Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
716/15.7T8PTL.G2
Relator: MARGARIDA FERNANDES
Descritores: SERVIDÃO PREDIAL
SERVIDÃO LEGAL DE PASSAGEM
EXTINÇÃO
DESNECESSIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/19/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário da Relatora:

I - A servidão é um direito real em virtude do qual é possibilitado ao proprietário de um prédio (prédio dominante) o gozo de certas utilidades do prédio pertencente a dono diferente (prédio serviente).

II - A desnecessidade, enquanto causa de extinção de servidão, não equivale a não utilidade ou proveito, mas à ideia de dispensabilidade, e a mesma não tem necessariamente que ser superveniente.

III – A desnecessidade da servidão deve ser objecto de um juízo de actualidade (apreciada pelo tribunal, atendendo à situação que se verifica na data em que a acção é proposta) e de proporcionalidade subjacente aos interesses em jogo.

IV – Para a extinção da servidão por desnecessidade não basta que, exista outra via de acesso do prédio dominante para a via pública, sendo necessário que este outro acesso ofereça condições de utilização similares, ou, pelo menos, não desproporcionalmente, agravadas.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório

P. M., residente no Lugar de ..., Rua da ... n.º ..., freguesia de ..., concelho de Ponte de Lima e E. L., casada com M. M., residente no lugar da ..., instauraram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum, contra A. V., casado com O. C., residente na Rua …, freguesia de ..., concelho de Ponte de Lima, pedindo:

a) a condenação do réu a reconhecer que as autoras são respectivamente usufrutuária e proprietária de raiz do prédio rústico inscrito na matriz rústica da freguesia de ... sob o art. ..., descrito na C.R. Predial de Ponte de Lima, freguesia de ..., com o nº .../20101123;
b) que seja declarada extinta, por desnecessidade, a servidão de passagem constituída por sentença sobre o referido prédio rústico com o nº ... a favor do prédio rústico inscrito na matriz da mesma freguesia sob o art. ...;
c) a condenação do réu a reconhecer que já têm possibilidade de acesso igualmente cómodo para o prédio inscrito na matriz sob o art. ... através do prédio inscrito na matriz sob o art. ..., com acesso já constituído e localizado junto à via pública;
d) a condenação do réu a reconhecer que o exercício da servidão de passagem constituída sobre o prédio das autoras tem graves inconvenientes para o prédio destas e que a extinção da servidão traz vantagens para o mesmo; e
e) a condenação do réu a abster-se de passar pelo prédio das autoras, perturbando o exercício do seu direito pleno de propriedade e usufruto.
Alegaram, em síntese, que, por sentença no âmbito de acção especial de arbitramento para expropriação por utilidade particular foi constituída uma servidão de passagem que onera o prédio das autoras a favor do prédio do réu inscrito na matriz sob o art. ... uma vez que este era um prédio encravado. Actualmente este prédio, embora continue a não ter comunicação com a via pública, confronta com outro prédio do réu, correspondente ao art. ..., o qual tem comunicação directa com a via pública e através do qual o réu, entretanto, abriu uma passagem que lhe permite o acesso ao prédio correspondente ao art. ... em melhores condições do que passando pelo prédio das autoras. Aliás, o réu deixou de usar a servidão de passagem.
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O ré contestou pugnando pela não extinção da servidão.

Para tanto alegou, em síntese, que, entre a constituição da servidão por sentença de 08/10/1986, transitada em julgado, e a presente data não ocorreu qualquer alteração ao nível da propriedade dos seus dois prédios. Recentemente, com a utilização de máquina ensiladeira e enfardadeira, bem como de tractor agrícola com atrelado para exploração do prédio correspondente ao art. ..., e para não requerer a ampliação da servidão de passagem, viu-se obrigado a abrir um acesso através do seu prédio correspondente ao art. ..., contudo este acesso alternativo é apenas utilizado nos meses de Abril ou Maio e Setembro ou Outubro a fim de permitir o enfardamento da palha e o ensilamento e transporte do milho, pois no resto do ano utiliza a servidão que onera o prédio das autoras.
Uma vez que o réu demandou a autora P. M. e J. M. na acção ordinária nº 667/10.1TBPTL que correu termos no 1º juízo do Tribunal de Ponte de Lima e aquelas, na contestação, não invocaram a desnecessidade da servidão de passagem constituída a favor do ora réu e não pugnaram pela sua extinção, a sentença aí proferida faz caso julgado quanto à existência do seu direito de servidão sobre aquele prédio.

Deduziu reconvenção pedindo:

a) que se declare que sobre o prédio das autoras se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de passagem de pessoas a pé, de animais, tractores, com ou sem atrelado, e alfaias agrícolas, com o trajecto, a largura e demais características e condições descritas designadamente nos arts. 54.º a 60.º da reconvenção - carreiro composto de terra batida, calcado e trilhado, em duro, com feição permanente, perfeitamente visível, com uma largura de cerca de 2,50m e comprimento de 24m, que desemboca do prédio do réus-, servidão essa que onera esse mesmo prédio a favor do prédio do reconvinte inscrito na matriz sob o art. ...;
b) subsidiariamente, e para o caso de procedência do pedido de extinção da referida servidão formulado pelas reconvindas na p.i. devem estas ser condenadas a pagar ao reconvinte:
b1) a quantia de Esc. 60.000$00, devidamente actualizada até à data da prolação de decisão final nestes autos, por referência ao Índice de Preço ao Consumidor, publicado anualmente pelo INE – Instituto Nacional de Estatística;
b2) a quantia de € 5.000,00, acrescida de juros de mora, contados à taxa legal sobre o capital em dívida, deste a data da notificação do pedido reconvencional até efectivo e integral pagamento condenando-se as reconvindas no pagamento de custas e de procuradoria condigna.
M. S. e E. N. pagaram a P. M. e M. E. Esc. 60.000$00 no ano de 1986 com contrapartida pela aquisição do direito de passagem sobre o prédio destas. Assim, em caso de procedência da acção, o reconvinte tem direito à restituição daquele valor nos termos do art. 1569º nº 3 do C.C.. A constituição de servidão sobre o prédio inscrito na matriz sob o art. ... acarretaria a desvalorização deste em, pelo menos, € 5.000,00.
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Em resposta as autoras mantiveram o alegado na p.i..

Mais referiram que, em caso de extinção da servidão por desnecessidade, procede-se, nos termos do art. 1569º nº 3 do C.C., à restituição “no todo ou em parte, conforme as circunstâncias” pelo que tendo o réu se servido da servidão durante cerca de 29 anos à que devolver-lhe parte da quantia paga de acordo o prudente arbítrio do julgador. Não tem lugar a actualização nos termos do art. 551º do C.C.. No mais, a indemnização requerida pelo réu deve ser paga por ele próprio a si mesmo.
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Em audiência prévia foi proferido despacho saneador, fixado o objecto do litígio, enunciados os temas da prova, admitidos os meios de prova e designada data para julgamento.
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Realizou-se audiência final, após a qual foi proferida sentença cuja parte decisória decisão que reproduzimos na íntegra:

“Em face do exposto julgo a presente ação procedente por provada e, em consequência, decido:

a) Condenar o Réu a reconhecer que as Autoras são respetivamente usufrutuária e proprietária de raiz do prédio rústico artigo ..., descrito no art.º 1.º da petição inicial;
b) Declarar extinta, por desnecessidade, a servidão de passagem de passagem constituída por sentença sobre o referido prédio rústico art.º ... identificado no artigo 1.º, a favor do prédio rústico art.º ..., identificado no artigo 4.º da petição inicial;
c) Condenar o Réu a reconhecer que já têm possibilidade de acesso igualmente cómodo para o prédio identificado em 4.º da petição inicial, através do prédio identificado em 5.º da petição inicial, com acesso já constituído e localizado junto à via pública;
d) Condenar o réu a reconhecer que o exercício da servidão de passagem constituída sobre o prédio das Autoras tem graves inconvenientes para o prédio destas e que a extinção da servidão traz vantagens para o mesmo; e
e) Condenar o Réu a abster-se de passar pelo prédio das Autoras, perturbando o exercício do seu direito pleno de propriedade e usufruto.

Da reconvenção

Quanto ao demais, decido julgar em parte procedente por provada a reconvenção e, em consequência, decido condenar as Autoras pagarem ao Réu a quantia de € 300,00 (trezentos euros).
E quanto aos demais pedidos da reconvenção absolvo as Autoras/reconvindas dos mesmos.
Custas da ação na totalidade a cargo do Réu.
Custas da reconvenção na proporção de 5/6 cargo do Réu reconvinte e 1/6 a cargos das autoras reconvindas.
Registe e notifique.”
*
Não se conformando com esta decisão veio o réu dela interpor recurso de apelação.

Em 21/06/2018 foi proferido Acórdão por esta Relação que julgou a apelação procedente, que anulou a sentença recorrida e todos os actos subsequentes e que determinou que o tribunal a quo proferisse nova sentença corrigindo as apontadas deficiências, obscuridades, contradições da matéria de facto e fundamentando os pontos de facto que não fundamentou.
*
Dando cumprimento a este Acórdão o tribunal recorrido proferiu, em 10/12/2018, nova sentença cuja parte decisória reproduzimos na íntegra:

Em face do exposto julgo a presente ação procedente por provada e, em consequência, decido:

a) Condenar o Réu a reconhecer que as Autoras são respetivamente usufrutuária e proprietária de raiz do prédio rústico artigo ..., descrito no art.º 1.º da petição inicial;
b) Declarar extinta, por desnecessidade, a servidão de passagem de passagem constituída por sentença sobre o referido prédio rústico art.º ... identificado no artigo 1.º, a favor do prédio rústico art.º ..., identificado no artigo 4.º da petição inicial;
c) Condenar o Réu a reconhecer que já têm possibilidade de acesso igualmente cómodo para o prédio identificado em 4.º da petição inicial, através do prédio identificado em 5.º da petição inicial, com acesso já constituído e localizado junto à via pública;
d) Condenar o réu a reconhecer que o exercício da servidão de passagem constituída sobre o prédio das Autoras tem graves inconvenientes para o prédio destas e que a extinção da servidão traz vantagens para o mesmo; e
e) Condenar o Réu a abster-se de passar pelo prédio das Autoras, perturbando o exercício do seu direito pleno de propriedade e usufruto.

Da reconvenção

Quanto ao demais, decido julgar em parte procedente por provada a reconvenção e, em consequência, decido condenar as Autoras pagarem ao Réu a quantia de €300,00 (trezentos euros)
E quanto aos demais pedidos da reconvenção absolvo as Autoras/reconvindas dos mesmos.
Custas da ação na totalidade a cargo do Réu
Custas da reconvenção na proporção de 5/6 cargo do Réu reconvinte e 1/6 a cargo das autoras reconvindas.
Registe e notifique.”
*
Não se conformando com esta decisão veio o réu dela interpor recurso de apelação apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:

“1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos, na parte em que:

a1) condenou o Réu a reconhecer que as Autoras são respetivamente usufrutuária e proprietária de raiz do prédio rústico artigo ..., descrito no art.º 1.º da petição inicial;
a2) declarou extinta, por desnecessidade, a servidão de passagem de passagem constituída por sentença sobre o referido prédio rústico art.º ... identificado no artigo 1.º, a favor do prédio rústico art.º ..., identificado no artigo 4.º da petição inicial;
a3) condenou o Réu a reconhecer que já tem possibilidade de acesso igualmente cómodo para o prédio identificado em 4.º da petição inicial, através do prédio identificado em 5.º da petição inicial, com acesso já constituído e localizado junto à via pública;
a4) condenou o Réu a reconhecer que o exercício da servidão de passagem constituída sobre o prédio das Autoras tem graves inconvenientes para o prédio destas e que a extinção da servidão traz vantagens para o mesmo; e
a5) condenar o Réu a abster-se de passar pelo prédio das Autoras, perturbando o exercício do seu direito pleno de propriedade e usufruto;
b) julgou a reconvenção parcialmente improcedente, condenando as Autoras a pagarem ao Réu a quantia de € 300,00 (trezentos euros) e absolvendo-as dos demais pedidos reconvencionais.
2. Em 25/05/2017, com a prolação da primeira sentença proferida nesta acção, o poder jurisdicional do Tribunal a quo ficou imediatamente esgotado.
3. Face à extinção do poder jurisdicional, só era lícito ao Tribunal recorrido alterar a douta sentença inicialmente proferida nos autos na estrita medida do que havia sido ordenado pelo Tribunal da Relação de Guimarães – ou seja, para suprimento das nulidades apontadas no Douto acórdão de 21/06/2018.
4. Não podia o Tribunal a quo, à boleia do suprimento das nulidades apontadas no Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 21/06/2018, alterar, noutros pontos não elencados nesse acórdão, a sentença inicialmente proferida, tendo em vista o suprimento de outras deficiências.
5. Na douta sentença recorrida, o Tribunal recorrido foi mais além daquilo que lhe era lícito fazer, face ao decidido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, pois, para além de suprir os vícios apontados pela Relação de Guimarães, o Tribunal recorrido procurou suprir alguns dos outros vícios apontados à primitiva sentença, através da inclusão no leque de factos provados de factos não alegados, da inserção de locuções que não constam da primitiva sentença e da inclusão na decisão da matéria de facto de conclusões de direito.
6. Ao fazê-lo, conheceu de questões que não lhe era lícito conhecer (excesso de pronúncia – art. 615.º, n.º 1, al. d) do Cód. Proc. Civil).
7. Por outro lado, praticou actos que não eram permitidos por lei, já que, tendo-se extinto o seu poder jurisdicional, apenas poderia suprir as irregularidades apontadas no Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães (violando, desse modo, o disposto no art. 613.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil).
8. O Tribunal recorrido deu, ainda, como provada factualidade não alegada, violando, desse modo, o disposto no art. 5.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.
9. Por fim, o Tribunal recorrido não se dignou sequer a dar integral cumprimento ao ordenado no Douto Acórdão de 21/06/2018.
10. Todos os actos acima referidos, atenta a sua natureza (estão em causa alterações à própria sentença), são susceptíveis de influir na decisão da causa, pelo que constituem nulidades processuais, para todos os efeitos legais: arts. 613.º, n.º 1, 615.º, n.º 1, al. d) e 195.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.
11. São essas nulidades que expressamente se invocam, mais se requerendo a V. Exas. que, julgando-as procedentes, decidam pela revogação da douta sentença recorrida, substituindo-a por Douto Acórdão que, após o suprimento das mesmas, julgue a acção totalmente improcedente e absolva o Réu dos pedidos contra ele formulados.
12. Os pontos 15, 16 e 21 da decisão da matéria de facto, ao pressuporem que o Réu deixou de utilizar o caminho de servidão acima referido, entram em contradição directa com os pontos 36 e 52 dos factos provados, que pressupõem precisamente o contrário, ou seja, que o Réu continua a utilizar esse caminho de servidão.
13. O ponto 20 dos factos provados entra em contradição com os pontos 37, 38 39 e 40 dos factos provados.
14. O ponto 39 dos factos provados está em contradição com o ponto dos factos não provados em que se deu como não provado “que o leito do prédio, referido em 5. supra, por ser servido por água de lima, entre Outubro e Maio de cada ano, é encharcado por água, que se espalha e acumula.”
15. Por fim, no ponto 40 dos factos provados deu-se como provado que, nos dias de maior pluviosidade e no período de interno, o acesso alternativa acumula água, o que dificulta a circulação sobre o mesmo, sobretudo de tractor e alfaias agrícolas, ao passo que, nos 2 (dois) pontos dos factos não provados, deu-se como provado o contrário.
16. De acordo com o art. 615.º, n.º 1, al. c) do Cód. Proc. Civil, a sentença é nula quando “os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”.
17. É essa nulidade que expressamente se invoca e que deverá determinar a anulação da douta sentença recorrida.
18. A acrescer ao exposto, a douta sentença recorrida é também deficiente, ao nível da fundamentação da decisão da matéria de facto.
19. Com efeito, na abordagem à prova testemunhal produzida, o Tribunal recorrido limitou-se a debitar generalidades relativamente à prova produzida, sem especificar concretamente quais os depoimentos que se revelaram susceptíveis de merecer credibilidade e levar à prova dos factos dados como provados.
20. De acordo com o disposto no art. 668.º, n.º 1, al. b) do Cód. Proc. Civil, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
21. Do ponto de vista da Recorrente, o défice de fundamentação contido na fundamentação da decisão da matéria de facto equivale à falta de fundamentação prevista na al. b) do n.º 1 do art. 668.º do Cód. Proc. Civil, o que a inquina com vício de nulidade, que expressamente se invoca.
22. Pelas razões expostas, deve o presente recurso ser julgado procedente, com a consequente revogação da douta sentença recorrida e prolação, em sua substituição, de Douto Acórdão que, uma vez supridas as nulidades em causa, julgue a acção totalmente improcedente, por não provada, absolvendo o Réu dos pedidos contra eles formulados ou que, caso assim se não entenda, ordene a baixa dos autos à 1.ª Instância, a fim de ser suprida a lacuna de fundamentação.
23. O Recorrente discorda do julgamento dos pontos 11, 14, 15, 16, 17, 20, 21, 22, 23 e 37 dos factos provados, pois entende que os mesmos deveriam ter sido dados como não provados.
24. No ponto 11 dos factos provados, o Tribunal recorrido, relativamente à primitiva sentença e sem que tal lhe tivesse sido ordenado no Douto Acórdão proferido nos autos em 21/06/2018, aditou a seguinte locução: “referida em 7 supra”.
25. Tal aditamento era vedado pelo disposto no art. 613.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.
26. Pelo que se impõe julgar procedente o presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, que deverá ser substituída por Douto Acórdão que elimine do ponto 11 dos factos provados a locução “referida em 7 supra”.
27. No ponto 14 dos factos provados deu-se como provado que o Réu é dono e legítimo proprietário do prédio identificado no ponto 5 dos factos provados.
28. O Recorrente discorda do julgamento desse ponto da matéria de facto, pois entende que deveria ter sido dado como provado que “o Réu e sua esposa são donos e legítimos proprietários do prédio identificado no ponto 5 dos factos provados”.
29.
30. O meio de prova que impunha decisão diversa é o doc. n.º 2, junto com a contestação, do qual resulta que esse prédio foi comprado pelo Réu, no estado de casado com O. C..
31. Daí que se imponha alterar o ponto 14 dos factos provados, dando-lhe a seguinte redacção: “o Réu e sua esposa são donos e legítimos proprietários do prédio identificado no ponto 5 dos factos provados”.
32. Nos pontos 15 e 16 dos factos provados deu-se como provado que o Réu tem feito todas as passagens para o prédio dominante através do acesso alternativo sugerido pelas Autoras.
33. O Recorrente discorda desses pontos da decisão da matéria de facto, pois entende que os pontos 15 e 16 dos factos provados deveriam ter sido dados como não provados.
34. Os meios de prova que impunham decisão diversa são:
- declarações de parte prestadas por E. L. na sessão do julgamento de 27 de Março de 2017, no excerto de minutos 07:20 a 08:50, onde a Autora afirma expressamente que o Réu passa pela propriedade dela “a pé e com tractor simples”;
- declarações de parte prestadas por E. L. na sessão do julgamento de 27 de Março de 2017, no excerto de minutos 20:00 a 20:15;
- depoimento prestado pela testemunha das Autoras, M. P., na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 08:00 a 08:20, em que a testemunha afirma que o Réu continua a passar pelo caminho de servidão;
- depoimento prestado pela testemunha D. L. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 17:10 a 17:42;
- depoimento prestado pela testemunha R. P. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 02:00 a 04:40;
- depoimento prestado pela testemunha F. L. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 00:43 a 03:30;
- depoimento prestado pela testemunha D. V. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 01:15 a 03:30.
35. Daí que se imponha a alteração dos pontos 15 e 16 dos factos provados, os quais deverão ser dados como não provados.
36. No ponto 17 dos factos provados, o Tribunal recorrido, relativamente à primitiva sentença e sem que tal lhe tivesse sido ordenado no Douto Acórdão proferido nos autos em 21/06/2018, alterou a redacção desse facto, fazendo constar do mesmo que a marca de passagem de tractor é bem visível no local “quando o autor por lá passa”.
37. Tal aditamento era vedado pelo disposto no art. 613.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.
38. Pelo que se impõe julgar procedente o presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, que deverá ser substituída por Douto Acórdão que substitua a redacção desse ponto da decisão da matéria de facto pelo seu texto original, a saber:
“É bem visível, no local, a marca da passagem de tratores agrícolas pelo referido acesso que liga os prédios rústicos identificados em 4.º e 5.º supra que são propriedade do réu.”
39. O Recorrente discorda do julgamento dos pontos 20, 21 e 22 dos Factos Provados, pois entende que os mesmos deveriam ter sido dados como não provados.
40. Em primeiro lugar, cumpre dizer que, comparativamente com a douta sentença primitiva, o Tribunal recorrido aditou factos novos a esses pontos da decisão da matéria de facto, nomeadamente:
41. - no ponto 20 dos factos provados (ponto 22 na sentença primitiva), a redacção foi alterada de “A passagem pelo terreno do Réu para aceder ao prédio identificado em 4 supra não se faz esporadicamente, mas sim na maioria das vezes, por existirem marcadas visíveis de passagem, é-lhe de mais fácil acesso do que seguindo pela passagem que atravessa o prédio das aqui Autoras, conforme se pode confirmar pelas fotografias doc. 07 s 23” para “A passagem pelo terreno do Réu (referido em 5 supra) para aceder ao prédio identificado em 4 supra, é em concreto para proceder às colheitas e sementeiras no do seu prédio referido em 4 supra, ficando marcas visíveis, deste modo, sendo mais cómodo o acesso ao prédio referido em 4 do que aceder pela passagem constituída sobre o prédio das Autoras”.
42. Um tal aditamento de factos era vedado pelo disposto no art. 613.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil, pelo que se impõe a procedência do presente recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida, na parte em que deu como provados os pontos 20 a 22 dos factos provados, proferindo-se douto acórdão que retire desses pontos da decisão da matéria de facto as locuções, acima referidas, indevidamente aditadas pelo Tribunal recorrido.
43. Em segundo lugar, as locuções “sendo mais cómodo o acesso” e “com melhor piso”, “encurta a distância” e “fica mais largo” não são factos, mas meras conclusões, que se poderiam extrair de uma correcta alegação de factos (nomeadamente, a alegação das características físicas do caminho, sua extensão, largura e tipo de piso), pelo que devem ser retiradas da decisão da matéria de facto.
44. Daí que se imponha a procedência do presente recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida, na parte em que deu como provados os pontos 20 a 22 dos factos provados, proferindo-se douto acórdão que retire desses pontos da decisão da matéria de facto as locuções, acima referidas, que encerram matéria conclusiva, e não matéria de facto.
45. Em terceiro lugar, o Tribunal recorrido incluiu nos citados pontos 20 a 22 dos factos provados factualidade não alegada pelas partes.
46. Concretizando, as locuções “é em concreto para proceder às colheitas e sementeiras no seu prédio”, “ficando marcas visíveis” e “sendo mais cómodo o acesso ao prédio” não foram alegadas na petição inicial, pelo que estava vedado ao Tribunal recorrido aditar as mesmas ao leque dos factos provados.
47. O mesmo se diga, ipsis verbis, para o ponto 22 dos factos provados, em que foram aditadas as locuções “encurta a distância para a via pública, fica mais largo e com melhor piso”, já que tais factos não foram alegados na petição inicial.
48. Ao fazer constar tais locuções da decisão da matéria de facto, o Tribunal recorrido violou o disposto no art. 5.º, n.º 2 do Cód. Proc. Civil (a contrario), o que impõe a revogação da douta sentença recorrida, na parte em que deu como provados os pontos 20 a 22 dos factos provados, e sua substituição por Douto Acórdão que remova de tais factos a factualidade, acima elencada, não alegada na petição inicial.
49. Em quarto lugar, os pontos 20, 21 e 22 dos factos provados deveriam ter sido dados como não provados, sendo que tal conclusão era imposta pelos seguintes meios de prova:
- declarações de parte prestadas por E. L. na sessão do julgamento de 27 de Março de 2017, no excerto de minutos 07:20 a 08:50, onde a Autora afirma expressamente que o Réu passa pela propriedade dela “a pé e com tractor simples”;
- declarações de parte prestadas por E. L. na sessão do julgamento de 27 de Março de 2017, no excerto de minutos 20:00 a 20:15;
- depoimento prestado pela testemunha das Autoras, M. P., na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 08:00 a 08:20, em que a testemunha afirma que o Réu continua a passar pelo caminho de servidão;
- depoimento prestado pela testemunha D. L. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 17:10 a 17:42;
- depoimento prestado pela testemunha R. P. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 02:00 a 04:40;
- depoimento prestado pela testemunha F. L. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 00:43 a 03:30;
- depoimento prestado pela testemunha D. V. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 01:15 a 03:30.
- esclarecimentos prestado pela Senhora Perita Eng. M. O., prestados na sessão da audiência de julgamento de 15 de Maio de 2017, no excerto de mins. 04:50 a 06:20 e, bem assim, no excerto de 08:00 a 09:45 e ainda no excerto de minutos 09:50 a 10:50 e no de minutos 11:55 a 13:20;
- depoimento prestado pela testemunha D. L. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 09:13 a 12:50;
- depoimento prestado pela testemunha R. P. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 08:00 a 09:40.
- depoimento prestado pela testemunha F. L. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 09:00 a 11:20;
- depoimento prestado pela testemunha D. V. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 03:20 a 07:30;
- documento n.º 22, junto com a p.i., que retrata o poço, em argolas, existente nas imediações do acesso sugerido pelas Autoras e que torna esse terreno húmido e dificilmente transitável por tractores e alfaias agrícolas.
50. Uma primeira observação quanto a estes factos: tendo ele sido alegado pelas Autoras na petição inicial, impendia sobre elas o ónus da sua prova.
51. Ora, esse ónus não foi, de todo, cumprido.
52. Daí que se imponha a alteração dos pontos 20, 21 e 22 dos factos provados, os quais deverão ser dados como não provados.
53. No ponto 23 dos factos provados deu-se como provado que “Ambos os prédios rústicos identificados nos artigos 4.º e 5.º supra, são terrenos de cultivo/lavradio onde são cultivadas as mesmas culturas durante o ano, conforme se pode verificar nos documento n.º 07 a 23, pois atualmente ambos os prédios estão cultivados com milho.”
54. O Recorrente entende que, contrariamente ao decidido em 1.ª Instância, esse facto deveria ter sido dado como não provado.
55. Os meios de prova que impunham decisão diversa são os seguintes:
- declarações de parte prestadas por E. L. na sessão do julgamento de 27 de Março de 2017, no excerto de minutos 08:57 a 09:30;
