Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
259/14.6TBAVV-A.G1
Relator: HELENA MELO
Descritores: DIVÓRCIO POR MÚTUO CONSENTIMENTO
RESPONSABILIDADES PARENTAIS
COMPETÊNCIA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/15/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
Decisão: DESATENDIDA
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: .Se numa acção por divórcio sem consentimento do outro cônjuge, os cônjuges acordarem em divorciarem-se por mútuo consentimento, seguir-se-ão os termos do processo por mútuo consentimento, com as necessárias adaptações (nº 2 do artº 1779º do CC), devendo as partes acordar quanto aos alimentos, ao destino da casa de morada de família, às responsabilidades parentais relativamente aos filhos menores e apresentar a relação de bens comuns com a indicação dos respectivos valores (artº 994º nº 1 do CPC).
. Se os cônjuges não apresentarem algum dos acordos a que estão obrigados, então o juiz fixa as consequências do divórcio (nº 3 do artº 1778º A do CC). A falta de acordo dos cônjuges quanto às consequências do divórcio não converte o processo de divórcio num de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges; continua a ser processo de divórcio por mútuo consentimento, por haver acordo dos cônjuges quanto à dissolução do casamento.
.As questões sobre as quais as partes não lograram acordo, constituem incidentes da acção de divórcio e são tramitadas nos próprios autos
. O tribunal português do domicílio do A. é o competente para a acção de divórcio e o competente para apreciar todas as questões incidentais que sejam suscitadas no seu âmbito – artº 72º e 91º nº 1 do CPC, não se aplicando o disposto no artº 155º da OTM..
.O disposto no artº 154º nº 4 da OTM e o artº 11º, nº 3 da Lei 141/2005 que revogou o diploma anterior, que estabelecem que, estando pendente acção de divórcio, as providências tutelares cíveis relativas à regulação do exercício do poder paternal correm por apenso àquela acção, tem como pressuposto a instauração de um processo de divórcio e a instauração autónoma noutro tribunal de uma acção de regulação das responsabilidades parentais.
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães:

I - Relatório
B… instaurou acção divórcio sem consentimento do outro cônjuge contra C….
Realizada tentativa de conciliação, pelo A. e pela R. (esta através do seu Exmº Mandatário que protestou juntar procuração com poderes especiais para o acto) foi declarado o propósito conjunto de se divorciarem. As partes prescindiram reciprocamente de alimentos, declararam não existir casa de morada de família e relacionaram os bens comuns, mas não chegaram a acordo quanto à regulação das responsabilidades parentais referentes à sua filha menor, D….
Seguidamente a Mma. Juíza proferiu despacho, onde ordenou que o processo passasse a seguir os termos do processo de divórcio por mútuo consentimento, previstos no artº 1778º do CC, para fixação das consequências do divórcio como se tratasse de um divórcio sem consentimento.
Mais decidiu que “com vista a apreciar a concreta questão relativa à regulação das responsabilidades parentais referentes à filha menor dos cônjuges, e com vista ao subsequente decretamento do divórcio, terá de seguir-se a tramitação prevista nos nº (s) 3º a 5º do artº 1778º-A do CPC.
Tratando-se de processo de jurisdição voluntária, nos termos conjugados dos artigos 968º e 292º e 295º do CPC, seguir-se-ão os termos processuais do regime dos incidentes, pelo que convido o A. a substanciar o pedido e a causa de pedir sobre o aspecto referido no artº 994º nº 1, al. c) do C.P.Civil.”
O A. veio apresentar um articulado pugnando pela fixação da residência da menor junto de si.
A R. veio igualmente apresentar um articulado opondo-se a esta pretensão e invocando a excepção de incompetência internacional dos tribunais portugueses para conhecer da presente acção e a litispendência entre a presente acção e a que alega ter instaurado na justiça brasileira.
Por despacho de 03.03.2015 a Mma Juíza a quo apreciou a excepção de litispendência e de incompetência, tendo proferido o seguinte despacho:
“Começando por esta segunda questão da litispendência, constata-se que os presentes autos deram entrada em 06/06/2014, tendo a R. sido citada e intervindo nos autos em 13.08.2014.
A acção de parentesco instaurada pela R. em Belo Horizonte, Brasil, deu entrada em 12.01.2015 – fls 82.
Pelo que se existir litispendência, o que duvidamos existir, ela não deverá ser suscitada nos presentes autos, que se consideram instaurados em primeiro lugar nos termos do artº 581º nº 4 do CPC, mas sim nos autos deduzidos em segundo lugar.
Quanto à segunda questão:
Como bem afirma o Digno Procurador, a presente acção é de divórcio, e como tal, competente para a sua tramitação é o do domicílio ou residência do autor – artº 72º do CPC.
Residindo o A. nos Arcos de Valdevez, logo se constata que a presente Secção de Família e Menores é competente para a tramitação da acção, indeferindo-se, por improcedente a excepção invocada pela R.
Custas do incidente a cargo da R., fixando a taxa de justiça em 2 UC.
Notifique.”

