiosa modificação/alteração da decisão sobre a matéria de facto, a conclusão que a recorrente alegou e provou, contrato a contrato, as suas razões e os factos consubstanciadores da legítima invocação da excepção de não pagamento, seja porque os serviços contratados não foram feitos pela recorrida, seja porque não foram todos feitos, seja porque foram feitos de forma gravemente defeituosa ou, como sucede com o caso SIQ-PME, porque, inclusive, já estão pagos, razão porque, atendendo ao manancial de factos provados e à prova produzida e constante do processo que os sustentam e, diríamos mesmo, impõem como alegado supra, o direito, se bem aplicado, impõe a absolvição da recorrente quanto ao pedido, logo impõe a revogação da sentença revidenda..”
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Foram apresentadas contra-alegações pela autora e, em síntese, considerou não existir qualquer nulidade e a manutenção da decisão.
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O recurso foi recebido nesta Relação, considerando-se devidamente admitido, no efeito legalmente previsto.
Assim, cumpre apreciar o recurso deduzido, após os vistos.

II. Questões a decidir.


Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em:
1- Analisar se a sentença padece de nulidade;
2- Apreciar a decisão da matéria de facto, apurando se ela deve ou não ser alterada;
3- E, como consequência, se deve ou não ser mantida a decisão recorrida.
*
III-
Para a apreciação das questões elencadas, é importante atentar na matéria que resultou provada e não provada, que o tribunal recorrido descreveu nos termos seguintes:
Resultaram provados os seguintes factos:

1.º No desenvolvimento da sua atividade comercial de consultoria de gestão, a Autora prestou serviços à Ré, até agosto de 2022, no âmbito de vários contratos e emitiu as respetivas faturas, mostrando-se por liquidar as seguintes:
i) ...82, emitida a ../../2020, com data de vencimento a 30/09/2020, no montante de 6.150,00 €, sendo reclamada a quantia em falta de 4.429,60 €, referente a elaboração de candidatura SI Inovação, concurso COVID-19, 3.ª tranche;
ii) ...02, emitida a ../../2021, com data de vencimento a 04/02/2021, no montante de 15.696,95€, referente a honorários SIFIDE 2019 aprovação;
iii) ...56, emitida a ../../2021, com data de vencimento a 28/03/2021, no montante de 3.690,00 €, referente a componente fixa PAPN (EMP03..., EMP04..., EMP05...);
iv) ...62, emitida a ../../2021, com data de vencimento a 30/07/2021, no montante de 9.225,00 €, referente a sucess-fee SIQPME (PT2020) 1.ª tranche;
v) ...09, emitida a ../../2022, com data de vencimento a 02/03/2022, no montante de 2.460,00 €, referente a honorários de assessoria (contrato ref.ª ...61) – janeiro de 2022;
vi) ...37, emitida a ../../2022, com data de vencimento a 30/03/2022, no montante de 2.460,00 €, referente a honorários de assessoria (contrato ref.ª ...61) – fevereiro de 2022;
vii) ...66 emitida a ../../2022, com data de vencimento a ../../2022, no montante de 2.460,00 €, referente a honorários de assessoria (contrato ref.ª ...61) – março de 2022;
viii) ...91, emitida a ../../2022, com data de vencimento a 30/05/2022, no montante de 2.460,00€, referente a honorários de assessoria (contrato ref.ª ...61) – abril de 2022;
ix) ...10, emitida a ../../2022, com data de vencimento a ../../2022, no montante de 2.460,00 €, referente a honorários de assessoria (contrato ref.ª ...61) – maio de 2022;
x) ...52, emitida a ../../2022, com data de vencimento a 30/07/2022, no montante de 2.460,00 €, referente a honorários de assessoria (contrato ref.ª ...61) – junho de 2022;
xi) ...77, emitida a ../../2022, com data de vencimento a 28/08/2022, no montante de 2.460,00 €, referente a honorários de assessoria (contrato ref.ª ...61) – julho de 2022;
xii) ...14, emitida a ../../2022, com data de vencimento a 30/09/2022, no montante de 2.460,00 €, referente a honorários de assessoria (contrato ref.ª ...61) – agosto de 2022;
xiii) ...41, emitida a ../../2023, com data de vencimento a 19/03/2023, no montante de 4.940,18 €, referente a honorários SIFIDE 2020 aprovação;
xiv) ...45, emitida a ../../2023, com data de vencimento a 19/03/2023, no montante de 16.015,67 €, referente a honorários SIFIDE 2021 aprovação.
2.º Em janeiro de 2021 foi acordada a prestação de assessoria contabilístico--financeira regular, da parte da Autora à Ré, nomeadamente nas seguintes matérias: Realização do orçamento anual, reporting operacional e financeiro mensal, análise de benchmarketing a nível ibérico, apoio ao processo de fecho de contas, no que concerne a registos contabilísticos de encerramento, validação final de exercício e relatórios de contas, supervisão contabilística (help-desk), com honorários fixados em 2.000 €/mês, acrescidos de IVA.
3.º Tal contrato pressupunha a afetação de 360 horas de trabalho por ano, numa média de 30 horas mensais, um banco de horas onde até agosto de 2022 foram imputadas pela Autora 678 horas de serviço.
4.º Em agosto de 2022 foram reclamadas pela Ré as horas imputadas pela Autora na emissão de relatório que veio com dados temporalmente desfasados; também não foram aceites pela Ré as horas imputadas na análise de informação da Due Diligence (29 horas) e do modelo SIFIDE (20,5 horas).
5.º Em janeiro de 2021 foi acordado pelas partes que a Ré apresentava determinados clientes seus à Autora, que fossem elegíveis para o Programa de Apoio à Produção Nacional (PAPN) e que pretendessem adquirir os seus equipamentos de impressão de etiquetas com recurso a financiamentos daquele programa, acordando um preço mais baixo do que os honorários normais da Autora, de 2.000 €.
7.º Foi acordado que a Ré pagaria os custos iniciais dos projetos dos seus clientes à Autora, correspondente à submissão da candidatura, com um valor de €1.000,00, por cada cliente (reduzindo para 750 € a partir da 5.ª candidatura).
8.º Foram submetidas e aprovadas, em fevereiro e março de 2021, as candidaturas de clientes da Ré, com investimento em equipamento de impressão - EMP05..., EMP03..., EMP04..., EMP06... e EMP07... -, tendo sido emitida a fatura ...56, não paga.
9.º Conforme adjudicação assinada pela Ré em 22 de abril de 2020, foi a Autora contratada pela Ré para submeter até 29/05/2020 a candidatura da Ré ao Sistema de Incentivos à Inovação Produtiva (Covid-19) – SI Inovação, que visava apoiar atividades destinadas ao desenvolvimento de produtos e serviços de combate à propagação da Covid-19.
10.º À Autora estavam adstritas as funções de elaboração e submissão da candidatura, e numa segunda fase, de apoio na contratualização do incentivo junto do organismo coordenador; à Ré incumbia fornecer a documentação e informação necessária e nomear um diretor de projeto interno.
11.º Os honorários acordados tinham um componente fixa de 500 € (paga até à submissão do formulário) e uma componente variável, de 2,5% sobre o total de financiamento aprovado, sujeito a um máximo de 25.000 € devidos com a comunicação da aprovação da candidatura.
12.º  A candidatura foi apresentada a 24/04/2020 e aprovada pelo IAPMEI para concessão de investimento financeiro elegível para o projeto de 1.377.500,00 € a executar entre 2020-05-01 e 2020-06-30, tendo sido remetido pedido de pagamento final em agosto de 2020 e emitida fatura ...82, parcialmente em dívida.
13.º Depois de contratada durante o ano de 2020 para apresentação de contra-alegações referentes ao ano fiscal de 2018, a Autora foi contratada pela Ré para apresentação de candidaturas ao SIFIDE para o período fiscal de 2019 a 2021, desde o diagnóstico, planeamento e acompanhamento institucional, mediante o pagamento de honorários calculados sobre ganhos incrementais do crédito fiscal aprovado, com um mínimo de €2.500 (dois mil e quinhentos euros) por candidatura, a pagar na aprovação (30%) e no usufruto (70%).
14.º A Autora apresentou as candidaturas e emitiu as faturas iniciais referentes a 30% dos honorários acordados, com a aprovação das três candidaturas – faturas ...02, ...41 e ...45.
15.º Como acordado por correio-electrónico trocado em 18 de junho de 2020, no qual Autor propôs o serviço e os honorários, aceites pela Ré, a Autora apresentou candidatura ao programa SIQPME, tendo emitido a fatura ...62, de ../../2021.
16.º A Ré procedeu ao pagamento de 9.225 € a 30/09/2021, tendo emitido recibo com referência a esta fatura ...62.

