Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1691/15.3T8CHV-A.G1
Relator: ANABELA MIRANDA TENREIRO
Descritores: COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
MENOR
RESIDÊNCIA HABITUAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/12/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I-No caso de residência plurilocalizada dos progenitores em Estados-Membros diferentes, o artigo 8.º, n.º 1 do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho de 27.11.2003, estabelece que em matéria de responsabilidade parental o tribunal competente é aquele que se encontra situado no Estado-Membro onde a criança resida habitualmente à data em que o processo seja instaurado no tribunal.
II-A ratio legis normativa, atendendo à justificação aduzida no 12.º Considerando, radica no superior interesse da criança e, em particular, no critério de proximidade.
III-Para efeito de aferição da competência internacional do tribunal, em matéria de regulação da responsabilidade parental, o conceito de residência habitual do menor deve ser interpretado, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, no sentido de que essa residência corresponde ao lugar que traduz uma certa integração da criança num ambiente social e familiar.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I—RELATÓRIO
Paulo J instaurou a presente acção com vista à regulação do exercício das responsabilidades parentais da menor Sara P, sua filha.
Alegou, em suma, que requerente e requerida não são casados entre si pelo que importa regular as responsabilidades parentais, sendo que a menor encontra-se a viver com a mãe.
Foi realizada a conferência de pais a que alude o artigo 35.0 da Lei n.º 141/2015, de 8 de Setembro, não tendo requerente e requerida chegado a acordo.
Remetendo-se as partes para audição técnica especializada, a mesma não teve lugar em virtude da requerida residir no estrangeiro.
Notificados para apresentar alegações, apenas a requerida o fez, arguindo a excepção de incompetência internacional dos tribunais portugueses para os termos da presente acção, no que não estão de acordo o Digno Magistrado do Ministério Público e o requerente.
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Proferiu-se decisão que declarou o tribunal internacionalmente competente, indeferindo a excepção deduzida.
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Inconformada com a decisão, a Requerida apresentou recurso, formulando as seguintes conclusões:
A) ANDOU MAL O TRIBUNAL A QUO, AO CONSIDERAR QUE A MENOR, PELO FACTO DE TER POUCO MAIS DO QUE DOIS ANOS DE IDADE, CONSIDERA SER POUCO TEMPO DE VIDA PARA PODER CONCLUIR POR UMA RESIDÊNCIA HABITUAL ESTÁVEL E PERMANENTE DA MESMA NO LUXEMBURGO.
B) APESAR DE APLICAR DEVIDAMENTE O REGULAMENTO 2201/2003 DE 27 DE NOVEMBRO, O RGPTC E A CONVENÇÃO DE HAIA, CERTO É QUE O TRIBUNAL A QUO FAZ UMA ERRADA PONDERAÇÃO ACERCA DO QUE CONSIDERA SER A RESIDÊNCIA HABITUAL ESTÁVEL E PERMANENTE DA MENOR E QUE NÃO SE PODERÁ CONSIDERAR COMO SENDO OUTRA QUE NÃO NO LUXEMBURGO!!
C) CONSIDERA, ASSIM, ERRADAMENTE, O TRIBUNAL A QUO QUE DE ACORDO COM O SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA E O CRITÉRIO DA PROXIMIDADE, OS TRIBUNAIS PORTUGUESES SÃO INTERNACIONALMENTE COMPETENTES PARA DECIDIR A QUESTÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS RELATIVAS À MENOR SARA COUTINHO, INDEFERINDO, POR CONSEQUÊNCIA A EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA INTERNACIONAL DOS TRIBUNAIS PORTUGUESES INVOCADA PELA ORA RECORRENTE.
D) SEM DÚVIDA QUE ANDOU MAL O TRIBUNAL A QUO, AO FAZER TAL CONSTATAÇÃO, SENDO QUE ATENDENDO AO SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA E AO CRITÉRIO DA PROXIMIDADE, SERÃO SEM DÚVIDA COMPETENTES OS TRIBUNAIS DO ESTADO DO LUXEMBURGO PARA DIRIMIR TAL QUESTÃO.
