Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1242/09.9TJVNF-B.G1
Relator: ANA CRISTINA DUARTE
Descritores: ACÇÃO DE DIVISÃO DE COISA COMUM
RECONVENÇÃO
PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO
INTERVENÇÃO PRINCIPAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/25/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1 - Na ação de divisão de coisa comum, se for deduzida reconvenção em que o demandado formule pedido de indemnização por benfeitorias feitas no prédio dividendo, deverá a reconvenção ser admitida, ao abrigo do disposto nos artigos 266º, n.º 3 e 37º, n.ºs 2 e 3 do Código de Processo Civil, ordenando-se, em consequência, que o processo siga os termos, subsequentes à contestação, do processo comum.
2 - Tal está ao alcance do juiz, incumbindo-lhe adaptar o processo, ao abrigo dos princípios da gestão processual e adequação formal – artigos 6.º e 547.º do CPC – considerando, além do mais, que o processo especial de divisão de coisa comum comporta, ele mesmo, a possibilidade, na sua fase não executiva, de se seguirem os termos do processo comum.
3 – O interveniente principal, se intervier em prazo igual ao fixado para a contestação na forma processual em causa, pode oferecer articulado próprio (petição ou contestação), seguindo-se entre as partes os demais articulados admissíveis.
Decisão Texto Integral:
TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES


22

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I.RELATÓRIO
D intentouação especial de divisão de coisa comum contra M e O.
Na contestaçãoos réus suscitaram, para além de outras questões, entretanto já dirimidas, a questão da ilegitimidade passiva da ré por preterição de litisconsórcio necessário, tendo a autora, a convite do tribunal, que reconheceu aquela ilegitimidade, requerido a intervenção principal provocada do marido da ré, o que foi deferido, tendo sido ordenada a sua citação.

O chamado apresentou contestação, tendo formulado pedido reconvencional no sentido de obter o reconhecimento da validade de um contrato de arrendamento rural, o reconhecimento de que realizou obras e benfeitorias nos prédios descritos na petição inicial sob as alíneas a) e e), bem como o pagamento dos valores correspondentes.
Replicou a autora para concluir pela inadmissibilidade da contestação e da reconvenção.


Foi proferido despacho do seguinte teor:
“Como bem refere a autora, sendo a intervenção posterior aos articulados – como no caso sucede – não é admissível a formulação de pretensão autónoma (cfr. art. 319.º, n.º 4 do CPC).
Para além disso, vista a reconvenção formulada e o que prevê o art. 266.º, n.º 2 do CPC, constata-se que a pretensão formulada não seria, em termos reconvencionais, admissível, o que, considerando o objeto da ação fácil se tornaria de concluir.
Indefere-se, pois, sem necessidade de ulteriores considerações, à reconvenção oferecida.
Custas do incidente pelo chamado, fixando-se a taxa de justiça em 1 Uc.
Notifique”.