Não resultaram provados outros factos relevantes, excluindo considerações, conclusões jurídicas, designadamente que:
- [contrato de assessoria] falta permanente e reiterada de acompanhamento à Ré, falta de reuniões entre a Autora e a Ré, que nunca esteve disponível para tais reuniões; resposta às solicitações da Ré era morosa, e as respostas desadequadas às solicitações da Ré;
- [PAPN] o valor pago pela Ré deveria, posteriormente e aquando da aprovação de cada projeto PAPN a cada cliente, ser creditado pela Autora à Ré;
- [SI Inovação Covid-19] o valor acordado apenas se vence após o último pagamento efetuado pelo IAPMEI à Ré, pagamento este que ainda não ocorreu; a Autora deveria ter feito alegações contrárias no fim do projeto em finais de 2023, o que a Ré reclamou;
- [SIFIDE] as candidaturas foram feitas internamente por colaboradoras da própria Ré, atenta a inoperância da Autora que nada fez, para elaborar tais candidaturas;
- [SIQPME] tenha sido acordado entre as partes a imputação nesta fatura de valor pago a 30/09/2021.”
*
1- Das nulidades da sentença:

Sustenta, pois, a recorrente que a decisão recorrida enferma das nulidades previstas no artigo 615º, n.º 1, alínea b) e c), do Código de Processo Civil, por:
- não especificar os fundamentos de facto que justificam a decisão, nomeadamente não especifica quais as prestações de serviço constantes das faturas aludidas no facto provado nº1, al. v) a xii) e ainda não há factos para concluir pelo valor faturado e que corresponderia ao acordado quanto às faturas referidas em ii)  e xiv) do facto 1º;
- e por padecer de contradição, pois decidiu em sentido contrário aos factos dados como provados, porquanto deu como provados os factos 15º e 16º e, posteriormente, condenou no pagamento da fatura nº ...62, quando com o pagamento efetuado em 30-09-2021 deveria ser imputado o pagamento daquela fatura, nos termos do art. 783º do CC.
Vejamos.
As causas de nulidade da sentença vêm taxativamente enunciadas no artigo 615º nº 1 do Código de Processo Civil, onde se estabelece, além do mais, que a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (al.b)).
Quanto ao vício de falta de fundamentação, ensina o Prof. Alberto dos Reis[1] , que “uma decisão sem fundamentos equivale a uma conclusão sem premissas”, conformemente a nulidade por falta de fundamentação só ocorre quando há “ausência total de fundamentos de direito e de facto”, sendo certo que “o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade”.
Para que a sentença esteja eivada deste vício de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.
Dispõe o Artigo 615º, nº1, alínea c) do CPC, que é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica pelo que se, na fundamentação da sentença, o julgador segue determinada linha de raciocínio apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decide em sentido divergente, ocorre tal oposição – cfr. Acórdãos da Relação de Coimbra de 11.1.94, Cardoso Albuquerque, BMJ nº 433, p. 633, do STJ de 13.2.97, Nascimento Costa, BMJ nº 464, p. 524 e de 22.6.99, Ferreira Ramos, CJ 1999 – II, p. 160.
Realidade distinta desta é o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou erro na interpretação desta, ou seja, quando – embora mal – o juiz entenda que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação ou dela decorre, o que existe é erro de julgamento e não oposição nos termos aludidos – cfr. Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum, 2000, pg. 298.
Por outras palavras, se a decisão está certa, ou não, é questão de mérito e não de nulidade da mesma – cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8.3.2001, acessível em www.dgsi.jstj/pt.
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Vista a reclamação da recorrente, bem como a sentença proferida, resulta manifesto que não ocorre a nulidade prevista nesta al. b) do nº 1 do art. 615º do CPC.
Em verdade, a sentença é extensa na fundamentação de facto e de direito, a respeito, pelo que não é nula á luz de tal disposição legal.
O que sustenta a recorrente é que os juízos nela expressos sobre a temática em causa são infundados.
Estamos, assim, perante juízos valorativos divergentes e não diante de vícios estruturais da própria sentença, que, a nosso ver, cumpriu os requisitos formais que a lei lhe assinala.
De modo que não ocorre a nulidade em apreço.

Mutatis mutandis, dir-se-á a respeito da nulidade prevista nesta al. c) do nº 1 do art. 615º do CPC.
Com efeito, não se verifica a existência de qualquer contradição entre a fundamentação e a decisão, pois que na fundamentação da sentença é seguida determinada linha de raciocínio apontando para determinada conclusão e, decide-se nesse sentido.
Na sentença entendeu-se que apesar do pagamento efetuado pela R no valor de 9.225€, tendo a R emitido recibo com referência à factura “ “..162” ( facto provado 16º), na verdade o tribunal deu como provado no facto nº1, ser uma das faturas por liquidar ( al. IV do facto nº1), e facto não provado nº5 –“ que tenha sido acordado entre as partes essa imputação nessa factura do valor pago”, pelo que na sentença seguiu-se o raciocínio de não se aplicar o nº1 do art. 783º do CC e considerou, bem ou mal, a imputação na dívida mais antiga do credor.
A não aplicação do art. 783º do CC não gera a nulidade da sentença, quando muito tratar-se-á de erro de julgamento.
O que se passa é que a Recorrente não se conforma com a decisão proferida, que no seu entender deveria ser outra, mas tal não configura uma nulidade, outrossim a invocação da existência de erro de julgamento e que irá ser apreciada oportunamente e em sede própria.
O Prof. Antunes Varela (in Manual de Processo Civil, pág. 686) diz-nos que “não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário”.
De modo que não ocorre a nulidade em apreço.
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2- Da Impugnação de facto:

A recorrente considera incorretamente julgados os factos  1º, 3º, 5º, 7º, 10º, 11º, 12º e 13º dos factos provados, e dos 4 primeiros pontos dos factos não provados (que devem ser considerados provados) e ainda o 5º facto dado como não provado ( deverá ser considerado provado).
Para o efeito, sustenta-se no depoimento do legal representante da autora e nas testemunhas ouvidas e prova documental junta aos autos.
Uma vez que estão em discussão cinco contratos de prestação de serviços realizados entre as partes, analisemos cada um deles de per si e respetiva matéria de facto impugnada a respeito de cada um.
Consigna-se que apesar de a recorrente ter indicado na conclusão 9º como impugnado o facto provado nº11, na verdade não consta, nem das restantes conclusões, nem das alegações, a impugnação a este facto, pelo que não cumpre a mesma o disposto no art. 640º do CPC e, nessa medida, rejeita-se tal impugnação.
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Quanto ao designado “ contrato de assessoria” ( ou de avença), temos os seguintes factos impugnados e que serão analisados por grupos respeitantes ao contrato respetivo:
- facto provado nº1, als. V) a XII;
- facto provado nº 3º;
- e 1º facto não provado.

