Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4522/16.3T8GMR.G1
Relator: EDUARDO AZEVEDO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
RETRIBUIÇÃO
ABONO DE VIAGEM
SUBSÍDIO DE FÉRIAS
SUBSÍDIO DE NATAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/21/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
1 – Não integra a retribuição do trabalhador a quantia paga a título de abono de viagem.

2- A partir de 2004 quanto às férias e ao subsidio de férias mantendo-se a expressa consagração convencional do princípio da não penalização retributiva e da equiparação do valor do subsídio de férias ao da retribuição de férias, o entendimento quanto às prestações que se venceram até ao fim do ano de 2003, à luz do DL nº 874/76 e do ACORDO DE EMPRESAS, permanece para as retribuições de férias e respectivo subsídio vencidos a partir de então, devendo, assim, incluir-se nestas prestações o valor médio de prestações complementares.

3- Quanto aos subsídios de Natal vencidos a partir de 2004 (inclusive) terão de circunscrever-se à remuneração de base e diuturnidades, por força do que estabeleceu o ACORDO DE EMPRESAS de 2004 (cláusula 143ª) e do regime supletivo (não contrariado por aquele ACORDO DE EMPRESAS e pelos ulteriores) emergente dos artºs 250º do CT de 2003 e 262º do CT de 2009, não podendo computar-se neles a média dos valores auferidos a título de prestações complementares.
Decisão Texto Integral:
Apelação 4522/16.3T8GMR.G1

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães

C. A. intentou acção com processo comum contra Empresa X, S.A.,.

Pediu que a R seja condenada a pagar-lhe as diferenças salariais apuradas como média de retribuição variável auferida, nos anos de 1993 a 2014, no valor de 6.043,88€, acrescida de juros de mora à taxa legal vencidos desde a data de vencimento de cada uma das prestações e vincendos, até efectivo e integral pagamento.
Alegou, para tanto, em síntese: foi admitido a prestar serviço de carteiro em 27.04.1993 mediante contrato de trabalho; nunca recebeu os subsídios de férias, Natal e retribuição do mês de férias da devida forma porquanto a R não integrou nos mesmos os valores médios da retribuição que auferia mensalmente a título de trabalho suplementar, trabalho nocturno, compensação especial de distribuição, compensação especial e abono de viagem, consoante o caso; tem direito às diferenças remuneratórias existentes entre os valores efectivamente recebidos e os devidos no valor de 6.043,88€.
A R contestou, alegando, em súmula: o exercício abusivo de direito; a prescrição do direito a juros anteriores aos cincos anos prévios à data de entrada da acção; não haver direito ao recebimento de juros pelo menos antes da citação; os subsídios referidos não fazem parte da retribuição; e, caso se julgue provada a acção, ter-se em consideração que a média de pagamento dos complementos de um ano dever-se-á repercutir no ano seguinte, devendo ser relegada a liquidação do pedido em conformidade, para execução de sentença.
Foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual, nomeadamente, se procedeu à identificação do objecto do litígio e a enunciação dos temas de prova.
As partes celebraram acordo quanto à matéria de facto e prescindiram de alegações orais.
Proferiu-se sentença, com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, decide o Tribunal julgar parcialmente procedente a acção e, em consequência:
condena a Ré, Empresa X, S.A., a pagar ao Autor C. A. a quantia de € 274,78 (duzentos e setenta e quatro euros e setenta e oito cêntimos) a título de diferenças no valor devido a título de retribuição de férias, subsídio de férias e de natal de 2000 a 2014, acrescida de juros de mora civis, à taxa legal, contabilizados desde a data de vencimento de cada uma das parcelas devidas, nos termos supra referidos, e até integral pagamento, aplicando-se qualquer alteração que venha a ser introduzida a taxa de juros civil enquanto aquele pagamento não se verificar.
No mais, absolve-se a Ré do pedido formulado pelo Autor”.

O A recorreu e concluiu:

1 - No caso em apreço, ficou provado de que de 2000 a 2014, o A. auferiu, em diversos meses, quantias variáveis a título de trabalho suplementar, trabalho nocturno, abono de viagem, subsidio condução, compensação especial distribuição, compensação especial, entre outros.

2 - Todas estas retribuições, abonos ou subsídios encontram-se previstos no ACORDO DE EMPRESAS.

3 - Defende-se de forma pacífica é que na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal se devem incluir todas as prestações regulares e periódicas pagas ao trabalhador como se ele estivesse em serviço efectivo, ou seja como se ele estivesse a desempenhar o seu trabalho no concreto condicionalismo em que o costuma desempenhar (nomeadamente o condicionalismo de tempo e risco sem esquecer a antiguidade.

4 - Ao analisarmos a clª 147º do ACORDO DE EMPRESAS verificamos que a mesma refere o seguinte:
-“Quando os trabalhadores, por necessidade de serviço, tenham de se deslocar em transporte próprio, a empresa pagar-lhes-á, por quilómetro, os subsídios seguintes:
a) 25% do preço médio do litro de gasolina, quando se trata de automóvel;
b) 12% quando se tratar de motociclo;
c) 10% quando se tratar de velocípede com motor ou ciclomotores;
d) 6% quando se desloquem a pé ou em velocípede a pedal.

5 - Atendendo ao corpo da cláusula 147ª só podemos concluir no sentido da Douta Sentença em análise, na verdade resulta com mediana clareza que os conceitos de “subsídio”, de média de preço e por último a “obrigatoriedade de pagar” quando o trabalhador se “desloque a pé”, não podem de forma alguma estar relacionadas com as concretas “ despesas” por si efectuadas.

6 - Ao estabelecer um preço médio de gasolina a entidade patronal não pode sequer exigir saber quanto pagou por esta, mas quantos quilómetros fez.

7 - Também se não vê de que forma os 6% quando se desloque a pé estarão directamente relacionados com o gasto de “meias solas”.

8 - A Clª 147º visa compensar o trabalho prestado pelo trabalhador num especial condicionalismo de tempo, lugar e modo de execução.

9 - Se atendermos a Douta Sentença, o seguimento da fundamentação usada para peticionar as prestações de trabalho suplementar, trabalho nocturno, compensação especial de distribuição, compensação por horário descontínuo, etc. cabe na perfeição ao abono de viagem.

10 - Quanto à característica da regularidade e periodicidade, existe jurisprudência que entende que, determinadas atribuições patrimoniais que pelas suas características (prémio de produtividade, distribuição de lucros), apenas uma vez no ano são atribuídas, não deixam de ter esta característica de regularidade e periodicidade, uma vez que o seu valor pode ser achado pela média dos 12 meses e o trabalhador não deixa de criar legitimas expectativas no seu recebimento.