Deste despacho recorre o chamado, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes
Conclusões:
1 - As partes foram notificadas do despacho, em cumprimento do mesmo, na data de 17.03.2016, com a referência 145931592, e o requerido e admitido a intervir como parte principal, A, com assunto de citação por carta registada com AR na mesma data, com a referência …, para, no prazo de 30 dias, oferecer o seu articulado ou fazer declaração de que faz seus os articulados da parte a que se associa, considerando-se a citação efetuada no dia da assinatura do AR, o prazo é contínuo suspendendo-se, no entanto, nas férias judiciais, que no caso de pessoa singular, quando a assinatura do Aviso de Receção não tenha sido feita pelo próprio, acrescerá dilação de cinco dias e terminando o prazo em dia que os tribunais estiveram encerrados, transfere-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte.
2 - Entretanto, o requerido admitido e aqui recorrente foi citado no dia 21/03/2016, conforme se verifica da Citação – Notificação via Postal, na pessoa de O, que apôs a sua assinatura no aviso de receção, razão pela qual o mesmo e nos termos do disposto do artº 233º, do NCPC, no dia 24/03/2016, através da referência …, foi, novamente, notificado de que ficava citado na pessoa e na data da assinatura do Aviso de Receção e para no prazo de 30 dias oferecer o seu articulado ou fazer a declaração de que fazia seus os articulados da parte que se associa, sendo que ao prazo de 30 dias acresce a dilação de cinco dias por a citação não ter sido efetuada na sua pessoa, bem como o prazo é contínuo suspendendo-se, no entanto, nas férias judiciais, tudo conforme melhor se verifica dos documentos juntos ao processo e os seus conteúdos aqui se dão integralmente por reproduzidos para os devidos efeitos legais.
3 - Ora, face ao exposto e nos termos legais, o aqui recorrente tinha o prazo de 35 dias para apresentar o seu articulado. No entanto, a citação apresentada no dia 21 de março de 2016 foi-o em período de férias judiciais, que no corrente ano ocorreram do dia 19 ao 28 de março, ou seja, do domingo de ramos a segunda-feira de Páscoa, segundo dispõe o artigo 28º, da Lei Nº 62/2013, de 28 de agosto, sendo que, nos termos do disposto no nº1, do artº 138º, do NCPC, o prazo processual, estabelecido por lei, ou fixado, por despacho do juiz, é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de atos a praticar em processos que a lei considere urgentes, regra esta da continuidade que não é absoluta na medida em que a lei prevê a suspensão nas férias judiciais, o que acontecerá quando o prazo for inferior a seis meses e não se trate de processos urgentes.
4 - Assim, dado que o recorrente foi citado em dia cujo o prazo estava suspenso, por se tratar de dia de férias judiciais, a citação considera-se efetuada no primeiro dia útil à suspensão que é o dia 29 de março de 2016, dia, inclusive, a partir do qual se inicia o prazo para o recorrente (tem 35 dias, 5 da dilação mais 30) apresentar o seu articulado, prazo dentro do qual o veio a fazer, ou seja, apresentando-o no dia 27 de abril do corrente ano, portanto ao trigésimo dia, sendo que ainda tinha mais cinco para apresentar o seu articulado, além do prazo estipulado na al.c), do nº 5, do artº 139º, do NCPC, pelo que o prazo para apresentar o seu articulado terminaria no dia 05/05/2016, pese os 3 últimos dias estarem sujeitos aos acréscimos legais.
5 - Perante tudo o exposto, o recorrente apresentou o seu articulado dentro do prazo legal, pelo que a sua apresentação foi tempestiva e veio a apresentar o seu articulado nos termos que melhor se verifica da sua contestação (Ref.3629589) e não declarou que faz seus os articulados da ré, dentro do prazo igual do facultado para a contestação – nº3, do art. 319º, do NCPC.
6 - De seguida, no douto despacho em crise, pela Meritíssima Juíza a quo é decretado “ Como bem refere a A., sendo a intervenção posterior aos articulados - como no caso sucede – não é admissível a formulação autónoma (cfr. Art. 319º, nº 4, do Cód. Proc. Civil). - “
7 - Ora, este despacho enferma de vários equívocos. Por um lado, em parte alguma da réplica se afigura que a recorrida tenha afirmado que a intervenção é posterior aos articulados, já que apenas refere a data do despacho e que o recorrente foi citado nessa data, sem contabilizar quaisquer prazos para a sua intervenção e diz, sem qualquer fundamento “... que já havia passado o prazo para apresentação da contestação”, pelo que “ao chamado apenas cabia a faculdade de aceitar os articulados da parte a que se associa”, o mesmo será dizer que ao recorrente fica-lhe coartado o direito de apresentar o seu articulado, como o fez em tempo oportuno. Por outro lado, e consequentemente, afirma a Meritíssima Juíza que “... - não é admissível a formulação de pretensão autónoma (cfr. Art. 319º, nº4, do Cód. Proc. Civil).- “, mas sem qualquer razão plausível e justificativa de direito, antes pelo contrário, afigura-se haver uma interpretação errada do que estipula os nºs 3 e 4, do citado artº 319º do NCPC, sendo que o nº 3 diz que o citado pode oferecer o seu articulado, dentro de prazo igual ao que foi facultado para a contestação, seguindo-se entre as partes os demais articulados. Ora, o prazo para apresentação da contestação no presente foi de 30 dias, pelo que o chamado também tem 30 dias para apresentar o seu articulado e, caso o não faça, então, e se intervier no processo passado o prazo, é que tem de aceitar os articulados da parte a que se associa e todos os atos e termos já processados.
