Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
524/14.2T8VRL-B.G1
Relator: ANABELA TENREIRO
Descritores: INSOLVÊNCIA
DÍVIDA
BEM COMUM
APREENSÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/28/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I—No processo de insolvência intentado contra um dos cônjuges ou ex-cônjuge, no caso de existirem bens comuns do casal, não pode ser apreendido o “direito à meação do prédio”, por tal situação não ter sustentabilidade legal.
II—O imóvel, que integra o património comum do casal dissolvido, por divórcio, deve ser apreendido, na totalidade, para a massa insolvente, e seguidamente, caso a dívida seja da responsabilidade exclusiva do cônjuge insolvente, ordenada a citação do ex-cônjuge do insolvente para requerer a separação de bens nos termos do art.º 740.º, n.º 1 do C.P.Civil, sem prejuízo de tal separação ser ordenada oficiosamente nos termos do art. 141.º, n.º 1, al. b) e n.º 3 do CIRE.
Decisão Texto Integral: Processo n.º 524/14.2T8VRL-B.G1
Comarca : [Instância Local-Secção Cível –Vila Real]

Relatora : Anabela Andrade Miranda Tenreiro
Adjunta : Francisca Micaela Fonseca da Mota Vieira
Adjunto : Fernando Fernandes Freitas


Sumário
I—No processo de insolvência intentado contra um dos cônjuges ou ex-cônjuge, no caso de existirem bens comuns do casal, não pode ser apreendido o “direito à meação do prédio”, por tal situação não ter sustentabilidade legal.
II—O imóvel, que integra o património comum do casal dissolvido, por divórcio, deve ser apreendido, na totalidade, para a massa insolvente, e seguidamente, caso a dívida seja da responsabilidade exclusiva do cônjuge insolvente, ordenada a citação do ex-cônjuge do insolvente para requerer a separação de bens nos termos do art.º 740.º, n.º 1 do C.P.Civil, sem prejuízo de tal separação ser ordenada oficiosamente nos termos do art. 141.º, n.º 1, al. b) e n.º 3 do CIRE.

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I—RELATÓRIO
Nos autos de insolvência de J… de que os presentes autos são dependência, foi proferida sentença de declaração de insolvência em 18.05.2015, fixando-se o prazo de 30 dias para apresentação da reclamação de créditos.
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No auto competente consignou-se a apreensão do direito à meação do prédio rústico, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sabrosa sob o nº 462/19920511, freguesia de Vilarinho de S. Romão, aí melhor identificado.
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Foram reclamados e não impugnados, dentro do prazo legalmente estabelecido, e ao abrigo do disposto no artigo 128º do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas os créditos constantes da lista de credores reconhecidos elaborada pelo administrador de insolvência a fls. 4.
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A C veio reclamar os seus créditos, no valor global de € 182.741,47, emergentes de três financiamentos concedidos ao aqui insolvente, J…, e à sua – à data -cônjuge, S…, casados no regime de comunhão de adquiridos.
Para garantia de tais empréstimos, os mutuários, J… e S… constituíram duas hipotecas voluntárias, registadas pelas Ap. 1 de 2005.12.06 e Ap. 3 de 2007.05.15, sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Sabrosa sob o nº 462/Vilarinho de S. Romão, adquiridos por ambos na constância do casamento.
Por força das mencionadas hipotecas voluntárias registadas em seu benefício, a C… qualificou os créditos por si reclamados como garantidos, qualificação essa igualmente atribuída pelo Sr. Administrador de Insolvência na lista a que alude o art. 129º do CIRE.
A lista de créditos reconhecidos, em que os créditos da C… foram integralmente reconhecidos – tanto no que tange à sua natureza, como no que respeita ao seu montante – não foi objecto de qualquer impugnação.
O cônjuge do aqui insolvente, S…, foi declarado insolvente no processo n.º 65/14.8T8VRL-C da Comarca de Vila Real, tendo o crédito da Caixa Geral de Depósitos sido graduado com preferência em relação aos créditos comuns, por força da hipoteca incidente sobre o mencionado imóvel.