Pretendendo a recorrente que se altere a redação do facto provado nº1, devendo ser retirada a expressão “ respetivas”  faturas ( deve manter-se as alínea i) a XIV, relativas às faturas emitidas;
. e ainda pretende a alteração da redação do facto provado nº3, nos termos seguintes:
“ Tal contrato pressupunha a afectação de 360 horas de trabalho por ano, numa média de 30 horas mensais, com reporte trimestral das horas despendidas tarefa a tarefa, um banco de horas onde até agosto de 2022 foram imputadas pela Autora 678 horas de serviço.”;
. Quanto ao 1º facto dos não provados, a redação deve passar a ser a seguinte, devendo incluir-se nos factos provados como facto 17º dos factos provados na sentença:
“17.º No ano de 2022 a Autora não prestou à Ré a assessoria contabilístico-financeira regular acordada como consta em 2.º, nem despendeu, no âmbito desse contrato, as horas acordadas de trabalho por ano numa média de 30 horas mensais, nem reportou trimestralmente as horas despendidas tarefa a tarefa.”.

A recorrente entende que das declarações do legal representante da A, e testemunhas CC ( antigo legal representante da R), BB ( gestor do projeto da assessoria), e FF ( funcionária na Ré no departamento financeiro desde 2019), conclui-se que no ano de 2022, a recorrida não prestou à recorrente os serviços que se obrigou prestar-lhe também nesse ano, no âmbito do contrato de avença descrito em 2º e 3º dos factos provados na sentença.
Assim sendo, a matéria impugnada e que a Ré pretende ver dada como provada respeita:
. à não prestação da assessoria contabilístico-financeira regular acordada;
- à quantidade de horas despendidas ( não despendeu as horas acordadas de trabalho por ano, numa média de 30 horas mensais);
- e ao não cumprimento de uma das obrigações assumidas ( reporte das horas trimestralmente a cada tarefa) no âmbito da avença.

Cumpre, pois, verificar se a prova obtida se apresenta de molde a alterar a factualidade impugnada, nos termos pretendidos pela apelante, a respeito daqueles factos impugnados.
Desde já se deixa consignado que analisámos a prova testemunhal, depoimento de parte e aludidos pela recorrente e recorrida e ainda documental dos autos.

Quanto ao aditamento pretendido ao ponto 3º dos factos provados- ( “com reporte trimestral das horas despendidas tarefa a tarefa”), embora esse facto não tenha sido alegado, concretamente, por qualquer das partes, nem no requerimento de injunção, nem na oposição, nem no articulado de resposta apresentado posteriormente pelo autor, a verdade é que resulta do teor do documento 1 ( junto em 6-11-2024), fls 18, que “ A EMP01... obriga-se a reportar, trimestralmente, as horas despendidas por tarefa”, documento esse em que se materializa o contrato de assessoria em causa, atenta a aceitação pela ré de tais condições apresentadas pela autora.
Assim, entende-se dever considerar provado e, consequentemente aditar, aquele facto ao ponto provado nº 3º, com a redação proposta, que passará a ter a seguinte redação proposta:
Tal contrato pressupunha a afetação de 360 horas de trabalho por ano, numa média de 30 horas mensais, com reporte trimestral das horas despendidas tarefa a tarefa, um banco de horas onde até agosto de 2022 foram imputadas pela Autora 678 horas de serviço.”.
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Quanto a retirar do corpo do facto nº1 a expressão “respetivas”, não se vislumbra utilidade na sua eliminação quando todo o facto e suas alíneas respeitam, respetivamente, a cada uma das faturas.

Sem embargo, nos termos do art. 662º do CPC, determina-se, oficiosamente,  a eliminação do corpo do facto provado nº1 do segmentomostrando-se por liquidar” e que corresponde à alegação do não pagamento pela Ré.
Ora, estamos perante a alegação de obrigações pecuniárias, pelo que cumpre ao credor demonstrar o seu direito (facto constitutivo – artigo 342.º, n.º 1. do Código Civil) e ao devedor provar o pagamento, enquanto facto extintivo da obrigação (artigo 342.º, n.º 2, do CC), recaindo sobre si uma dupla presunção: a de que não pagou e a presunção de culpa de tal falta de pagamento (cumprimento) – cf. artigo 799.º, n.os 1 e 2, do CC.
Assim sendo, o facto nº1 em causa respeita aos serviços prestados pela autora à R que emitiu as faturas respetivas, presumindo-se o não pagamento, pelo que caberia sempre à R alegar e provar se estão pagas ou não foram pagas por qualquer outro motivo extintivo, impeditivo ou modificativo.
Assim, não será de boa técnica dar como provado o não pagamento ou a não liquidação, pelo que se ordena a eliminação daquele segmento.
*
A recorrente sustenta, com base na prova testemunhal que indicou ( declarações do legal representante da A AA; testemunhas BB, CC, na altura legal representante da Ré e FF), que a R , no ano de 2022, não prestou os serviços a que se obrigou no âmbito daquele contrato referido nos factos provados 2 e 3., nem despendeu as horas acordadas.
Repare-se que já não discute a restante matéria contida no ponto 1º dos factos não aprovados ( falta de acompanhamento e de reuniões, respostas morosas e desadequadas), focando-se a impugnação na não prestação de serviços a que se obrigou e de forma regular e sem dispêndio das horas acordadas.
Vejamos.
Não concordamos com a inexistência da prova da prestação de serviços acordada e das horas de trabalho despendidas pela Recorrida na execução dos serviços de consultadoria prestados durante aquele período de Janeiro a Agosto de 2022, porquanto tendo em consideração a documentação junta aos autos, e que serviu de fundamento à prova desses serviços, realizados pela Autora e a que se obrigou, mostra-se ser perfeitamente aceitável aquele número de horas médias para 8 meses de contrato- meses de janeiro a agosto de 2022, para o serviço que foi feito.
Para o efeito, veja-se o que ressuma dos documentos juntos em 6-11-2024:
. doc.s 2- email de 30-08-2022 a dar conta do reporting financeiro;
. doc.3- simulações de fecho em dezembro de 2022, balanços, demonstração de resultados;
. doc. 4- reporting Junho de 2022, balanços e demonstração de resultados;
. doc. 5- email- de 27-01-2022, com título “ Formação: relatórios Power..”;
. doc. 6- datado de 18-01-2022- “ memorando Formação”;
. Doc. 7- Formação power BI- em Janeiro de 2022;
- doc. 8- Formação power BI- em Janeiro de 2022;
- doc. 8- A- vídeo de CC, onde o próprio faz a apologia da utilidade dos serviços prestados pela autora que “ todos os dias vai aos nossos servidores e atualiza informação e extrapola dados para várias plataformas”;
- doc. 8-C- datado de 18-03-2022 “ desenvolvimento Power BI”;
- doc. 8-D- “ reporting faturação 2019-2022;
- doc. 8-E- “ reporting contabilidade 2019-2021;
- doc. 8-F- “ reporting Produção 2020-2022;
- doc. 8-G- “ reporting pendentes terceiros 2012-2022.

