Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
118/14.2TBCMN-A.G1
Relator: FRANCISCO CUNHA XAVIER
Descritores: OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
PRAZO PEREMPTÓRIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/26/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I. Na norma da alínea a) do n.º 1 do artigo 732º do Código de Processo Civil, em que se determina a rejeição liminar dos embargos quando tenham sido deduzidos fora de prazo, abrange-se, não só as situações em que os embargos são apresentados extemporaneamente por decurso do prazo peremptório, como também aquelas em que são deduzidos antes do prazo se iniciar.
II. Tal interpretação, em função dos elementos literal, histórico e sistemático do processo executivo, sai reforçada em sede de processo executivo sob a forma sumária, no qual, por força do disposto no n.º 1 do artigo 856º, a citação só ocorre, em regra, após a penhora, e marca o início do prazo, não só para dedução de embargos de executado, mas também para oposição à penhora, cuja efectivação é notificada simultaneamente com a citação.
Decisão Texto Integral: I – RELATÓRIO
1. A… deduziu oposição à execução sumária que, sob o n.º 118/14.2TBCMN, corre termos no Tribunal da Comarca de Viana do Castelo, em que é exequente O…, SA., invocando a prescrição da dívida exequenda.
2. Após realização de tentativa de conciliação, que resultou infrutífera (cf. acta de fls. 18), foi proferido o seguinte despacho:
“O executado A… veio deduzir embargos à execução sumária que corre por apenso.
Sucede que, atento o disposto no art.º 856º nº 1 do CPC, a dedução de oposição à execução e à penhora é, no presente caso, intempestiva, atendendo a que não foi ainda prosseguida a penhora, nem realizada a citação, ao abrigo desse normativo legal.
Assim sendo, nos termos previstos no art.º 732º nº 1 alínea a) e 551º nº 3, ambos do CPC, indefiro liminarmente os presentes embargos.
As custas serão suportadas pelo embargante, com taxa de justiça que fixo no mínimo legalmente previsto.- cf. art.º 539º nº 1 do CPC.”
3. Inconformado recorreu o executado, pedindo a revogação do despacho de indeferimento liminar e a extinção da acção executiva, com os seguintes fundamentos:
1.ª O Douto Despacho recorrido faz, salvo o devido respeito, interpretação errada da finalidade da citação.
2.ª Com efeito, dispõe o nº1 do art. 219º do NCPC que, “A citação é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção (…)”.
3.ª Salvo o devido respeito por opinião contrária, (e atendendo à finalidade da citação) tendo o apelante tido conhecimento da acção executiva que contra si estava pendente e tendo deduzido a sua defesa através dos referidos embargos de executado, a citação seria um ato desnecessário.
4.ª Acontece, ainda que, foi o aqui apelante convocado para a “Tentativa de Conciliação” no âmbito do presente Processo de Embargos de Executado, a qual teve lugar no dia 4 de Dezembro de 2014 pelas 11h e 30m, conforme consta dos autos.
5.ª Assim, não pode o apelante conceber a interpretação do Tribunal a quo ao indeferir liminarmente os embargos por si apresentados.
6.ª Quanto ao facto de ainda não ter sido prosseguida a penhora, e conforme requerimento apresentado pelo apelante em 17 de Abril de 2015 a fls… dos autos, requerendo a extinção da acção executiva, dir-se-á que
7.ª Dispõe o nº1 do art. 727º do NCPC, “O exequente pode requerer que a penhora seja efectuada sem a citação prévia do executado, desde que alegue factos que justifiquem o receio da perda da garantia patrimonial do seu crédito e ofereça de imediato os meios de prova”.
8.ª Resulta do Requerimento Executivo que a Exequente não requereu dispensa de citação prévia do executado, nem posteriormente.
9.ª Dispondo o art. 6º nº 1, da lei de Aprovação do Código de Processo Civil, Lei n.º 41/2013 de 26 de Julho, que “O disposto no Código de Processo Civil, (…) aplica-se, (…) a todas as execuções pendentes à data da sua entrada em vigor”.
10.ª O que sucedeu no dia 1 de Setembro de 2013 (Art. 8º do citado diploma legal).
11.ª Donde resulta que deveria a Exequente ter procedido á citação do executado, pelo menos desde Setembro de 2013, todavia omitiu este ato.
12.ª Com efeito, determina o art. 750º do NCPC: “ 1. Se não forem encontrados bens penhoráveis no prazo de três meses a contar da notificação prevista no nº1 do artigo 748º, o agente de execução notifica o exequente para especificar quais os bens que pretende ver penhorados na execução; simultaneamente, é notificado o executado para indicar bens à penhora (…). 2. Se nem o exequente nem o executado indicarem bens penhoráveis no prazo de 10 dias, extingue-se sem mais a execução.”
13.ª Consultados os autos, constata-se não terem sido encontrados bens penhoráveis (há mais de três meses) desde a propositura da acção executiva até á presente data, bem como a omissão por parte do Ilustre AE do imposto nas sobreditas normas.