E) ALIÁS, TAL COMO REFERIDO NO ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, DE 28/01/2016 (PROCESSO Nº 6987/13.6TBALM.L1.S1), O TJUE, POR ACÓRDÃO DE 22/12/2010, CONSIDEROU QUE A DETERMINAÇÃO DO CONCEITO DE RESIDÊNCIA HABITUAL HÁ-DE SER FEITA À LUZ DAS DISPOSIÇÕES DO DITO REGULAMENTO, NOMEADAMENTE DO CONSTANTE DO SEU CONSIDERANDO 12º, DAÍ RESULTANDO QUE “AS REGRAS DE COMPETÊNCIA NELE FIXADAS SÃO DEFINIDAS EM FUNÇÃO DO SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA, EM PARTICULAR DO CRITÉRIO DA PROXIMIDADE.”
F) O CONCEITO DE “RESIDÊNCIA HABITUAL” CORRESPONDE AO LUGAR QUE TRADUZ UMA CERTA INTEGRAÇÃO DA CRIANÇA NUM AMBIENTE SOCIAL E FAMILIAR, SENDO QUE PARA DETERMINAR A RESIDÊNCIA HABITUAL DE UMA CRIANÇA, ALÉM DA PRESENÇA FÍSICA DESTA NUM ESTADO-MEMBRO, OUTROS FATORES SUPLEMENTARES (V.G. A DURAÇÃO, A REGULARIDADE, AS CONDIÇÕES E AS RAZÕES DE PERMANÊNCIA NUM TERRITÓRIO DE UM ESTADO MEMBRO OU DA MUDANÇA, A NACIONALIDADE DA CRIANÇA, A IDADE E, BEM ASSIM, OS LAÇOS FAMILIARES E SOCIAIS QUE A CRIANÇA TIVER NO REFERIDO ESTADO-MEMBRO) DEVEM INDICAR QUE ESSA PRESENÇA NÃO TEM CARÁCTER TEMPORÁRIO OU OCASIONAL.
G) OBVIAMENTE QUE DE ACORDO COM O EXPOSTO, DÚVIDAS NÃO RESTAM QUE, DE FACTO, A MENOR NASCEU NO LUXEMBURGO, TEM LÁ A SUA RESIDÊNCIA HABITUAL, ESTÁVEL E PERMANENTE (DESDE O SEU NASCIMENTO) SENDO NESSE PAÍS QUE ESTÁ A CRIAR OS SEUS LAÇOS FAMILIARES E SOCIAIS, SENDO CERTO QUE APENAS SE DESLOCA A PORTUGAL OCASIONALMENTE E SEM QUALQUER CARÁCTER DE REGULARIDADE, PORQUANTO SERÁ FÁCIL CONSTATAR QUE NUNCA SE PODERÁ AFIRMAR QUE TERÁ A SUA RESIDÊNCIA HABITUAL, ESTÁVEL E PERMANENTE EM PORTUGAL.
H) ADEMAIS, ESTA TEM SIDO A POSIÇÃO DOMINANTE DA DOUTRINA PORTUGUESA, TAL COMO ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, DE 09/12/2004, PROCESSO 04B3939, ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA, DE 20/05/2004, PROCESSO 10809/2004-2, AMBOS DISPONÍVEIS EM WWW.DGSI.PT, ENTRE OUTROS.
I) ESTEVE MAL O TRIBUNAL A QUO, PORTANTO, AO NÃO CONSIDERAR A RESIDÊNCIA HABITUAL, ESTÁVEL E PERMANENTE DA MENOR COMO SENDO NO LUXEMBURGO, O QUE ACARRETARIA A INCOMPETÊNCIA INTERNACIONAL DOS TRIBUNAIS PORTUGUESES PARA DIRIMIR TAL CONFLITO.