11 - A confirmar este princípio de entendimento da regularidade e periodicidade dos suplementos remuneratórios, evidenciados (…) determina-se no Acórdão do STJ 03.11.1989 que esta habitualidade, não tem medida certa, deve ser entendida, “cum grano salis”, ou seja, não se exige que determinada prestação pecuniária seja recebida todos os meses do ano em que haja prestação de trabalho (ou seja 11 meses por ano) antes se entende que ela se verificará, desde que num determinado ano, seja maior o número de vezes em que foi recebida do que aqueles em que não foi.

12 - À luz deste critério, dir-se-á pois que sempre que num determinado ano, certa prestação pecuniária seja recebida pelo menos 6 meses, tem carácter habitual.

13 - Dado o carácter retributivo atribuído às prestações complementares que o A. recebeu regularmente ao longo de vários anos, criando pois a legitima expectativa delas, a disciplina dos artº.s 254 nº. 1 e 250 nº. 2 do Código do Trabalho não é aplicável, uma vez que, nos termos do artº. 11 da Lei Preambular ao Código do Trabalho de 2003 “ A retribuição auferida pelo trabalhador não pode ser reduzida por mero efeito da entrada em vigor “.

14 - As verbas reclamadas judicialmente são referentes a verbas remuneratórias que a Recorrida deveria ter pago ao Recorrente.

Termina pretendendo que seja dado provimento ao recurso.
A R contra-alegou, concluindo:

1. Nos termos do art. 82.º da LCT/249.º C.Trab.2003/ art. 258º C.Trab.2009, a retribuição traduz o conjunto de valores com carácter pecuniário ou em espécie que o empregador se encontra obrigado a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em contrapartida do eu trabalho ou, mais precisamente, da disponibilidade da sua força de trabalho, por força do contrato, da lei, de instrumento de regulamentação colectiva aplicável ou dos usos.

2. Porém, é a própria lei que exclui do conceito de retribuição determinadas prestações, como é o caso de quantias recebidas a título de abono de viagem e outras equivalentes.

3. Também resulta claramente dos sucessivos ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A. (Cl. 147.º ACORDO DE EMPRESAS/2006) que tais prestações têm como fim específico compensar o trabalhador por encargos acrescidos com as despesas ao serviço do empregador, de meio de transporte próprio e em deslocações de casa para o local de trabalho e vice-versa. Logo, não constituem um ganho acrescido resultante da sua prestação laboral.

4. Assim, e como bem decidiu o Tribunal a quo não basta que se verifique a regularidade das prestações para que as mesmas sejam consideradas retribuição.

5. Por outro lado, a primeira Instância, que adoptou e bem, o critério ultimamente estabelecido pelo Supremo Tribunal de Justiça, seguindo de perto a corrente que entende que deve atender-se ao pagamento feito todos os meses de actividade do ano, no período anterior ao vencimento da prestação complementar em causa.

6. Assim, serão consideradas como sendo regulares e periódicas e, portanto, que integram o conceito de retribuição, as prestações pecuniárias pagas 11 meses no ano, sendo esta a interpretação mais correcta, tendo em conta que o legislador pretende retirar do conceito de retribuição, as prestações ocasionais, o carácter de habitualidade afere-se, porque manifesto, se determinada prestação pecuniária foi recebida em todos os meses de actividade.
Termina pretendendo a improcedência do recurso.
O processo foi com vista ao MP dando parecer no sentido da procedência parcial do recurso.
Efectuado o exame preliminar e corridos os vistos legais, cumpre decidir.
As questões a conhecer são relativas ao reconhecimento do abono de viagem como atribuição de carácter retributivo e ao número de meses em que devem ser recebidas as prestações complementares para serem integradas no conceito de regularidade e periodicidade.

Os factos considerados assentes na sentença

1- Em 27.Abr.1993, o A. foi admitido para trabalhar, mediante contrato de trabalho a termo certo pelo período de 6 meses, sob autoridade e direcção da R., para exercer as funções de Carteiro, no CDP de Fafe.

2- Manteve a situação de contratado a termo, tendo em 01.Dez.1995, sido admitido como efectivo para as funções de CRT, ficando colocado no CDP 4820 Fafe.

3- Actualmente, o A. continua com a categoria profissional de Carteiro e encontra-se colocado no já mencionado CDP de Fafe.

4- Em virtude das suas funções e do horário de trabalho que praticava ao serviço da Ré, o A. vinha auferindo mensalmente as quantias abaixo descritas:
(...)

5- Até Novembro de 2003, a Ré não pagou ao A. os valores médios mensais das prestações complementares que aquele auferia, quer na retribuição de férias, quer no subsídio de férias e de Natal, que incluem exclusivamente o vencimento base e as diuturnidades.

6- Após Novembro de 2003, a Ré passou a pagar na retribuição de férias e subsídio de férias um valor médio retributivo, constantes dos quadros supra, e de acordo com Despacho proferido pelo Conselho de Administração dos EMPRESA X, S.A., no qual é determinado quais as prestações pecuniárias complementares passíveis de integrarem a média para o cálculo do Subsidio de Férias e Retribuição de Férias.

7- Os valores médios retributivos pagos pela Ré àquele título, desde 2003 até 2007, cujo montante se cifra em € 867,35, conforme quadro seguinte:

8- No que respeita ao subsídio de Natal, a Ré nunca fez incidir qualquer quantia relativa àquelas prestações complementares”.
Embora no início das motivações do recurso se refira que os juros de mora envolve questão a debater, na verdade, nessa parte não se desenvolve a impetração e são-lhe alheias as conclusões.
Nestes termos fica prejudicado o conhecimento dessa matéria porquanto o âmbito do recurso é unicamente delimitado pelas conclusões.
O recorrente discorda do entendimento que o abono de viagem não é componente da sua retribuição, de molde a que a média do seu recebimento seja considerada na determinação da renumeração de férias e dos subsídios de férias e de Natal.
Atento à clª 147º do ACORDO DE EMPRESAS considera que o mesmo não se destina “a fazer face a despesas concretas que o trabalhador presumivelmente tem que efectuar para executar o contrato, para “ir trabalhar“, constituído um ganho acrescido para o mesmo, uma mais valia resultante da sua prestação laboral”.
Aos créditos que estão eventualmente em causa na factualidade assente (período de 2000 a 2014), é aplicável a legislação e instrumentos de regulamentação colectiva seguintes:
até Novembro de 2003 é aplicável a LCT, aprovada pelo DL 49408 de 24.11.69, o DL 874/76, de 28.12 (Regime Jurídico das Férias, Faltas e Feriados) e o DL 88/96, de 03.07 (quanto ao subsídio de Natal que o generalizou aos trabalhadores vinculados por contrato de trabalho a quaisquer entidades empregadoras), por força do disposto no nº 1 do artº 3º da Lei 99/2003, de 27.08 que aprovou o CT.
desde 01.12.2003 até 17.02.2009 o CT aprovado pelo último diploma;
desde 18.02.2009 o CT aprovado pela Lei 7/2009, de 12.02; e,
os ACORDO DE EMPRESAS celebrado como Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Empresa X, S.A. e Telecomunicações (SNTCT), em conformidade com o invocado no nº 46 da petição inicial, o que não é questionado pela parte contrária, publicados com alterações ou textos consolidados nos BTEs nºs 21/96 de 08.06, 8/99 de 08.02, 30/2000 de 15.08, 29/2002 de 08.08, 29/2004 de 08.08, 27/2006 de 22.07 e 01/2010 de 08.01.