É deste despacho que a R. veio interpor o presente recurso em separado, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. A presente acção resulta da convolação de acção de divórcio sem consentimento do outro cônjuge em divórcio por mútuo consentimento, tendo em vista exclusivamente " ... apreciar a concreta questão relativa regulação das responsabilidades parentais referentes à filha menor dos cônjuges ... ", o que assim foi determinado por douto despacho proferido Mm", Juiz do Tribunal a quo, na sequência do acordo dos cônjuges quanto à resolução de se divorciarem.
2. Para tanto, convidou o " ... 0 Autor a substanciar o pedido e a causa de pedir sobre o aspecto referido no art. 994, nº.1, alínea c) do CPCivil." (cfr. douto despacho de fls., de 10/12/2014).
3. Atento o disposto no n°.3 do artigo 1778°.-A do Código Civil, conjugado com o disposto no nº 4… do artigo 154°. da OTM, a questão da regulação das responsabilidades parentais haveria de ter corrido por apenso à acção de divórcio.
4. A inobservância daquelas disposições processuais determina, necessariamente, a nulidade da douta decisão recorrida e, consequentemente, da que vier a ser proferida a final.
SEM PRESCINDIR,
5. A acção, que havia começado como de divórcio, sofreu uma modificação objectiva da instância, no sentido de se converter, na prática, exclusivamente numa acção de regulação das responsabilidades parentais.
6. Rigorosamente, a eufemística expressão substanciar é, aqui, sinónimo de alterar o pedido e a causa de pedir, porquanto, quer os factos, quer o pedido formulados na acção não permitiam a decisão que se impunha agora tomar, sobre a regulação das responsabilidades parentais.
7. Seja por apenso à acção principal de divórcio ou na sequência da modificação objectiva da instância, as regras processuais a aplicar são as da acção de regulação de responsabilidades parentais.
8. Quer quanto à natureza de acção de jurisdição voluntária, quer quanto às regras sobre meios e ónus de prova, quer, principalmente, quanto às regras de competência.
9. Sobre a competência internacional dos Tribunais Portugueses para a acção de regulação das responsabilidades parentais dispõe-se no nº 1 do artigo 155° da OTM que é competente o Tribunal da residência do menor no momento em que o processo foi instaurado.
10. Que, no caso, reside no Brasil.
11. Razão pela qual entende a recorrente que, salvo melhor opinião, a Mm", Juiz do Tribunal a quo fez uma menos correcta interpretação e aplicação ao caso concreto das normas contidas, entre mais, nos artigos 154°. e 155°. da OTM, 65°./b) e 931°./4 do Código de Processo Civil e ainda do 1778°.-A do Código Civil.
12. E assim, porquanto se impunha antes concluir pela incompetência internacional dos Tribunais Portugueses para regular as responsabilidades parentais da menor, filha de recorrente e recorrida.
SEM PRESCINDIR,
13. No douto despacho sob recurso é manifesto o lapso quando, por referência ao documento junto pela recorrente na resposta ao articulado superveniente do A., se refere que a acção de regulação das responsabilidades parentais que corre termos no Brasil foi instaurada em 12/01/2015, quando a mesma foi à distribuição em 24/07/2014.
14. O pressuposto de que a presente acção terá sido proposta em primeiro lugar assenta, por isso, na menos correcta apreciação feita do documento junto pela recorrente, que revela exactamente o contrário.
15. Ora, é manifesto que é a mesma a causa de pedir e o pedido na acção de regulação das relações parentais intentada no Brasil e na presente.
16. Numa e noutra visa-se regular as responsabilidades parentais quanto à mesma menor.
17. Pelo que, a excepção dilatória de litispendência deve ser considerada procedente por provada e assim declarada e, em consequência, absolver-se a R. da instância.
TERMOS EM QUE, NOS MAIS DE DIREITO E COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS,
deve dar-se provimento ao presente recurso e, em consequência, alterar-se o douto despacho na parte que decidiu pela improcedência do pedido de declaração da incompetência internacional dos Tribunais Portugueses e de litispendência e, em consequência, absolver-se a requerida/apelante da instância.
O Ministério Público e o pai da menor contra-alegaram, tendo ambos oferecido as seguintes conclusões:
1º O recurso não tem qualquer fundamento.
2º O recorrido nunca foi citado, notificado, ou teve qualquer conhecimento da existência de processo no Brasil que conduza a litispendência.
3° O recurso tem apenas um intuito dilatório, para que a recorrente continue a impedir o contacto da menor e o pai, o que faz há perto de dois anos.
4° A Douta Decisão recorrida não padece de qualquer vício, devendo ser mantida na íntegra.
Este é também o nosso entendimento, reiterando-se que a Ré, ao invocar a excepção da incompetência internacional do tribunal, aduziu argumentos de facto e de direito cuja pertinência se reconhece; todavia, tal argumentação centra-se única e exclusivamente na questão da regulação das responsabilidades parentais da menor Joana Sofia, olvidando que estamos no âmbito de uma acção de divórcio, pelo que é aplicável o disposto no art. 72.° do CPC, sendo competente o tribunal do domicílio ou residência do autor.
Foi proferida pela relatora decisão singular julgando improcedente a apelação.
Não concordando com a decisão veio a apelante reclamar para a conferência, invocando em síntese, que a decisão da relatora é nula porque não se pronunciou sobre as questões suscitadas no recurso e ainda que assim não se entenda, deverá a apelação ser julgada procedente.