J) O FACTO POIS DE O REQUERENTE RESIDIR EM PORTUGAL, SALVO O DEVIDO RESPEITO, NÃO RELEVA PARA EFEITOS DA EXCEÇÃO INVOCADA, SENDO DE ATENDER ÚNICA E EXCLUSIVAMENTE AO SUPERIOR INTERESSE DA MENOR, EM PARTICULAR DO CRITÉRIO DA PROXIMIDADE,
K) O QUE, SEM QUALQUER DÚVIDA, LEVARÁ AO FACTO DE OS TRIBUNAIS DO LUXEMBURGO SEREM COMPETENTES PARA DIRIMIR TAL CONFLITO, ATENTA A INCOMPETÊNCIA INTERNACIONAL DOS TRIBUNAIS PORTUGUESES.
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O Ministério Público respondeu defendendo a confirmação da decisão recorrida:
Reiterando-se a posição já assumida nos autos e concordando-se na íntegra com os fundamentos e consequente decisão do Tribunal a quo, considera-se que não assiste razão à requerida recorrente, sendo da competência deste Tribunal a tramitação dos autos e posterior decisão.
Com efeito, não obstante a menor residir actualmente fora do território nacional, não está afastada a competência deste Tribunal, desde logo porque quer a mesma quer ambos os progenitores são de nacionalidade portuguesa, e que o requerente tem a sua residência habitual em Portugal, fazendo com que este Tribunal esteja melhor colocado para servir o superior interesse da menor que mantém com Portugal uma particular e forte ligação (confronte-se nesse sentido e a título de exemplo o já citado Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 27/03/2002 proferido no âmbito do Processo 703/11.4TBLNH.LI-I, bem como o também já citado Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 09/04/2013 proferido no âmbito do Processo 1053/I3.7TBVNG.PI, ambos disponíveis nas Bases Jurídico-Documentais), o que aliás prevê o Regulamento (CE) 2201/20°3, de 27 de Novembro, no seu artigo 15!!'
Em conclusão, estando o Tribunal a quo melhor colocado para decidir sobre regulação do exercício das responsabilidades parentais relativo à menor, por a mesma ser de nacionalidade portuguesa assim como ambos os progenitores, e por o seu pai residir habitualmente em Portugal, país com o qual a mesma mantém uma particular e forte ligação, não está afastada a sua competência ainda que a menor resida actualmente no estrangeiro.
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O Requerente contra-alegou, concluindo que :
A) Não existem dúvidas que à data da entrada da acção, a menor, de nacionalidade portuguesa, já residia no Luxemburgo, com a mãe, que, conforme é alegado pela própria, e não contestado.
B) Não obstante, o Tribunal a quo esteve bem ao considerar que a menor, pelo facto de ter pouco mais do que dois anos de idade, considera ser pouco tempo de vida para poder concluir por uma residência habitual estável e permanente da mesma no Luxemburgo.
C) O pai da menor reside em Portugal, estando a deslocar-se ao Luxemburgo para visitá-la, sem que, todavia se encontrem reguladas as responsabilidades parentais.
D) Sendo o pai a demonstrar o maior interesse em regular as responsabilidades parentais da menor, e estando este a residir em Portugal.
E) Acresce que, a mãe da menor deslocou-se a Portugal para intervir na conferência de pais, tendo, inclusive, constituído mandatário português.
F) Aplicou devidamente o Regulamento 2201/2003 de 27 de Novembro, o RGPTC e a Convenção de Haia, certo é que o Tribunal a quo faz uma correta ponderação acerca do que considera ser a residência habitual estável e permanente da menor.
G) O Tribunal a quo, considera correctamente que de acordo com o superior interesse da criança e o critério da proximidade, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes para decidir a questão das responsabilidades parentais relativas à menor Sara Coutinho.
H) Indeferindo, por consequência a excepção de incompetência internacional dos tribunais portugueses invocada pela recorrente.
