Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA JOÃO MATOS | ||
Descritores: | LETRA DE CÂMBIO REFORMA NOVAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 11/17/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | I. A reforma de uma letra é a sua substituição por outra, por os intervenientes terem acordado em diferir o vencimento, ou por haver intervenção de novos subscritores ou a eliminação de alguns dos anteriores, ou por o devedor ter efectuado um pagamento parcial, sendo neste caso emitido um novo título com o valor da diferença entre o pagamento efectuado e a dívida inicial. II. A simples reforma da letra não implica, só por si, a novação da obrigação nela incorporada, sendo necessário - para a extinção e substituição definitiva da obrigação inicial por uma nova -, uma vontade expressa e inequivocamente manifestada nesse sentido, conforme art. 859º do C.C.. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo I - RELATÓRIO 1.1. Decisão impugnada 1.1.1. B…, residente no Lugar de Daivões, Salvador, concelho de Ribeira de Pena (Recorrido), propôs a presente oposição à acção executiva comum, proposta contra si por C…, Montalegre (Recorrente), pedindo que • a mesma fosse recebida e julgada procedente, sendo ele próprio absolvido do pedido formulado na dita acção executiva. Alegou para o efeito, em síntese, ter sido a letra de câmbio apresentada como título executivo, de € 8.000,00, substituída por uma outra, de € 8.600,00, sacada pelo Exequente sobre D… que igualmente a aceitou, limitando-se ele próprio a avalizá-la; e ter resultado essa substituição de títulos da cedência da dívida que a primitiva corporizava, feita por si a favor de D…, cedência que o Exequente aceitou. Mais alegou que esta nova letra foi depois substituída por uma outra, de € 9.200,00, de novo sacada pelo Exequente sobre D…, que a aceitou, actualizando-se assim os juros devidos. Defendeu, por isso, o Oponente (Executado) que o Oponido (Exequente), ao executar o primitivo título, estaria a cobrar-se duas vezes pelo mesmo negócio, com duas pessoas distintas. 1.1.2. Foi proferido despacho liminar, admitindo a oposição à execução e ordenando a notificação do Exequente (Oponido) para, querendo e em vinte dias, a contestar, sob pena de se considerarem confessados os factos alegados pelo Executado (Oponente). 1.1.3. O Exequente (Oponido) contestou, pedindo que a oposição fosse julgada improcedente, por não provada. Alegou para o efeito, em síntese, que tendo vendido diverso material agrícola do seu comércio ao Executado (Oponente), o mesmo emanou e assinou a seu favor uma letra, de € 8.000,00, para pagamento parcial do preço total devido. Mais alegou que, nada lhe tendo sido pago por conta da dita letra, vem suportando, ele próprio, desde Agosto de 2009, a sua reforma, ascendendo o seu prejuízo a mais de € 10.000,00. Por fim, o Exequente (Oponido) alegou que nunca o Executado (Oponente) negou a sua dívida, antes reiterando promessas de a honrar, ou directamente ou por intermédio de Terceiros, sendo que ele próprio nunca aceitou qualquer cedência da mesma. 1.1.4. Atenta a simplicidade da causa, foi dispensa a realização de audiência preliminar e proferido despacho saneador (certificando a validade e a regularidade da instância). 1.1.5. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, julgando «procedente, por provada, a presente oposição e, consequentemente», determinando «a extinção dos autos executivos com o consequente levantamento das penhoras efectuadas nos autos». * 1.2. Recurso (fundamentos) Foi precisamente inconformado com esta decisão que o Exequente (Oponido) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse julgado procedente e, desse modo, revogada a decisão recorrida, substituindo-se por outra, a mandar prosseguir a Execução Comum nº 200/11.8TBMTR. Concluiu as suas alegações da seguinte forma (sintetizada, sem repetições de processado, ou reproduções de textos legais ou jurisprudenciais): 1ª - A reforma de uma letra de câmbio não importa, por si só, a novação da obrigação cambiária (o que pressupõe a manifestação de uma vontade inequívoca nesse sentido). 4 - A reforma de uma letra não importa a novação da obrigação cambiária, o que pressuporia a manifestação de uma vontade inequívoca nesse sentido, o que não sucedeu, nem foi invocado pela exequente. 5 - Por conseguinte, é de concluir que a simples substituição de uma letra por outra não implica, por si só, a novação da obrigação, excepto se houver expressa e inequívoca manifestação de vontade dos intervenientes nesse sentido, tal como sucede com a emissão da primeira letra, geradora da obrigação cambiária, com respeito à relação subjacente. 