II – Objecto do Recurso
Considerando que:
. o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e,
. os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido,
as questões a decidir, de acordo com as conclusões da apelante, são as seguintes:
. se a decisão singular é nula;
.se a regulação das responsabilidades parentais deve ser tramitada por apenso aos autos de divórcio;
. se o tribunal competente para a regulação das responsabilidades parentais é o tribunal da residência da menor; e,
. se se verifica litispendência entre a acção de divórcio instaurada em Portugal pelo A. e a acção instaurada pela R. no Brasil de regulação das responsabilidades parentais.

III – Fundamentação
A situação factual é a supra mencionada.

Da nulidade do despacho proferido ao abrigo do artº 645º do CPC
A sentença será nula, quer no caso de o juiz deixar de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, quer quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (artº 615, nº 1, alínea d), do CPC), disciplina aplicável aos despachos por força do disposto no 613º, nº 3 do CPC. Desde logo, importa precisar o que deve entender-se por questões, cujo conhecimento ou não conhecimento constitui nulidade por excesso ou falta de pronúncia. Como tem sido entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência, apenas as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o “thema decidendum”, ou que dele se afastam, constituem verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade prevista no artº 668, nº 1, al. d) do CPC. Deve assim distinguir-se as verdadeiras questões dos meros “raciocínios, razões, argumentos ou considerações”, invocados pelas partes e de que o tribunal não tenha conhecido ou que o tribunal tenha aduzido sem invocação das partes (entre outros, Abílio Neto, Código do Processo Civil Anotado, 14.ª ed., pág. 702).
A apelante vem alegar que a decisão singular não se pronunciou concretamente se acção deveria ter ocorrido por apenso e se lhe deveriam ser aplicáveis as regras da competência estabelecidas para as acções de regulação das responsabilidades parentais, como defende a apelante, mas não lhe assiste razão.
A decisão singular pronunciou-se expressamente sobre a questão, entendendo que o nº 4 do artº 154º da OTM não tem aplicação no caso em análise, e que a regulação das responsabilidades parentais constitui um incidente do divórcio a tramitar nos próprios autos, aplicando-se as regras da competência, em razão do território, estabelecidas para a acção principal – a acção de divórcio – artº 72º e 91º do CPC ( e não o disposto no artº 155º da OTM).
A decisão não tem que pronunciar-se sobre todas as razões e argumentos invocados pelas partes, como se referiu.
Improcede, assim, a alegada nulidade.

