Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3771/11.5TBVCT.G1
Relator: RAQUEL REGO
Descritores: AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
ADIAMENTO
FALTA DE ADVOGADO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/25/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I - Quando não tenha havido contacto prévio do tribunal com os mandatários, a data designada para a diligência configura-se como potencialmente provisória durante cinco dias.
II – Se estes nada declararem nesse prazo deve entender-se que ocorre um acordo tácito quanto à mesma.
III – Consequentemente, a falta de mandatário na audiência de julgamento, sem qualquer comunicação de impossibilidade de comparência, não dá lugar ao respectivo adiamento.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I – RELATÓRIO.

1. Nos presentes autos, de acção comum com processo sumário, veio C…, autor nos mesmos, interpor recurso do seguinte despacho:

«A ausência do mandatário do Autor não constitui fundamento para o adiamento da presente audiência, sendo certo que o mesmo não comunicou ao Tribunal nenhuma circunstância impeditiva da sua presença que determinasse o adiamento do julgamento (artigos 651º, nº 1, alínea d) e 155º, nº 5, do C.P.C.).
Nos termos do artigo 651º, nº 5, do C.P.C., proceda-se à gravação dos depoimentos».

2. Nas correspondentes alegações, conclui do seguinte modo:
- Nos termos conjugados da alínea c) do nº1 do artigo 651º do CPC e do nº1 do artigo 155º do CPC, o juiz, por regra deve providenciar pela marcação do julgamento mediante acordo previamente estabelecido com os mandatários das partes, sendo que, quando não o fizer, a falta destes à audiência de julgamento é, sem mais, motivo de adiamento.
- Nos presentes autos foi marcada audiência de julgamento, sem previa consulta aos mandatários das partes nos termos do nº1 do artigo 155º do CPC.
- Posteriormente, por despacho, emanado sem prévia consulta dos mandatários, nos termos do nº1 do artigo 155º CPC, foi adiada a audiência de julgamento para outra data notificada aos mandatários sem a faculdade prevista no nº2 do artigo 155º do CPC.
- Ausente o mandatário do A. na data e hora designada para a audiência de julgamento, considerou a Meritíssima Juiz a quo não existir motivo de adiamento, sendo que tal a decisão ficou vertida em acta por meio de despacho que mandou realizar a audiência de julgamento.
- Tal despacho é claramente violador do disposto dos termos conjugados da alínea c) do nº1 do artigo 651º do CPC, com vem sendo entendimento da Jurisprudência (p.ex. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21 de Outubro de 2008, Processo nº 6801/2008-1 e Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 07 de Fevereiro de 2012, Processo 408940/10.7YIPRT.P1).
- Deste modo, ao decidir como decidiu, o douto despacho recorrido violou, por errada interpretação e aplicação, o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 155º do CPC e alínea c) do nº1 do artigo 651º do Código de Processo Civil.

3. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO.
O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso.

A matéria de facto a considerar é a seguinte:
1. A fls. 54 dos autos foi proferido despacho a designar o dia 19 de Setembro de 2012, pelas 14 horas, para a realização da audiência de julgamento.
2. A fls. 56 foi proferido novo despacho dando sem efeito o dia anterior e designando como nova data o dia 12 de Dezembro de 2012, pelas 14 horas, para o mesmo fim.
3. A designação de tais datas não foi precedida de qualquer consulta aos Senhores Advogados constituídos mandatários no processo.
4. Notificados, nenhum dos aludidos mandatários fez qual qualquer declaração de indisponibilidade.
5. No dia designado para julgamento, apesar de não se encontrar presente o Senhor Advogado que representava o autor, o Tribunal proferiu o despacho recorrido, procedendo à realização da audiência.