Estabelece tal cláusula:
“( ... )
1- Quando os trabalhadores, por necessidade de serviço, tenham de se deslocar em transporte próprio, a empresa pagar-lhes-á, por quilómetro, os subsídios seguintes:
25% do preço médio do litro de gasolina, quando se tratar de automóvel;
12%, quando se tratar de motociclo;
10%, quando se tratar de velocípedes com motor ou de ciclomotores;
6%, quando se desloquem a pé ou em velocípede a pedal.
( ... )”.
Dela não vislumbramos o intuito divisado pelo recorrente. As expressões bem como os meios de mobilidade previstos justificam-se e enquadram-se no desempenho das funções exercidas pelo trabalhador e no que o seu “condicionalismo de tempo, lugar e modo de execução” podem acarretar, contudo através de despesas acrescidas em virtude da prestação do trabalho e com a utilização de transporte próprio, e não somente na eventual “maior penosidade que envolve a prestação do trabalho naquelas circunstâncias” assim constituindo um ganho acrescido resultante da prestação laboral.
Por outro lado não se deve olvidar que a lei, como regra, expressamente exclui da renumeração a importância recebida a este título:
artº 87º da LCT - não se consideram retribuição as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações ou novas instalações feitos em serviço da entidade patronal, salvo quando, sendo tais deslocações frequentes, essas importâncias, na parte que excedam as respectivas despesas normais, tenham sido previstas na contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da remuneração do trabalhador;
artº 260º, nº 1 do CT/2003 - não se consideram retribuição as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respectivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador; e
artº 260º, nº 1, alª a), do CT/2009 - não se consideram retribuição: a) As importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respectivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador;
Encontra-se, pois, razão legal para que se tenha discernido na sentença sobre o critério das despesas.
E, mais que não fosse, precisamente, para se evitar qualquer constrangimento entre o valor atribuído e o que decorrerá da normalidade legalmente prevista, sendo a demonstração ónus do trabalhador.
Obviamente que esse ónus não conflitua com o disposto quer no artº 82º, nº 3 da LCT, quer no artº 249º, nº 3 do CT/2003 (até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador), quer ainda no artº 258º, nº 3 do CT/2009 (presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador).
Não colide com essa presunção juris tantum (artº 350º do CC) que importa inversão do ónus da prova (artº 344º do CC), na medida em que estamos perante uma excepção legal que reconduz o ónus de prova para o trabalhador de que o valor do abono excedia as despesas normais suportadas.
Efectivamente não se vê que fosse lógico fazer funcionar a presunção inutilizando o comando dos normativos que determinam a excepção. A norma que a prevê deve ser conjugada com estes.
De todo o modo, em virtude do próprio conceito conformador da prestação esta não será de considerar constituinte de retribuição face ao conceito deste evidenciado nos demais números dos três últimos preceitos da lei substantiva de trabalho citados.
Por seu turno falha inevitavelmente o paralelo que se pretendeu estabelecer entre a finalidade do abono e a do subsídio de condução, este sim no exclusivo exercício da função com utilização de viatura da empresa: segundo a sentença “esta prestação visa, nos termos do ACORDO DE EMPRESAS em vigor compensar o trabalhador que, não sendo motorista, exerce tarefas de condução. Assim, não existem dúvidas que são contrapartida de uma determinada forma de desempenho das suas tarefas profissionais e, assim, devem considerar-se retribuição. Também aqui o pagamento reiterado e periódico fariam presumir tal natureza – cfr. neste sentido Acórdão da Relação do Porto de 8/4/2013, proferido no processo nº 335/10.4TTVLG.P1”.
Estando, como predito, excluída expressa e legalmente a natureza retributiva dos abonos de viagem (art.ºs 87.º da LCT, 260.º, n.º 1, do CT de 2003 e 260.º, n.º 1, al. a) do CT de 2009), e não operando em relação aos mesmos, a presunção legal acima referenciada, sob pena de ver contra si decidida a questão compete ao trabalhador caso pretenda ver reconhecida a natureza retributiva desses abonos na parte que excedam as respectivas despesas normais, fazer a correspondente prova (artº 342º, n.º 1 do CC).
Inclusivamente não foi apurada matéria de facto susceptível de infirmar a finalidade da atribuição do referido abono de viagem.
O recorrente não pôs em causa nem logrou fazer prova que o fundamento da atribuição e pagamento do mencionado abono de viagem fosse outro que não o previsto na clª 147ª do ACORDO DE EMPRESAS aplicável e/ou que as importâncias recebidas a esse título excediam as despesas normais que com tal abono se visam ressarcir.
Assim decidiu-se correctamente na sentença ao excluir-se este abono da renumeração:
“Segundo o disposto no art. 87.º da LCT “Não se consideram retribuição as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações ou novas instalações, feitas em serviço da entidade patronal, salvo quando, sendo tais deslocações frequentes, essas importâncias, na parte que excedam as respectivas despesas normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da remuneração do trabalhador”.
É manifesto – até porque é facto público e notório e resulta das regras de experiência comum – que o exercício das funções de carteiro implica a realização de deslocações ou a pé ou em transporte.
Tal subsídio ou abono não visa, portanto, compensar o trabalho prestado pelo trabalhador mas antes as despesas por si efectuadas e com a utilização de transporte próprio.
Em princípio o mesmo não integra a retribuição a não ser quando se verifiquem as condições previstas na parte final do citado art. 87.º da LCT.
In casu, o autor não alegou sequer que as importâncias que recebeu excediam as despesas por ele efectuadas.
Assim, e porque este abono tem uma causa específica e individualizável diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade para este, visando antes ressarcir o trabalhador de despesas por ele suportadas em virtude da prestação de trabalho e com a utilização de transporte próprio, concluímos que não deverá ser havido como retribuição – cfr. neste sentido veja-se Acórdãos da Relação do Porto de 24.03.2014 e 09.05.2016 proferido no processo 10/14.0TTMTS.P1, bem assim, os acórdãos da Relação de Guimarães, de 03.12.2015, proferido no processo 116/14.6T8VRL.G e de 07.04.2016, proc. nº 124/14.7TTBLC.G1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
Com interesse, ainda, acórdão desta Relação de Guimarães, datado de 06.10.2016, proferido no âmbito do processo nº 2503/15.3T8VCT.G1, relatado pelo Sr. Desembargador Antero Veiga, onde se sumaria nos seguintes termos: “ Quanto a “ajuda viagem/ ab. Kms”. a cla. 147º do ACORDO DE EMPRESAS de 96 aludia ao subsídio, pago ao quilómetro, para compensar os trabalhadores que por necessidade de serviço tivessem que deslocar-se em transporte próprio. Ao mesmo se refere o ACORDO DE EMPRESAS de 81 na cla. 155º e as posteriores mantêm a referência. Os montantes assim pagos, não se demonstrando que e em que parte excedem as respectivas despesas, não devem ser consideradas como retribuição, – artigo 87º da LCT, 260º CT de 2003 e 260º, 1, a) do CT 2009. Tal ónus compete ao trabalhador. Trata-se de verbas sem natureza retributiva, já que visam, como resulta da cláusula, compensar o trabalhador pelos gastos incorridos em meio de transporte. Vd. RP de 18/2/2013, www.dgsi.pt, processo nº 573/10.0TTSTS.P1, STJ de 17/1/2007, www.dgsi.pt, processo nº 06S2967.” – também disponível em www.dgsi.pt”.