Acresce que, considerando os depoimentos das testemunhas BB e GG, as quais confirmaram ter sido o serviço prestado conforme acordado, bem como o mapa de horas junto aos autos, tendo esclarecido que atendendo ao excesso de horas de 2021, foi acordado não as descontar e descontar em 2022 e ainda assim havia horas a mais que não foram faturadas, pelo que atentas as horas em causa e serviço prestado,  é perfeitamente aceitável, segundo as regras da experiência, que o tempo despendido com o apoio prestado pela Autora tenha sido o acordado entre as partes, para além da intervenção da autora nos projetos que entretanto estavam em curso, como o Sifide e Due Diligence.
Repare-se que, conforme se salienta na sentença, com cuja análise crítica se concorda, “ Não existiu reclamação das restantes horas incluídas, nem da falta de reuniões, sendo que durante mais de ano e meio não houve qualquer reclamação escrita ou interpelação para tal pela Ré, o que aconteceu só no fim da relação comercial. Não houve prova que a Autora não tivesse comparecido ou evitado reuniões, nem sequer que tenha sido marcada ou pedida informação, que não tivesse resposta da Autora.
Mesmo relativamente a respostas morosas, designadamente numa falha de projeção pedida em julho de 2022, não há qualquer interpelação ou reclamação formal, sendo que não se percebeu bem a relação entre esta falta de resposta e o incumprimento bancário pela Ré, alegada pelas testemunhas FF e  DD.
Do depoimento do antigo legal representante resulta que as relações se deterioraram por várias razões, não sendo as mais relevantes as relativas à assessoria, mas sim as ligadas com o PAPN e o atraso nas vendas (que fundamentou o pedido de indemnização) e com outro programa que não chegou a ser contratado. Acresce a isto, o facto daquele querer manter os serviços da Autora enquanto esta efetuava a Due Diligence, mas os trabalhadores da Ré não concordavam com esta necessidade para os restantes serviços (como resulta dos depoimentos das testemunhas FF, EE e DD).
De resto, parece que mais do que qualquer falha objetiva da Autora, foi mais um problema de confiança entre as partes, sendo que nessa altura entrou novo CFO para as funções que foram assumidas a determinada altura pela Autora (pela saída do anterior, HH) e a Autora pressionou a Ré a pagar o faturado.”.
E daí as queixas da ré apenas surgirem em email de Julho de 2022 e daí em diante, e já quando as partes cessaram a relação jurídica ( cfr. doc.s 3 e 4 juntos com a oposição).
Mais se consigna que na data em que acordaram na realização deste contrato de assessoria- em 26 de janeiro de 2022- ( que mais não era do que a continuidade do contrato firmado entre as partes anteriormente), a ré encontrava-se com uma dívida para com a autora, numa conta corrente cujas dívidas além do mais englobava pagamentos de avenças do ano de 2021 ( cfr. emails da Ré para a A, datados de 8 e 9 de fevereiro de 2022- doc.s 9 a 9.4 juntos com a pi aperfeiçoada), o que indiciava dificuldades financeiras.
Por outro lado, no ano de 2021 vigorou entre as partes um contrato de avença e assessoria contabilístico-financeira, pelo que, crê-se, que se a ré não estivesse satisfeita com a prestação de serviços da autora não voltaria a contratar os mesmos serviços à autora, daí não se entende o depoimento das testemunhas da ré quando reafirmam “… eles nunca fizeram fechos de contas nem nunca tiveram intervenção na área contabilística de fechos de contas. Nunca.” ( cfr. depoimento da testemunha II). Por outro lado, temos testemunhas como BB a afirmar que nunca houve queixas da ré, e estas apenas surgiram quando entraram em litígio.
Tudo conjugado, torna inverosímil a não existência de serviços prestados pela autora à R no âmbito daquela avença contratada, com média de 30 horas mensais.
A respeito do não cumprimento da obrigação de reporte das horas a que se obrigou fazer a autora, tendo sido matéria alegada na oposição, na verdade não houve pronúncia acerca da mesma, nomeadamente no facto não provado nº1.
Em recurso, pretende a recorrente que se dê como provado tal facto, com base na mesma prova supra indicada.
Na verdade, da prova produzida resulta que trimestralmente não houve reporte escrito em relatório das horas despendidas por tarefa, mas o acordo não contemplava esse relatório escrito ou o modo do reporte, apenas tão somente que deveria ser feito trimestralmente.
Sem embargo, dir-se-á que não se provou que não existiu tal reporte das horas quando na verdade, o reporte até foi regular, conforme afirmado pela testemunha BB, pois a Ré sabia que trabalhos estavam a ser realizados em cada mês, estando sempre a par do que estava a ser feito, sendo certo que a bolsa de horas é prevista consoante as tarefas: sabendo as tarefas realizadas, sabia as horas despendidas. E até foram horas a mais do que o acordado, conforme afirmado pelas testemunhas BB e GG.
Portanto, ocorrendo o reporte com cada uma das tarefas feitas, e sendo feitas mensalmente, o reporte até seria mais do que o previsto, até eventualmente seria diariamente quando no vídeo junto aos autos CC diz que a autora atualiza a informação ( contabilística) todos os dias.
O legal representante da A expressivamente afirmou que “…o envolvimento era de tal ordem que eu acho que era notório para a própria EMP02...…”.
Por outro lado, ainda que dúvidas houvesse, aquele reporte ficou a constar de um mapa junto aos autos ( doc. 4), pelo que sempre ficaria sanada tal obrigação, tornando inútil a apreciação da impugnação.
Por tudo o exposto, a prova indicada pela apelante não tem a virtualidade para infirmar a convicção plasmada na sentença e com a qual concordamos, porquanto não pondera, em conjunto, toda a prova produzida nos autos e da qual ressuma a efetiva prestação de serviços a que se obrigou a autora

Improcede, pois, a impugnação, por falta de fundamento.
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Quanto ao designado “ contrato PAPN”, temos os seguintes factos impugnados:
- facto provado nº5;
- facto provado nº 7º;
- e 2º facto não provado.
Pretendendo a recorrente que se altere a redação quer dos 5º e 7º factos provados, quer do 2º facto dos não provados na sentença, considerando-o provado por inclusão no 7º facto provado, que passarão a ter a seguinte redação, respetivamente:
 -“5. Desde janeiro de 2021 foi acordado pelas partes que a Ré apresentava determinados clientes seus à Autora, que fossem elegíveis para o Programa de Apoio à Produção Nacional (PAPN) e que pretendessem adquirir os seus equipamentos de impressão de etiquetas com recurso a financiamentos daquele programa, acordando um preço mais baixo do que os honorários fixos normais da Autora, de 2.000 €.”;
- Quanto ao 7º facto provado a redação deve passar a ser a seguinte:
“7.º Foi ainda acordado que a Ré pagaria os custos iniciais dos projetos dos seus clientes à Autora, correspondente à submissão da candidatura, com um valor de €1.000,00, por cada cliente (reduzindo para 750 € a partir da 5ª candidatura), nos projetos que não tivesse aprovação, e que esse valor deveria, posteriormente, ser creditado pela Autora à Ré nos projetos que fossem aprovados, relativamente aos quais a Autora ainda pagaria à Ré uma comissão de 10% a título de angariação de clientela, calculada sobre o valor dos honorários variáveis cobrados pela Autora a cada um dos clientes da Ré.”.