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Proferiu-se sentença que considerou todos os créditos reconhecidos, de natureza comum, e por não haver graduação a fazer entre os mesmos, determinou que deverão ser pagos pelo produto da liquidação, na proporção respetiva caso o produto da liquidação da massa se revele insuficiente para a sua satisfação integral.
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Inconformada com esta decisão, a C…, credora reclamante, interpôs recurso, finalizando com as seguintes
Conclusões
1.Nos termos e tempo legalmente previstos, a C… veio reclamar os seus créditos, no valor global de € 182.741,47, emergentes de três distintos financiamentos concedidos ao aqui insolvente, J…, e à sua – à data - esposa, S...
2.Para garantia de tais empréstimos, os mutuários constituíram duas hipotecas voluntárias, devidamente registadas pelas Ap. 1 de 2005.12.06 e Ap. 3 de 2007.05.15, sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Sabrosa sob o nº 462/Vilarinho de S. Romão.
3. Por força das mencionadas hipotecas voluntárias registadas em seu benefício, a C… qualificou os créditos por si reclamados como garantidos.
4. Qualificação essa igualmente atribuída pelo Sr. Administrador de Insolvência na lista a que alude o art. 129º do CIRE.
5. A lista de créditos reconhecidos, em que os créditos da C… foram integralmente reconhecidos – tanto no que tange à sua natureza, como no que respeita ao seu montante – não foi objecto de qualquer impugnação.
6. Proferida a competente sentença de verificação e graduação de créditos, pese embora os créditos reclamados pela C… hajam sido reconhecidos, foram qualificados como comuns.
7. Sustenta a Meritíssima Juiz a quo a sua decisão com base em que, nestes autos, não foi apreendido o imóvel em si mesmo, mas antes o direito à meação do insolvente nos bens que integram a comunhão conjugal indivisa.
8. Cremos, contudo, assim não ser, ou seja, não estar apreendido o direito à meação do insolvente num conjunto, indeterminado, de bens, mas concretamente a sua meação no imóvel supra descrito.
9. De facto, assim não fosse, isto é, caso não estivesse apreendido o direito à meação do insolvente naquele concreto e identificado prédio, razão nenhuma haveria para que o Sr. Administrador de Insolvência registasse, nesse bem, a presente declaração de insolvência.
10. Entendemos que não carece de registo a apreensão de um direito à meação nos bens que, anteriormente, integravam a comunhão conjugal, mas já o carece a apreensão de um direito concretamente incidente sobre um específico bem imóvel.
11. No caso dos autos, cremos, o Sr. Administrador de Insolvência apreendeu o direito do insolvente sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Sabrosa sob o nº 462/Vilarinho de S. Romão, motivo pelo qual procedeu ao registo da declaração de insolvência naquele mesmo imóvel.
12.Acresce ainda que, e fundamentalmente, a ex-cônjuge do aqui insolvente, e co-proprietária do bem imóvel hipotecado em benefício da C…, foi igualmente declarada insolvente, no âmbito do processo nº 65/14.8T8VRL, que corre termos igualmente nesta Comarca de Vila Real, pela Instância Central de Vila Real, Secção Cível, J2.
13. Prescreve o art. 743º/2 do NCPC, aplicável ex vi art. 17º do CIRE, que “Quando, em execuções diversas, sejam penhorados todos os quinhões no património autónomo ou todos os direitos sobre o bem indiviso, realiza-se uma única venda, no âmbito do processo em que se tenha efetuado a primeira penhora, com posterior divisão do produto obtido”.
14. Assim sendo, face à declaração de insolvência de ambos os proprietários do bem imóvel hipotecado e supra descrito – ainda que em processos distintos - o bem imóvel, em si mesmo e pela sua totalidade, terá de ser vendido, no processo em que foi primeiramente declarada a insolvência.
15. Note-se que no Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto em 22.11.2010,disponívelemhttp://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8fa42e6a7f133d1a802577f90030cf84?OpenDocument, se entendeu que “(…) é imperativa a norma do art. 826º/2 do CPC. Logo que do processo conste haver penhora de todos os quinhões no património autónomo ou todos os direitos sobre o bem indiviso ou direitos não pode deixar de ter lugar uma única venda. Esta obrigação abrange todos os processos, independentemente da prioridade da prioridade de realização da penhora ou do seu registo. No caso concreto, o processo de execução e o de insolvência. Não está na disponibilidade das partes, nem do tribunal. A norma visa terminar com uma situação de compropriedade, evitando o processo de divisão de coisa comum, além de trazer a vantagem de tornar mais fácil e rentável a venda, com poupança de esforço e gastos. É mais uma manifestação da sabida aversão do legislador pela compropriedade ou comunhão.”