Com interesse também o excerto do parecer quanto ao acórdão deste Tribunal de 03.11.2016 (procº nº 2657/15.9T8GMR.G1): “A cláusula 147º do ACORDO DE EMPRESAS de 96 aludia ao subsídio pago ao quilómetro, para compensar os trabalhadores que por necessidade de serviço tivessem que deslocar-se em transporte próprio. Ao mesmo se refere o ACORDO DE EMPRESAS de 81 na cla. 155ª e as posteriores mantêm a referência.
Os montantes assim pagos, não se demonstrando que e em que parte excedem as respectivas despesas, não devem ser consideradas como retribuição, - artigo 87º da LCT, 260° CT de 2003 e 260º, nº 1, a) do CT 2009.
Tal ónus compete ao trabalhador.
Ora o trabalhador não alega que exercia as suas funções a pé, nem demonstra tal facto, bem como não demonstra em que medida as quantias entregues ultrapassam as despesas incorridas.
Algum relevo há de ter o artigo 260º 1, a) do CT e os anteriores no mesmo sentido. O teor da cláusula por si só, não aponta no sentido pretendido. Quando muito abrange situações diferentes e que podem ter diversa abordagem, mas sempre dependente da prova por banda do trabalhador designadamente de que exercia serviço a pé, ou de que os valores pagos excedem e em que montante o atribuído”.
E prossegue-se no parecer: “O caso dos autos é inteiramente coincidente, com o que foi objecto de conhecimento naquele aresto.
De facto, também aqui nada foi invocado, em termos de causa de pedir, quer no sentido de que os montantes pagos de abono de viagem se reportavam a deslocações em serviço apeado, quer ainda no que excediam e em quanto o concreto montante das despesas realizadas e, muito menos comprovado o que quer que fosse, a esse respeito.
Assim, e revendo a posição antes tomada relativamente a esta questão, entende-se não assumirem carácter retributivo, para efeitos do cálculo das férias e subsídios, pese embora o seu carácter periódico e regular, as importâncias auferidas pelo Autor, no decurso do contrato, a título de abono de viagem, conforme foi decidido pelo tribunal a quo e vem uniformemente decidindo este Tribunal da Relação - v., para além do acórdão referido, acs. de 03.11.2016, proc. nº 124/14.7T8GMR.G1, proc. nº 234/14.0TTVCT.G2 e proc. nº 2716/15.8T8VCT.G1.” (cfr ainda acórdãos do STJ de 17.01.2007, procº nº 06S2967 e deste Tribunal, de 18.02.2016, proc.º n.º 246/14.4TTPRT.G1 e de 02.03.2017, processo nº 3134/15.3T8VCT.G1).
Nesta parte improcede o recurso.
Igualmente improcederá ao pugnar pelo entendimento que as verbas reclamadas respeitantes aos diversos complementos remuneratórios cuja média do seu recebimento pretende integrada na renumeração de férias e dos subsídios de férias e de Natal sejam as auferidas pelo menos durantes seis meses num determinado ano, assim reunindo as características da regularidade e periodicidade exigida legalmente.
Cabe ao trabalhador alegar e provar o recebimento dos complementos e ao empregador a demonstração de que não constituem contrapartida da actividade ou não têm natureza periódica e regular, para afastar a sua natureza retributiva (artºs 344º, nº 1 e 2, e 350º do CC).
Na sentença excluíram-se as importâncias recebidas a título de abono de viagem.
Quanto a ele sob este prisma o recurso encontra-se já prejudicado.
Consideraram-se relevantes, para efeito de aferir o carácter regular e periódico das prestações, apenas as que foram pagas ao recorrente em 11 dos 12 meses que antecederam o respectivo vencimento, pelo que só nessa parte não se mostrava ilidida a presunção legal referida. Foi o que sucedeu com as quantias pagas a título de trabalho suplementar no ano de 2008, de trabalho nocturno nos anos de 2000 a 2010, de compensação especial nos anos de 2000 e 2001, de subsídio de condução no ano de 2012 e de compensação especial de distribuição no ano de 2001 a 2012.
Concordamos com esta posição consentânea com a jurisprudência designadamente do Supremo Tribunal de Justiça (acórdão nº 14/2015, DR 1ª série, de 2015.10.29) e cuja opção foi justificada igualmente na sentença:
“Por outro lado, a atribuição de carácter retributivo a uma certa prestação do empregador exige também uma certa regularidade e periodicidade no seu pagamento.
Por regularidade, a lei pretende referir-se a uma prestação não arbitrária, que segue uma regra permanente.
Quanto à periodicidade, para que a prestação se integre na retribuição a lei considera que ela deve ser paga em períodos certos no tempo ou aproximadamente certos, de forma a inserir-se na própria ideia de periodicidade típica do contrato de trabalho e das necessidades recíprocas dos dois contraentes.
A este propósito Maria do Rosário Palma Ramalho, refere que, um dos elementos essenciais para distinguir o conceito de retribuição é precisamente o facto da mesma ser “regular e periódica: embora possa variar, quanto à unidade de tempo considerada (…) a periodicidade é um elemento essencial do conceito de retribuição, o que permite dele afastar as prestações patrimoniais feitas pelo empregador ao trabalhador a título ocasional (por exemplo um prémio de desempenho). A periodicidade é ainda justificada pelo facto de, frequentemente, a retribuição ser a principal ou a única fonte de rendimento do trabalhador, tornando-se assim difícil protelar excessivamente no tempo a sua percepção” – cfr. in Direito do Trabalho Parte II – Situações Laborais Individuais, pág. 548.
Motta Veiga, no seu manual de Lições do Direito do Trabalho, cita o Ac. da Relação do Porto de 30/04/2012, onde se refere que “As remunerações complementares somente podem fazer parte da retribuição “stricto sensu” ficando sujeitas à respectiva disciplina legal se, nos termos do contrato de trabalho ou dos usos, assumirem carácter regular ou habitual, e deverem portanto considerar-se como elemento integrante da remuneração do trabalhador, sobretudo se forem pagos por forma a criar no espírito deste a convicção de que constituem complemento normal do seu trabalho” – cfr. pág. 471, 6ª edição.
(…)
No caso em apreço, mostra-se assente que a Ré pagou ao autor para além da retribuição e das diuturnidades devidas, várias prestações complementares, tal como resulta dos quadros descritos na matéria de facto provada.
Cumpre, deste modo, verificar se as prestações complementares peticionadas pelo autor C. A., têm, nomeadamente, pelo seu carácter de regularidade, a virtude de serem contabilizadas para efeito de saber se devem ser incluídas na retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal, a média das atribuições patrimoniais pagas ao mesmo, constantes dos “quadros”.
*
Porém, tratando-se de prestações que não sejam pagas todos os meses do ano, o critério seguido pela jurisprudência com vista à qualificação das mesmas como regulares não tem sido uniforme.
Ou seja, a jurisprudência tem-se dividido quanto a existir um número mínimo de meses de pagamento para que se possa integrar determinada quantia no conceito de retribuição.
Vejamos.
(…)
Finalmente, o Supremo Tribunal de Justiça vinha a considerar que o critério orientador para a consideração de determinada prestação como regular deve ser encontrado no seu pagamento nos onze meses de actividade prestada ao longo do ano – vejam-se os acórdãos de 23/06/2010, 15/09/2010, 16/12/2010 e 05/06/2012, disponíveis em www.dgsi.pt, com os n.ºs de processo: 607/07.STJLSB.L1.S1, 469/09.4, 2065/07.5TTLSB.L1.S1 e 2131/08.0TTLSB.L1.S1.