- depoimento prestado pela testemunha das Autoras, R. L., na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 16:15 a 18:06, do qual resulta que o terreno das Autoras tem actualmente uma plantação de castanheiros;
- depoimento prestado pela testemunha D. L. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 06:50 a 08:10 e, bem assim, no excerto de 05:20 a 06:40, do qual resulta que ambos os prédios do Autor são destinados ao cultivo de milho, oliveira, batata, hortaliça, feijão, entre outras culturas;
- depoimento prestado pela testemunha R. P. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 10:08 a 04:40;
- depoimento prestado pela testemunha F. L. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 06:50 a 09:00, em que foi demonstrado, com pormenor, a diferença de culturas entre o prédio das Autoras (castanheiro, que carece de pouca água) e prédio onde está implantado o acesso alternativo sugerido pelas Autoras (milho, erva castelhana, batatas, feijão e outras leguminosas).
56. Assim, não sendo ambos os prédios destinados ao mesmo tipo de culturas, o Tribunal recorrido andou mal ao dar como provada a matéria do ponto 23 dos factos provados, pelo que se impõe alterar a decisão desse ponto dos factos provados, dando-o como não provado.
57. O Recorrente discorda do julgamento do ponto 37 dos Factos Provados, pois entende que o mesmo deveria ter sido dado como não provado.
58. Em primeiro lugar, cumpre dizer que, comparativamente com a douta sentença primitiva, o Tribunal recorrido aditou factos novos a esses pontos da decisão da matéria de facto, nomeadamente, a locução “(porque o Réu o cultiva ao mesmo tempo que cultiva o prédio referido em 4 supra (Identidade de culturas facto 23)”.
59. Um tal aditamento de factos era vedado pelo disposto no art. 613.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil, pelo que se impõe a procedência do presente recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida, na parte em que deu como provados o ponto 37 dos factos provados, proferindo-se douto acórdão que retire desse ponto da decisão da matéria de facto a locução, acima referida, indevidamente aditada pelo Tribunal recorrido.
60. Em segundo lugar, o Tribunal recorrido incluiu no citado ponto 37 dos factos provados factualidade não alegada pelas partes.
61. Concretizando, a locução “(porque o Réu o cultiva ao mesmo tempo que cultiva o prédio referido em 4 supra (Identidade de culturas facto 23)” não foi alegada pelas Autoras, pelo que estava vedado ao Tribunal recorrido adita a mesma ao leque dos factos provados.
62. Ao fazer constar tal locução da decisão da matéria de facto, o Tribunal recorrido violou o disposto no art. 5.º, n.º 2 do Cód. Proc. Civil (a contrario), o que impõe a revogação da douta sentença recorrida, na parte em que deu como provado o ponto 37 dos fasctos provados, e sua substituição por Douto Acórdão que remova de tal ponto da decisão da matéria de facto a factualidade, acima elencada, não alegada na petição inicial.
63. Em terceiro lugar, o Recorrente discorda do julgamento do ponto 37 dos factos provados, pois entende que o mesmo deveria ser expurgado da locução “(porque o Réu o cultiva ao mesmo tempo que cultiva o prédio referido em 4 supra (Identidade de culturas facto 23)”, passando a ter a sua redacção originária, a saber: “No prédio referido em 5. Supra não s evê qualquer caminho calcado, trilhado, em duro, com feição permanente, que permita o aceso e trânsito de pessoas e bens ao prédio do Réu referido em 4. supra.”
64. Os meios de prova que impunham a prolação de decisão diversa são os seguintes.
- depoimento prestado pela testemunha D. L. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 17:10 a 17:42;
- depoimento prestado pela testemunha R. P. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 02:00 a 04:40;
- depoimento prestado pela testemunha F. L. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 00:43 a 03:30;
- depoimento prestado pela testemunha D. V. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 01:15 a 03:30;
- esclarecimentos prestado pela Senhora Perita Eng. M. O., prestados na sessão da audiência de julgamento de 15 de Maio de 2017, no excerto de mins. 04:50 a 06:20 e, bem assim, no excerto de 08:00 a 09:45 e ainda no excerto de minutos 09:50 a 10:50 e no de minutos 11:55 a 13:20;
- depoimento prestado pela testemunha D. L. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 09:13 a 12:50;
- depoimento prestado pela testemunha R. P. na sessão do julgamento realizada em 27 de Março de 2017, nomeadamente, no excerto de 08:00 a 09:40;
- depoimento prestado pela testemunha F. L. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 09:00 a 11:20;
- depoimento prestado pela testemunha D. V. na sessão do julgamento realizada em 15 de Maio de 2017, nomeadamente, no excerto de 03:20 a 07:30;
- documento n.º 22, junto com a p.i., que retrata o poço, em argolas, existente nas imediações do acesso sugerido pelas Autoras e que torna esse terreno húmido e dificilmente transitável por tractores e alfaias agrícolas.
65. Daí que se imponha a alteração do 37 dos factos provados, que deve ser expurgado da locução “(porque o Réu o cultiva ao mesmo tempo que cultiva o prédio referido em 4 supra (Identidade de culturas facto 23)”, passando a ter a sua redacção originária, a saber: “No prédio referido em 5. Supra não s evê qualquer caminho calcado, trilhado, em duro, com feição permanente, que permita o aceso e trânsito de pessoas e bens ao prédio do Réu referido em 4. supra.”
66. Para obter ganho de causa, não bastava às Autoras alegar e provar a existência de um acesso alternativo ao prédio dominante, mas também que esse caminho alternativo proporciona condições de acesso semelhantes ao da servidão actualmente existentes ou, pelo menos, que não fossem excessivamente onerosas para o proprietário do prédio serviente.
67. Essa alegação e prova claramente não foram feitas pelas Autoras.
68. Não havendo equivalência de condições de acesso entre ambos os caminhos, forçosa se torna a conclusão de que, no caso dos autos, não se verifica uma situação de desnecessidade objectiva do caminho de servidão, o que equivale a dizer que não estão, de todo, verificados os pressupostos exigidos pelo n.º 2 do art. 1549.º do Cód. Civil.
69. Ainda que se entendesse que o Autor teria de fazer obras no novo acesso, de modo a lograr obter essa identidade de condições de circulação, não pode deixar de se levar em conta que, por um lado, essas obras estão por fazer e não incumbe ao Réu realizá-las (o que afasta o requisito da actualidade da suposta desnecessidade da servidão), e, por outro, essa utilização só poderia ser feita à custa da renúncia, pelo Réu, da utilização de água de lima no seu prédio onde seria implantado o acesso alternativo.
70. No quadro de um pedido de extinção de servidão por desnecessidade, não é exigível ao titular desse direito que, em ordem a permitir a citada extinção, renuncie a direitos próprios, nomeadamente, ao direito a regar um seu prédio com água de lima, já que um tal facto tem inerente a imposição de encargos ao beneficiário da servidão que tornam demasiado onerosa para ele a extinção do seu direito.
71. Não se verifica, in casu, uma situação de desnecessidade objectiva da servidão, por parte do prédio dominante, já que o acesso alternativo, para além de implicar um agravamento das condições de circulação, com impossibilidade de acesso ao prédio serviente nos períodos de maior pluviosidade, tem inerente uma renúncia a água de lima que não pode ser imposta ao Réu.
72. Independentemente da procedência do recurso da matéria de facto, os autos reúnem já condições para a prolação de decisão de mérito, que absolva o Réu dos pedidos contra ele formulados.
73. Ao decidir como decidiu, o Tribunal recorrido violou a disposição do art. 1569.º, n.º 2 do Cód. Civil.
74. Deve, pois, revogar-se a douta sentença recorrida, que deverá ser substituída por Douto Acórdão que julgue a acção totalmente improcedente, por não provada.
75. A Senhora Perita, nos esclarecimentos prestados na audiência de julgamento, afirmou que, para tornar as condições de circulação dos dois acessos minimamente semelhantes, seria necessária a realização de obras, nomeadamente, a aplicação de uma camada 10 cm de tuvenant, numa faixa com largura de 3,00 metros. Afirmou ainda, na última questão a que respondeu, que, nas condições verificadas aquando da deslocação ao local, se não forem feitas obras, é difícil passarem máquinas. Por fim, disse ainda que seria necessário deixar de fazer a água de lima transbordar do rego de água existente nas imediações do acesso alternativo, sob pena de o mesmo se tornar novamente intransitável.
76. A necessidade de realização de obras, por ser pressuposto da extinção da servidão, carecia de ser oportunamente alegada pelas Autoras, não só porque é condição sine qua non da própria “desnecessidade”, mas também porque o custo desses trabalhos sempre teria de ser suportado por elas.
77. Tendo-se apurado, em sede de produção de provas, que, sem realização das obras acima referidas, não há equiparação nas condições de acesso ao prédio dominante nem há, por outro lado, uma situação de desnecessidade objectiva, o Tribunal recorrido, ao julgar extinta a servidão, violou a disposição do n.º 2 do art. 1569.º do Cód. Civil.
78. Daí que se imponha revogar a decisão recorrida, que deverá ser substituída por Douto Acórdão que julgue a presente acção improcedente, por não provada, com a consequente absolvição do Réu dos pedidos contra ele formulados.
79. O conceito de desnecessidade tem de ser aferido por referência ao prédio dominante, nomeadamente, às suas características físicas, e já não por referência ao seu proprietário ou a vicissitudes ocorridas em vida deste.
80. A circunstância de o proprietário do prédio dominante – no caso, o Réu – ser proprietário de um prédio com ele confinante, o qual, por sua vez, confina com a via pública, não corresponde, de todo, a uma característica objectiva, típica e exclusiva do prédio dominante, mas antes, a uma questão exclusivamente respeitante ao seu proprietário.
81. Não estando em causa uma circunstância respeitante ao prédio dominante, a alteração na propriedade de um prédio confinante - nomeadamente, o prédio referido no ponto 5 dos factos provados – não se integre na previsão da parte final do n.º 2 do art. 1569.º do Cód. Civil nem constitua, por maioria de razão, fundamento para a extinção do direito de servidão em referência nos autos.
82. Deste modo, ao decidir pela extinção do direito de servidão com fundamento no facto de o Réu ser dono de um prédio confinante que confronta com a via pública, o Tribunal recorrido extravasou os limites da estatuição contida na parte final do n.º 2 do art. 1569.º do Cód. Civil (nomeadamente, na expressão “desde que se mostrem desnecessárias ao prédio dominante”) e violou essa disposição legal.
83. Daí que se imponha a revogação da douta sentença recorrida e sua substituição por Douto Acórdão que julgue a presente acção totalmente improcedente, com a consequente absolvição do Réu dos pedidos contra ele formulados.
84. A servidão de passagem em referência nos autos foi constituída por decisão, transitada em julgado, proferida em 8 de Outubro de 1986.
85. Por outro lado, resultados factos provados que o prédio referido no ponto 5 dos factos provados foi comprado pelo Réu (e mulher) em 31 de Dezembro de 1973.
86. No momento em que o então Tribunal Judicial de Ponte de Lima decidiu pela constituição da servidão, o Réu, para além de ser dono do prédio dominante, também já era dono do prédio referido no ponto 5 dos factos provados.
87. Do ponto de vista do Recorrente, a circunstância de o Réu ser dono de um prédio que confronta com o prédio dominante, o qual, por sua vez, confronta com a via pública não poderia ser considerada como fundamento para a decisão de extinção da servidão, sob pena de se ofender a autoridade de caso julgado decorrente do citado proc. n.º 19/1985.
88. De tal modo que a decisão recorrida violou, além de outras, a disposição do art. 619.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil, pelo que deve ser revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue a acção totalmente improcedente, por não provada, absolvendo o Réu dos pedidos contra ele formulados.
89. Por fim e em complemento dos fundamentos acima invocados, há uma outra questão que, do ponto de vista do Recorrente, não foi devidamente ponderada pelo Tribunal recorrido.
90. O prédio identificado no art. 5.º da p.i. foi comprado pelo Réu no estado de casado com O. C., mais se afirmando nesse documento que o casamento foi submetido ao regime da comunhão geral de bens (embora o regime de bens do casamento do Réu seja o da comunhão de adquiridos).
91. Independentemente do regime de bens do casamento do Réu, a presente acção não poderia deixar de ter sido instaurada contra o ora Réu e sua mulher, sob pena de ser insusceptível de produzir qualquer efeito útil.
92. O Tribunal não poderá deixar de levar em conta o conceito de legitimidade substantiva, que é necessariamente abordado na pronúncia sobre o mérito da acção e que passa por saber se, com os intervenientes presentes em juízo, a decisão é susceptível de produzir pleno efeito.
93. Sendo a esposa do Recorrente com ele casada no regime da comunhão de adquiridos, não poderia deixar de intervir em juízo – não tanto para contradizer o pedido de extinção da servidão de passagem, mas pelo facto de tal extinção implicar a constituição de ónus sobre o prédio identificado no art. 5.º da p.i. (prédio esse que integra a comunhão conjugal, independentemente do regime de bens, por ter sido adquirido após o matrimónio – cfr. doc. n.º 2, junto com a contestação.).
94. Assim, nos moldes em que foi configurada pelas Autoras, a presente acção não reúne condições para produzir o seu efeito útil, em virtude de o Réu carecer de legitimidade substantiva, porque desacompanhado da sua mulher.
95. Nesta parte, a decisão recorrida violou o disposto no art. 34.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.
96. Daí que se imponha revogar a decisão recorrida, que deverá ser substituída por Douto Acórdão que julgue a acção totalmente improcedente, por não provada.
97. Relativamente ao pedido reconvencional e no que respeita ao pedido formulado sob a alínea a), face à matéria de facto provada, em consequência da procedência do recurso da matéria de facto, é indiscutível que sobre o prédio das Autoras se encontra constituída servidão de passagem, a favor do prédio do Réu identificado no ponto 4 dos factos provados, constituída, além do mais, por usucapião.
98. Como tal, ao decidir pela improcedência de tal pedido reconvencional, o Tribunal recorrido violou, além de outras, as disposições dos arts. 1251.º, 1287.º e 1293.º, al. a), este último a contrario, todos do Cód. Civil.
99. Deve, pois, ser revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue procedente o pedido reconvencional formulado na al. a).
100. No que respeita ao pedido formulado sob a al. b1), o Tribunal recorrido discorda da indemnização fixada pelo Tribunal recorrido - € 300,00 -, pois entende que a mesma é manifestamente insuficiente para o compensar pelos prejuízos decorrentes da extinção da servidão.
101. Essa quantia não poderia deixar de ser actualizada, até à presente data, de acordo com o índice do preço ao consumidor, de modo a ser equivalente ao valor pago pelo Réu aquando da constituição da servidão.
102. Daí que, ao decidir como decidiu, o Tribunal recorrido tenha violado a disposição do n.º 3 do art. 1569.º do Cód. Civil.
103. Deve, pois, julgar-se procedente o presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, que deverá ser substituída por Douto Acórdão que julgue integralmente procedente o pedido formulado no ponto b1) do pedido reconvencional.
104. Por fim, o Recorrente discorda da sentença recorrida, na parte em que julgou improcedente o ponto b2) do pedido reconvencional.
105. Ocorrendo a extinção da servidão à custa da criação de um acesso no prédio do Réu, é da mais elementar justiça que este seja ressarcido por esse prejuízo, que foi quantificado pela Senhora Perita, no relatório pericial, em € 1 000,00.
106. A decisão recorrida violou, nesta parte, o n.º 2 do art. 1569.º do Cód. Civil, pelo que deve ser revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue o pedido reconvencional formulado no ponto b2) parcialmente procedente e condene as Autoras a pagar ao Réu €1 000,00, acrescidos de juros moratórios, nos termos aí peticionados.
Pugna pela revogação da sentença e pela prolação de acórdão que esteja em conformidade com as conclusões referidas.
*
Contra-alegou a autora P. M. pugnando pela confirmação da sentença recorrida.
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O Tribunal pronunciou-se no sentido da inexistência de nulidades na sentença.
O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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Tendo em atenção que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, as questões a decidir são:

A) A nulidade da sentença nos termos do art. 615º nº 1 b), c) e d) do C.P.C.;
B) Apurar se ocorreu erro na apreciação da matéria de facto;
C) E/ou se ocorreu erro na subsunção jurídica.
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II – Fundamentação

Foram considerados provados os seguintes factos:

1. As autoras P. M. e E. L. são usufrutuária e proprietária de raiz, respectivamente, do prédio rústico identificado como leira de lavradio com oliveiras, sito no lugar da ..., freguesia de ..., concelho de Ponte de Lima, a confrontar de Norte com José, a Sul com J. V. (actualmente com o réu), a Nascente com Conde de … (actualmente com o réu) e a Poente com A. P., descrito na C.R.Predial de Ponte de Lima sobre o nº ... – freguesia de ... e inscrito na matriz predial rústica respectiva sob o nº ..., identificada no croqui a cor rosa. Vide doc. 01, 02, 03 e 06, juntos a fls. 24 a 26; 39 a 49; 50 a 53; e 55 vº.
2. A autora P. M. adquiriu o prédio rústico supra por escritura de habilitação e partilha por óbito de M. C. e doações e colação lavrada a 23/05/1979, celebrada no Cartório Notarial de Ponte de Lima. Vide doc. 02, junto a fls. 39 a 49.
3. Por escritura de doação outorgada no dia 10/08/2010 no Cartório Notarial de S. A., a autora P. M. doou à autora E. L. o prédio identificado no facto 1 supra, com reserva de usufruto para ela doadora. Vide doc. 1 e 3, juntos a fls. 24 a 26 e 50 a 53.
4. Por sua vez, o réu é proprietário do prédio rústico identificado como leira de lavradio com oliveiras, sita no lugar de ... da freguesia de ..., a confrontar a Norte com M. C. (actualmente com as Autoras), de Sul com João, de Nascente com J. V. (actualmente com o próprio réu) e de Poente com M. C., inscrito na matriz predial rústica sob o nº ..., identificada no croqui a cor verde (Doc. 06), que adquiriu por escritura de doação de M. S. e mulher, lavrada no Cartório Notarial de Ponte de Lima em 16/11/1983. Vide doc. 04 e 06, junto a fls. 54 e 55v.º .
5. Sendo o réu ainda dono e legítimo proprietário do prédio rústico leira de lavradio com Oliveiras, sito no Lugar da ..., a confrontar a Norte caminho público, do nascente com J. J., do Sul com Conde do … e do poente M. C. (actualmente com o próprio réu, art. ...), inscrito na matriz predial respectiva sob o nº ..., identificada no croqui a cor azul (doc. 06). Vide doc. 05 e 06, junto a fls. 55 e 55vº.
6. Por si e por seus ante possuidores, autoras e réu estão na posse dos referidos prédios, que detêm materialmente há mais de 5, 15, 20, 30 e mais anos, zelando pela sua conservação e limpeza, vigiando-os, cultivando-os, neles semeando e colhendo os respectivos frutos e, de um modo geral, deles retirando todas as utilidades que são susceptíveis de produzir ou proporcionar, com conhecimento e aceitação de toda a gente, sem oposição de ninguém, sem qualquer interrupção temporal até ao presente, na fé de exercerem, como direito próprio, todos os poderes inerentes ao direito de propriedade e na convicção de que assim actuando não ofendem o direito de outrem nem prejudicam ninguém.
7. Em 18/02/1985, foi instaurada, pelos pais do ora réu contra a ora autora P. M. e a sua mãe, uma acção especial de arbitramento para expropriação por utilidade particular, na qual foi proferida sentença condenando “os Réus a consentirem que o AA. façam no prédio, referido na al. b) do art. 1.ª da petição inicial, uma servidão de passagem, em favor do prédio referido na alínea a do mesmo artigo 1.º, com o conteúdo, forma, características e tempo de exercício que resultar da fase executiva”. Doc. 3 junto a fls. 138 a 146.
8. O processo seguiu os ulteriores termos e, na fase executiva, os peritos apresentaram laudo escrito onde foram de parecer que a servidão que onera o prédio da ora autora a favor do identificado prédio do ora réu:
a) Terá o seu início no canto Norte Nascente do prédio que é hoje da autora, seguindo pela sua extrema nascente até atingir o prédio dos réus, a Sul;
b) Terá a largura de 2,5m em toda a extensão da referida extrema nascente do dito prédio, largura esta que ficará a contar do tronco das oliveiras que se encontram implantadas na crista do vale da referida extrema do mesmo prédio para o interior deste. Doc. 3 junto a fls. 138 a 146.
9. Os peritos deram parecer também no sentido de que, atentas as culturas praticadas no prédio do réu, a servidão de passagem de carro, gado ou tractor agrícola com ou sem atrelado, deveria ser utilizada para todo o ano, com excepção dos meses de Fevereiro, Agosto e Dezembro e a pé e gado preso durante todo o ano e que a indemnização a atribuir seria no montante de Esc. 60.000,00 (sessenta mil escudos). Doc. 3 junto a fls. 138 a 146.
10. O laudo pericial não teve oposição das partes, pelo que foi homologado por sentença proferida naquele processo em 08/10/1986, transitada em julgado. Doc. 3 junto a fls. 138 a 146.
11. À data referida em 7 supra, o prédio do réu era um prédio encravado que apenas tinha acesso à via pública através da servidão de passagem constituída sobre o prédio que hoje pertence às autoras. (vide doc. junto a fls. 183 a 197).
12. Actualmente o prédio identificado em 4 supra, embora continue a não ter comunicação directa com a via pública, confronta com outro prédio do Réu identificado em 5 supra que tem comunicação directa com a via pública e a partir do qual o réu consegue aceder ao seu prédio. Vide doc. 06 junto a fls. 55v.
13. Tal situação referida em 12 supra, alterou-se em consequência da realização de obras por parte do réu, o qual abriu uma entrada de forma a constituir um acesso/caminho que liga os prédios identificados nos factos 4 e 5 supra, pelo que, a partir desse momento, o réu passou a ter acesso ao prédio dominante através de outro prédio sua propriedade (o referido em 5 supra), o qual confronta com a via pública. Vide doc. 07 a 23, juntos a fls. 24 a 34; 58; 74; 78; 82; 86; 90; 94; e 98.
14. Isto porque, o ora réu é também dono e legitimo proprietário do prédio identificado em 5 supra, pelo qual passou a ter acesso ao prédio identificado em 4 supra. Vide doc. 04, 05, 06, 07 a 23, juntos a fls. 54; 55; 55 vº; 27 a 34; 58; 74; 78; 82; 86; 90; 94; 98.
15. E é através do referido prédio rústico artº ..., supra mencionado em 5 supra que o ora réu tem feito todas as passagens para o prédio referido no facto 4.º supra, o qual confronta a nascente com os prédios identificados 1 e 4 supra, e estes a poente com aquele. Vide doc. 06, 07 a 23 junto s a fls. 55.v 27 a 34; 58; 74; 78; 82; 86; 90; 94; e 98
16. Deixando de passar pelo caminho de passagem que onera o prédio das ora autoras referido em 8 supra.
17. Sendo bem visíveis no local, quando o autor por lá passa, a marca da passagem de tractores agrícolas pelo referido acesso que liga os prédios rústicos identificados em 4 e 5 supra que são propriedade do réu. Vide doc. 07 a 23 juntos a fls.. 27 a 34; 58, 74; 78; 82; 86; 90; 94; e 98.
18. Consta da petição inicial elaborada pelo ora réu que deu origem ao Proc. Ordinário n.º 667/10.1TBPTL ao que se refere nos arts. 27º e 28º, que passa transcrever:
“27. Mais recentemente, o autor verificou que, no início do caminho de servidão onde configura uma curva à esquerda, quase em angulo recto, havia dificuldades de manobra devido ao pouco espaço e à oliveira aí existente, que impediam a passagem, ainda que apenas esporádica, de um atrelado.
28. Pelo que para não ter de requerer a ampliação, em largura e nesse ponto do percurso, do caminho de servidão, o réu viu-se obrigado a socorrer-se de uma outra abertura, para este caso especial, que implica o atravessamento de um outro prédio que, pelo Nascente, confronta ambos os prédios descritos no artigo 1º desta petição inicial e por onde passa quando esporadicamente tem que levar o atrelado.” Vide doc. 24 junto a fls. 59
19. Com referência à data da entrada em juízo da citada acção ano 2010, pelo menos há mais de 5 anos que já existe esta abertura no prédio identificado em 4 supra e para aceder a este.
20. A passagem pelo terreno do réu (referido em 5 supra) para aceder ao prédio identificado 4 supra, é em concreto para proceder às colheitas e sementeiras no do seu prédio referido em 4 supra, ficando marcas visíveis, deste modo, sendo mais cómodo o acesso ao prédio referido em 4 do que aceder pela passagem constituída sobre prédio das autoras cfr se pode ver pelas fotografias doc. 07 a 23
21. Actualmente o réu utiliza como passagem para o seu prédio rústico identificado em 4 supra, o seu próprio prédio rústico identificado em 5 supra, que confronta com aquele pelo lado nascente e também com o das autoras, bem como com a via pública. Vide Doc. 06 junto a fls. 55v.
22. A acessibilidade efectuada pelo réu pelo seu próprio prédio rústico identificado em 5 supra, encurta que a distância para a via pública, fica mais largo e com melhor piso, do que aceder ao seu prédio referido em 4 supra pelo prédio das autoras como se pode ver por meio das fotografias juntas. Vide doc. 07 a 23.
23. Ambos os prédios rústicos identificados nos artigos 4º e 5º supra, são terrenos de cultivo/lavradio onde são cultivadas as mesmas culturas durante o ano, conforme se pode verificar nos documento n.º 07 a 23, pois actualmente ambos os prédios estão cultivados com milho. Vide doc. 07 a 23.
24. O prédio identificado em 4 supra foi doado a réu pelos pais dele, M. S. e mulher E. N. por escritura pública de doação outorgada no Cartório Notarial de Ponte de Lima em 16/11/1983, exarada de fls. 15V a fls. 25 do Livro de Escrituras n.º ...-Z, nos termos que constam do documento doc. nº 1 junto a fls. 152 a 178.
25. O prédio identificado no art. 5.º da p.i. foi comprado pelo éu a José e mulher M. G. por escritura pública de venda outorgada em 31/12/73 de Dezembro de 1973, no Cartório Notarial de Ponte de Lima, exarada de fls. 68V a fls. 69V do Livro de Notas para Escrituras Diversas n.º Z-..., nos termos que constam do documento que se junta e se dá aqui por integralmente reproduzido: doc. nº 2 junto a fls. 180 a 182
26. A servidão de passagem referida em 8 foi constituída por sentença, transitada, proferida em 08/10/1986, no âmbito da acção especial de arbitramento para expropriação para utilidade particular que correu termos no então Tribunal Judicial de Ponte de Lima com o n.º 19/1985, nos termos que constam do documento que se junta e se dá aqui por integralmente reproduzido: doc. nº 3 junto a fls. 152 a 178.
27. A servidão de passagem em referência foi constituída na sequência de laudo unânime de peritos, prestado no âmbito da acção judicial acima referida, que concluíram que a melhor forma de exercício desse direito de servidão seria através do prédio das autoras e pelo modo descrito naquele laudo – cfr. doc. n.º 3 junto a fls. 183 a 197.
28. Como resulta do laudo pericial que consta do doc. nº 3 junto a fls. 183 a 197, a servidão de passagem sobre o prédio das autoras tem as seguintes características:
a) início no canto Nascente do prédio das autoras, seguindo pela sua estrema Nascente até atingir o prédio do réu, a Sul.
b) largura de 2,5 m em toda a extensão Nascente do prédio das autoras, a contar do tronco das oliveiras que se encontram implantadas na crista do vale da referida estrema Nascente para o interior do prédio, ou seja, para o lado Poente;
c) atentas as culturas praticadas no prédio do réu (milho, azeite, batata, centeio, hortaliça e pastagens), para uma normal exploração desse prédio com vista à realização daquelas culturas é necessária a servidão de passagem, a pé e com gado preso, de modo permanente, e de carro e gado, tractor agrícola, com ou sem atrelado, e alfaias agrícolas, durante todo o ano, com excepção dos meses de Fevereiro, Agosto e Dezembro.
29. O caminho de servidão acima descrito, junto à estrema do prédio das autoras, para quem vai da via pública para o prédio dominante, tem uma curva à esquerda, em ângulo reto (90 graus),tornejando do sentido Nascente-Poente para o sentido Norte-Sul.
30. Essa curva em ângulo recto dificulta a realização de manobras para acesso ao prédio dominante, com máquina ensiladeira e enfardadeira.
31. A máquina ensiladeira é utilizada nas colheitas, entre Setembro e Outubro de cada ano, e destina-se a colher e desfazer o milho.
32. A máquina enfardadeira é utilizada entre Abril e Maio de cada ano, previamente às sementeiras, e destina-se a enfardar o pasto que cresce entre as colheitas e as sementeiras.
33. Mais recentemente, o réu passou a utilizar as máquinas ensiladeira e enfardadeira, bem como tractor agrícola com atrelado, para exploração do prédio dele identificado no facto 4 supra.
34. Pelo que, e para não ter de requerer a ampliação, em largura e na curva em ângulo recto acima referida, o réu viu-se obrigado a socorrer-se de uma outra abertura a referida em 13 supra em especial para este caso, que implica o atravessamento do prédio dele identificado no facto 5 supra.
35. Essa alternativa é a mais utilizada no período dos meses de Abril ou Maio e Setembro ou Outubro de cada ano, a fim de permitir o enfardamento de palha e o ensilamento e transporte de milho.
36. Em todos os demais períodos do ano e, bem assim, sempre que pretende aceder ao prédio referido em 4 supra a pé, com animais e tractor agrícola, com ou sem atrelado, o Réu serve-se do caminho de servidão constituído sobre o prédio das Autoras
37. No prédio referido em 5 supra não se vê qualquer caminho calcado, trilhado, em duro, com feição permanente, porque o réu o cultiva ao mesmo tempo que cultiva o prédio referido em 4 supra (Identidade de culturas facto 23.), de forma a permitir o acesso e trânsito de pessoas e bens ao prédio do réu referido no facto 4 supra.
38. Esse prédio encontra-se num plano inferior, relativamente ao prédio dominante e ao prédio serviente.
39. E é servido por água de rega e por água de lima, proveniente de uma nascente de água de consortes conhecida como Fonte de …, nos seguintes termos:
a) entre Junho e Setembro de cada ano, é servido por água de rega, destinada a regar o milho e demais culturas existentes no referido prédio;
b) Entre Outubro e Maio de cada ano, é servido por água de lima, que é usada para se espalhar e acumular no terreno, para protecção da erva e restante vegetação e, no Inverno, para defesa das plantações contra as geadas.
40. Esse terreno é todo composto por terra mole, destinada a uso agrícola, que não tem consistência e que, sobretudo nos dias de maior pluviosidade e no período de Inverno, acumula água e dificulta a circulação sobre o mesmo, sobretudo de tractor e alfaias agrícolas. 41. Entre os meses de Maio e Setembro de cada ano, a área do prédio identificado em 5 supra encontra-se ocupada, em toda a sua extensão, pelo cultivo de milho.
42. Entre os meses de Setembro e Maio de cada ano, por sua vez, a área do prédio identificado 5 supra encontra-se ocupada, em toda a sua extensão, por erva castelhana semeada pelo réu, com o propósito de fazer fardos e de ter alimentação para os animais.
43. O réu continua a cultivar no prédio identificado em 4 supra de oliveiras para produção de azeite, milho, feijão e batatas e forragens, o que exige a circulação de tractor e alfaias agrícolas durante todo o ano, com excepção dos meses de Fevereiro, Agosto e Dezembro de cada ano.
44. Correu termos no 1º Juízo do então Tribunal Judicial de Ponte de Lima a acção ordinária n.º 667/10.1TBPTL, instaurada pelo ora réu contras a autora P. M. e J. M. cfr. docs. n.º 6 e 7, juntos a fls. 200 a 238.
45. Nessa acção, as aí rés apresentaram contestação mas não se defenderam por excepção, designadamente invocando uma suposta e alegada desnecessidade da servidão de passagem constituída a favor do prédio do ora réu, nem pugnaram pela sua extinção cfr. docs. nº 6 e 7, juntos a fls. 200 a 238.
46. Por outro lado, o facto de o autor ser dono de um prédio confinante, que supostamente também poderia permitir o acesso à via pública, já se verificava na data da constituição da servidão de passagem do prédio das autoras.
47. M. S. e E. N. pagaram à Ré P. M. e a M. E. a quantia de Esc. 60.000$00, no ano de 1986, como contrapartida pela aquisição do direito de passagem sobre o prédio delas.
48. O prédio referido 5 supra tem um valor real e de mercado inferior a €10.000,00
49. A constituição de direito de passagem sobre o referido prédio, a favor do prédio do Reconvinte, implica, como consequência directa, a desvalorização do mesmo em valor de cerca de a € 1.000,00.
50. O caminho de passagem de que se pretende a sua extinção, existe na estrema Nascente do prédio das reconvindas, é composto por terra batida, calcado e trilhado, em duro, com feição permanente, perfeitamente visível, com uma largura de cerca de 2,50 metros e comprimento de 24,00 metros, que vai desembocar no prédio do reconvinte (referido em 4 supra)
51. É por esse caminho que se processava e processa o trânsito de pessoas e bens, a pé e com animais, da via pública para o prédio do reconvinte identificado em 4 supra, a qualquer hora do dia ou da noite e em qualquer dia da semana, durante todo o ano.
52. Por si e seus antecessores, desde 08/10/1986 – cfr. referido em 10 supra - que o reconvinte utiliza o leito desse caminho para acesso ao prédio dele identificado 4 dos factos provados, sem qualquer interrupção, à vista, com conhecimento e aceitação de toda a gente, no ânimo de quem exerce um direito próprio e com a convicção e certeza de que, assim actuando, não prejudicava, como efectivamente não prejudica, ninguém.
*
E foram considerados não provados os seguintes factos:

- Que o leito do prédio referido em 5 supra, por ser servido por água de lima, entre Outubro e Maio de cada ano, é encharcado por água, que se espalha e acumula.
- Essa água dificulta o trânsito de pessoas e bens e impossibilita a circulação de tractor.
*
A) A nulidade da sentença
1.
O Apelante começa por arguir a nulidade da sentença por deficiente fundamentação que equipara à falta da mesma. Refere que a sentença recorrida se limitou a debitar generalidades sem concretizar os depoimentos em que se baseou
A apelada P. M. pronunciou-se pela ausência de nulidade.

Vejamos.

Reafirmamos aqui os considerando efectuados no anterior acórdão no que concerne a esta nulidade.

Com efeito, sendo certo que as decisões devem ser fundamentadas (art. 205º nº 1 da C.R.P. e 154º do C.P.C.), que não pode confundir-se a falta absoluta de fundamentação com a fundamentação insuficiente, errada ou medíocre e que apenas a primeira constitui a causa de nulidade prevista na al. b) do nº 1 do artigo 615º do C.P.C., verificamos que, na sentença recorrida, mostram-se enunciados os factos julgados provados e não provados, constam os meios de prova que foram decisivos para a formação da convicção do juiz a quo e foi feita a subsunção jurídica. Acresce que, da mesma resulta que, na sequência do ordenado no anterior acórdão, ter-se verificado um esforço de fundamentação.

Assim, não ocorrendo falta absoluta de factos provados e não provados e/ou de fundamentação de direito, não se mostra verificada a causa de nulidade que o recorrente pretende assacar à decisão recorrida.

“A insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente: afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser alterada ou revogada em recurso, mas não produz a nulidade.” – Ac. do S.T.J. de 28/05/2015 (Granja da Fonseca), in www.dgsi.pt.

2.
O Apelante arguiu igualmente a nulidade da sentença referindo a existência de ambiguidades ao nível da decisão da matéria de facto decorrente de terem sido dados como provados factos contraditórios e não conciliáveis entre si, designadamente a contradição entre o alegado em 15, 16 e 21 e em 36 e 52; entre o alegado em 20 e o referido em 37 a 40; ainda entre o alegado em 39 com o facto não provado onde se lê “que o leito do prédio referido em 5 supra, por ser servido por água de lima, entre Outubro e Maio de cada ano, é encharcado por água, que se espalha e acumula”; entre o alegado em 40 e os factos não provados.
A apelada P. M. pronunciou-se pela ausência de nulidade.

Vejamos.

Reafirmamos que esta nulidade a que se refere a 1ª parte do citado preceito remete para o princípio da coerência lógica da sentença uma vez que entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica, i.e., a decisão proferida não pode seguir um caminho diverso daquele que apontava a linha de raciocínio plasmado nos fundamentos. E a obscuridade e a ambiguidade mencionadas na 2ª parte do referido preceito verificam-se quando alguma passagem da decisão é ininteligível ou quando se preste a mais do que um sentido respectivamente. Neste sentido Ac. do S.T.J. de 02/06/2016 (Fernanda Isabel Pereira), in www.dgsi.pt.
Situação distinta é erro de julgamento (error in judicando), quer quanto à apreciação da matéria de facto, quer quanto à determinação e interpretação da norma jurídica aplicável.

No caso sub judice, o alegado pelo apelante não consubstancia qualquer contradição entre a fundamentação de facto e/ou de direito com a parte decisória da sentença, nem qualquer ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, pelo que não se verifica igualmente a suscitada nulidade.
3.
Refere o apelante que o Tribunal recorrido “à boleia” do suprimento das deficiências apontadas no acórdão desta Relação alterou outros pontos dos factos não elencados naquele acórdão.
Defende que a sentença é nula nos termos do art. 615º d) do C.P.C. uma vez que o juiz conheceu de questões que não podia tomar conhecimento. Refere igualmente que o tribunal recorrido praticou acto não permitido por lei uma vez que se mostrava extinto o poder jurisdicional previsto no art. 613º nº 1 do C.P.C. e deu como provada matéria não alegada violando o art. 5º nº 1 do C.P.C..
A apelada P. M. refere inexistir nulidade.
A nulidade prevista no art. 615º nº 1 d) do C.P.C. apenas ocorre quando não se decide alguma das questões suscitadas pelas partes que não tenha ficado prejudicada pela solução dada a outra ou se conheça de questões de que não se podia tomar conhecimento (art. 608º nº 2 do C.P.C.).

Como se lê no Ac. do S.T.J. de 16/02/2015 (Sousa Peixoto), in www.dgsi.pt “Questões, para o efeito do disposto no nº 2 do art. 660º do C.P.C., não são aqueles argumentos e razões, mas sim e apenas as questões de fundo, isto é, as que integram matéria decisória, os pontos de facto ou de direito relevantes no quadro do litígio, ou seja, os concernantes ao pedido, à causa de pedir e às excepções”.
Afigura-se que as alocuções aditadas à matéria de facto provada não consubstancia excesso de pronúncia na medida em que as mesmas não consubstanciam questões a resolver nos termos do art. 608º nº 2 do C.P.C. Em sede de reapreciação da matéria de facto verificar-se-á se foi extravasado o ordenado por este Tribunal e, na afirmativa, a consequência.

Pelo exposto, temos por não verificada a invocada nulidade.
*
B) Reapreciação da matéria de facto

O Tribunal da 1ª Instância, ao proferir sentença, deve, em sede de fundamentação “(…) declarar quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas de factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência” (art. 607º nº 4 do C.P.C.) e “O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes” (art. 607º nº 5 do C.P.C.).
Sendo certo que o julgador aprecia a prova de acordo com a sua livre convicção, salvo algumas limitações, a análise crítica da prova é da maior importância do ponto de vista da fundamentação de facto da decisão. Com efeito, esta deve ser elaborada por forma a que, através da sua leitura, qualquer pessoa possa perceber quais os concretos meios de prova em que o Tribunal se baseou para considerar determinado facto provado ou não provado e a razão pela qual tais meios de prova foram considerados credíveis e idóneos para sustentar tal facto. Esta justificação terá de obedecer a critérios de racionalidade, de lógica, objectivos e assentes nas regras da experiência.
A exigência de análise crítica da prova nos termos supra referidos permite à parte não convencida quanto à bondade da decisão de facto tomada pelo tribunal da 1ª instância interpor recurso contrapondo os seus argumentos e justificar as razões da sua discordância.
Caso seja requerida a reapreciação da matéria de facto incumbe, desde logo, ao Tribunal da Relação verificar se os ónus previstos no acima art. 640º do C.P.C. se mostram cumpridos, sob pena de rejeição do recurso.
Não havendo motivo de rejeição procede este tribunal à reapreciação da prova nos exactos termos requeridos. Incumbe a este Tribunal controlar a convicção do julgador da primeira instância verificando se esta se mostra contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos e sindicar a formação da sua convicção. i.e., o processo lógico. Assim sendo, nada impede que, fundado no mesmo princípio da livre apreciação da prova, o tribunal superior conclua de forma diversa da do tribunal recorrido, mas para o fazer terá de ter bases sólidas e objectivas.
Tendo por base estas considerações e ouvida a prova produzida vejamos as questões suscitadas pelo apelante.
Antes de mais, importa referir que o tribunal recorrido procedeu satisfatoriamente à fundamentação a que se aludiu no anterior acórdão.

- Ponto 11 dos factos provados

Afigura-se-nos que o assinalado pelo apelante a este propósito é completamente irrelevante. Com efeito, a referência ao ponto 7 visou eventualmente tornar mais clara a afirmação sendo que até é desnecessária por esta não oferecer dúvidas.
Quanto ao mais, do conjunto da prova produzida não subsistem dúvidas que o prédio referido no ponto 4 dos factos provados é um prédio encravado que tinha acesso à via pública pela servidão em causa.

- Ponto 14 dos factos provados

Este facto teve na sua génese os art. 5º da p.i.e 7º da contestação onde se refere que o réu é também dono do prédio referido em 5. Ora, não estando em causa nestes autos a propriedade deste prédio, se é apenas sua ou se é bem comum do casal, afigura-se irrelevante a precisão pretendida.

- Pontos 15 e 16 dos factos provados

Concordamos com o apelante quando refere que da prova produzida não resulta que o réu tenha passado a fazer todas as passagens através do caminho que entretanto abriu no seu prédio correspondente ao art. ... e que tenha deixado de passar na servidão.
Com efeito, a autora E. L. admitiu que o réu, ora passava pela servidão, ora passava pelo caminho que ele abriu noutra sua propriedade aludindo inclusive ao facto de que neste caso o fazer com a máquina enfardadeira. O mesmo foi referido pelas testemunhas M. P., D. S. e F. L..
Assim, há que eliminar estes pontos dos factos provados, os quais passam a integrar os factos não provados.