Da competência do Tribunal e do processamento por apenso
O divórcio litigioso com base na violação culposa dos deveres conjugais foi eliminado do nosso ordenamento jurídico pela Lei 61/2008. A par do divórcio por mútuo consentimento, a lei prevê actualmente o divórcio sem consentimento de um dos cônjuges (cfr. artº 1773º, nº 1, do C.Civil), regulado no artigo 1779º e ss do CC.
Com o abandono do fundamento da culpa no divórcio, a lei portuguesa procurou convergir com as tendências mais recentes do direito europeu.
O divórcio sem consentimento assenta em factos objetivos demonstrativos da ruptura definitiva do casamento, atribuindo a qualquer dos cônjuges o direito de requerer o divórcio, independentemente da sua maior ou menor contribuição para a crise matrimonial (artigo 1781.º, alínea d), do Código Civil).
No processo de divórcio sem consentimento há sempre lugar a uma tentativa de conciliação (nº 1 do artº 1779º do CC) e se a conciliação não for possível, o juiz tentará obter o acordo dos cônjuges para o divórcio por mútuo consentimento. Se os cônjuges acordarem em divorciarem-se por mútuo consentimento, seguir-se-ão os termos do processo por mútuo consentimento, com as necessárias adaptações (nº 2 do artº 1779º do CC). Deverão então as partes acordar quanto aos alimentos, ao destino da casa de morada de família, às responsabilidades parentais relativamente aos filhos menores e apresentar a relação de bens comuns com a indicação dos respectivos valores (artº 994º nº 1 do CPC).
O juiz aprecia os acordos que os cônjuges tiverem apresentado e convida-os a alterá-los se esses acordos não acautelarem os interesses de algum deles ou dos filhos (nº 2 do artº 1778º A do CC), procedendo por fim à sua homologação e fixando as custas por ambas as partes.
Se os cônjuges não apresentarem algum dos acordos a que estão obrigados, então o juiz fixa as consequências do divórcio (nº 3 do artº 1778º A do CC). A falta de acordo dos cônjuges quanto às consequências do divórcio não converte o processo de divórcio num de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges - continua a ser processo de divórcio por mútuo consentimento, por haver acordo dos cônjuges quanto à dissolução do casamento. A lei criou uma figura híbrida, que é o «divórcio por mútuo consentimento judicial»(1) por contraposição ao divórcio por mútuo consentimento administrativo.
Segundo o nº 4 do mencionado artº 1778º-A, o juiz, a fim de fixar as consequências do divórcio, «pode determinar a prática de actos e a produção de prova eventualmente necessária».
A lei prescinde dos acordos acerca dos alimentos entre os cônjuges, do destino da casa de morada de família e, sendo caso disso, sobre o exercício das responsabilidades parentais, sendo então a decisão exclusivamente da competência do tribunal (artigo 1778.º do Código Civil).
Não tendo as partes acordado quanto às responsabilidades parentais, bem andou a Mma. Juíza a quo ao convidar o A. a substanciar o pedido e a causa de pedir quanto à regulação das responsabilidades parentais, a fim de a melhor habilitar a fixar as consequências do divórcio, podendo ainda, determinar a prática de actos e a produção de prova que entender necessária.
Insurge-se a apelante porque entende que a acção de divórcio sofreu uma modificação objectiva da instância, tendo se convolado numa acção de regulação das responsabilidades parentais, regendo-se pelas regras aplicáveis a estas acções, designadamente as regras sobre a competência (artº 155º da OTM).
Não o entendemos assim.
O Código Processo Civil prevê nos seus artigos 264º e 265º os casos de modificação objectiva da instância: alteração do pedido e da causa de pedir com acordo e sem acordo. No caso não há qualquer alteração do pedido ou da causa de pedir. Trata-se de um processo de divórcio litigioso que se converteu em divórcio por mútuo consentimento, cabendo ao juiz fixar as consequências do divórcio, relativamente às questões que devem ser resolvidas, designadamente a regulação das responsabilidades parentais, sobre as quais as partes não chegaram a acordo.
A regulação das responsabilidades parentais apenas surge como consequência da conversão do divórcio sem consentimento em divórcio por acordo dos cônjuges.
Assim, ao contrário do regime anterior, em que existia uma separação definida na tramitação e na competência entre o divórcio por mútuo consentimento (onde os cônjuges deveriam acordar nas questões relativas aos seus interesses pessoais e patrimoniais e aos interesses dos filhos menores) e o divórcio litigioso (em que essas questões seriam objecto de decisão nas acções próprias, não afectando a tramitação da ação de divórcio), no regime atual, estando os cônjuges de acordo em cessar a relação matrimonial por divórcio mas não havendo acordo sobre todas ou alguma das questões que constituem as consequências do divórcio, incumbe ao juiz decidir os efeitos do divórcio relativamente a essas questões, como se fosse um divórcio sem consentimento.
Estas questões sobre as quais as partes não lograram acordo, constituem incidentes da acção de divórcio e são tramitadas nos próprios autos. Assim, “consistindo a questão principal da causa no decretamento do divórcio (artigo 1778.º-A, n.º 5 do Código Civil), a definição judicial das consequências deste configura uma questão incidental, a resolver de acordo com as orientações processuais que o juiz entender mais convenientes, quer quanto ao conteúdo e forma dos atos processuais, quer quanto à produção de prova considerada necessária, observando os princípios processuais, nomeadamente da igualdade das partes e do contraditório(2)” .
A fixação das consequências do divórcio constitui pressuposto da homologação do divórcio por mútuo consentimento.
O tribunal português do domicílio do A. é o competente para a acção de divórcio e o competente para apreciar todas as questões incidentais que sejam suscitadas no seu âmbito – artº 72º e 91º nº 1 do CPC, não se aplicando o disposto no artº 155º da OTM..
O disposto no artº 154º nº 4 que dispõe que, estando pendente acção de divórcio, as providências tutelares cíveis relativas à regulação do exercício do poder paternal correm por apenso àquela acção, tem como pressuposto a instauração de um processo de divórcio e a instauração autónoma noutro tribunal de uma acção de regulação das responsabilidades parentais, o que não é o caso dos autos.
A OTM veio a ser revogada, entretanto, pelo artº 6º, alínea a) da Lei 141/2015, de 8/09 que aprovou o Regime Geral do Processo Tutelar Cível e que entrou em vigor 30 dias após a data da publicação (artº 7º), mas o artº 11º nº 3 da Lei 141/2005, não trouxe alterações ao que dispunha o nº 4 do artº 154º da OTM.
Dir-se-á finalmente que, ainda que se entendesse que a regulação das responsabilidades parentais devesse ser processada por apenso, a competência para a regulação das responsabilidades parentais, sempre se manteria, por força do disposto no artº 91º do CPC.