(…)
Contudo, na sequência da publicação do Acórdão do STJ nº 14/2015, de 29 de Outubro, e após ponderação da argumentação ali esgrimida, conforme se referirá, entendeu-se ser de rever e alterar a posição até então seguida para aquela que era já pugnada e defendida pelo STJ, passando a acompanhar, de perto, a ora assumida pela relatora Paula Leal de Carvalho, no acórdão da Relação do Porto de 16.11.2015, no âmbito do processo nº1529/13.6TTPNF.P1, onde se pode ler “atenta a doutrina constante do Acórdão do STJ nº 14/2015, de 01.10.2015, proferido no Proc. 4156/10.6TTLSB.L1.S1, publicado no DR 1ª série, de 29.10.2015 e que tendo, nos termos dos arts. 186º do CPT e 686º, nº 1, do CPC/2013, valor ampliado de revista, veio fixar, ainda que à cláusula 12ª do Regulamento de Remunerações, Reformas e Garantias Sociais, integrado no ACORDO DE EMPRESAS/2006, publicado no BTE n.º 8, de 28.02.2006 (relativo à TAP), a seguinte interpretação: «No cálculo das retribuições de férias e de subsídio de férias do tripulante de cabina deve atender-se à média das quantias auferidas pelo mesmo, a título de prestação retributiva especial a que alude a cláusula 5.ª do Regulamento de Remunerações, Reformas e Garantias Sociais, nos doze meses que antecedem aquele em que é devido o seu pagamento, desde que, nesse período, o tripulante tenha auferido tal prestação em, pelo menos, onze meses». O julgamento ampliado de revista tem lugar quando o Presidente do STJ entenda que tal se revela “necessário ou conveniente para assegurar a uniformidade da jurisprudência” (artigo 686.º, nº 1, do CPC), sendo este precisamente o objectivo de tal julgamento, o que justifica também a publicação do acórdão na 1.ª série do DR.
Ainda que o citado aresto se reporte à interpretação de cláusula constante de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que não é aplicável ao caso dos autos, afigura-se-nos, todavia, que não se deverá, face ao valor reforçado desse acórdão e à uniformização de jurisprudência que dele decorre e à similitude de situações a demandar tratamento análogo, deixar de se aplicar à situação em apreço nos autos a doutrina que decorre da interpretação sufragada em tal aresto.
Com efeito, o que estava em causa no referido Acórdão, tal como nos autos, é a mesma questão jurídica, qual seja a interpretação do conceito de retribuição previsto na lei geral, conceito este que tem natureza indeterminada e sendo as considerações nele tecidas transponíveis para o caso dos EMPRESA X, S.A. por identidade ou analogia de situações. Tanto num caso, como no outro, há que interpretar o que se deve considerar como regular e periódico para preenchimento do conceito de retribuição para os mesmos efeitos (integração da retribuição de férias e subsídios de férias e de Natal). Ou seja, as considerações tecidas no ponto 6 do acórdão e vertidas na interpretação uniformizadora são, por identidade ou analogia, transponíveis para o caso dos EMPRESA X, S.A., S.A.. Ora, assim sendo e revendo posição anterior, entende-se ser de aderir, para efeitos de integração da retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal (quanto a estes, apenas os devidos até 2003, estes os considerados na sentença), ao critério preconizado no citado Acórdão, e, assim, atendendo-se apenas às prestações que hajam sido auferidas em todos os meses de actividade do período a que respeitam a retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal (11 meses).” – cfr. disponível em www.dgsi.pt.
No mesmo sentido, veja-se acórdãos da mesma Relação do Porto de 16.11.2015, e de 16.12.2015, proferidos, respectivamente, no âmbito dos processos nº 548/12.4TTGDM.P1, proc. nº 308/15.0T8AVR.P.1 e proc. nº 132/14.8T8VNG.P1, e acórdão da Relação do Porto de 18.01.2016, proferido no âmbito do processo nº 224/14.3TTPRT.P1, acórdãos da Relação do Porto de 15.02.2016 e 29.02.2016, proferidos nos procs. nº 1116/14.1T8PNF.P1 e nº 401/14.7TTVNG.P1 (este com voto de vencido), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
Recentemente, com interesse para a matéria em análise, veja-se acórdão da Relação de Guimarães de 21.01.2016, proferido no âmbito do processo nº 139/13.2TTVRl.G1, relatado por Antero Veiga, o qual parece ir no mesmo sentido, disponível também em www.dgsi.pt.
“Sobre o critério de aferição da periodicidade necessária defendeu-se que o pagamento entre cinco a onze meses bastaria, no Ac. RL de 16/12/2009, Processo n.º 3323/08.7 TTLSB.l, referido em “Retribuição e outras Atribuições Patrimoniais”, CEJ, maio de 2013, pág. 15. O Ac. STJ de 18/4/2007, proc. nº 06S4557, www.dgsi.pt, pressupõe entendimento aproximado.
Mais recentes são os acórdãos que aludem a um critério mais apertado, referindo a “cadência mensal, independentemente da variação dos valores recebidos, o que, de algum modo, tem correspondência com o critério estabelecido na lei para efeito de cálculo da retribuição variável”. Aludem ao recebimento em todos os meses de actividade do ano. STJ de 23.06.2010, processos nº 607/07.5TTLSB.L1.S1; de 15.09.2010, processo nº 469/09.4, de 16.12.2010, processo nº 2065/07.5TTLSB.L1.S1, de 5.06.2012, processo nº 2131/08.0TTLSB.L1.S1, de 2/4/2014, processo nº2911/08.6TTLSB.L1.S1, de 14/1/2015, processo nº 2330/11.7TTLSB.L1.S1, todos em www.dgsi.pt.
É ajustado o entendimento. Contudo, sem o considerar de forma estritamente matemática, o que possibilitaria até a manipulação, bastando à patronal retirar um mês para fugir à integração das prestações nos subsídios e remuneração de férias.
Deve, utilizando embora tal critério como indicador, aferir-se em concreto tendo em conta a própria natureza da “empresa”, da entidade patronal onde se presta serviço, da verificação do carácter periódico em moldes tais que, apesar de pagas apenas alguns meses no ano, o são de forma sistemática ao longo dos anos, criando nos trabalhadores a legitima expectativa no seu recebimento. (…) Assim no caso presente, importa considerar as prestações percepcionadas com uma cadência aproximada dos onze meses ano, sendo no entanto de atentar no facto de certas verbas que tenham integrado o conceito não devem deixar de o integrar só porque num ou outro ano posteriores não atingem tal cadência.” – disponível em www.dgsi.pt..
Em idêntico sentido veja-se acórdão da mesma Relação de Guimarães e Sr. Juiz Desembargador, datado de 03.11.2016, proferido no âmbito do processo nº 2657/15.9T8GMR, deste J3, relativo a decisão proferida pela signatária.
Chama-se ainda à colação, e em reforço da posição ora assumida, o disposto no artigo 8º, nº 3, do Código Civil, segundo o qual “Nas decisões a proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito”.
Ou seja, em conformidade com a doutrina expressa no Acórdão do STJ n.º 14/2015 (publicado no DR 1ª série, de 2015.10.29) – posição agora adoptada pelos motivos supra, conforme já se deixou expresso –, e em ordem a tal uniformização segue-se o entendimento de que, para que uma prestação variável possa consubstanciar a regularidade e periodicidade necessárias à atribuição de natureza retributiva, deve ser paga em, pelo menos, 11 (onze) meses por cada ano.
Desta feita, só está verificado o pressuposto da regularidade do pagamento, que tem de verificar-se para que uma dada prestação pecuniária possa considerar-se como parte integrante da retribuição devida pelo empregador ao trabalhador, quando aquela prestação seja paga em onze de cada doze meses que se tiverem por referência temporal”.