6 - Ora, é manifesto que da matéria assente não resulta minimamente demonstrada a vontade das partes em constituir, através da reforma das letras dos autos, novas obrigações cambiárias, distintas das constituídas através das primitivas letras. 2ª - A letra reformada e a letra que operou a reforma reportam-se à mesma relação subjacente, que permanece inalterada nos autos, já que nenhum pagamento - ainda que parcial - foi efectuado, inexistindo qualquer outra causa de extinção da obrigação. 7 - A reforma de uma letra não significa a multiplicação da obrigação que determinou a respectiva emissão, referindo-se a anterior e a nova letra à mesma relação subjacente e à satisfação de um único interesse patrimonial, 8 - Reconduz-se melhor ao conceito de alteração do que ao de novação e, de qualquer modo, não é suficiente o elemento objectivo de substituição de uma letra por outra, sendo ainda indispensável a declaração de vontade de extinção da primitiva obrigação cambiária, manifestada pelo modo expresso já apreciado. 9 - Não se tendo apurado o pagamento integral do valor constante de cada uma das letras dadas à execução, a novação da obrigação correspondente, ou qualquer outra forma de extinção da obrigação exequenda, é manifesto que a oposição não pode proceder, sem esquecer que se deu como provado a relação comercial subjacente entre exequente e executado e que este nada pagou * 1.3. Recurso (contra-alegações) O Executado (Recorrido) contra-alegou, pedindo que fosse negado provimento ao recurso, e mantida a sentença recorrida. Defendeu nas suas contra-alegações, singelamente, ter o Tribunal a quo decidido com acerto, quer em termos de julgamento da matéria de facto, quer na interpretação e aplicação do direito aos factos apurados. * II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR 2.1. Objecto do recurso - EM GERAL O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2, ambos do CPC). * 2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar Mercê do exposto, uma única questão foi submetida à apreciação deste Tribunal: - • A reforma de uma letra de câmbio implica necessariamente a novação da dívida que a mesma corporiza, tornando inexequível o título inicial (reformado) ? * III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Com interesse para a apreciação da questão enunciada, foram dados como provados pelo Tribunal a quo os seguintes factos (aqui devidamente numerados e reordenados, lógica e cronologicamente): 1 – B… (Executado e Oponente) tanto está em Portugal como na Suíça. 2 – C… (Exequente e Oponido) é comerciante, proprietário do estabelecimento comercial xxx, dedicando-se à venda de tractores, máquinas agrícolas e afins. 3 - No âmbito da sua actividade, e porque o Executado (Oponente) foi candidato a um projecto agrícola no IFAP, o Exequente (Oponido) procedeu à venda àquele de vários materiais e maquinaria agrícola, tendo-lhe o Executado pedido, a fim de ser subsidiado, que emanasse um recibo pro-forma, para receber o dinheiro do projecto. 4 - Não tendo o Executado (Oponente) pago ao Exequente (Oponido) os vários materiais e maquinaria agrícola referidos no facto provado anterior, aquele emanou e assinou para o efeito, a favor deste, uma letra de câmbio, no valor de € 8.000,00 (oito mil euros, e zero cêntimos), prometendo-lhe que pagaria. 5 - O negócio realizado a pedido do Executado (Oponente) foi em valor superior a € 8.000,00 (oito mil euros, e zero cêntimos), com venda de mais material agrícola, cujo total do negócio aquele reconheceu e assinou uma declaração de dívida. 6 - O Exequente (Oponido) interpelou o Executado (Oponente) para pagar a quantia em débito, dando-lhe um prazo para regularizar e pagar a dívida, bem como os juros comerciais. 7 - Desde Agosto de 2009 que o Exequente (Oponido) tem suportado a reforma da letra de € 8.000,00 (oito mil euros, e zero cêntimos), cujo montante se encontra totalmente em dívida, não tendo sido paga pelo Executado (Oponente) qualquer quantia. 8 - O título executivo que serve de base a esta execução (letra de câmbio no valor de € 8.000,00) foi substituído por uma outra letra de câmbio, passada a favor do Exequente (Oponido) e por ele assinada, na qualidade de sacador. 9 - A letra dada à execução (letra de câmbio no valor de € 8.000,00) foi reformada por outra letra de câmbio, emitida em 03 de Agosto de 2009, no valor de 8.600,00 € (oito mil, seiscentos euros e zero cêntimos), sacada sobre D… e por este aceite, a favor do sacador, aqui Exequente, e com vencimento em 03 de Novembro de 2009 (conforme cópia que é fls. 6 e 87 dos autos, e que aqui se dá por integralmente reproduzida). 10 - Posteriormente, o Exequente recebeu uma nova letra de câmbio, emitida em 10 de Novembro de 2009, no valor de € 9.200,00 (nove mil, duzentos euros, e zero cêntimos), que assinou na qualidade de sacador, aceite pelo sacado D…, para reformar a letra no valor de 8.600,00€, com os valores actualizados de juros (conforme cópia que é fls. 6 e 87 dos autos, e que aqui se dá por integralmente reproduzida). 