- Ponto 17 dos factos provados

Afigura-se-nos que o assinalado pelo apelante a este propósito é irrelevante. Com efeito, o aditamento da expressão “quando lá passa” visou tornar mais clara a afirmação que, quando o réu aí passa com tractores ficam visíveis as marcas da passagem. Acresce que se trata de um facto concretizador que pode ser considerado pelo juiz apesar de não ter sido alegado (art. 5º nº 2 b) do C.P.C.). Entendemos que não ocorre uma violação ao ordenado por este Tribunal tanto mais que este assinalou a contradição da anterior redacção com outros factos dados como provados.
Quanto ao mais, do conjunto da prova produzida não subsistem dúvidas que o terreno do prédio correspondente ao art. ... é um terreno com água, menos consistente pelo que necessariamente quando lá passam máquinas ficam marcas de passagem.

- Pontos 20 a 22 dos factos provados

Afigura-se-nos que o tribunal recorrido no ponto 20 1ª parte deu cumprimento à eliminação da assinalada contradição referindo que a passagem no prédio correspondente ao art. ... ocorre para proceder às colheitas e sementeiras ficando, quando isso ocorre, marcas visíveis da passagem das maquinas, sendo este um facto concretizador. A segunda parte deste ponto deve ser eliminada uma vez que “mais cómodo” é uma conclusão que se deve retirar dos factos provados. Acresce que da prova produzida resulta que a razão da passagem pelo prédio correspondente ao art. ... é o facto das máquinas ensiladeira e enfardadeira não conseguirem passar pela servidão (a servidão tem uma largura de 2,5 m e neste sentido as declarações da autora E. L., os depoimentos da testemunha F. P.).

Assim, a redacção do ponto 20 deve passar a ser a seguinte:

“20. A passagem pelo terreno do réu (referido em 5 supra) para aceder ao prédio identificado 4 supra, é em concreto para proceder às colheitas e sementeiras no do seu prédio referido em 4 supra, ficando marcas visíveis.”

De molde a compatibilizar o referido no ponto 21 com o ponto anterior este deve passar a ter a seguinte redacção:

“21. Nos termos referidos o réu utiliza como passagem para o seu prédio rústico identificado em 4 supra o seu próprio prédio rústico identificado em 5 supra, que confronta com aquele pelo lado nascente e também com o das autoras, bem como com a via pública. Vide Doc. 06 junto a fls. 55v.”

No ponto 22 é de eliminar a expressão “com melhor piso” por ser conclusiva e por não corresponder à prova produzida, designadamente a pericial que referiu que, por se tratar de terreno arado e com água, o piso do prédio correspondente ao art. ... é um piso com menos consistência do que o da servidão. Mantém-se as expressões “encurta” e “mais largo” por terem resultando da prova produzida e corresponderem a factos concretizadores de que o julgador pode lançar mão. Assim, este ponto passa a ter a seguinte redacção:

“22. A acessibilidade efectuada pelo réu pelo seu próprio prédio rústico identificado em 5 supra, encurta a distância para a via pública, fica mais largo do que aceder ao seu prédio referido em 4 supra pelo prédio das autoras como se pode ver por meio das fotografias juntas. Vide doc. 07 a 23.”

- Ponto 23 dos factos provados

É de manter este facto uma vez que se apurou que os dois prédios do réu – o referido em 4 e o referido em 5 – têm as mesmas culturas. Apurou que o prédio das autores tem presentemente castanheiros, mas este facto não alude ao prédio destas.

- Ponto 37 dos factos provados

Neste ponto é de eliminar a expressão “porque o réu o cultiva ao mesmo tempo que cultiva o prédio referido em 4 supra (identidade de culturas facto 23.)” uma vez que, além do mais, já resulta do ponto 23 dos factos provados. Acresce que existem outras razões que justificam que inexista no prédio referido em 5 um trilho permanente (a existência de água sendo este um prédio num plano inferior e o facto do réu aí passar com determinadas máquinas em determinadas alturas do ano).

Assim, a redacção deve passar a seguinte:

“37. No prédio referido em 5 supra não se vê qualquer caminho calcado, trilhado, em duro, com feição permanente, de forma a permitir o acesso e trânsito de pessoas e bens ao prédio do réu referido no facto 4 supra.”.

- Ponto 40 dos factos provados

A alteração da redacção introduzida pelo tribunal recorrido é irrelevante, pois a expressão inicial eliminada consta já do ponto 37. Mais entendemos que a noção “acumular” é diferente de “encharcar” referida nos factos não provados, sendo esta mais forte, pelo que apenas se elimina a primeira expressão destes últimos factos.

- Pontos 50 a 52 dos factos provados

Estes factos constavam anteriormente dos factos não provados e concordamos que, em face da prova produzida e com vista a evitar contradições, devem ser considerados provados.
*
Por uma questão metodológica passar-se-á a descrever a matéria de facto apurada de acordo com o decidido nesta instância:

1. As autoras P. M. e E. L. são usufrutuária e proprietária de raiz, respectivamente, do prédio rústico identificado como leira de lavradio com oliveiras, sito no lugar da ..., freguesia de ..., concelho de Ponte de Lima, a confrontar de Norte com José, a Sul com J. V. (actualmente com o réu), a Nascente com Conde de … (actualmente com o réu) e a Poente com A. P., descrito na C.R.Predial de Ponte de Lima sobre o nº ... – freguesia de ... e inscrito na matriz predial rústica respectiva sob o nº ..., identificada no croqui a cor rosa. Vide doc. 01, 02, 03 e 06, juntos a fls. 24 a 26; 39 a 49; 50 a 53; e 55 vº.
2. A autora P. M. adquiriu o prédio rústico supra por escritura de habilitação e partilha por óbito de M. C. e doações e colação lavrada a 23/05/1979, celebrada no Cartório Notarial de Ponte de Lima. Vide doc. 02, junto a fls. 39 a 49.
3. Por escritura de doação outorgada no dia 10/08/2010 no Cartório Notarial de S. A., a autora P. M. doou à autora E. L. o prédio identificado no facto 1 supra, com reserva de usufruto para ela doadora. Vide doc. 1 e 3, juntos a fls. 24 a 26 e 50 a 53.
4. Por sua vez, o réu é proprietário do prédio rústico identificado como leira de lavradio com oliveiras, sita no lugar de ... da freguesia de ..., a confrontar a Norte com M. C. (actualmente com as Autoras), de Sul com João, de Nascente com J. V. (actualmente com o próprio réu) e de Poente com M. C., inscrito na matriz predial rústica sob o nº ..., identificada no croqui a cor verde (Doc. 06), que adquiriu por escritura de doação de M. S. e mulher, lavrada no Cartório Notarial de Ponte de Lima em 16/11/1983. Vide doc. 04 e 06, junto a fls. 54 e 55v.º .
5. Sendo o réu ainda dono e legítimo proprietário do prédio rústico leira de lavradio com Oliveiras, sito no Lugar da ..., a confrontar a Norte caminho público, do nascente com J. J., do Sul com Conde do … e do poente M. C. (actualmente com o próprio réu, art. ...), inscrito na matriz predial respectiva sob o nº ..., identificada no croqui a cor azul (doc. 06). Vide doc. 05 e 06, junto a fls. 55 e 55vº.
6. Por si e por seus ante possuidores, autoras e réu estão na posse dos referidos prédios, que detêm materialmente há mais de 5, 15, 20, 30 e mais anos, zelando pela sua conservação e limpeza, vigiando-os, cultivando-os, neles semeando e colhendo os respectivos frutos e, de um modo geral, deles retirando todas as utilidades que são susceptíveis de produzir ou proporcionar, com conhecimento e aceitação de toda a gente, sem oposição de ninguém, sem qualquer interrupção temporal até ao presente, na fé de exercerem, como direito próprio, todos os poderes inerentes ao direito de propriedade e na convicção de que assim actuando não ofendem o direito de outrem nem prejudicam ninguém.
7. Em 18/02/1985, foi instaurada, pelos pais do ora réu contra a ora autora P. M. e a sua mãe, uma acção especial de arbitramento para expropriação por utilidade particular, na qual foi proferida sentença condenando “os Réus a consentirem que o AA. façam no prédio, referido na al. b) do art. 1.ª da petição inicial, uma servidão de passagem, em favor do prédio referido na alínea a do mesmo artigo 1.º, com o conteúdo, forma, características e tempo de exercício que resultar da fase executiva”. Doc. 3 junto a fls. 138 a 146.
8. O processo seguiu os ulteriores termos e, na fase executiva, os peritos apresentaram laudo escrito onde foram de parecer que a servidão que onera o prédio da ora autora a favor do identificado prédio do ora réu:
a) Terá o seu início no canto Norte Nascente do prédio que é hoje da autora, seguindo pela sua extrema nascente até atingir o prédio dos réus, a Sul;
b) Terá a largura de 2,5m em toda a extensão da referida extrema nascente do dito prédio, largura esta que ficará a contar do tronco das oliveiras que se encontram implantadas na crista do vale da referida extrema do mesmo prédio para o interior deste. Doc. 3 junto a fls. 138 a 146.
9. Os peritos deram parecer também no sentido de que, atentas as culturas praticadas no prédio do réu, a servidão de passagem de carro, gado ou tractor agrícola com ou sem atrelado, deveria ser utilizada para todo o ano, com excepção dos meses de Fevereiro, Agosto e Dezembro e a pé e gado preso durante todo o ano e que a indemnização a atribuir seria no montante de Esc. 60.000,00 (sessenta mil escudos). Doc. 3 junto a fls. 138 a 146.
10. O laudo pericial não teve oposição das partes, pelo que foi homologado por sentença proferida naquele processo em 08/10/1986, transitada em julgado. Doc. 3 junto a fls. 138 a 146.
11. À data referida em 7 supra, o prédio do réu era um prédio encravado que apenas tinha acesso à via pública através da servidão de passagem constituída sobre o prédio que hoje pertence às autoras. (vide doc. junto a fls. 183 a 197).
12. Actualmente o prédio identificado em 4 supra, embora continue a não ter comunicação directa com a via pública, confronta com outro prédio do Réu identificado em 5 supra que tem comunicação directa com a via pública e a partir do qual o réu consegue aceder ao seu prédio. Vide doc. 06 junto a fls. 55v.
13. Tal situação referida em 12 supra, alterou-se em consequência da realização de obras por parte do réu, o qual abriu uma entrada de forma a constituir um acesso/caminho que liga os prédios identificados nos factos 4 e 5 supra, pelo que, a partir desse momento, o réu passou a ter acesso ao prédio dominante através de outro prédio sua propriedade (o referido em 5 supra), o qual confronta com a via pública. Vide doc. 07 a 23, juntos a fls. 24 a 34; 58; 74; 78; 82; 86; 90; 94; e 98.
14. Isto porque, o ora réu é também dono e legitimo proprietário do prédio identificado em 5 supra, pelo qual passou a ter acesso ao prédio identificado em 4 supra. Vide doc. 04, 05, 06, 07 a 23, juntos a fls. 54; 55; 55 vº; 27 a 34; 58; 74; 78; 82; 86; 90; 94; 98.
-
17. Sendo bem visíveis no local, quando o autor por lá passa, a marca da passagem de tractores agrícolas pelo referido acesso que liga os prédios rústicos identificados em 4 e 5 supra que são propriedade do réu. Vide doc. 07 a 23 juntos a fls.. 27 a 34; 58, 74; 78; 82; 86; 90; 94; e 98.
18. Consta da petição inicial elaborada pelo ora réu que deu origem ao Proc. Ordinário n.º 667/10.1TBPTL ao que se refere nos arts. 27º e 28º, que passa transcrever:
“27. Mais recentemente, o autor verificou que, no início do caminho de servidão onde configura uma curva à esquerda, quase em angulo recto, havia dificuldades de manobra devido ao pouco espaço e à oliveira aí existente, que impediam a passagem, ainda que apenas esporádica, de um atrelado.
28. Pelo que para não ter de requerer a ampliação, em largura e nesse ponto do percurso, do caminho de servidão, o réu viu-se obrigado a socorrer-se de uma outra abertura, para este caso especial, que implica o atravessamento de um outro prédio que, pelo Nascente, confronta ambos os prédios descritos no artigo 1º desta petição inicial e por onde passa quando esporadicamente tem que levar o atrelado.” Vide doc. 24 junto a fls. 59
19. Com referência à data da entrada em juízo da citada acção ano 2010, pelo menos há mais de 5 anos que já existe esta abertura no prédio identificado em 4 supra e para aceder a este.
20. A passagem pelo terreno do réu (referido em 5 supra) para aceder ao prédio identificado 4 supra, é em concreto para proceder às colheitas e sementeiras no do seu prédio referido em 4 supra, ficando marcas visíveis.
21. Nos termos referidos o réu utiliza como passagem para o seu prédio rústico identificado em 4 supra o seu próprio prédio rústico identificado em 5 supra, que confronta com aquele pelo lado nascente e também com o das autoras, bem como com a via pública. Vide Doc. 06 junto a fls. 55v.
“22. A acessibilidade efectuada pelo réu pelo seu próprio prédio rústico identificado em 5 supra, encurta a distância para a via pública, fica mais largo do que aceder ao seu prédio referido em 4 supra pelo prédio das autoras como se pode ver por meio das fotografias juntas. Vide doc. 07 a 23.”
23. Ambos os prédios rústicos identificados nos artigos 4º e 5º supra, são terrenos de cultivo/lavradio onde são cultivadas as mesmas culturas durante o ano, conforme se pode verificar nos documento n.º 07 a 23, pois actualmente ambos os prédios estão cultivados com milho. Vide doc. 07 a 23.
24. O prédio identificado em 4 supra foi doado a réu pelos pais dele, M. S. e mulher E. N. por escritura pública de doação outorgada no Cartório Notarial de Ponte de Lima em 16/11/1983, exarada de fls. 15V a fls. 25 do Livro de Escrituras n.º ...-Z, nos termos que constam do documento doc. nº 1 junto a fls. 152 a 178.
25. O prédio identificado no art. 5.º da p.i. foi comprado pelo éu a José e mulher M. G. por escritura pública de venda outorgada em 31/12/73 de Dezembro de 1973, no Cartório Notarial de Ponte de Lima, exarada de fls. 68V a fls. 69V do Livro de Notas para Escrituras Diversas n.º Z-..., nos termos que constam do documento que se junta e se dá aqui por integralmente reproduzido: doc. nº 2 junto a fls. 180 a 182
26. A servidão de passagem referida em 8 foi constituída por sentença, transitada, proferida em 08/10/1986, no âmbito da acção especial de arbitramento para expropriação para utilidade particular que correu termos no então Tribunal Judicial de Ponte de Lima com o n.º 19/1985, nos termos que constam do documento que se junta e se dá aqui por integralmente reproduzido: doc. nº 3 junto a fls. 152 a 178.
27. A servidão de passagem em referência foi constituída na sequência de laudo unânime de peritos, prestado no âmbito da acção judicial acima referida, que concluíram que a melhor forma de exercício desse direito de servidão seria através do prédio das autoras e pelo modo descrito naquele laudo – cfr. doc. n.º 3 junto a fls. 183 a 197.
28. Como resulta do laudo pericial que consta do doc. nº 3 junto a fls. 183 a 197, a servidão de passagem sobre o prédio das autoras tem as seguintes características:
a) início no canto Nascente do prédio das autoras, seguindo pela sua estrema Nascente até atingir o prédio do réu, a Sul.
b) largura de 2,5 m em toda a extensão Nascente do prédio das autoras, a contar do tronco das oliveiras que se encontram implantadas na crista do vale da referida estrema Nascente para o interior do prédio, ou seja, para o lado Poente;
c) atentas as culturas praticadas no prédio do réu (milho, azeite, batata, centeio, hortaliça e pastagens), para uma normal exploração desse prédio com vista à realização daquelas culturas é necessária a servidão de passagem, a pé e com gado preso, de modo permanente, e de carro e gado, tractor agrícola, com ou sem atrelado, e alfaias agrícolas, durante todo o ano, com excepção dos meses de Fevereiro, Agosto e Dezembro.
29. O caminho de servidão acima descrito, junto à estrema do prédio das autoras, para quem vai da via pública para o prédio dominante, tem uma curva à esquerda, em ângulo reto (90 graus),tornejando do sentido Nascente-Poente para o sentido Norte-Sul.
30. Essa curva em ângulo recto dificulta a realização de manobras para acesso ao prédio dominante, com máquina ensiladeira e enfardadeira.
31. A máquina ensiladeira é utilizada nas colheitas, entre Setembro e Outubro de cada ano, e destina-se a colher e desfazer o milho.
32. A máquina enfardadeira é utilizada entre Abril e Maio de cada ano, previamente às sementeiras, e destina-se a enfardar o pasto que cresce entre as colheitas e as sementeiras.
33. Mais recentemente, o réu passou a utilizar as máquinas ensiladeira e enfardadeira, bem como tractor agrícola com atrelado, para exploração do prédio dele identificado no facto 4 supra.
34. Pelo que, e para não ter de requerer a ampliação, em largura e na curva em ângulo recto acima referida, o réu viu-se obrigado a socorrer-se de uma outra abertura a referida em 13 supra em especial para este caso, que implica o atravessamento do prédio dele identificado no facto 5 supra.
35. Essa alternativa é a mais utilizada no período dos meses de Abril ou Maio e Setembro ou Outubro de cada ano, a fim de permitir o enfardamento de palha e o ensilamento e transporte de milho.
36. Em todos os demais períodos do ano e, bem assim, sempre que pretende aceder ao prédio referido em 4 supra a pé, com animais e tractor agrícola, com ou sem atrelado, o Réu serve-se do caminho de servidão constituído sobre o prédio das Autoras
37. No prédio referido em 5 supra não se vê qualquer caminho calcado, trilhado, em duro, com feição permanente de forma a permitir o acesso e trânsito de pessoas e bens ao prédio do réu referido no facto 4 supra.
38. Esse prédio encontra-se num plano inferior, relativamente ao prédio dominante e ao prédio serviente.
39. E é servido por água de rega e por água de lima, proveniente de uma nascente de água de consortes conhecida como Fonte de …, nos seguintes termos:
a) entre Junho e Setembro de cada ano, é servido por água de rega, destinada a regar o milho e demais culturas existentes no referido prédio;
b) Entre Outubro e Maio de cada ano, é servido por água de lima, que é usada para se espalhar e acumular no terreno, para protecção da erva e restante vegetação e, no Inverno, para defesa das plantações contra as geadas.
40. Esse terreno é todo composto por terra mole, destinada a uso agrícola, que não tem consistência e que, sobretudo nos dias de maior pluviosidade e no período de Inverno, acumula água e dificulta a circulação sobre o mesmo, sobretudo de tractor e alfaias agrícolas. 41. Entre os meses de Maio e Setembro de cada ano, a área do prédio identificado em 5 supra encontra-se ocupada, em toda a sua extensão, pelo cultivo de milho.
42. Entre os meses de Setembro e Maio de cada ano, por sua vez, a área do prédio identificado 5 supra encontra-se ocupada, em toda a sua extensão, por erva castelhana semeada pelo réu, com o propósito de fazer fardos e de ter alimentação para os animais.
43. O réu continua a cultivar no prédio identificado em 4 supra de oliveiras para produção de azeite, milho, feijão e batatas e forragens, o que exige a circulação de tractor e alfaias agrícolas durante todo o ano, com excepção dos meses de Fevereiro, Agosto e Dezembro de cada ano.
44. Correu termos no 1º Juízo do então Tribunal Judicial de Ponte de Lima a acção ordinária n.º 667/10.1TBPTL, instaurada pelo ora réu contras a autora P. M. e J. M. cfr. docs. n.º 6 e 7, juntos a fls. 200 a 238.
45. Nessa acção, as aí rés apresentaram contestação mas não se defenderam por excepção, designadamente invocando uma suposta e alegada desnecessidade da servidão de passagem constituída a favor do prédio do ora réu, nem pugnaram pela sua extinção cfr. docs. nº 6 e 7, juntos a fls. 200 a 238.
46. Por outro lado, o facto de o autor ser dono de um prédio confinante, que supostamente também poderia permitir o acesso à via pública, já se verificava na data da constituição da servidão de passagem do prédio das autoras.
47. M. S. e E. N. pagaram à Ré P. M. e a M. E. a quantia de Esc. 60.000$00, no ano de 1986, como contrapartida pela aquisição do direito de passagem sobre o prédio delas.
48. O prédio referido 5 supra tem um valor real e de mercado inferior a €10.000,00
49. A constituição de direito de passagem sobre o referido prédio, a favor do prédio do Reconvinte, implica, como consequência directa, a desvalorização do mesmo em valor de cerca de a € 1.000,00.
50. O caminho de passagem de que se pretende a sua extinção, existe na estrema Nascente do prédio das reconvindas, é composto por terra batida, calcado e trilhado, em duro, com feição permanente, perfeitamente visível, com uma largura de cerca de 2,50 metros e comprimento de 24,00 metros, que vai desembocar no prédio do reconvinte (referido em 4 supra)
51. É por esse caminho que se processava e processa o trânsito de pessoas e bens, a pé e com animais, da via pública para o prédio do reconvinte identificado em 4 supra, a qualquer hora do dia ou da noite e em qualquer dia da semana, durante todo o ano.
52. Por si e seus antecessores, desde 08/10/1986 – cfr. referido em 10 supra - que o reconvinte utiliza o leito desse caminho para acesso ao prédio dele identificado 4 dos factos provados, sem qualquer interrupção, à vista, com conhecimento e aceitação de toda a gente, no ânimo de quem exerce um direito próprio e com a convicção e certeza de que, assim actuando, não prejudicava, como efectivamente não prejudica, ninguém.
*
E foram considerados não provados os seguintes factos:

- Que o leito do prédio referido em 5 supra, por ser servido por água de lima, entre Outubro e Maio de cada ano, é encharcado por água, que se espalha.
- Essa água dificulta o trânsito de pessoas e bens e impossibilita a circulação de tractor.
- E é através do referido prédio rústico artº ..., supra mencionado em 5 supra que o ora réu tem feito todas as passagens para o prédio referido no facto 4.º supra, o qual confronta a nascente com os prédios identificados 1 e 4 supra, e estes a poente com aquele. Vide doc. 06, 07 a 23 junto s a fls. 55.v 27 a 34; 58; 74; 78; 82; 86; 90; 94; e 98
- Deixando de passar pelo caminho de passagem que onera o prédio das ora autoras referido em 8 supra.
*
B) Subsunção jurídica

Defende o apelante que a acção deve ser julgada improcedente, pois não se provou no caso em apreço que a servidão em causa se tenha tornado objectivamente desnecessária nos termos e para os efeitos do disposto no art. 1569º nº 2 do C.C.. Ainda que se entendesse que um caminho alternativo é possível com a feitura de obras as autoras não alegram estes factos, não incumbe ao réu fazê-las e não é exigível que este renuncie a direitos próprios como o aproveitamento da água de lima. Uma vez que, aquando da constituição da servidão por sentença judicial, já o réu era proprietário do prédio correspondente ao art. ..., não se pode com fundamento neste facto declarar extinta a servidão, sob pena de violação da autoridade de caso julgado. Refere ainda que, para a acção produzir o seu efeito útil, o cônjuge do réu devia estar nos autos.
Por outro lado, o pedido reconvencional deve ser julgado procedente quanto aos pedidos b1) e b2).
A apelada pugna pela manutenção da decisão.
Em face da alteração da matéria de facto supra ordenada a subsunção jurídica é distinta daquela efectuada pelo tribunal a quo.

Vejamos.

O art. 1543º do C.C. fornece a noção de servidão predial nos seguintes termos:

Servidão predial é o encargo imposto num prédio em proveito exclusivo de outro prédio pertencente a dono diferente; diz-se serviente o prédio sujeito à servidão e dominante o que dela beneficia.

A servidão é um direito real em virtude do qual é possibilitado ao proprietário de um prédio (prédio dominante) o gozo de certas utilidades do prédio (ius in re aliena) pertencente a dono diferente (prédio serviente). Este proveito ou vantagem de que um prédio beneficia tem de encontrar-se objectivamente ligado a outro prédio, implicando consequentemente uma restrição ou limitação do direito de propriedade do prédio onerado, inibindo o respectivo proprietário de praticar actos que possam perturbar ou impedir o exercício da servidão.

Segundo Menezes Leitão, in Direitos Reais, Almedina, 2009, p. 394 e ss. as servidões prediais possuem as seguintes características:

a) ligação necessária ao prédio por intermédio do qual ela se exerce;
b) atipicidade do seu conteúdo - art. 1544º do C.C.. Por exemplo, servidão de passagem (servitus itineri), de aqueduto (servitus aqueductus), de aproveitamento de águas (servitus aquae haustos), de escoamento, etc.;
c) inseparabilidade (art. 1545º do C.C.);
d) indivisibilidade (art. 1546º do C.C.).

No que concerne ao modo de constituição das servidões dispõe o art. 1547º do C.C.:

1. As servidões prediais podem ser constituídas por contrato, testamento, usucapião ou destinação de pai de família.
2. As servidões legais, na falta de constituição voluntária, podem ser constituídas por sentença judicial ou por decisão administrativa, conforme os casos.

Referindo-se às modalidades ou tipo de servidões escreve José de Oliveira Ascensão, in Direito Civil – Reais, 4ª edição (reimpressão), pág. 251-252, que a expressão servidão legal é utilizada “para designar certas categorias de servidão que podem ser coactivamente impostas. São disso exemplo (…) as servidões de trânsito ou passagem previstas nos art.º 1550º a 1556º” do C.C.. Diz-se que as servidões são legais porque, na falta de constituição voluntária, podem ser constituídas por sentença judicial ou por decisão administrativa, conforme os casos (art.º 1547º/2)”. E “(…) servidão coactiva não é a que foi coactivamente imposta, mas a que o pode ser coactivamente. (…) Se as partes, por contrato, por exemplo, regularem a sua situação, o legislador não deixa de considerar existente uma servidão legal. Este princípio tem a sua consagração legal no art.º 1569º, n.º 3, do Cód. Civil, que dispõe a extinção por desnecessidade das servidões legais, qualquer que tenha sido o título da sua constituição. Com isto se quer dizer que, verificando-se os pressupostos que permitem impor uma servidão legal, a servidão que se constituir se deve sempre considerar legal, mesmo que não tenha sido coactivamente actuada”.

Assim, o critério que diferencia as servidões legais e voluntárias reside apenas na circunstância das primeiras, ao contrário das segundas, poderem ser impostas coactivamente sendo que, caso não o tenham sido por os proprietários do prédio serviente terem consentido voluntariamente na sua sujeição, as mesmas não perdem aquela natureza.
A servidão legal de passagem encontra-se prevista nos art. 1550º a 1556º do C.C..

Nos termos do primeiro preceito Os proprietários de prédios que não tenham comunicação com a via pública, nem condições que permitam estabelecê-la sem excessivo incómodo ou dispêndio, têm a faculdade de exigir a constituição de servidões de passagem sobre os prédios rústicos vizinhos (encrave absoluto) e que De igual faculdade goza o proprietário que tenha comunicação insuficiente com a via pública, por terreno seu ou alheio (encrave realtivo).

Dispõem os art. 1553º e 1554º do C.C. respectivamente que A passagem deve ser concedida através do prédio ou prédios que sofram menor prejuízo, e pelo modo e lugar menos inconveniente para os prédios onerados e Pela constituição da servidão de passagem é devida a indemnização correspondente ao prejuízo sofrido.