Sem prejuízo do mencionado do citado acórdão deste Tribunal da Relação de 21.01.2016 que de qualquer forma apelava à forma sistemática de percepção ao longo dos anos susceptível de criar nos trabalhadores a legitima expectativa no seu recebimento, perante o entendimento expendido no parecer de que ainda assim deviam “considerar-se, para o cálculo das diferenças de retribuição pelas férias, subsídio de férias e subsídio de Natal (apenas até 31.12.2003), relativamente aos anos de 2000 a 2014”, a media das importâncias auferidas em, pelo menos, 6 meses no ano, a título de trabalho suplementar nos anos de 2000, 2005, 2006 e 2007, de subsídio de condução nos anos de 2005, 2013 e 2014, de trabalho nocturno nos anos de 2011, 2012, 2013 e 2014 e de compensação especial de distribuição nos anos de 2000, 2013, e 2014 não vemos razão para discordar do tribunal a quo.
Ou seja, quanto ao acréscimo retributivo relativo a trabalho suplementar porque a cadência da sua realização ao longo do período em causa não é uma constante e ocorrem lapsos até de anos, sendo o ultimo em 2008; no que concerne a título de trabalho nocturno na medida em que pela sua natureza e finalidade o mesmo não permite a criação da tal legitima expectativa no seu recebimento; referente a título de compensação especial de distribuição uma vez que nos anos de 2000, 2013 e 2014 ainda assim o número de pagamentos os respectivos valores não são representativos de forma a sugerir mais uma vez essa expectativa; e no que respeita a título de complemento por subsídio de condução já que também a cadência de pagamento envolve lapso grande de tempo, para além também da sua natureza e finalidade.
Por último, somente nas conclusões, de forma imprecisa e genérica, o recorrente refere que dada forma como recebeu as prestações complementares “a disciplina dos artº.s 254 nº. 1 e 250 nº. 2 do Código do Trabalho não é aplicável, uma vez que, nos termos do artº. 11 da Lei Preambular ao Código do Trabalho de 2003 “A retribuição auferida pelo trabalhador não pode ser reduzida por mero efeito da entrada em vigor””.
Esta questão foi de forma extensa e devida, tratada na sentença:
“ O Tribunal aqui chegado e verificado que as prestações atrás enunciadas integram o conceito de retribuição devida pela ré ao autor, importa agora determinar se as mesmas deviam, conforme peticionado, ter sido contabilizadas para efeitos de retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal, devidos desde 2000 até 2014 (atento os vários períodos em causa).
É que, conforme infra se explicará, não basta que uma dada prestação possa ser integrada no conceito de retribuição para que automaticamente possa concluir-se no sentido de que a mesma é divida na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.
Vejamos.
Nos termos do artigo 2º, nº 1 do DL 874/76, de 28/12 (LFFF com as alterações conferidas pelo DL 397/91, de 16/10, e pela Lei nº 118/99 de 11/08: “Os trabalhadores têm direito a um período de férias remuneradas em cada ano civil.”.
O artigo 6º, nº 1 do mesmo diploma prescrevia que “A retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo e deve ser paga antes do início daquele período.”, acrescentando o nº 2 do mesmo artigo que “Além da retribuição mencionada no número anterior, os trabalhadores têm direito a um subsídio de férias de montante igual ao dessa retribuição.”
No que respeita a retribuição de férias e ao subsídio de férias importa atentar, igualmente, em que foi publicado no BTE nº 24, de 29/6/1981, um ACORDO DE EMPRESAS subscrito pelos Empresa X, S.A. e Telecomunicações de Portugal (ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A.) que previa que: “Os trabalhadores têm direito, em cada ano, a um subsídio de férias de montante igual ao da remuneração mensal do mês de Dezembro nesse ano.” (cláusula 150ª/1) – o IRC ora citado sofreu as alterações publicadas nos BTE´S nº 37, de 08/10/1983, nº 44, de 29/11/1985, nº 45, de 08/12/1988 e nº 13, de 09/04/1990 (cfr. também, ACORDO DE EMPRESAS´S publicados nos BTE´S nº 21, de 8/6/1996, nº 8, de 28/2/1999, nº 30, de 15/8/2000, nº 29, de 8/8/2002, nº 29, de 8/8/2004, nº 27, de 22/7/2006, n.º 14, 15/4/2008, nº 1, de 8/1/2010, e nº 34 de 15/9/2010).
De acordo com a cláusula 167ª, nº 1 do mesmo do ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./1981, “Os trabalhadores têm direito à retribuição correspondente ao período de férias, a qual em caso algum poderá ser inferior à que receberiam se estivessem em serviço normal, acrescida de um subsídio de férias de montante igual ao dessa retribuição.”.
Assim, quer a lei, quer o ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./1981 estabeleciam uma relação de equivalência entre a retribuição que os trabalhadores receberiam se estivessem ao serviço, por um lado, e a retribuição de férias e o subsídio de férias, por outro lado.
Apenas estavam excluídas da retribuição de férias e do subsídio de férias as prestações pecuniárias que tivessem por escopo compensar o trabalhador por despesas concretas que tivesse de suportar para prestar o seu trabalho (v.g. subsídios de refeição e de transporte, valor do passe adquirido para serem realizadas deslocações de casa para o local de trabalho e vice-versa), bem assim como as prestações assistencialistas (v.g. subsídio familiar).
No que toca ao subsídio de Natal prescrevia a cláusula 151ª, nº 1 do ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./1981 que: “Todos os trabalhadores abrangidos por este acordo terão direito a receber um subsídio correspondente à sua remuneração mensal, o qual lhes será pago com a remuneração respeitante ao mês de Novembro e corrigido em caso de aumento de vencimento no mês de Dezembro.”, em resultado do que tal normativo excluía a aplicação do regime do DL 88/1996, de 3/7, atendendo ao disposto no seu artigo 1º, nº 2 e tendo em conta que não estava em causa nenhuma situação do tipo das previstas no respectivo artigo 1º, nº 3.
Ora, inexistindo na LCT norma legal ou convencional que indicasse o que deveria considerar-se “remuneração mensal” para efeitos do prescrito nessa cláusula 151º, nº1, deveria lançar-se mão do critério qualificador consagrado no artigo 82º da LCT, à semelhança do sucedido quanto à retribuição de férias e ao subsídio de férias, sendo nesse mesmo sentido que deveria interpretar-se o art. 2º, nº 1 do DL 88/1996, de tudo resultando que o subsídio de Natal deveria ser sempre de valor igual a um mês de retribuição, devendo para o efeito atender-se a todas as prestações de natureza retributiva que fossem contrapartida da execução do trabalho – neste sentido, por exemplo, acórdãos do STJ de 18/4/2007, proferido no processo 06S4557, de 19/2/2003, proferido no processo 4072/2002, e de 18/6/2003, proferido no processo 3741/2002.
No âmbito dos Códigos do Trabalho de 2003 e 2009, devem ser diferentemente equacionados a retribuição de férias e o subsídio de férias, por um lado, e o subsídio de Natal, por outro lado.
Nos termos do artigo 255º, nº 1, do Código do Trabalho de 2003, “A retribuição do período de férias corresponde à que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efectivo.” acrescentando o nº 2 que “Além da retribuição mencionada no número anterior, o trabalhador tem direito a um subsídio de férias cujo montante compreende a retribuição base e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho.”.