11 - O Exequente não celebrou qualquer contrato com D…, nem lhe vendeu quaisquer bens. 12 - Na acção executiva comum que o Exequente moveu contra o Executado (de que estes autos são apenso, e dos bens aí apreendidos pela Senhora Solicitadora de Execução, faz parte o tractor agrícola de marca Hurlimann, com a matrícula 58-FZ- 48, o qual foi um dos bens que foi alvo de negócio entre o Executado e o Exequente, não tendo aquele pago a este a parte que o mesmo peticiona nos autos principais. * IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO 4.1. Título executivo - Letra de câmbio 4.1.1.1. Título executivo Lia-se no art. 45º, nº 1 do C.P.C. (vigente à data da instauração em juízo da acção executiva que constitui os autos principais) que toda «a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva». Mais se lia, no art. 46º, nº 1, al. c) do mesmo diploma, que «à execução (..) podem servir de base os documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável nos termos do art. 805º» do mesmo diploma. Entre estes documentos poderá figurar a letra de câmbio, definida pelo art. 1º da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças (L.U.S.L.L.) como um título à ordem, sujeito a certas formalidades, pelo qual uma pessoa – sacador – ordena a outra – sacado – que lhe pague a si ou a terceiro – tomador - determinada importância. A supressão da referência expressa à letra de câmbio, no elenco dos títulos executivos, foi realizada pela revisão introduzida no C.P.C. então em vigor, pelo Dec-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, por ser tida como desnecessária (José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume 1º, 2ª ed, Coimbra Editora, 2008, p. 93). * 4.1.1.2. Letra de câmbio - Obrigados cambiários Relativamente ao aceitante de uma letra, lê-se no art. 28º da L.U.S.L.L. que «o sacado obriga-se pelo aceite a pagar a letra à data do vencimento». Esta obrigação nasce exclusivamente do acto formal da sua assinatura, prometendo por ela executar a ordem de pagamento que no título se contém: deve o montante da letra, ainda que nada devesse ao sacador, e deve-o por efeito da promessa directa que fez ao tomador, firmando a letra com a sua assinatura. Por outras palavras, «o aceitante é o devedor principal e isto porque é ele que assume o compromisso de efectuar o pagamento da letra, no seu vencimento. Certo que tal compromisso tem o mesmo objecto que a obrigação de pagamento assumida, antes, pelo sacador, com o simples acto de emissão da letra; ambos se obrigam à mesma prestação pecuniária e assim assumem perante o portador da letra uma posição que, sob certo aspecto, se pode definir como a de co-devedores solidários mas que, se considerarmos, segundo a estrutura do título, a posição recíproca dos dois responsáveis, sacador e aceitante, melhor se definirá pelos conceitos de obrigação principal e obrigação acessória, sendo o aceitante, porque se conforma com a ordem dada, o devedor principal, e o sacador apenas um devedor subsidiário, que, como ordenador do pagamento por outrem, só se responsabiliza naturalmente pela efectivação deste, no caso de a ordem não ser cumprida. A sua obrigação é, por assim dizer, secundária» (Pereira Coelho, citado por Abel Delgado, Lei Uniforme Sobre Letras E Livranças, 6ª edição, Livraria Petrony, Ldª, Lisboa, 1990, p. 149, com bold apócrifo). No entanto, o sacador, sendo garante do pagamento da letra, não deixa de ser o seu garante específico, nunca podendo desonerar-se da garantia do pagamento do montante nela inscrito (art. 9º da L.U.S.L.L.). Por fim, podendo o pagamento do subscritor da livrança «ser no todo ou em parte garantido por aval», o avalista - dador de aval - será «responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada» (arts. 30º, 1º e 32º, 1º, respectivamente, da L.U.S.L.L.). Lê-se ainda no art. 43º da L.U.L.L. que «o portador de uma letra pode exercer os seus direitos de acção contra os endossantes, sacador e outos co-obrigados no vencimento», sendo todos solidariamente responsáveis para com ele (ainda art. 47º do mesmo diploma). Assim se compreende que a acção cambiária, a que emerge directamente da letra, seja dirigida contra o devedor principal, o aceitante, e a acção de regresso seja dirigida contra os obrigados de regresso, entres os quais se conta o sacador (art. 43º da L.U.S.L.L.). E assim se compreende outrossim que a solidariedade entre os obrigados cambiários, que permite que o portador tenha o direito de accionar todos os obrigados - sacadores, aceitantes, endossantes ou avalistas - , individualmente ou colectivamente, sem estar adstrito à ordem