Revertendo ao caso em apreço verificamos que, em face do prédio encravado do réu correspondente ao art. ..., por sentença de 08/10/86, foi constituída sobre o prédio das autoras e a favor do prédio do réu uma servidão legal de passagem de pessoas, gado e tractor agrícola com e sem atrelado, com a largura de 2,5 m a contar do tronco das oliveiras que se encontram implantadas na crista do vale da referida extrema do mesmo prédio para o interior deste e com um comprimento de 24 m, com início no canto Norte Nascente do prédio da autora, seguindo pela sua extrema nascente até atingir o prédio dos réus, a sul e com as demais características aí referidas. No âmbito desses autos foi arbitrada uma indemnização por parte do proprietário do prédio dominante ao proprietário do prédio serviente no valor de Esc. 60.000$00.
*
Pretendem as autoras que seja declarada extinta a referida servidão com fundamento na sua desnecessidade.

Quid iuris?

Esta causa de extinção das servidões encontra-se prevista no art. 1569º do C.C..

Dispõe este preceito:

“(…)
2. As servidões constituídas por usucapião serão judicialmente declaradas extintas, a requerimento do proprietário do prédio serviente, desde que se mostrem desnecessárias ao prédio dominante.
3. O disposto no número anterior é aplicável às servidões legais, qualquer que tenha sido o título da sua constituição; tendo havido indemnização, será esta restituída, no todo ou em parte, conforme as circunstâncias.”

Como se lê no Ac. da R.P. de 29/09/2011 (Pinto de Almeida), in www.dgsi.pt: “É essa a finalidade prosseguida pelo artigo 1569, nºs 2 e 3: libertar os prédios onerados de encargos desnecessários que os desvalorizam, sem que, em contrapartida, valorizem o prédio dominante; considera que onde não há necessidade não se justifica o encargo, que, em princípio, é causa de prejuízos para o prédio serviente.”

Esta causa de extinção de servidões teve por fonte o art. 2279º & único do Código de Seabra, aditado pela Reforma de 16/12/1930, que estipulava que As servidões constituídas por prescrição poderão ser judicialmente declaradas extintas, a requerimento do proprietário serviente, desde que se tornem desnecessárias ao prédio dominante, ou por terem cessado as correspondentes necessidades deste prédio, ou por ser impossível já satisfazê-las por via daquelas servidões ou porque o proprietário dominante pode fazê-lo por qualquer outro meio igualmente cómodo.

Cunha Gonçalves, in Tratado de Direito Civil, em comentário ao Código Civil Português, Vol. XII, Coimbra Editora, 1937, p. 35-36. elencava três situações que poderiam dar azo à desnecessidade das servidões:

“a) Reunião do prédio encravado a outro prédio que tem comunicação com a via pública, quer o dono deste adquira aquele, quer se verifique a inversa;
b) Abertura de uma estrada nova, que atinge o prédio encravado, pois deste modo opera-se a desencravação, tornando-se injusta a passagem forçada através do prédio serviente (…);
c) Transformação do prédio encravado, de sorte que ao seu dono seja possível alcançar a mesma via pública, contanto que esta comunicação não seja menos cómoda do que a servidão, isto é, que aquela comunicação sirva para uso idêntico ao da servidão. Por ex., se a servidão for a pé e de carro e a nova comunicação pelo terreno do prédio encravado só for possível a pé, aquela servidão não poderá cessar”.

Apesar do art. 1569º do actual C.C. não enumerar situações em que a servidão se tornou desnecessária o conceito de desnecessidade mantém-se o mesmo pelo que continua actual o estudo de Oliveira Ascensão denominado “Desnecessidade e Extinção de Direitos Reais”, publicado na Separata da Revista da F.D.L., Ano 1964, onde se lê: “a desnecessidade tem de ser objectiva, típica e exclusiva da servidão, não se confundindo com a desnecessidade subjectiva, que assentaria na ausência de interesse, vantagem ou conveniência pessoal do titular do direito. A servidão assenta numa relação predial estabelecida de maneira que a valia do prédio aumenta, graças a uma utilização "latu sensu" de prédio alheio. Quando essa utilização de nada aproveite ao prédio dominante surge-nos a figura da desnecessidade” (p. 10). E “a desnecessidade, que em matéria de servidão se considera, supõe uma mudança na situação, não no prédio onerado ou serviente, mas do prédio dominante. Por virtude de certas alterações neste sobrevindas, aquela utilização, sempre possível, do prédio serviente, perdeu utilidade para o prédio dominante.” (p. 12).
Assim, parte da jurisprudência, cremos que maioritária, defende que a desnecessidade tem que corresponder a uma mudança objectiva no prédio dominante, através da qual a servidão deixou de revestir qualquer utilidade para o mesmo, a qual necessariamente tem que ser superveniente em relação à sua constituição.

Neste sentido vide, entre outros, Ac. do S.T.J. de 11/12/2012 (Moreira Alves), in www.dgsi.pt onde se lê: “Quando se trate de extinguir uma servidão por desnecessidade, nos termos do art. 1569.º, n.º 2, do CC, deve atender-se, apenas, à desnecessidade objectiva, referente ao prédio dominante, em si mesmo considerado, o que significa que a extinção com o fundamento na desnecessidade da servidão tem de resultar de alterações objectivas, típicas e exclusivas, verificadas no prédio dominante.” (sublinhado nosso) e “A apreciação da utilidade ou desnecessidade da servidão deve ser objecto de um juízo de actualidade, no sentido de que há-de ser apreciada pelo tribunal, atendendo à situação presente, ou seja, atendendo à situação que se verifica na data em que a acção é proposta.” (sublinhado nosso).

Contudo, há igualmente na jurisprudência quem defenda que a desnecessidade não equivale a não utilidade ou proveito e que mesma não tem que ser superveniente sendo que o legislador pretendeu uma ponderação actualizada da necessidade de manter o encargo sobre o prédio a cargo do julgador segundo um juízo de proporcionalidade face aos interesses em jogo. Subscrevemos esta tese atenta a solidez dos seus argumentos.

Neste sentido lê-se no Ac. da R.C. de 13/05/2014 (Barateiro Martins), in www.dgsi.pt:

Juízo de proporcionalidade que deve ser encontrado na ponderação das circunstâncias concretas de cada caso; na existência de alternativa que, sem ou com um mínimo de prejuízo para o prédio dominante, permite eliminar o encargo incidente sobre o prédio serviente, uma vez que, v.g., está garantida uma acessibilidade, em termos de comodidade e regularidade, ao prédio dominante, sem onerar, desnecessariamente, o prédio serviente.” (sublinhado nosso).
“(…) a “desnecessidade originária” (que conduz à nulidade do acto constitutivo da servidão por violação do princípio da tipicidade) não pode ter o mesmo recorte conceitual da “desnecessidade”, como causa de extinção das servidões, prevista no art. 1569.º/2 do C. Civil; aquela tem que ser mais severa e exigente e exprimir uma ideia de total e absoluta inutilidade e esta, sim, “contentar-se” e “ficar-se” por uma ideia de dispensabilidade.

Por outras palavras, se se pode constituir por usucapião um caminho/servidão que não é totalmente necessário e imprescindível ao prédio dominante, não se deve depois exigir, na apreciação da sua extinção, a sua total inutilidade; e muito menos circunscrevê-la à que for superveniente (à constituição da servidão), pois que, naturalmente, se “ab initio” não é totalmente necessário, será sempre difícil divisar e destrinçar a parte da desnecessidade que resulta e é reportável ao seu recrudescimento superveniente.
É justamente por tudo isto que não aderimos à tese da desnecessidade da servidão ter forçosamente de radicar numa alteração objectiva verificada em relação ao prédio dominante após a constituição da servidão e de molde a retirar-lhe toda a utilidade.
Embora uma servidão traga proveito ao prédio dominante – é este o seu requisito existencial – esse proveito pode não se justificar face à dimensão do encargo que resulta para o prédio serviente e à utilidade/proveito que proporciona ao prédio dominante
E, nesta hipótese, quando alguém adquiriu, por usucapião, um direito de servidão sobre outro prédio em que a sua utilidade não justifique esse encargo, deve ser concedido, ao proprietário do prédio onerado, o direito de requerer a extinção de tal encargo, por desnecessidade deste; desnecessidade, como fundamento da extinção da servidão, que deve assim aferir-se em relação ao momento da introdução da acção em juízo (ao momento do exercício do direito potestativo extintivo).
(…) não basta (para a extinção da servidão por desnecessidade) que, para além da passagem objecto da servidão, exista outra via de acesso do prédio dominante para a via pública, porquanto é necessário que este outro acesso ofereça condições de utilização similares, ou, pelo menos, não desproporcionalmente, agravadas.”
No sentido vide, entre outros, Ac. R.C.de 20/10/2017 (Maria João Areias), in www.dgsi.pt.
Por fim, importa referir que incumbe a quem requer a extinção da servidão o ónus de alegar e provar os factos que conduzem a sua desnecessidade, podendo esta passar pela viabilidade de eventuais obras destinadas, por ex., a dotar o prédio dominante de acesso directo à via pública, obras essas a suportar por ele.
Revertendo ao caso em apreço verificamos que, devido ao facto do réu ter passado a utilizar máquinas ensiladeira e enfardadeira e tractor agrícola com atrelado no prédio serviente, e estes não passarem com facilidade na servidão devido ao facto desta ter uma curva em ângulo recto, aquele, para não requerer a ampliação em largura da servidão, abriu um caminho no seu outro prédio correspondente ao art. ... que utiliza principalmente nos meses de Abril ou Maio e Setembro ou Outubro, sendo que nos outros meses serve-se da servidão. Por esta razão, neste seu outro prédio não existem marcas correspondentes a um caminho calcado, trilhado, duro e com feição permanente, contrariamente às marcas correspondentes à servidão.

Ora, o prédio dominante continua encravado tendo necessidade de acesso à via pública. Não se pode dizer que o caminho aberto, ainda que mais curto e mais largo, constitua uma alternativa à servidão uma vez que o mesmo não consubstancia uma alteração permanente dado que apenas é utilizado cerca de dois meses por ano com a passagem de máquinas e tractor com atrelado. Acresce que, atentas as características do prédio no qual o caminho foi aberto – terra arada e sem consistência, num piso inferior ao prédio dominante e que acumula água – é difícil a circulação de tais máquinas e tractor nos demais meses do ano. Assim, de modo algum, se pode concluir que este acesso não causa ou causa pouco prejuízo para o prédio dominante, que garanta um acesso cómodo e regular e em condições similares ou não desprorporcionalmente agravadas por comparação com o acesso pela servidão, bem pelo contrário.

A servidão, além de continuar a ser útil e proveitosa para o prédio dominante, continua a mostrar-se objectivamente necessária e não dispensável, além de que não onera em demasia o prédio serviente.
No caso em apreço, as requerentes não alegaram sequer a possibilidade de quaisquer obras, nem se disponibilizaram a pagá-las, sendo que estas teriam que verificar-se no prédio dominante, e não num prédio terceiro, propriedade ou não do mesmo dono, o qual tem o direito a não renunciar, total ou parcialmente, às utilidades que este prédio lhe dá.

Face à não verificação desta causa de extinção de servidão fica prejudicado o conhecimento da eventual violação da autoridade de caso julgado, bem como da legitimidade processual e substantiva (sendo, aliás, esta uma questão nova não susceptível de ser objecto deste recurso).

Pelo exposto, julgar a acção improcedente, por não provada.
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Da prova produzida resulta apenas a constituição da servidão por decisão judicial de 08/10/1986 e não por usucapião.

Com efeito, da matéria de facto não constam factos de onde se retire a posse por parte do réu no que diz respeito à servidão - o exercício do poder de facto sobre a coisa, onde se incluem factos que permitem caracterizar a posse como pública e pacífica; a existência de sinais visíveis e permanentes, quer no prédio dominante, quer no prédio serviente e intenção do detentor se comportar como titular do direito real correspondente aos actos praticados - não obstante esta matéria haver sido alegada por este no art. 59º da contestação (o facto constante no ponto 6 dos factos provados reporta-se apenas aos prédios). Acresce que o réu não se insurgiu quanto a esta omissão na presente apelação.

Assim sendo, impõe-se julgar a reconvenção totalmente improcedente, por não provada, e absolver as autoras do pedido.
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Sumário – 663º nº 7 do C.P.C.:

I - A servidão é um direito real em virtude do qual é possibilitado ao proprietário de um prédio (prédio dominante) o gozo de certas utilidades do prédio pertencente a dono diferente (prédio serviente).
II - A desnecessidade, enquanto causa de extinção de servidão, não equivale a não utilidade ou proveito, mas à ideia de dispensabilidade, e a mesma não tem necessariamente que ser superveniente.
III – A desnecessidade da servidão deve ser objecto de um juízo de actualidade (apreciada pelo tribunal, atendendo à situação que se verifica na data em que a acção é proposta) e de proporcionalidade subjacente aos interesses em jogo.
IV – Para a extinção da servidão por desnecessidade não basta que, exista outra via de acesso do prédio dominante para a via pública, sendo necessário que este outro acesso ofereça condições de utilização similares, ou, pelo menos, não desproporcionalmente, agravadas.
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III – Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e revogam parcialmente a decisão recorrida nos seguintes termos:

Julgam a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, mantendo a condenação do réu a reconhecer que as autoras são respectivamente usufrutuária e proprietária do prédio rústico inscrito na matriz rústica da freguesia de ... sob o art. ... e descrito na C.R. Predial de Ponte de Lima, freguesia de ..., com o nº .../20101123, e absolvendo o réu dos demais pedidos;
E julgando improcedente, por não provada, a reconvenção, absolvendo as autoras do pedido.
Custas da apelação e da acção na proporção do decaimento.
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Guimarães, 19/09/2018

Relatora: Margarida Almeida Fernandes
Adjuntos: Margarida Sousa
Afonso Cabral de Andrade