Assim, do mesmo passo que se consagrou em relação à retribuição de férias o denominado princípio da não penalização retributiva, abandonou-se em relação ao subsídio de férias a tradição equiparativa do seu montante ao da retribuição de férias, excluindo-se do primeiro as prestações que não sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho (veja-se Leal Amado, Comissões, Subsídio de Natal e de Férias à luz do Código do Trabalho, in Prontuário do Direito do Trabalho, nºs 76, 77, 78, 2007, pág. 229 e segs., citado no acórdão da Relação do Porto de 16.12.2015, que vimos seguindo de perto).
Cumpre, porém, sublinhar que tal exclusão equiparativa não tinha aplicação às relações de trabalho a que se aplicassem o ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A., dado que tal equiparação necessária decorria do estatuído na cláusula 167ª nº1 do ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./1981 – no mesmo sentido estatuíram as cláusulas 142ª, nº 1 e 162ª dos ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A. de 1996, de 2004 e de 2006, e em sentido congénere estatuiu o ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A. de 2008 (cláusula 76ª, nº 1, da qual se extrai a equiparação do montante do subsídio de férias ao da remuneração do mês de Dezembro, independentemente de esta constituir, total ou parcialmente, contrapartida do modo específico da execução do contrato).
Note-se que, atento o estatuído nos artigos 264º, nºs 1 e 2 e 261º, nº 3, do Código do Trabalho de 2009, aplica-se no âmbito de vigência deste (cfr. cláusula 76º nº 1 do ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A. de 2010).
No que concerne ao subsídio de Natal, o Código do Trabalho de 2003 dispôs no seu artigo 254º, nº 1 que, “O trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano.”, e no seu artigo 250º, nº 1 que “Quando as disposições legais, convencionais ou contratuais não disponham em contrário, entende-se que a base de cálculo das prestações complementares e acessórias nelas estabelecidas é constituída apenas pela retribuição base e diuturnidades.”, sendo o subsídio de Natal, justamente, uma das prestações complementares aludidas neste último dispositivo legal.
Assim, o montante do subsídio de Natal passou a corresponder, salvo disposição legal, convencional ou contratual em contrário, à soma da retribuição base com as diuturnidades, sendo que nenhuma das prestações em causa nos autos é passível de integrar o conceito de retribuição base enunciado no artigo 250º, nº 2, alínea a) do Código do Trabalho de 2003.
Ora, não existe norma contratual que contrarie o conteúdo do artigo 250º, nº 1 do Código do Trabalho de 2003.
É certo, e não se olvida que o ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./1981 prescrevia que “Todos os trabalhadores abrangidos por este acordo terão direito a receber um subsídio correspondente à sua remuneração mensal, o qual lhes será pago com a remuneração respeitante ao mês de Novembro e corrigido em caso de aumento de vencimento no mês de Dezembro.” - cláusula 151ª nº 1, cuja redacção foi mantida nas alterações subsequentes que foram introduzidas no ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A. (v.g., cláusulas 143ª, nº 1 do ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A. /1996, do ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./2004, do ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./2006, e 77ª, nº 1 do ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./2008 e do ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./2010).
Ora, como se afere do texto delas, essas normas do ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A. não contrariam a previsão do artigo 250º, nº 1 do Código do Trabalho de 2003, pelo que no âmbito de vigência do Código do Trabalho 2009 deixaram de relevar para a quantificação do montante do subsídio de Natal os suplementos remuneratórios do tipo dos que estão em causa nestes autos.
Cumpre referir que não se desconhece que “A retribuição auferida pelo trabalhador não pode ser reduzida por mero efeito da entrada em vigor do Código do Trabalho.” – artigo 11º da Lei Preambular ao Código do Trabalho de 2003.
Conjugando esta norma com o artigo 8º, nº 1 da mesma Lei, mostra-se claro que as alterações decorrentes do Código do Trabalho de 2003 não se aplicam aos subsídios de férias e de Natal vencidos em data anterior a 1 de Dezembro de 2003, data da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, sendo que, no que se reporta ao subsídio de Natal tal subsídio se venceu em Novembro (cfr. cláusula 143ª, nº 1 ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./1996).
Sucede porém que, já depois da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, foi publicado o ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A. de 2004, o qual se limita a remeter, no que respeita ao montante do subsídio de Natal a que alude a cláusula 143ª, para o valor da “remuneração mensal”, em resultado do que não pode deixar de considerar-se que o mesmo nada dispôs que contrariasse o estatuído no artigo 250º do Código do Trabalho de 2003, para tanto não bastando tal referência genérica a “remuneração mensal”.
De resto, o mesmo veio a registar-se nos ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./2006 (cláusula 143ª), de 2008 (cláusula 77ª, nº 1) e de 2010 (cláusula 77ª, nº 1).
Serve quanto vem de referir-se que a partir do ACORDO DE EMPRESAS de 2004, a circunscrição do subsídio de Natal à remuneração de base e diuturnidades, não decorre do mero efeito da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, em termos proibidos pelo citado artigo 11º. Com efeito, à data da outorga desse ACORDO DE EMPRESAS de 2004 já estava em vigor o Código do Trabalho de 2003 e a partes outorgante nesse ACORDO DE EMPRESAS não curaram de contrariar no respectivo texto o conteúdo supletivo do artigo 250º do referido Código de 2003, com a consequente aplicação deste.
Deste modo, a não integração nos subsídios de Natal que se venceram a partir de 2004 das médias de prestações que até então integravam aquele subsídio e que excedem a retribuição base e as diuturnidades não decorre apenas do mero efeito da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, mas sim da negociação colectiva levada a cabo no ano de 2004, mantida nesse específico segmento nos anos de 2006 e 2008.
Tal aplica-se, ainda, a partir do momento da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2009, tendo em conta estatuído nos seus artigos 262º e 263º, bem assim como a inexistência no ACORDO DE EMPRESAS/EMPRESA X, S.A./2010 de cláusula que contrariasse o estatuído naquele artigo 262º.
Em síntese, as prestações pecuniárias supra referidas deveriam e devem integrar o conceito de retribuição devida pela ré ao autor e, de igual modo, verem-se repercutidas no valor da retribuição de férias e do subsídio de férias e de Natal até 2003, inclusive, o mesmo devendo acontecer em relação à retribuição de férias e ao subsídio de férias vencidos a partir de 2004, mas já não em relação ao subsídio de Natal.
Conclui-se pois que, tendo em atenção o critério adoptado e que supra se fez alusão – 11 meses por cada ano –, haverá que retirar dos cálculos efectuados todos os complementos retributivos do subsídio de natal a partir de 2004, inclusive.
A propósito da questão tratada e com interesse veja-se o Acórdão da Relação de Guimarães de 21.01.2016, proferido no âmbito do processo nº 139/13.2TTVRl.G1, e ainda, o já citado acórdão da Relação do Porto, de 09.05.2016, processo 10/14.0TTMTS.P1, disponíveis em www.dgsi.pt”.
Por tudo isto, deverá ser julgado improcedente o recurso.