por que eles se obrigaram, seja uma solidariedade imprópria (art. 47º da L.U.L.L.). Com efeito, «o sacador, endossante e respectivos avalistas são obrigados indirectos, assumem uma obrigação acessória, de garantia para com o portador, podendo recuperar integralmente dos obrigados anteriores o que pagaram ao portador. O aceitante é o único obrigado directo, o devedor principal da prestação cambiária. A prestação não se divide, pois, pelos condevedores, como na solidariedade verdadeira e própria. A solidariedade significa apenas que o portador, assim como o signatário que realizou o pagamento recuperatório, podem exigir de qualquer dos responsáveis, individual ou colectivamente (...) a totalidade da letra» (Pereira Coelho, citado por Abel Delgado, op cit., p. 275 e 276). Contudo, a recusa de pagamento deverá ser comprovada por um acto formal, o protesto (art. 44º da L.U.S.L.L.). Feito, o portador do título pode reclamar daquele ou daqueles contra quem exerce o seu direito de acção o pagamento da letra, dos juros devidos desde a data do seu vencimento, das despesas de protesto, das dos avisos dados e de outras despesas (art. 48º do mesmo texto). * 4.1.1.3. Negócio Cartular - Negócio Subjacente (Relações Mediatas - Relações Imediatas) Lê-se no art. 17º da L.U.S.L.L. que «as pessoas accionadas em virtude de uma letra não podem opor ao portador do título as excepções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com os portadores anteriores, a menos que o portador ao adquirir a letra tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor». Logo, numa letra há que distinguir duas realidades: o negócio cartular e o negócio subjacente. O negócio cartular exprime-se num crédito pecuniário, do qual é sujeito activo o legítimo portador do título e sujeito passivos todos os intervenientes no mesmo. Em consequência, o saque de uma letra constitui sempre uma atribuição patrimonial enquanto «deslocação patrimonial de uma pessoa para outra» (Pedro Pais de Vasconcelos, Direito Comercial – Títulos de Crédito, A.A.F.D.L., 1990, p. 3). Contudo, subjacente ao saque de uma letra existe sempre um negócio que determinou a sua emissão, o dito negócio subjacente (que constitui a causa daquela mesma emissão). Logo, entre os intervenientes no título, que sejam simultaneamente partes no negócio subjacente, é sempre estabelecido acordo quanto à função que a atribuição patrimonial desempenha relativamente ao negócio subjacente, sendo tal acordo denominado pela doutrina de «convenção executiva» (a que estabelece a relação entre o negócio cartular e o negócio subjacente). Assim, a «letra está no domínio das relações imediatas, quando está no domínio das relações entre um subscritor e o sujeito cambiário imediato (relações sacador-sacado, sacador-tomador, tomador primeiro endossado, etc.), isto é, nas relações nas quais os sujeitos cambiários o são concomitantemente das convenções extracartulares. A letra está no domínio das relações mediatas, quando na posse duma pessoa estranha às convenções extracartulares» (Abel Delgado, op. cit, em anotação ao art. 17º citado, com bold apócrifo). Logo, se no domínio das relações imediatas (entre um subscritor e o sujeito cambiário imediato, em que ambos são concomitantemente sujeitos cambiários e sujeitos das convenções extracartulares) tudo se passa como se a obrigação cambiária deixasse de ser literal e abstrata, já no domínio das relações mediatas (entre um subscritor e um possuidor do título estranho às convenções extracartulares) aquele não pode opor a este as excepções derivadas das relações pessoais mantidas com outros portadores anteriores da letra. O art. 17º da L.U.S.L.L., citado, mais não faz do que extrair consequências práticas dos princípios da literalidade da obrigação cambiária (que se reconstitui pela simples inspecção do título), da sua abstracção (uma vez que aquele é independente da "causa debendi"), e da autonomia do direito do portador (que é considerado como um credor originário). Por isso, no domínio das relações mediatas - entre um subscritor e um possuidor do título estranho às convenções extracartulares -, aquele só pode opôr a este as excepções derivadas das relações pessoais mantidas com outros portadores anteriores da letra quando o portador actual, ao adquirir o título, tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor, não bastando para o efeito a simples má fé (isto é, o conhecimento da excepção anterior), exigindo-se ainda que o portador, sempre no momento de adquirir a letra, tenha agido com a consciência de prejudicar o devedor (embora não necessariamente com a intenção de o fazer). Mas estando a letra nas relações imediatas, isto é, não tendo entrado em circulação, já não valem os princípios cambiários da literalidade e abstracção. * 