14.ª Ora, encontrando-se o requerimento sobredito junto aos autos, pelo menos desde o dia 20 de Abril de 2015, ou seja em data anterior à prolação do Douto Despacho recorrido, e sendo que o n.º 2 do Art. 608º do NCPC dispõe que o “ O Juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido á sua apreciação (…)”.,
15.ª O mesmo padece de nulidade, conforme o disposto no art. 615º nº1, al. d), o que só por lapso do Tribunal a quo, pode ter sucedido.
16.ª Não pode o recorrente conformar-se com o indeferimento liminar dos embargos por si apresentados, por violar a disposições legais contidas nos arts. 219º, 732º nº1 al. a), 727º n.º 1, 750º n.ºs 1. e 2. do NCPC, bem como art. 6º da Lei que aprovou o NCPC, Lei nº 41/2013 de 26 de Julho.
17.ª Não pode igualmente conformar-se com a omissão de pronúncia relativamente ao requerimento apresentado pelo apelante em 17 de Abril de 2015 a fls… dos autos, requerendo a extinção da acção executiva.
18.ª Bem como com a sua condenação nas custas.
19.ª O recorrente beneficia de Apoio Judiciário nas modalidades de dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o processo, nomeação e compensação de patrono, cfr. doc. junto.

4. Não foram apresentadas contra-alegações.
O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II – OBJECTO DO RECURSO
O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil (NCPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho.
Considerando o teor das conclusões apresentadas, importa decidir as seguintes questões:
(i) Da nulidade da decisão por omissão de pronúncia;
(ii) Da tempestividade dos presentes embargos.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A) - OS FACTOS
Com interesse para a decisão relevam as ocorrências processuais constantes do relato dos autos.
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B) – O DIREITO
1. Invoca o recorrente a nulidade do despacho recorrido por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, em virtude de o tribunal não se ter pronunciado sobre o requerimento apresentado em 17 de Abril de 2015, em que invoca a extinção da acção executiva, “por ainda não ter sido prosseguida a penhora”.
Como se sabe, ocorre omissão de pronúncia quando o tribunal deixa de apreciar sobre questões submetidas pelas partes à sua apreciação, ou das quais deve conhecer oficiosamente, mas não quando deixa de rebater, um a um, os argumentos invocados pelas partes, ou quando utiliza uma argumentação improcedente, pois, nesta derradeira hipótese o que há é erro de julgamento.
O requerimento invocado pelo recorrente não está incorporado no processo em suporte físico (no qual foi proferido despacho a determinar que, em cumprimento do provimento do tribunal recorrido n.º 2/2014, fossem os autos instruídos com todos os actos registados no programa informático Citius), mas apurou-se que o mesmo consta do ficheiro informático do processo, como entrado em 17/04/2015, datando o despacho recorrido de 24/04/2015.
Não obstante, tendo o despacho recorrido rejeitado liminarmente os embargos, por terem sido deduzidos fora de prazo, não tinha o tribunal que se pronunciar sobre a “nova situação” invocada no dito requerimento.
E é assim porque, em face do indeferimento liminar dos embargos, por dedução fora do prazo, ficou prejudicado o conhecimento do mérito de qualquer questão, seja suscitada no requerimento inicial, seja em requerimento posterior.
Não houve, por conseguinte, qualquer omissão de pronúncia.
Assim, improcede a arguida nulidade.

2. Como resulta da decisão recorrida os embargos foram liminarmente indeferidos por terem sido interpostos antes do prazo, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 732º do Código de Processo Civil, onde se prescreve:
Artigo 732.º
Termos da oposição à execução
1 - Os embargos, que devem ser autuados por apenso, são liminarmente indeferidos quando:
a) Tiverem sido deduzidos fora do prazo; (destaque nosso)
(…)
No caso em apreço não subsistem dúvidas de que a execução a que os presentes embargos se reportam segue a forma sumária, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 550º do Código de Processo Civil, por se basear em requerimento de injunção ao qual foi aposta fórmula executiva, daí que, em face do disposto no n.º 1 do artigo 856º do mesmo código, o prazo para a oposição só se inicia com a citação que tem lugar após a realização da penhora, porquanto se estabelece que: “Feita a penhora, é o executado citado para a execução e, em simultâneo, notificado do acto de penhora, podendo deduzir, no prazo de 20 dias, embargos de executado e oposição à penhora”.
A questão que, com pertinência, se coloca consiste, pois, em saber, se não tendo sido ainda efectuada a penhora e, por conseguinte, não tendo sido realizada a citação, pode o executado deduzir, no caso concreto, embargos à execução.
2. Ora, tendo em conta o teor literal da norma da alínea a) do n.º 1 do artigo 732º do Código de Processo Civil (aqui aplicável por remissão do n.º 3 do artigo 551º), que se reporta ao indeferimento liminar dos embargos quando tiverem sido deduzidos fora do prazo, a resposta não poderá deixar de ser negativa, porquanto tal expressão tanto abarca a dedução antecipada de embargos, ou seja antes da prática do acto (a citação) que despoleta o início do prazo, como também os casos em que o acto é praticado decorrido que esteja o prazo peremptório.