Da litispendência
Ainda que a acção para a regulação das responsabilidades parentais tenha sido instaurada em primeiro lugar, como alega a apelante e o que se desconhece, pois que este recurso em separado não fornece tais elementos, sendo que a anterioridade da acção é determinada pelo momento da citação e não pela sua distribuição (artº 582º, nº 2 do CPC) desde logo não se verifica litispendência, pois que a pendência de uma causa numa jurisdição estrangeira é irrelevante para efeitos de litispendência, nos termos do nº 3 do artº 580º do CPC, salvo se outra for a solução estabelecida em convenções internacionais, o que no caso não se verifica
Assim, a decisão recorrida deve ser mantida.

Sumário:
.Se numa acção por divórcio sem consentimento do outro cônjuge, os cônjuges acordarem em divorciarem-se por mútuo consentimento, seguir-se-ão os termos do processo por mútuo consentimento, com as necessárias adaptações (nº 2 do artº 1779º do CC), devendo as partes acordar quanto aos alimentos, ao destino da casa de morada de família, às responsabilidades parentais relativamente aos filhos menores e apresentar a relação de bens comuns com a indicação dos respectivos valores (artº 994º nº 1 do CPC).
. Se os cônjuges não apresentarem algum dos acordos a que estão obrigados, então o juiz fixa as consequências do divórcio (nº 3 do artº 1778º A do CC). A falta de acordo dos cônjuges quanto às consequências do divórcio não converte o processo de divórcio num de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges; continua a ser processo de divórcio por mútuo consentimento, por haver acordo dos cônjuges quanto à dissolução do casamento.
.As questões sobre as quais as partes não lograram acordo, constituem incidentes da acção de divórcio e são tramitadas nos próprios autos
. O tribunal português do domicílio do A. é o competente para a acção de divórcio e o competente para apreciar todas as questões incidentais que sejam suscitadas no seu âmbito – artº 72º e 91º nº 1 do CPC, não se aplicando o disposto no artº 155º da OTM..
.O disposto no artº 154º nº 4 da OTM e o artº 11º, nº 3 da Lei 141/2005 que revogou o diploma anterior, que estabelecem que, estando pendente acção de divórcio, as providências tutelares cíveis relativas à regulação do exercício do poder paternal correm por apenso àquela acção, tem como pressuposto a instauração de um processo de divórcio e a instauração autónoma noutro tribunal de uma acção de regulação das responsabilidades parentais.

IV – Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em desatender a reclamação.
Custas pela apelante.
Notifique.
Guimarães, 15 de Março de 2016
Helena Gomes de Melo
Isabel Silva
Heitor Gonçalves
(1) Cfr. se defende no Ac. do TRG de 13.03.2012, proferido no proc. nº 2330/11, acessível em www.dgsi.pt.
(2) Cfr. defende em www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/familia/O_divorcio.pdf, António José Fialho, Comunicação apresentada na ação de formação “Regime Jurídico do Divórcio”, realizada pelo CEJ no dia 23.11.2012.