4.1.2. Concretizando, verifica-se que o Exequente dos autos principais demandou o ali Executado, oferecendo como título executivo uma letra de câmbio por este emanada e assinada a seu favor (isto é, aceite por ele, e figurando o Exequente como sacador), no valor de € 8.000,00. Mais se verifica que a dita letra titulava parte do preço de materiais e maquinaria que o Exequente vendera antes ao Executado. Por fim, verifica-se que, à data da instauração em juízo dos autos principais, a letra de câmbio em causa encontrava-se vencida; e que o Executado não pagara a Exequente o seu montante, nem mesmo parte dele. Logo, duas conclusões se podem desde já enunciar: a letra de câmbio apresentada à execução configura efectivo título executivo; e o Executado figura no mesmo como efectivo obrigado ao pagamento da quantia nele inscrita. Contudo, e encontrando-se as partes no domínio das relações imediatas, veio o mesmo Executado invocar (porque podia fazê-lo, já que subtraído aos princípios cambiários da literalidade e da abstracção), como causa extintiva do direito do Exequente, a alegada «cedência da dívida (…) ao Sr. D… e pelo exequente aceite», traduzida na substituição do «título executivo que serve de base a esta execução» por uma outra letra, aceite pelo mesmo D… a favor do Exequente, «no montante de € 8.600,00», depois também ela substituída por uma outra, com os mesmos sacado/aceitante e sacador, «no montante de € 9.2000,00» (nos termos do art. 816º do C.P.C., e do art. 857º do C.C.). Logo, invocou o Executado que teria ocorrido uma novação da obrigação de pagamento de preço que o onerava, por ter havido duas sucessivas substituições (reformas) da letra de câmbio inicial dada à execução. Prossegue-se, pois, nessa análise. * 4.2. Reforma de letra - Efeitos 4.2.1.1. Reforma de letra A impropriamente chamada, no giro comercial, reforma de letra (já que, em sentido próprio, corresponderá à reconstituição de um título de crédito, destruído ou perdido) consiste na substituição, pelos sujeitos cambiários, de uma letra inicial por outra, ou outras (Alexandre Soveral Martins, Títulos de Crédito e Valores Mobiliários, Parte I – Títulos de Crédito, Almedina 2008, pág. 78.). O seu objectivo precípuo é permitir ao devedor uma gestão das suas dívidas, o que pode ser conseguido através do diferimento da data de vencimento, da amortização parcial do débito - com emissão de uma nova letra de montante inferior -, ou da divisão do montante inicial por várias novas letras. Com efeito, «é usual, no comércio, que chegada a data do vencimento, o devedor, geralmente o aceitante ou o sacador, conforme os casos, proceda ao pagamento da letra (ou livrança) enviando ao portador uma nova letra por si aceite de montante correspondente parcialmente à quantia a pagar e o remanescente em dinheiro, ou nos casos da chamada “reforma por inteiro”, que lhe envie aceite uma letra pelo montante do total montante anterior. A letra originária extingue-se por cumprimento e surge uma nova letra autónoma da primeira» (Pais de Vasconcelos). Compreende-se, por isso, que se afirme que, nesta «aceção, a reforma tem por fim diferir o pagamento da obrigação constante da letra renovada, traduzindo-se numa espécie de pagamento, porque com a letra nova se amortizou a antiga. Esta reforma “contratual” resulta do facto de o devedor cambiário não poder pagar a letra, total ou parcialmente, no prazo do vencimento, entregando ao banco ou ao portador um título novo» (Ac. da RC, de 13.01.2015, Maria João Areias, Processo nº 6/12.1TBTBU-A.C1, in www.dgsi.pt, como todos os demais acórdãos citados em indicação de origem, com bold apócrifo. No mesmo sentido, José Gonçalves Dias, Da Letra e da Livrança, segundo a Lei Uniforme e o Código Comercial, Vol. I, pág. 4016, Abel Delgado, Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças Anotada, 7ª edição, Petrony, p. 212, e Pinto Coelho, Lições Direito Comercial, 2. Vol., Fascículo VI, As Letras, 2ª parte, pág. 67). Resulta do referido que «o elemento fundamental da reforma é a substituição de uma letra (letra reformada) por outra (letra de reforma), o que poderá ser motivado por diversas circunstâncias como o simples diferimento da data do vencimento, alteração do montante, a intervenção de novos subscritores ou a eliminação de algum dos anteriores»; e como motivo mais frequente encontrar-se-á «a amortização parcial do débito, passando a constar da nova letra o montante ainda em dívida, o que poderia, porém, ser obtido através de um meio mais simples, ou seja, da menção na letra inicial do pagamento parcial (artigo 39 da citada L.U.L.L.)» (Ac. do STJ, de 26.03.1996, Martins da Costa, Processo nº 088003, com bold apócrifo). Ora, e como «se colhe da própria definição do conceito de “reforma” dos títulos de