16. Pese embora o citado Acórdão tenha sido proferido na vigência do anterior Código de Processo Civil, a verdade é que o ali aludido nº 2 do art. 826º do CPC foi transposto, sem qualquer alteração, para o Novo Código de Processo Civil, correspondendo, precisamente, ao mencionado art. 743º/2 do NCPC.
17. Ademais, uma tal venda nos termos acima expostos corresponde à intenção e proposta do Sr. Administrador de Insolvência em funções, que no relatório a que alude o art. 155º do CIRE, veio já propor “que a venda seja efectuada conjuntamente com a Ilustre Administradora de Insolvência da cônjuge: Dr.ª Al…, com domicílio profissional na Rua Sr.ª da B…, Viseu, para facilitar a venda em ambos os processos, repartindo-se por ambos o produto da venda”.
18. Isto posto, porquanto face à declaração de insolvência tanto de J… como de S…, o imóvel hipotecado, em si mesmo, necessariamente será vendido, se se mantiver a graduação dos créditos da C…como comuns, violar-se-á a preferência de pagamento que lhe conferem as hipotecas registadas em seu benefício.
19. A C… perderá, assim, a sua garantia, sem obter o correspectivo pagamento preferencial dos seus créditos, dado que, uma vez vendido o bem imóvel, o direito de propriedade sobre esse prédio será – atento o disposto no art. 824º/2 do Código Civil – transferido livre de quaisquer ónus e encargos e essa transferência de propriedade afecta inelutavelmente a sua garantia.
20. Ora, é pelo produto da venda daquele imóvel – cuja meação pertence ao insolvente - e atento o disposto no art. 686º do Código Civil, que o credor hipotecário, no caso a ora Apelante, goza do direito de ser pago com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo, como é o caso dos restantes credores dos autos.
21. Por esse motivo, refira-se, foram os créditos da C… reconhecidos e graduados com preferência sobre os demais pelo produto obtido pela massa insolvente no processo de insolvência da ex-cônjuge do aqui insolvente.
22. Assim não decidindo a sentença proferida pelo Tribunal a quo, padece a mesma de ilegalidade, por violação do disposto no art. 686º do Código Civil e sonegação do direito da C… decorrente dessa disposição legal, que, assim, verá excutida a sua garantia sem o correspectivo pagamento dos créditos por si reclamados – com preferência de pagamento sobre os demais credores–pelo produto da respectiva venda.
23. Nesta conformidade, deverá a sentença ora recorrida ser revogada, por ilegal, e substituída por outra que para pagamento pelo produto da venda do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Sabrosa sob o nº 462/Vilarinho de S. Romão gradue os créditos da C… com preferência de pagamento sobre os demais credores, por força das hipotecas voluntárias registadas sobre esse imóvel para garantia dos seus créditos.

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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II—Delimitação do Objecto do Recurso
A questão a apreciar, delimitada pelas conclusões do recurso, consiste em saber se o crédito da recorrente deve ser graduado como comum ou com preferência em relação aos demais créditos, por força da hipoteca voluntária registada a seu favor que incide sobre o mencionado imóvel.
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III—FUNDAMENTAÇÃO (dão-se por reproduzidos os actos processuais acimas descritos)
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IV—DIREITO
Na sentença que declarar a insolvência, o juiz, além do mais, decreta a apreensão, para imediata entrega ao administrador da insolvência, dos elementos da contabilidade do devedor e de todos os seus bens, ainda que arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos e sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 150.º.
Assim, nos termos do art. 149.º do CIRE proferida a sentença declaratória de insolvência, procede-se à imediata apreensão dos elementos e bens acima mencionados.
A massa insolvente abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo.
O processo de insolvência rege-se pelas disposições do CIRE (Código de Insolvência e de Recuperação de Empresa) e pelo Código de Processo Civil em tudo o que não contrarie essas disposições.