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Nos termos do artº 155º, nº1, do Código de Processo Civil, “a fim de prevenir o risco de sobreposição de datas de diligências a que devam comparecer os mandatários judiciais, deve o juiz providenciar pela marcação do dia e hora da sua realização mediante prévio acordo com aqueles, podendo encarregar a secretaria de realizar, por forma expedita, os contactos prévios necessários.
Quando a marcação não possa ser feita nos termos do número anterior, devem os mandatários impedidos em consequência de outro serviço judicial já marcado comunicar ao Tribunal, no prazo de cinco dias, propondo datas alternativas, após contacto com os restantes mandatários interessados – nº2.
O juiz ponderadas as razões aduzidas, poderá alterar a data inicialmente fixada – nº3.
Os mandatários judiciais devem comunicar prontamente ao Tribunal quaisquer circunstâncias impeditivas da sua presença e que determinem o adiamento de diligência marcada – nº5.
A primeira situação, prevista no nº 1 do art. 155º do Código de Processo Civil, ocorre quando a marcação da diligência operou por acordo prévio entre o tribunal e os mandatários, seja em contacto directo, seja por contacto indirecto, isto é, com a intermediação de funcionário judicial.
Por sua vez, a segunda situação verifica-se quando não tenha havido contacto prévio do tribunal com os mandatários, caso em que a data de designação da diligência se configura como potencialmente provisória durante cinco dias.
Com efeito, durante esses cinco dias, contados da data da notificação dos mandatários das partes, o tribunal tem de ponderar que eles possam vir comunicar o seu impedimento em consequência de outro serviço judicial já marcado e cada um, após contacto com o(s) outro(s), propor a realização da diligência em data ou datas alternativas.
Esta redacção, dada ao preceito pelo DL 329-A/95, “mais do que um elementar dever de cortesia entre os intervenientes técnicos no processo (…) visa assegurar que as diligências se realizem nas melhores condições possíveis de participação de todos os que nela, a título principal ou acidental, devam intervir” – Código de Processo Civil Anotado, Lebre de Freitas, 1º vol., pag.274.
E, como não poderia deixar de ser, com o regime consagrado no nº2 do preceito em análise, não se visou a prática de acto inútil, o mesmo é dizer, não se impôs aos mandatários judiciais um dever de comunicação, sem consequências advindas da sua omissão.
Daí que, tal como outros, também nós entendemos que, do silêncio do mandatário perante a designação de uma data sem seu prévio acordo, se forma um acto de aceitação tácita quanto à que foi escolhida unilateralmente pelo tribunal.
Assim decidiu o Acórdão da Relação de Lisboa, de 7/11/02, C.J., Ano XXVII, tomo V, 73, onde se refere que «No caso de os mandatários, no prazo de cinco dias, declararem a sua disponibilidade para a data indicada pelo juiz para a diligência ou se nada declararem, deve entender-se, tendo em conta o seu dever de cooperação relativo à informação da existência de impedimento, tratar-se, no primeiro caso, de acordo expresso, e, no segundo, de acordo tácito (art.217º, nº1, do CC)».
Acresce que não assume relevância a agora invocada circunstância de, na notificação efectuada, não se incluir a faculdade (sic) prevista no nº2 do artº 155º, pois que, para além de não ser uma faculdade mas um dever, a sua existência é do conhecimento obrigatório dos profissionais do foro.
Também no sentido de que o acordo quanto à data designada pode assumir a forma expressa ou tácita confira-se o acórdão da Relação de Lisboa, 19 de Janeiro de 2010, itij.
Sem desconhecermos a posição invocada em sede de alegações (que julgamos minoritária) esta é a interpretação que melhor se coaduna com o objectivo prosseguido pelo legislador e que expressamente fez constar do preâmbulo do Decreto-Lei 183/2000, de 10/8, que «…No que concerne aos mandatários judiciais … só existirá adiamento da audiência por falta de advogado se o tribunal não houver diligenciado a marcação por acordo ou se, tendo havido tentativa de marcação da audiência por acordo, o advogado comunicar atempadamente a sua impossibilidade de comparecer».
Ora, no caso que ora nos ocupa, designada que foi a data para julgamento, sem prévio acordo, o Senhor Advogado, dentro dos 5 dias legalmente consignados, optou por não comunicar ao Tribunal a sua impossibilidade de comparecer e sugeriu outras.
E, assim, a que era tendencialmente provisória por não ter resultado de prévio acordo, tornou-se definitiva pelo silêncio daquele Mandatário, que consubstanciou um acordo tácito do mesmo.
Acontece, porém, que aquele Senhor Advogado decidiu também não comparecer no dia agendado e, mais uma vez, não deu a conhecer qualquer impossibilidade em fazê-lo.
O Tribunal procedeu à realização da audiência sem a presença daquele, registando os depoimentos prestados.
Há, então, que chamar à colação o regime consignado no artº 651º, nº1, als. c) e d), do mesmo diploma, onde se preceitua, quanto às causas de adiamento da audiência, que, a mesma só é adiada (no que ao caso interessa) se o juiz não tiver providenciado pela marcação mediante acordo prévio com os mandatários judiciais, nos termos do artº 155º e faltar algum dos advogados ou se faltar algum dos advogados que tenham comunicado a impossibilidade da sua comparência, nos termos do nº5 do artº 155º.
Assim, das aludidas alíneas decorre que, nas hipóteses a que se referem, haverá um adiamento da audiência de julgamento por virtude de falta de comparência de algum ou de alguns dos mandatários das partes, reportando-se a al.c) à situação em que o juiz designa a data sem a diligência de acordo prévio com os mandatários, implicando a falta de algum deles o adiamento automático da audiência e a al.d) à situação de o juiz haver designado a data da audiência de julgamento na sequência da sua diligência tendente ao acordo sobre a data da respectiva designação com os mandatários, dependendo o seu adiamento por falta de comparência de advogado do facto de ele haver comunicado atempadamente ao tribunal – até à abertura – a sua impossibilidade de comparecer.
Assim não acontecendo, procede-se à gravação dos depoimentos das testemunhas presentes, podendo o advogado faltoso requerer, após a audição do registo do depoimento, nova inquirição, excepto se a falta for julgada injustificada, ou se tendo havido marcação da audiência por acordo, não tiver sido dado cumprimento ao disposto no nº5 do artº 155º do Código de Processo Civil.
Volvendo ao caso em apreço, a data encontrava-se agendada por acordo (tácito, como vimos) com os Senhores Advogados e não foi comunicada qualquer impossibilidade, ao abrigo do já citado artº 155º, nº5. Restava, por isso, ao Sr. Juiz proceder à realização da audiência, observando o regime consignado no nº5 do artº 651º. Assim ocorreu, sem violação de preceito legal.
Por tudo quanto se registou, não assiste razão ao apelante.

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III- Decisão.

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.

Guimarães, 25 de Junho de 2013
Raquel Rego
António Sobrinho
Isabel Rocha