crédito», se «quem dela beneficia é o devedor, geralmente o aceitante, na medida em que, por via deste instituto jurídico-mercantil, logra protelar sucessivamente o prazo de pagamento», caber-lhe-á suportar as despesas inerentes à reforma (Ac. do STJ. de 20.10.2011, Álvaro Rodrigues, Processo nº 609/07.1TBPTL.G1.S1. No mesmo sentido, Ac. do STJ, de 17.02.1994, Sá Couto, Processo nº 084210). Precisa-se, porém, que a «reforma de letra não implica a multiplicação efectiva da obrigação que determinou a emissão do título, referindo-se a letra primitiva e a letra renovada à mesma relação subjacente e à satisfação de um único interesse patrimonial» (Ac. do STJ, de 07.10.2003, Afonso de Melo, Processo nº 03A2320). Logo, «não haverá novação da obrigação cambiária incorporada no título primitivo se, de acordo com o art. 859º do C.C., não houver vontade expressamente manifestada nesse sentido» (Ac. da RG, de 29.03.2011, Maria da Conceição Saavedra, Processo nº 3715/09.4TBBRG-A.G1). Diz-se, por isso, que, em princípio, a simples substituição de uma letra (letra reformada) por outra (letra de reforma) corresponde ao conceito de alteração, e não ao de novação, já que a novação objectiva da obrigação - a substituição de uma obrigação por outra - pressupõe que se expresse claramente essa vontade (arts. 857º e 859º, ambos do C.C.). Precisa-se ainda que, no caso de substituição de uma letra por outra de valor inferior, a reforma da letra constitui uma operação complexa, em que figura não só a substituição da letra mas, também, o pagamento da reforma, isto é, da diferença entre a letra reformada e a letra da reforma: esta «operação jurídico-cambiária só deve dar-se como perfeita quando as duas suboperações estiverem realizadas» (Ac. do STJ, de 28.01.2003, Quirino Soares). Logo, para que o novo título opere uma função substitutiva daquele que o antecede, e para que essa substituição produza efeito, torna-se necessário que a operação de reforma seja completada com sucesso, isto é, que o credor embolse o quantitativo referente à amortização e seja apresentada nova letra (devidamente aceite) pelo diferencial entre o pagamento e a dívida primitiva. * 4.2.1.2. Novação de dívida Lê-se no art. 857º do C.C. que dá-se «a novação objectiva quando o devedor contrai perante o credor uma nova obrigação em substituição da antiga». A novação é, assim, um verdadeiro contrato extintivo-constitutivo de obrigações, pelo qual as partes visam expressamente substituir uma obrigação originária, que se extingue, por uma obrigação nova, que se constitui (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol II, 4ª edição, Coimbra Editora, p. 147, com bold apócrifo). Mais se lê, no art. 859º do C.C., que a «vontade de contrair a nova obrigação em substituição da antiga deve ser expressamente manifestada». Logo, não basta aqui uma declaração tácita ou presumida, sendo a declaração é expressa «quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação de vontade», e é tácita «quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam» (art. 217º, nº 1 do C.C.). Por outras palavras, a vontade de extinguir a obrigação anterior deve ser declarada de modo directo, inequívoco ou terminante, não se tendo mesmo considerado suficiente a formulação proposta por Vaz Serra, que defendia ser suficiente uma manifestação clara da vontade de novar, não sendo de exigir uma declaração expressa («Novação», BMJ nº 72, pág. 47, nota 74). Exige-se, assim, não só uma vontade claramente manifestada, mas uma vontade expressamente manifestada, incompatível com uma declaração tácita ou presumida (A. Varela, Das Obrigações em Geral, Vol II, 7ª edição, Almedina, p. 237 e 238, com bold apócrifo. No mesmo sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. II, 3ª edição, Coimbra Editora, p.151, e Almeida Costa, Direito das Obrigações, 11ª edição, Almedina, 2008, p. 1113, nota 1. De forma que se nos afigura mais mitigada, na linha defendida por Vaz Serra, Paulo Mota Pinto, Declaração Tácita e Comportamento Concludente no Negócio Jurídico, Almedina, 1995, Coimbra, p. 493 e 498). O animus novandi surge, assim e precisamente, como um dos casos em que a lei exige que a vontade seja expressamente exteriorizada, não bastando a verificação de factos indiciadores de comportamento concludente. Compreende-se, por isso, que se afirme que, em «consequência do disposto neste artigo [859º do C.C.], não pode ter-se necessariamente como novação a subscrição dum título de crédito, duma letra por ex., posteriormente à constituição da obrigação fundamental. Se for expressamente manifestada a vontade de novar, isto é, de substituir a obrigação antiga por uma nova, verifica-se uma dação em cumprimento ao lado da novação da dívida. Se não houver declaração expressa, presume-se uma datio pro solvendo, nos termos do n.