A recorrente entende que os depoimentos das testemunhas CC, e DD justificam/impõem a alteração da decisão sobre a matéria de facto, bem como das regras da experiência comum e do normal das coisas, resulta evidente que o denominado contrato PAPN celebrado entre as partes teve, como condições acordadas entre as partes, que a recorrente apresentaria clientes seus à recorrida para que esta elaborasse projetos elegíveis para o programa PAPN e que pretendessem adquirir os seus equipamentos com recurso a financiamentos desse programa, que, por isso, a recorrente se responsabilizava pelo pagamento do valor de €1.000,00 a título de componente fixa dos honorários da recorrida, devidos se o projeto não fosse aprovado, creditados se fosse porque, neste caso, a recorrida englobaria os seus honorários na componente variável de honorários a cobrar aos clientes em função do valor da candidatura, devendo, neste caso, a recorrida pagar à recorrente uma comissão de 10% a título de angariação de clientela, calculada sobre o valor da componente variável dos honorários da recorrida, tal qual detalhado nas alegações supra que aqui se dão por integralmente reproduzidas.

A este respeito lê-se na fundamentação da sentença o seguinte: “ relativamente ao PAPN, também aqui em sede de oposição, a Ré aceitou a contratação com a Autora para realizar candidaturas a este programa a clientes da Ré, que pretendessem comprar equipamentos, a um preço especial.
Resulta dos emails trocados a este propósito e juntos como doc. 3 da PI, que o acordo é a Ré pagar os custos iniciais dos projetos à EMP01... com um preço especial. Não resulta aqui a obrigação de emissão de qualquer nota de crédito, nem de percentagem de valores de comissão.”

Com efeito, da prova indicada pela recorrente não se retira o acordo entre as partes conforme pretendido, para além do que está consignado no doc. 3 junto com a pi aperfeiçoada.
Em verdade, ao contrário do que entende a recorrente, não se retira do doc. 4 da p.i aperfeiçoada e doc. 9 a 9.4 que o aludido acordo do PAPN foi mais abrangente do que o que consta do doc. 3.
Desde logo, o doc 9 a 9.4- email de 09-02-2022- enviado da R (CC) para a A, nos termos do qual, além de assumir pagamentos e propor planos de pagamento, ainda se refere ao pagamento do “ PAPN- de acordo com o plano…caso a caso na aprovação”, ou seja, é uma declaração unilateral sem qualquer anuência da parte da autora para que se firme um acordo.
De igual modo, o aludido doc. 4, que é um email datado de Outubro de 2022, enviado numa altura em que as relações jurídicas tinham cessado e enviado pela A para a R, refere expressamente que não se combinou notas de crédito mas sim faturas de comissões emitidas à Ré pela angariação de cliente e esta matéria nada tem que ver com o segmento “ projetos PAPN”, cuja matéria está no parágrafo anterior daquele email.
Por outro lado, nada mais se diz a respeito das aludidas comissões, nomeadamente quanto a percentagens e a que angariações se reportava aquela alusão, pelo que tal documento de per si nada revela em termos de acordo das partes a respeito do contrato PAPN, ficando em aberto nomeadamente a questão de que percentagens se trata? e sobre todas as angariações ou só algumas e quais, nomeadamente que tivessem que ver com os projetos PAPN?
Também os doc.s 13 a 17 de per si não provam o dito acordo, porquanto são emitidos pela ré, unilateralmente e posteriormente à cessação da relação jurídica das partes.
Aquele mesmo documento nº4, quanto aos “fees”, e a respeito dos projetos PAPN, refere-se a um acordo entre as partes, em partes iguais, concluindo-lhe caber 1000 euros, metade dos seus fees habituais de 2000 euros, sendo certo que 1000 euros é precisamente a componente fixa já acordada inicialmente pelas partes e constante do acordo conforme doc.3.
Assim sendo, e a respeito, mais uma vez, nada mais se prova para além do que consta do referido doc.3.
É bem certo que a testemunha CC afirmou  a versão da ré. Contudo, não se olvide que tal depoimento foi infirmado pelas declarações do legal representante da autora, como se lê-se na sentença “ AA, que esclareceu que fora do PAPN e atendendo a que a Ré sugeriu referenciar outros clientes, foi aprovada uma comissão de 10% (como aconteceu com uma empresa, EMP08..., cujo valor foi imputado à primeira fatura, a mais antiga aqui peticionada nos autos, de acordo com o legal representante da Autora). Mas não houve acordo, mas um pedido para adiar o pagamento, uma vez que, apesar da candidatura ter sido aprovada, o pagamento (e consequente compra das máquinas) foi muito demorado e até nalguns casos não ocorreu, como resulta de troca de emails já aquando do fim dos contratos (doc. 9.1 da PI – emails de 12/09/2022 e 13/10/2022). Tal dilação foi acontecendo por as partes continuarem a laborar e na perspetiva de um negócio maior de procura de investidores.
Dos emails juntos constata-se ainda que foi várias vezes referida a emissão de nota de crédito (v.g., doc. 6 da oposição email de 23/07/2021), mas esta é uma indicação apenas da parte da Ré, sem sinais de qualquer aceitação pela Autora, ainda que tenha sido discutida no âmbito da prestação final de contas até um desconto de comissão pela angariação (mas sempre neste domínio do acordo extrajudicial), pelo que não se pode provar o alegado acordo.”.
E não se diga que o depoimento da testemunha DD elucida a questão pois apesar de afirmar a versão da ré, e que já vimos não colhe por contrariada pela restante prova, acresce que é uma testemunha que não participou nas negociações do acordo contratual entre as partes e o que diz saber é o que consta dos emails que viu trocados entre CC e a autora, sendo certo que estes emails a respeito das designadas “notas de crédito” e comissões, conforme supra analisamos, ocorrem numa altura em que já cessaram as relações jurídicas entre as partes e, portanto, não são claros, inclusive se dizem respeito até a um acordo extrajudicial, quanto mais se se referem ao acordo inicial.
Acresce dizer que esta última realidade ( acordo extrajudicial) foi afirmada pela testemunha GG (Manager na A e ali a prestar funções desde 2015), ou seja, esta testemunha referiu-se a uma reunião com DD, e numa lógica de acordo global para resolução global e numa lógica de compromisso, colocou-se a hipótese de comissões, numa situação única e como forma de desconto para se resolver toda a situação.
Por tudo o exposto, a prova indicada pela apelante não tem a virtualidade para infirmar a convicção plasmada na sentença e com a qual concordamos, porquanto não pondera, em conjunto, toda a prova produzida nos autos.
Improcede, pois, a impugnação, por falta de fundamento.
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Quanto ao designado contrato-“ candidatura ao programa SIQPME”, temos o seguinte facto impugnado:
- 5º facto não provado.
Pretendendo a recorrente que se altere a redação do 5º facto dos não provados na sentença, cuja matéria deve considerar-se provada nos termos da redação de um 18ª facto provado nos seguintes termos:
“ 18.º As partes acordaram a imputação nesta fatura do valor pago a 30/09/2021.”.
Neste particular, atentos os factos provados nos pontos 15º e 16º e nada mais de provando, cremos ser irrelevante, aliás como também a recorrente sustenta numa primeira análise, aferir se a imputação obteve ou não o acordo do credor, pelo que se torna inútil a sua apreciação, seguindo-se, assim, a jurisprudência dos tribunais superiores em casos similares ( cfr. art. 130º do CPC).
Com efeito, numa situação em que temos o facto provado ( nº16) e não impugnado de que a ré pagou o valor da fatura nº “…162”, tendo emitido recibo com aquela referência à fatura, pagamento esse feito em 30-09-2021, numa altura em que a ré era devedora de várias quantias à A e realizando aquele pagamento o qual não permitia extinguir todas, a lei permite ao devedor escolher aquela que pretende extinguir. Mais: nesse caso, o devedor encontra-se, pois, dispensado, da anuência do credor.
Daí ser inútil apreciar aquela matéria de facto dada como não provada e a respeito do acordo com a autora na imputação naquela fatura.
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Quanto ao designado “ contrato SI Inovação Covid 19”, temos os seguintes factos impugnados:
- facto provado nº10;
- facto provado nº 12º;
- e 3º facto não provado.
Pretendendo a recorrente que se altere a redação quer dos 10º e 12º factos provados, quer do 3º facto dos não provados na sentença, cuja matéria deve considerar-se provada nos termos da redação de um 19ª facto provado, factos estes que deverão passar a ter a seguinte redação:
“10.º À Autora estavam adstritas as funções de elaboração (nomeadamente com entrega de check-list com informação necessária à elaboração da candidatura, identificação dos investimentos elegíveis) e submissão da candidatura, e numa segunda fase, de apoio na contratualização do incentivo junto do organismo coordenador, as funções de análise do documento de decisão emitido por este organismo, de apresentação de alegações contrárias (se aplicável) e de recolha dos elementos necessários para a contratualização.”
“12.º A candidatura foi apresentada a 24/04/2020 e aprovada pelo IAPMEI para concessão de investimento financiado e aprovado de €950.386,39 a executar entre 2020-05.31 e 2020-06.30, tendo sido remetido pedido de pagamento final em agosto de 2020 e emitida a fatura ...82, parcialmente por pagar.”
“19.º O valor da componente variável dos honorários para o contrato SI Inovação Covid-19 apenas se vence após o último pagamento efetuado pelo IAPMEI, pagamento este que já ocorreu, a Autora deveria ter feito alegações contrárias à decisão do IAPMEI mas não as fez, nem em 2020 nem no encerramento do projecto em finais de 2023, o que a Ré reclamou.”