Sumário, da única responsabilidade do relator

1 – Não integra a retribuição do trabalhador a quantia paga a título de abono de viagem.

2 - A partir de 2004 quanto às férias e ao subsidio de férias mantendo-se a expressa consagração convencional do princípio da não penalização retributiva e da equiparação do valor do subsídio de férias ao da retribuição de férias, o entendimento quanto às prestações que se venceram até ao fim do ano de 2003, à luz do DL nº 874/76 e do ACORDO DE EMPRESAS, permanece para as retribuições de férias e respectivo subsídio vencidos a partir de então, devendo, assim, incluir-se nestas prestações o valor médio de prestações complementares.

3- Quanto aos subsídios de Natal vencidos a partir de 2004 (inclusive) terão de circunscrever-se à remuneração de base e diuturnidades, por força do que estabeleceu o ACORDO DE EMPRESAS de 2004 (cláusula 143ª) e do regime supletivo (não contrariado por aquele ACORDO DE EMPRESAS e pelos ulteriores) emergente dos artºs 250º do CT de 2003 e 262º do CT de 2009, não podendo computar-se neles a média dos valores auferidos a título de prestações complementares.

Decisão

Acordam os Juízes nesta Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a sentença.
Custas pelo recorrente.
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O acórdão compõe-se de 28 folhas, com os versos não impressos.
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21.09.2017