º 2 do artigo 840.º: a dívida antiga só se extingue pela satisfação da dívida de novo contraída» (Pires e Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. II, 3ª edição, Coimbra Editora, p. 151). * 4.2.1.3. Efeito da reforma de letra Face ao exposto, compreende-se que se defenda que a reforma de uma letra não implica, só por si, a novação da obrigação nela incorporada, sendo necessário - para a extinção e substituição definitiva da obrigação inicial por uma nova - que os subscritores dos títulos (reformado e de reforma) manifestem expressamente essa vontade. Com efeito, da «ausência de animus novandi - e este pressupõe manifestação de vontade expressa nesse sentido - decorre, pois, que a nova obrigação é apenas confirmatória da anterior mas sem extinguir esta, ficando o credor com a faculdade alternativa de exigir qualquer delas para solver a dívida. Confirmatória da existência da anterior, mas não necessariamente do respectivo montante, porventura reduzido se se verificou (…) qualquer pagamento ou amortização parcial» (Ac. do STJ, de 17.12.2009, Processo nº 1583/06, com bold apócrifo). Compreende-se agora melhor o que se deixou dito supra, que «a reforma de letras, no caso mais vulgar de simples redução do seu montante, por amortização parcial, reconduz-se melhor ao conceito de alteração do que ao de novação e, de qualquer modo, não é suficiente o elemento objectivo de substituição de uma letra por outra, sendo ainda indispensável a declaração de vontade de extinção da primitiva obrigação cambiária, manifestada pelo modo expresso já apreciado». Considera-se, porém, um «meio directo de manifestação daquela vontade (…) a devolução dos títulos reformados pois, se ela não ocorrer, justifica-se mesmo a presunção de as partes se quererem manter vinculadas por esses títulos. Tal presunção tem ainda lugar, e mais vincadamente, na hipótese de esses títulos conterem assinaturas de outros obrigados cambiários, mesmo de simples garantes, não reproduzidas nas letras de reforma, por não ser normal que o seu portador queira prescindir das garantias dadas por tais assinaturas. Também o facto de ter havido pagamento parcial de uma letra, acompanhado ou não de reforma ou de menção nela expressa, não lhe retira a força de título executivo, por não poder o portador recusar esse pagamento (cit. artigo 39 da L.U.), sem prejuízo de, no domínio das relações imediatas, o devedor poder livremente invocar essa amortização e de o credor a dever considerar no requerimento inicial da execução (assim, acórdão deste tribunal de 12 de Março de 1989, no Bol. 386, pág. 473)» (Ac do STJ, de 26.03.1996, Martins da Costa, Proc. 088003). A jurisprudência vem-se unanimemente pronunciando no sentido aqui reiterado (v.g. Ac. do STJ, de 10.07.1990, Joaquim de Carvalho, Processo nº 078917, Ac. do STJ, de 26.03.1996, Martins da Costa, Processo nº 088003, Ac. do STJ, de 17.10.2002, Sousa Inês, Processo nº 02B2208, Ac. do STJ, de 07.10.2003, Afonso de Melo, Processo nº 03A2320, Ac. da RP, de 26.04.2001, Norberto Brandão, Processo nº 0130442, Ac. da RP, de 02.06.2005, José Ferraz, Processo nº 0531454, Ac. da RC, de 28.06.2005, Ferreira Barros, Processo nº 1865/2005, Ac. da RL, de 08.11.2007, Eduardo Sapateiro, Processo nº 4894/2007-6, Ac. da RP, de 14.02.2008, Deolinda Varão, Processo nº 0735588, Ac. da RL, de 17.04.2008, Jorge Leal, Processo nº 868/2008-2, Ac. da RE, de 30.04.2009, Fernando Bento, Processo nº 1583/06.7TBABT-A.E1, Ac. do STJ, de 16.06.2009, Fonseca Ramos, Processo nº 344/05.5TBBGC-A.S1, Ac. da RC, de 23.06.2009, Isabel Fonseca, Processo nº 46/07.8TBSPS-A.C1, Ac. da RL, de 25.03.2010, Ana Paula Boularot, Processo nº 2130/08-2, Ac. da RL, de 01.02.2011, Anabela Calafate, Processo nº 819/07.1TCFUN-A.L1-1, Ac. da RG, de 01.02.2011, A. Costa Fernandes, Processo nº 3678/09.6TBBRG-A.G1, Ac. da RG, de 29.03.2011, Maria da Conceição Saavedra, Processo nº 3715/09.4TBBRG-A.G1, Ac. da RP, de 20.12.2011, Ramos Lopes, Processo nº 3181/09.4TBVFR-A.P, Ac. da RC, de 27.03.2012, António Beça Pereira, Processo nº1507/09.0TBVNO-A.C1, e Ac. da RC, de 13.01.2015, Maria João Areias, Processo nº 6/12.1TBTBU-A.C1). * 4.2.2. Concretizando, explicitados os institutos da «reforma de letra» e da «novação de obrigação», e os seus efeitos, importa agora verificar o fundamento de oposição do Executado, de que o título executivo apresentado nos autos principais (inicial letra de câmbio de € 8.000,00) teria sido sucessivamente substituído por outos (letra de câmbio de € 8.6000,00 e letra de câmbio de € 9.200,00), substituição essa resultante da cedência da sua dívida a D… (que nos títulos substitutos figura como sacado/aceitante), aceite pelo Exequente. Recordando que as partes se encontram no domínio das relações