A recorrente entende que os depoimentos de CC e EE “justificam/impõem a alteração da decisão sobre a matéria de facto, bem como das regras da experiência comum e do normal das coisas, resulta evidente que o denominado contrato Covid-19 celebrado entre as partes teve, como condições acordadas entre as partes, que a recorrida se obrigou a elaborar uma candidatura da recorrente ao programa SI Inovação Covid-19, e a acompanhar essa candidatura até final, isto é, até ao encerramento dessa candidatura junto do IAPMEI, nomeadamente elaborando, se necessário, como foi, alegações contrárias a uma decisão total ou parcialmente desfavorável (que ocorreu), acompanhamento e alegações contrárias essas que a recorrida não fez, e, ainda, que, a candidatura foi mal elaborada pela recorrida, o que deu causa a uma perda de cerca de €300.000,00 à recorrente, por redução do financiamento elegível nesse montante, tendo sido aprovado um financiamento de €950.386,39, que, atenta a inoperância da recorrida, apenas a recorrente “salvou” pela sua intervenção contra a intenção do IAPMEI de resolver todo o contrato de financiamento, razões pelas quais, não só não são devidos à recorrida os honorários que esta reclama da recorrente, inclusive pela excepção de não cumprimento que esta lhe opõe, como, ainda por cima, a recorrida, com sufrágio errado do tribunal “a quo”, calculou os seus honorários com base no investimento elegível, não financiamento aprovado como contratado, tal qual detalhado nas alegações supra que aqui se dão por integralmente reproduzidas”.