E, do ponto de vista processual outra não pode ser a solução no caso concreto, porquanto a citação no processo sumário de execução cumpre uma dupla função, face ao disposto no n.º1 do artigo 856º do Código de Processo Civil, pois marca simultaneamente o início do prazo para a dedução de embargos à execução e para deduzir oposição à penhora, cuja realização é notificada simultaneamente com a citação, sendo certo que o legislador quis acautelar que a intervenção do executado na execução só se fazia após a realização da penhora.
Ou seja, a citação não serve apenas para dar a conhecer ao executado a pendência da execução, permitindo-lhe a dedução de embargos, mas marca também o momento a partir do qual este pode deduzir oposição à penhora, cuja efectivação lhe é simultaneamente comunicada.
Importa referir que não estamos em presença de uma situação em que haja sido preterida a citação, como parece pretender o executado ao invocar o disposto no n.º 1 do artigo 727º do Código de Processo Civil, que se reporta à dispensa de citação prévia no processo ordinário, que aqui não é aplicável, face às regras próprias do processo sumário previstas no artigo 856º do Código de Processo Civil, que determinam a citação após a penhora.
3. De resto, o elemento histórico do preceito em causa não deixa dúvidas quando à inadmissibilidade dos embargos antes da citação.
Efectivamente, já no domínio do Código de 1876, cujo artigo 915º determinava que os embargos deviam ser deduzidos “dentro do decénio”, o Supremo Tribunal da Justiça, em acórdão de 15/05/1936, decidiu com um voto de vencido, que deduzidos antes, os embargos deviam ser rejeitados (cf. Revista de Legislação e Jurisprudência, 69º, pág. 105).
LOPES CARDOSO entendia que esta interpretação literal da norma em causa, quer do actual (referia-se ao artigo 817º, n.º 1, do Código de Processo Civil de 1961, que continha, à semelhança do código revisto em 95/96, expressão idêntica à do actual Código de Processo Civil de 2013) “… não se harmoniza com outras disposições da lei que, por uma forma geral, só dá efeitos peremptórios ao excesso e não à antecipação do prazo: - Nos termos do artigo 146º, n.º 1, só o «decurso» do prazo faz caducar o direito de praticar o acto”, referindo ser mais aceitável a opinião expressa no voto vencido do aludido acórdão, opinião segundo a qual a dedução prematura de embargos constituía mera nulidade, enquadrável no código de 61 no artigo 201º, n.º 1, “e só quando possa influir no exame ou decisão da causa, o que em regra não sucederá” (cf. Manual da Acção Executiva, 3ª edição, reimpressão, pág. 273).
Em sentido diverso, que aqui se adopta, entendia ALBERTO DOS REIS que a doutrina do Acórdão do Supremo Tribunal da Justiça continuava a ser a correcta em face do n.º 1 do artigo 817º do Código de 1939, de que a alínea a) do n.º1 do artigo 817º do Código de 61 é cópia [com correspondência em preceito idêntico no Código revisto em 95/96, e na actual alínea a) do n.º 1 do artigo 732º], com crítica fundamentada à posição de Lopes Cardoso, observando que: “Mal se compreende que o executado seja admitido a deduzir oposição antes de citado, ou antes de a citação começar a produzir efeitos. Acrescentamos: o indeferimento ou rejeição não cria dificuldades ao executado, não o prejudica; indiciado que seja o curso do prazo, ele voltará a deduzir a oposição que fora rejeitada.” (Processo de Execução, II, pág. 49, e Código de Processo Civil Anotado, 2ª ed., pág. 560).
4. Resta referir que o facto de em momento anterior ao indeferimento liminar se ter marcado tentativa de conciliação não impede a prolação da apreciação liminar da petição, porque os autos não passaram à fase contraditória, que se inicia com a audição da parte contrária.
5. Deste modo, improcede o recurso, com a consequente confirmação do despacho de indeferimento liminar.
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C) - SUMÁRIO
I. Na norma da alínea a) do n.º 1 do artigo 732º do Código de Processo Civil, em que se determina a rejeição liminar dos embargos quando tenham sido deduzidos fora de prazo, abrange-se, não só as situações em que os embargos são apresentados extemporaneamente por decurso do prazo peremptório, como também aquelas em que são deduzidos antes do prazo se iniciar.
II. Tal interpretação, em função dos elementos literal, histórico e sistemático do processo executivo, sai reforçada em sede de processo executivo sob a forma sumária, no qual, por força do disposto no n.º 1 do artigo 856º, a citação só ocorre, em regra, após a penhora, e marca o início do prazo, não só para dedução de embargos de executado, mas também para oposição à penhora, cuja efectivação é notificada simultaneamente com a citação.
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IV – DECISÃO
Nestes termos e com tais fundamentos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar o despacho recorrido.
Custas da oposição e do recurso a cargo do executado, sem prejuízo do apoio judiciário.
Guimarães, 26 de Novembro de 2015
Francisco Cunha Xavier
Francisca Mendes
João Diogo Rodrigues