imediatas, começa-se por referir que, tendo o Executado alegado conclusivamente a «cedência da dívida (…) ao Sr. D… e pelo exequente aceite», não concretizou quando, e por que modo, foi essa cedência concretizada. Logo, e para esse efeito, ficou o Tribunal limitado à sua demais alegação, que a letra inicial, de € 8.000,00, «que serve de base a esta execução foi substituído por uma letra (…) no montante de 8.600,00 €», tendo depois o «exequente, na qualidade de sacador», recebido «uma nova letra que assinou, aceite, pelo sacado D…, para reformar a letra» de € 8.600,00, esta última no montante de 9.2000,00 €». Relativamente a esta alegação, provou-se, de facto, que: a letra de câmbio de € 8.000,00, vem sendo reformada desde Agosto de 2009, sendo sucessivamente substituída por duas novas letras de câmbio, com aceite de um Terceiro, a primeira no valor de € 8.600,00, e a segunda no valor de € 9.200,00; e tem sido o Exequente a suportar integralmente as despesas inerentes a tais reformas, nada lhe tendo igualmente sido pago, do valor inicial titulado pela primeira letra de câmbio em causa Não se provou, porém (uma vez que não consta do elenco dos factos provados na sentença proferida pelo Tribunal a quo) que, conjuntamente com as ditas substituições/reformas de títulos, as partes (Exequente e Executado) tenham expressamente acordado entre si que as ditas operações materiais de troca de títulos corresponderiam a efectivas novações das obrigações consubstanciadas nos sucessivamente reformados (ónus que, indiscutivelmente, pertencia ao Executado, aqui Oponente, nos termos do art. 342º, nº 1 do C.C.). De forma coerente com esta não prova (de que tenha havido qualquer declaração expressa de vontade, no sentido de a obrigação cambiária ficar extinta em consequência da sua substituição pela letra de reforma) compreende-se que a letra de câmbio inicial de € 8.000,00 tenha permanecido na posse do Exequente (revelando que o recebimento, por ele, da nova letra de € 8.600,00 e, depois, da letra de € 9.200,00, não correspondeu à substituição definitiva da anterior). Precisa-se, a propósito, que dificilmente se compreenderia uma tal novação, uma vez que a obrigação subjacente à emissão da primeira letra de câmbio, dada à execução - o pagamento de parte do preço de mercadorias vendidas pelo Exequente ao Executado - permanece integralmente em dívida; e aquele não tem visto o seu património beneficiado com as sucessivas reformas feitas, antes pelo contrário, já que tem suportado as despesas exigidas para o efeito (o que apenas se compreende se tiver apresentado a primeira a desconto bancário, não querendo agora, mercê da sua condição de sacador, de ter de a honrar perante o Banco a que haja recorrido, face ao previsível incumprimento dos demais obrigados cambiários). Não se provou ainda (reitera-se) qualquer pagamento da quantia justificativa da emissão da primeira letra de câmbio, pelo que falece igualmente este fundamento de extinção - ainda que parcial - da obrigação exequenda. Concluindo, não tendo ficado demonstrado nos autos, nem a vontade de contrair uma nova obrigação, pela reforma da letra de câmbio dada à execução, nem o seu pagamento - ainda que parcial - , mantém-se o Exequente como legítimo portador do título; e não pode deixar de improceder na sua totalidade a oposição deduzida pelo Executado. * Procede, assim, o recurso interposto. * V - DECISÃO Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente o recurso de apelação interposto por C… e, em consequência, revogam a decisão recorrida, substituindo por outra que julga totalmente improcedente a oposição deduzida pelo Executado B… à Execução Comum nº 200/11.8TBMTR-A (que assim prosseguirá os seus termos normais). * Custas da oposição e da apelação pelo ali Executado e aqui Recorrido (artigo 527º, nº 1 do CPC). * Guimarães, 17 de Novembro 2016. (Relatora Maria João Marques Pinto de Matos) (1ª Adjunta Elisabete de Jesus Santos de Oliveira Valente) (2º Adjunto (Heitor Pereira Carvalho Gonçalves) SUMÁRIO (da responsabilidade da Relatora - art. 663º, n 7 do C.P.C.) I. A reforma de uma letra é a sua substituição por outra, por os intervenientes terem acordado em diferir o vencimento, ou por haver intervenção de novos subscritores ou a eliminação de alguns dos anteriores, ou por o devedor ter efectuado um pagamento parcial, sendo neste caso emitido um novo título com o valor da diferença entre o pagamento efectuado e a dívida inicial. II. A simples reforma da letra não implica, só por si, a novação da obrigação nela incorporada, sendo necessário - para a extinção e substituição definitiva da obrigação inicial por uma nova -, uma vontade expressa e inequivocamente manifestada nesse sentido, conforme art. 859º do C.C.. (Maria João Marques Pinto de Matos) |