A este respeito lê-se na fundamentação da sentença o seguinte: “o mesmo acontece com o SI Inovação Covid-19, que a Ré aceita nos seus termos, mas mais uma vez refere que o pagamento apenas não ocorreu por ter referido várias vezes à Autora que só era devido quando recebesse o último pagamento – ao contrário do acordado inicialmente e sem evidência de acordo ulterior.
O legal representante da Autora, AA, admite que existiu um acordo apenas para dividir em três partes a componente variável, aparecendo, assim, uma fatura parcial em dívida respeitante a parte da 2.ª tranche (JJ 20/...82, emitida em ../../2020).”.
Com efeito, da prova indicada pela recorrente não se retira o acordo entre as partes conforme pretendido, para além do que está consignado no doc. 4 junto com requerimento de 24-10-2023 e cuja factualidade está refletida no ponto 11 dos factos provados ( facto estável, atenta a rejeição da impugnação a respeito), nos termos do qual os honorários quanto à componente variável são devidos com a aprovação da candidatura, aliás de acordo com o acordo contratual realizado entre as partes e constante daquele doc.4.
Repare-se ainda que a quantia em causa corresponde ao cálculo da percentagem sobre o total efetivamente financiado e que foi reduzido para €950.386,39 e ao que parece, em recurso, a R aceita estar pago, atenta a redação pretendida dar ao ponto 19º.
Ou seja, tendo sido aprovado o financiamento, logo em 07-05-2020, os honorários eram devidos, de tal modo que, conforme depoimento da testemunha GG, foram pagos numa primeira tranche no valor de 12.500 euros, resultando na contabilidade ainda um saldo em dívida e correspondente a uma segunda tranche, o que tudo inculca que a Ré nunca discutiu aquela dívida, apenas agora que surgiu o litigio entre as partes e com justificações em fundamento, qual seja “ não recebeu o incentivo a que tinha direito por a autora não ter feito alegações”, quando houve despesas que o IAPMEI não considerou elegíveis e que foi a ré quem indicou, bem como a ré não procedeu a alguns trâmites e que levou a que não tivesse direito àquela majoração de 15% do financiamento, ou seja, tudo matérias que nada têm que ver com as obrigações da autora.
A autora tratou, conforme sua obrigação, da candidatura, a qual foi aprovada, únicas condições para o pagamento dos honorários, pelo que tem direito aos honorários acordados serem pagos aquando da aprovação da candidatura, conforme acordo das partes, e reafirmado pelas testemunhas KK e LL.
Assim sendo, a prova indicada pela apelante, nomeadamente os depoimentos das testemunhas CC e EE não têm a virtualidade para infirmar a convicção plasmada na sentença e com a qual concordamos, porquanto não pondera, em conjunto, toda a prova produzida nos autos, sendo certo que são depoimentos que poderiam ter interesse para a matéria alegada em sede de reconvenção, mas que não é objeto dos presentes autos.
A este propósito lê-se na sentença “ Do depoimento conjugado das testemunhas (LL, CC, EE e FF) resulta que a Ré sempre teve acesso à plataforma, sendo notificada das mensagens, sendo o responsável pelo projeto o administrador, que assinou o contrato com o Estado, ciente das suas obrigações. Não resulta que tenha sido pedido mais algum serviço à Autora no âmbito deste programa, em 2023, sendo que em dezembro de 2020 já tinham sido dadas à Ré as informações relevantes para esta vistoria final (doc. 7 oposição).
Em junho, findo o prazo de contratualização, a Autora remete à Ré um guia de acompanhamento (doc. 12 junto a 06/11/2024), salientando nesse email as regras que devem ser cumpridas pela Ré e eventual reunião.
Dos documentos juntos pela Ré (doc. 7 da oposição) resulta ainda que há uma decisão intercalar em dezembro de 2020, e uma reunião em que são tomadas decisões relativamente aos problemas apontados pelo IAPMEI.
A Ré desde essa altura é informada dos trâmites a seguir, aquando da auditoria final (doc. 8 da oposição) e que deveria desde essa altura ter diligenciado, nomeadamente quanto à majoração e aos valores não aceites. Em 2023, já depois de cessarem as relações com a Autora, a auditoria final não tinha sido realizada, tendo pedido a Ré diretamente ao IAPMEI informações sobre o estado do valor final (5% em falta), aos que a Ré teve de responder.
Sem prejuízo de outras questões levantadas em sede de reconvenção não admitida, a verdade é que resulta do contrato que os honorários seriam devidos com a comunicação da aprovação da candidatura, sendo que o pedido de pagamento final ocorreu em agosto, data em que foi efetivamente faturado e que seria devido o pagamento.”.
Acresce dizer que a testemunha GG ainda sublinhou, neste particular, que a autora alertou a ré para aquelas questões que exigiam regularização para ter direito ao financiamento pedido inicialmente e nada foi feito, nomeadamente a ré tinha dois meses para executar o projeto, ou seja, de maio a Julho e não o fez. A testemunha deu o exemplo de a ré não ter registado as máscaras, pelo que não teve direito à majoração de 15% e isso apenas à ré incumbia, mas também aqui tudo se reporta a matéria que não é discutida nos presentes autos, mas com eventual interesse para a matéria alegada em sede de reconvenção e que não é objeto dos presentes autos.
E não sendo tais matérias condição para o pagamento dos honorários, não têm interesse, porquanto a única condição para o pagamento daquele era a aprovação do financiamento, o qual não se discute que foi aprovado, apenas não foi na quantia peticionada inicialmente.
Improcede, pois, a impugnação, por falta de fundamento.
*
Quanto ao designado “ contrato Sifide”, temos os seguintes factos impugnados:
- facto provado nº13;
- facto provado nº 14º;
- e 4º facto não provado.
Pretendendo a recorrente que se altere a redação quer dos 13º e 14º factos provados, quer do 4º facto dos não provados na sentença, cuja matéria deve considerar-se provada nos termos da redação de um 20º facto provado, factos estes que deverão passar a ter a seguinte redação:
“13.º Depois de contratada durante o ano de 2020 para apresentação de contra-alegações referentes ao ano fiscal de 2018, a Autora foi contratada pela Ré para elaboração e submissão de candidaturas ao SIFIDE para o período fiscal de 2019 a 2021, desde o diagnóstico, planeamento e acompanhamento institucional, mediante o pagamento de honorários calculados sobre ganhos incrementais do crédito fiscal aprovado relativamente ao nível habitual de SIFIDE que a Ré vinha obtendo nos últimos anos, com um mínimo de €2.500 (dois mil e quinhentos euros) por candidatura, a pagar na aprovação (30%) e no usufruto (70%).”
14.º A Autora apresentou as candidaturas e, com a aprovação das três candidaturas, emitiu faturas iniciais – faturas ...02, ...41 e ...45.”
“20.º As candidaturas ao SIFIDE para o período fiscal de 2019 a 2021 foram feitas internamente por colaboradores da própria Ré, atenta a inoperância da Autora, que apenas as submeteu.”

A recorrente entende que os depoimentos das testemunhas EE e de ... “ justificam/impõem a alteração da decisão sobre a matéria de facto, bem como das regras da experiência comum e do normal das coisas, resulta evidente que a recorrida não elaborou as candidaturas para os anos 2019, 2020 e 2021 do denominado contrato SIFIDE, apesar de se ter obrigado contratualmente a fazê-las, não apenas a corrigi-las e submete-las na respetiva plataforma”.

A este respeito lê-se na fundamentação da sentença o seguinte: “ relativamente ao SIFIDE a Ré não nega nem o contratado, nem a emissão das faturas propriamente ditas (nada tendo sido aqui referido quanto ao valor, tendo sido juntos elementos da aprovação – doc. 14 de 6/11/2024) mas acrescenta que a Autora não fez trabalho nenhum de estudo e recolha dos elementos, que foi feito internamente, tendo a Autora apenas submetido a candidatura.
Ora, não seria credível que a Autora durante três anos não tenha feito nada, e faturados milhares de euros, sem qualquer reclamação. E efetivamente, do que resulta da prova produzida é que os serviços da Ré constataram que, antes faziam a candidatura e depois continuaram a fazer, e durante os anos em que a Ré a fez, também tiveram que prestar todas as informações, pelo que não lhes parecia um gasto razoável (cf. depoimentos de EE e FF da contabilidade).
A testemunha GG e KK da Autora confirmam o serviço prestado e que até receberam elogios, com a aprovação do incentivo correspondente, e que até iniciaram o levantamento para 2022, e a efetuar uma nova base para cálculo das horas de trabalhos de ID (que tinha colocado mais dúvidas nos anos anteriores), trabalho que só cessou aquando do fim da relação comercial.
O próprio legal representante legal na altura, CC, admite que o SIFIDE era um complemento do trabalho todo e que foi prestado, mas por erro, não deveriam ter contratado terceiros. Em elementos juntos aos autos, só referia problemas financeiros, nomeadamente em email datado de 7/02/2022 em que pede o pagamento a prestações, não havendo outra justificação.”.
Vejamos.
Em primeiro lugar, não se vislumbra porque razão a recorrente pretende que se retire do ponto provado nº14º o segmento “ referentes a 30% dos honorários acordados”, quando aceita no ponto provado nº13º os honorários a pagar em 30% na aprovação, sendo certo que a quantia peticionada respeita a esses 30% calculados sobre os ganhos incrementais do crédito fiscal aprovado, aliás conforme contratualizado entre as partes.
Também não se vislumbra porque razão pretende a recorrente que se adite ao ponto 13º aquele segmento “ relativamente ao nível habitual de SIFIDE que a Ré vinha obtendo nos últimos anos”, quando se trata da contratualização de cada uma das candidaturas individualmente e sem referências a “ nível habitual de Sifide que a ré vinha obtendo”, quando até se percebe que a ré vem obtendo tais “sifides”, ultimamente sempre com a intervenção da autora.
Por outro lado, os documentos nº 13 a 23 ( juntos com requerimento 6-11-2024), espelham bem o trabalho feito pela autora nas candidaturas aos SIFIDES de 2019, 2020 e 2021, pelo que não é inverosímil que não tenha sido feito o trabalho pela autora, ainda que com colaboração da R, atentos os elementos que disponibilizou e pedidos pela autora, conforme emails juntos aos autos.
Aliás no email de 9-02-2022 ( cfr. doc. 9 a 9.4), a testemunha CC, CEO da Ré, assume o pagamento do trabalho do SIFIDE de 2019, em 6 prestações.
Assim sendo, a prova indicada pela apelante, nomeadamente os depoimentos das testemunhas EE e II não têm a virtualidade para infirmar a convicção plasmada na sentença e com a qual concordamos, porquanto não pondera, em conjunto, toda a prova produzida nos autos, nomeadamente a documental e donde ressumam as candidaturas efetuadas e donde se conclui que a obrigação da autora foi prestada conforme acordo das partes. Agora se não era necessária tal prestação de serviços por sempre ter sido assegurada pelos funcionários da ré e por terem tal capacidade para o fazer sem intervenção de terceiros já não é matéria com interesse para o desfecho da causa.
Improcede, pois, a impugnação pretendida.
*
IV
 A factualidade (provada) a atender para efeito da decisão a proferir é a já constante de III, com a retificação ordenada oficiosamente ao corpo do facto provado nº1, com eliminação do segmento “… mostrando-se por liquidar” e correção com aditamento ao facto provado nº3.
*
V. Reapreciação de direito.