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II-Colhidos os vistos, cumpre decidir.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da recorrente nos termos do disposto nos artigos 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1 do C.P.Civil, pelo que a questão a resolver consiste em saber se os tribunais portugueses são competentes para regular as responsabilidades parentais à luz do Regulamento 2201/2003 do Conselho de 27.11.2003 relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental.
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III--FUNDAMENTAÇÃO
FACTOS (com interesse para a decisão)
1—A menor Sara P, de nacionalidade portuguesa, nasceu em 25/11/2013 no Luxemburgo e reside com a Requerida, sua mãe, desde essa data, no Luxemburgo;
2—O Requerente e a Requerida, progenitores da menor, têm ambos a nacionalidade protuguesa;
3—À data da instauração do processo, a menor residia com a Requerida, sua mãe, no Luxembrugo;
4—A Requerida reside no Luxemburgo há cerca de oito anos;
5--O Requerente, pai da menor, reside em Portugal;
6—Os avós da menor residem em Portugal.
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IV—DIREITO
Para resolver a questão da competência do tribunal, em razão da nacionalidade, cumpre analisar o quadro legal aplicável à situação sub judice.
Segundo o artigo 59.º do C.P.Civil os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62.º e 63.º, sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais.
Especificamente sobre a regulação das responsabilidades parentais, e no que respeita à competência territorial, o art. 9.º, n.º 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC) previsto na Lei n.º 141/2015, de 8 de Setembro, estabelece que é competente, para decretar as providências tutelares cíveis, o tribunal da residência do menor no momento em que o processo foi instaurado.
Se, nos termos do n.º 3, os titulares das responsabilidades parentais tiverem residências diferentes, é competente o tribunal da residência daquele que exercer as responsabilidades parentais.
Porém, se no momento da instauração do processo a criança residir no estrangeiro e o tribunal português for internacionalmente competente, é competente para apreciar e decidir a causa o tribunal da residência do requerente ou do requerido. (n.º 7)
Nesta matéria de protecção de menores, cumpre assinalar que Portugal assinou e ratificou a Convenção Relativa à Competência à Lei Aplicável, ao Reconhecimento, à Execução e à Cooperação em Matéria de Responsabilidade Parental e de Medidas De Proteção Das Crianças, concluída em Haia, em 19 de Outubro de 1996.
O Luxemburgo, país onde a recorrente e a menor residem, foi Estado parte nesta Convenção, que assinou em 1.04.2003, ratificou em 05.08.2010, entrando em vigor nesse país em 01.12.2010.
No entanto, quanto à aplicabilidade da Convenção de Haia é importante salientar que o caso em apreciação encontra-se apenas sujeito ao Regulamento n.º 2201/2003 do Conselho de 27.11.2003 porquanto, nos termos do seu art. 61.º, a menor tem residência habitual num Estado-Membro da União Europeia.
Assim sendo, o artigo 8.º, n.º 1 do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho de 27.11.2003, de aplicação directa por força do primado ou prevalência do Direito da União Europeia, especialmente consagrado no artigo 8.º, n.º 4 da CRP, dispõe, sob reserva dos artigos 9.º, 10.º e 12.º , que Os tribunais de um Estado-Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental relativa a uma criança que resida habitualmente nesse Estado-Membro à data em que o processo seja instaurado no tribunal.
A ratio legis normativa, atendendo à justificação aduzida no 12.º Considerando, radica no superior interesse da criança e, em particular, no critério de proximidade.
O fundamento de tal solução, nas palavras de Nuno Ascensão Silva, encontra-se no facto de se achar que as autoridades da residência habitual são as que estão em melhores condições para apreciar a questão das responsabilidades parentais, a situação real do menor e o alcance prático das medidas que venham a ser tomadas.