Pese embora as regras específicas resultantes do artigo 150.º do CIRE sobre a forma como deve ser feita a apreensão, são aplicáveis as disposições do Código de Processo Civil previstas para o processo executivo nomeadamente o regime da penhora.
Na execução movida apenas contra um dos cônjuges, e antes da revisão introduzida pelo Dec.-Lei n.º 329-A/95 de 12.12, o artigo 825.º, n.º 1 do C.P.Civil estabelecia que a execução dos bens comuns fica suspensa, depois de penhorado o direito à meação do devedor, até ser exigível o cumprimento, nos termos da lei substantiva.
Ou seja, o direito à meação do devedor/executado pelas dívidas da responsabilidade exclusiva deste último só era exigível depois de dissolvido, declarado nulo ou anulado o casamento, ou depois de decretada a separação judicial de pessoas e bens ou simples separação judicial de bens (moratória legal )—v. art. 1696.º, n.º 1 do C.Civil.
Não havendo lugar à moratória (pelo facto da dívida ser da responsabilidade de ambos) podiam ser imediatamente penhorados bens comuns do casal, contando que o exequente, ao nomeá-los à penhora, pedisse a citação do cônjuge do executado, para requerer a separação de bens.
Após a alteração do art. 825.º (cuja redacção, nesta parte, é semelhante à do actual 740.º, n.º 1) operada pelo referido Dec.-Lei n.º 329.º-A/95 de 12 de Dezembro, foi eliminada a moratória no caso de dívida da responsabilidade exclusiva de um dos cônjuges, e facultada a penhora de bens comuns do casal, independentemente da comunicabilidade da dívida, contanto que o exequente, ao nomeá-los à penhora, pedisse a citação do cônjuge do executado, para requerer a separação de bens.
E no caso de serem penhorados bens comuns do casal, impunha-se a citação do cônjuge do executado para requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência de acção em que a separação já tenha sido requerida.
Ao eliminar a moratória, o legislador teve de ajustar o regime substantivo com a lei processual e, consequentemente, alterou simultaneamente o mencionado artigo 1696.º, n.º 1 do C.Civil que passou a ter a seguinte redacção : Pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem os bens próprios do cônjuge devedor e, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns.
Apensado o requerimento de separação ou junta a certidão, a execução fica suspensa até à partilha-v. n.º 2 do art. 740.º do C.P.Civil.
Em suma, nas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges, o legislador deixou de exigir a moratória, em consequência da penhora do direito à meação do devedor.
Pelas dívidas que são da responsabilidade de ambos os cônjuges respondem os bens comuns do casal,e, na falta ou insuficiência deles, solidariamente, os bens próprios de qualquer dos cônjuges.—v. art. 1695.º, n.º 1 do C.Civil.
Por conseguinte, quer a dívida seja da responsabilidade de apenas de um dos cônjuges quer de ambos, a lei permite a penhora de bens comuns, devendo ser cumprido, no primeiro caso, o disposto no art. 740.º, n.º 1 do C.P.Civil no que respeita à citação do cônjuge para requerer a separação de bens ou juntar certidão da pendência de acção com essa finalidade, sob pena de a execução prosseguir sobre os bens comuns.
A Jurisprudência, em diversos casos , esclareceu que a dissolução do casamento, por divórcio, não altera o regime de bens, mantendo-se comuns até à partilha, e sendo aplicável ao ex-cônjuge o mencionado artigo 825.º, correspondente, na parte que agora interessa, ao actual art. 740.º, n.º 1 do C.P.Civil.
Nos presentes autos foi aprendido o direito à meação de bem imóvel determinado.
Incidem sobre este imóvel, adquirido pelo insolvente e respectivo cônjuge, na constância do casamento, sob o regime de comunhão de adquiridos, duas hipotecas voluntárias destinadas a garantir à recorrente C… o pagamento dos mútuos concedidos ao insolvente e ao seu cônjuge, na altura.
Nos termos do artigo 686.º, n.º 1 do C.Civil a hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis pertencentes ao devedor ou a terceiro com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo.
Por outro lado, não há dúvida que o referido imóvel é um bem comum do casal, à luz do artigo 1724.º, al. b) do C.Civil.