Como resulta das conclusões do recurso da Ré/apelante, a alteração da decisão, na parte da matéria de direito, dependia da modificação/alteração da decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal a quo.
Contudo, como já se viu, considerou este tribunal da Relação ser de improceder o recurso na parte referente à reapreciação da decisão da matéria de facto, razão pela qual não se introduziram modificações nas respostas que foram dadas pela primeira instância aos concretos pontos de facto impugnados pela R/apelante ( com exceção do corpo do facto provado nº1, com eliminação oficiosa do segmento “… mostrando-se por liquidar” e aditamento ao facto provado nº3).
Esta alteração não tem relevância no desfecho do mérito da ação, sendo certo que em relação aos contratos de assessoria/avença, PAPN, SI Inovação Covid, Sifide  considerando o disposto pelo artº 608º nº2 aplicável ex vi do nº2, do artº 663º, ambos do Código de Processo Civil, e não se nos impondo tecer quaisquer considerações quanto à bondade e acerto da decisão da primeira instância no âmbito da subsunção dos factos às normas legais correspondentes, temos que a apelação terá de inevitavelmente improceder, mantendo-se e confirmando-se a sentença recorrida, a respeito.
Já em relação ao contrato “SIQPME”, ao contrário do sustentado na sentença, consideramos que o pagamento feito pela Ré da fatura “...62”, donde consta a dívida “ tranche da SIQPME” e com referência a essa mesma fatura apenas poderá significar que a Ré pretendia pagar essa dívida “SIQPME”( cfr. doc. 10 junto com oposição e fatura junta com requerimento datado de 24-10-2023).
Ora, dispõe o artigo 783º do Código Civil (designação pelo devedor) que se o devedor, por diversas dívidas da mesma espécie ao mesmo credor, efetuar uma prestação que não chegue para as extinguir a todas, fica à sua escolha designar as dívidas a que o cumprimento se refere (n.º 1) e que o devedor não pode designar contra a vontade do credor uma dívida que ainda não esteja vencida, se o prazo tiver sido estabelecido em benefício do credor; e também não lhe é lícito designar contra a vontade do credor uma dívida de montante superior ao da prestação efetuada, desde que o credor tenha o direito de recusar a prestação parcial (n.º 2).
Ou seja, o devedor pode escolher a dívida que quer extinguir e está dispensado da anuência do credor, desde que não ocorram as limitações daquele nº2.
“ Estamos perante uma norma em que existe um claro favor debitoris. Uma vez que não existe qualquer critério de preferência temporal no que se refere ao cumprimento das obrigações, o devedor é em princípio livre de optar por aquela dívida cuja extinção considera mais conveniente ( AC PR 14-12-2017”( in Comentário ao CC, da UCP, p. 1073)
No caso temos uma escolha feita pelo devedor de modo expresso: temos o facto provado ( nº16) e não impugnado de que a ré pagou o valor da fatura nº “…162”, tendo emitido recibo com aquela referência à fatura, pagamento esse feito em 30-09-2021, numa altura em que a ré era devedora de várias quantias à A e realizando aquele pagamento o qual não permitia extinguir todas, a lei permite ao devedor escolher aquela que pretende extinguir.
Por outro lado, o devedor encontra-se, pois, dispensado, da anuência do credor.
Acresce dizer que, no caso, além de termos uma escolha expressa, ainda temos uma escolha tácita, porquanto o pagamento em causa é em quantia de valor igual àquela fatura em causa, a qual é uma das dívidas da Ré para com a autora ( a do contrato SIQPME), pelo que dúvidas não restam de que o devedor escolheu a divida que pretendia pagar e não estamos perante qualquer uma das exceções da lei a esta designação pelo devedor prevista no art. 783º do CC.
Do exposto deriva que, no caso presente e contrariamente ao entendido na sentença recorrida, tratando-se de uma sucessão de dívidas da ré, da mesma espécie ( obrigações pecuniárias), oriundas de diversos contratos de prestação de serviços e relativamente ao mesmo credor – a autora/recorrida – em primeira linha tem aplicação o estatuído no citado nº 1 do art. 783º do C. Civil e, consequentemente, estando provado que a ré ao efetuar aquele pagamento indicou expressamente a dívida em causa, com referência à fatura respetiva, a que o mesmo se destinava, a autora, enquanto credora, não podia imputá-lo a outras dívidas ainda que mais antigas, como fez.
Assim sendo, considera-se que a dívida constante da fatura nº ...62 está paga.
Destarte, resta absolver a Ré deste pedido de pagamento na quantia de € 9.225,00, pelo que deverá ser condenada na quantia peticionada correspondente à soma das faturas em dívida e não pagas, subtraída deste valor pago, ou seja, deverá ser condenada na quantia de € 64.452,4 ( 73.677,40- € 9.225), acrescida de juros moratórios desde a data de vencimento das faturas em dívida até efetivo e integral pagamento.

V. Decisão.

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes da 3ª Secção Cível deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente a apelação, e, em consequência, determina-se a absolvição da ré do pedido de condenação na dívida “SIQPME” no valor de € 9.225,00 e, no mais confirma-se a sentença, condenando-se a Ré EMP02..., S.A. a pagar à Autora EMP01..., S.A., a quantia de € 64.452,4, acrescida de juros moratórios desde a data de vencimento das faturas até efetivo e integral pagamento, às taxas legalmente e supletivamente estabelecidas para as obrigações comerciais e da quantia de € 40 (quarenta Euros) relativa a indemnização legalmente prevista.
Custas da ação e do recurso pela ré/recorrente e recorrida, na proporção do decaimento.
*
Guimarães, 4 de novembro de 2025

Anizabel Sousa Pereira
José Manuel Flores e
Fernanda Proença Fernandes

[1]   In “Código de Processo Civil Anotado”, Volume V, páginas 139 e 140.