O interesse superior da criança permite mesmo que o tribunal competente possa, a título excepcional e em certas condições, remeter o processo a um tribunal de outro Estado-Membro se este estiver em melhores condições para dele conhecer. (13.º considerando)
O Tribunal de Justiça da União Europeia, no Acórdão Mercredi, de 22 de Dezembro de 2010, declarou que:
O conceito de “residência habitual”, na acepção dos artigos 8.º e 10.º do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho, de 27 de Novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento (CE) n.º 1347/2000, deve ser interpretado no sentido de que essa residência corresponde ao lugar que traduz uma certa integração da criança num ambiente social e familiar. Para tanto, e quando está em causa a situação de uma criança em idade lactente que se encontra com a mãe apenas há alguns dias num Estado-Membro diferente do da sua residência habitual, para o qual foi deslocada, devem designadamente ser tidas em conta, por um lado, a duração, a regularidade, as condições e as razões da estada no território desse Estado Membro e da mudança da mãe para o referido Estado e, por outro, em razão, designadamente, da idade da criança, as origens geográficas e familiares da mãe, bem como as relações familiares e sociais mantidas por esta e pela criança no mesmo Estado-Membro. Cabe ao órgão jurisdicional fixar a residência habitual da criança tendo em conta todas as circunstâncias de facto específicas de cada caso.
O Tribunal de Justiça, no referido Acórdão, relembrou que, para assegurar o respeito pelo interesse superior da criança, o conceito de residência habitual corresponde ao lugar que traduz uma certa integração da criança num ambiente social e familiar.
Por outras palavras, na fixação da residência habitual da criança, para efeitos de competência, o tribunal deverá ponderar todas as circunstâncias do caso e decidir estritamente em função do interesse superior da criança.
Através de uma interpretação meramente literal do art. 8.º, n.º 1 do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho, de 27 de Novembro de 2003 é manifesto que, em princípio, seriam os tribunais do Luxemburgo, país onde a menor residia quando a presente acção foi instaurada, os tribunais competentes para decidir o litígio.
Contudo, a única ligação da menor, que tem pouco mais de dois anos de idade, com aquele país é apenas essa, a de sua mãe se encontrar aí a residir.
Aquele facto relativo à idade da menor, como aliás na situação que o Tribunal de Justiça apreciou, reveste uma importância especial, e conduz-nos à conclusão de que a criança ainda não se encontra verdadeiramente integrada, naquele país, em termos sociais.
Já no que concerne à esfera familiar, para além da natural relação com a recorrente, sua mãe, e ao invés de Portugal, inexiste qualquer outra ligação familiar relevante da menor no Luxembrugo.
Esclarecendo melhor aquela declaração sobre a importância especial da idade, o Tribunal de Justiça declarou que o ambiente social e familiar da criança, essencial para a determinação do lugar da sua residência habitual, é composto por diferentes factores que variam em função da idade da criança, ou seja, são diferentes consoante esteja em idade escolar, em idade lactente ou tenha terminado os estudos.
No caso concreto, aplicando a interpretação do Tribunal de Justiça sobre o conceito de residência habitual, afigura-se-nos que a decisão do Tribunal a quo mostra-se inteiramente correcta e equilibrada, correspondendo ao interesse da menor porquanto os pais, a menor e a respectiva família têm nacionalidade portuguesa, a menor apenas tem dois anos de idade, o pai reside em Portugal e a única ligação com o Luxemburgo prende-se com o facto de a mãe aí residir.
Em suma, o tribunal a quo é internacionalmente competente para regular as responsabilidades parentais da menor.
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V- DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal em negar provimento ao recurso, e em consequência, confirmam a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
Notifique e registe.
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(Processado e revisto com recurso a meios informáticos)
Guimarães, 12 de Julho de 2016
(Anabela Andrade Miranda Tenreiro)
(Francisca Micaela Fonseca da Mota Vieira)
(Fernando Fernandes Freitas)
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1 Cfr. n.º 2 do art. 8.º.
2 Disponível no site www.cej.pt.
3 Disponível no site curia.europa.eu.
4 Note-se que o Acórdão do STJ de 20.01.2009 disponível no site www.dgsi.pt., aplicando a interpretação do TJUE chega a uma decisão em sentido oposto àquela que se perfilha neste caso uma vez que o circunstancialismo fáctico é diferente deste.