E a dívida (mútuos) contraída junto da recorrente C… pelo ex-casal, responsabiliza ambos os cônjuges—v. art. 1691.º, n.º 1, al. a) do C.Civil—pelo qual respondem, como já acima referimos, os bens comuns do casal.
Os bens comuns do casal, no regime de comunhão, integram um património colectivo ou, na definição de A. Varela um património colectivo de afectação especial, autónomo, cabendo a cada cônjuge um único direito sobre o mesmo.
É um património de afectação especial porque, na explicação do referido autor , o complexo de bens que em cada o momento o integra se encontra adstrito à satisfação da sociedade conjugal.
Sobre uma situação similar à destes autos, o Tribunal da Relação do Porto concluiu que não é admissível a penhora ou a apreensão de um “direito à meação” em cada um dos bens que constitui o património do casal uma vez que não nenhum dos cônjuges possui uma quota-parte sobre bens em concreto, sendo titulares de um único direito sobre um património autónomo, que não suporta divisão, nem mesmo ideal.
Ora, a sentença de reconhecimento e graduação dos créditos baseou-se na apreensão de um “bem” ou “direito” que não tem sustentação legal (direito à meação do prédio rústico supra identificado), impondo-se, por isso, a correcção do auto de apreensão no sentido de ser apreendida a totalidade desse imóvel, que inclusivamente foi registada, e oportunamente, ser proferida sentença de reconhecimento e graduação dos créditos, que tenha em consideração os bens ou direitos apreendidos para a massa insolvente.
Nesta conformidade, e sufragando a argumentação do citado aresto, deve o imóvel em causa ser apreendido, na totalidade, para a massa insolvente, não havendo necessidade de se proceder à citação do ex-cônjuge do insolvente para requerer a separação de bens nos termos do art.º 740.º, n.º 1 do C.P.Civil , por se tratar de dívida da responsabilidade de ambos os cônjuges.
A questão da venda, colocada pela recorrente, embora seja pertinente, não foi decidida pelo tribunal a quo, pelo que não poderá ser reapreciada, nesta sede de recurso.
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V—DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem este Tribunal da Relação em julgar procedente o recurso, e consequentemente, revogando a sentença, determina-se que se proceda da forma supra indicada relativamente ao auto de apreensão, antes de ser proferida sentença de reconhecimento e graduação de créditos.
Sem custas.
Notifique e registe.
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Guimarães, 28 de Janeiro de 2016

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(Anabela Andrade Miranda Tenreiro)



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(Francisca Micaela Fonseca da Mota Vieira)



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(Fernando Fernandes Freitas)
1) Cfr. artigo 36.º, n.º 1, al. g) do CIRE.
2) Cfr. artigo 46.º do CIRE
3) Cfr. artigo 17.º do CIRE.
4) v. sobre o assunto, Varela, Antunes, Direito da Família, 1987, Livraria Petrony, pág. 395.
5) No art. 4.º do mencionado Dec.-Lei n.º 329-A/95
6) v. Ac. STJ de 15/01/2013 e Acórdãos da Rel.Lisboa de 04/03/2004, 10/01/2008, 11/03/2010 e 15/01/2013 disponíveis in www.dgsi.pt.
7) v. Amaral, Jorge Augusto Pais do Amaral, Direito da Família e das Sucessões, 2.ª edição, Almedina, pág. 138.
8) v. Direito da Família, 1987, Livraria Petrony, pág. 394.
9) v. ob. cit., nota 2 da pág. 394.
10) v. Acórdão de 11/03/2014 e doutrina aí citada in www.dgsi.pt.
11) A interpretação deste preceito deve ser feita em conjugação com o regime substantivo (v. artigo 1692.º e 1696.º, n.º 1 do CC), ou seja, só deverá ser aplicado em execução movida contra um só dos cônjuges, por dívida da exclusiva responsabilidade deste e por insuficiência de bens próprios (que respondem em primeira linha); só neste caso da dívida ser da responsabilidade exclusiva do cônjuge insolvente deverá ser ordenada a citação do ex-cônjuge para requerer a separação de bens, sem prejuízo de tal separação ser ordenada oficiosamente nos termos do artigo 141.º, n.º 1, al. b) e n.º 3 do CIRE.