8 - A intervenção do recorrente não foi posterior aos articulados, o que o artº 319º, nº 3, do NCPC diz é que é concedido ao interveniente/chamado um prazo igual ao da contestação, dentro do qual este pode oferecer o seu articulado ou, em alternativa, declarar que faz seus os articulados da parte a que se associa, ou seja a lei não diz que o chamado intervém no prazo da contestação.
9 - Consequentemente, o chamado dispõe de um prazo próprio na vigência do qual poderáacertar a sua estratégia processual, em que, ou contesta de mote próprio ou adere à posição da partea que se associa.
10 - É comummente reconhecido que é na contestação ou na réplica que as partes primitivasacionam os incidentes de intervenção, conforme prevê o artº 318º do citado código – e não fariasentido o legislador exigir que o interveniente tomasse parte na lide antes de ter ocorrido o prazo dacontestação.
11 - No entanto, a lei é explicita, clara e expressamente refere que o interveniente pode fazerseus os articulados, diga-se do A. ou do R., consoante à parte a quem se associa, o que significa,como é usual, que a sua intervenção tem lugar quando já foram apresentadas a petição e acontestação.
12 - A oportunidade do demandante conferida pelo artº 318º, nº1, al.a) e b) expressamenterefere, “... até ao termo da fase dos articulados” e ainda a al.a) “... sem prejuízo do disposto no artº261º”, até ao trânsito em julgado da decisão que julgue a ilegitimidade de alguma das partes por nãoestar em juízo determinada pessoa, pode o autor ou o reconvinte chamar essa pessoa a intervir, oque quer dizer que a todo o tempo pode haver intervenção provocada.
13 - De onde se afere que o tribunal a quo interpretou e aplicou mal o nº 4, do artº 319º, doNCPC, que sancionou o interveniente ao não admitir o seu articulado, que foi dentro do prazo e éadmissível a sua pretensão, sob pena de ser prejudicado em comparação dos chamados que, dentrodo prazo legal, não apresentam a sua pretensão autónoma, sendo sancionados pela lei que têm queaceitar os apresentados da parte a quem se associam.
14 - O despacho em crise, a manter-se gerará nulidade de todos os atos processuaissubsequentes, nos termos do artº 195º, do NCPC, dado que pode influir na decisão da causa, vistoque impede que o recorrente se posicione proporcionalmente, invocando e provando factos quedizem respeito a todos os intervenientes processuais.
15 - O recorrente após citação para o presente, associado à requerida Olívia sua mulher,apresentou o seu articulado nos termos previstos no disposto no nº3, do artº 319º, do NCPC,apresentando pedido reconvencional contra a requerente D, O, na qualidade de interessada e herdeira e cessionária da herança ilíquida e indivisaaberta por óbito de sua mãe, A e a O e o habilitado no presente, J, ambos na qualidade de interessados e herdeiros da herança, ilíquida e indivisaaberta por óbito do então requerido seu pai, M, daí a legitimidade de todospara o pedido reconvencional, a primeira na qualidade de comproprietária na proporção de 5/12 dosprédios dados à divisão e os restantes na qualidade de interessados e cessionária das herançasilíquidas e indivisas abertas por óbito de A e M, aquem pertencem os restantes 7/12 indivisos dos mesmos prédios.
16 - O pedido reconvencional foi efetuado por benfeitorias devidamente autorizadas pelaproprietária do usufruto, D e pelos proprietários da raiz, D e Me mulher A, respetivamente, conformemelhor se verifica do doc. Nº 1, junto ao requerimento do recorrente, a coberto de um Contrato deArrendamento Rural, contrato que, por sua vez, foi objeto de aditamento com a ocorrência do óbito
da outorgante A.
17 - Assim, e conforme se verifica do doc. Nº 2 junto ao citado articulado do recorrente, areferida D, o M, no estado de viúvo, a no presenterequerente D, o no presente habilitado J e a então suamulher R, outorgaram Aditamento de Contrato de Arrendamento com orecorrente A e a requerida sua mulher O em quereconhecem que este Aditamento faz parte do citado doc. Nº 1, ou seja, do Contrato deArrendamento Rural, celebrado em 1 de março de 1987 e que o seu conteúdo corresponde às suaslivres e espontâneas vontades, pelo que o vão assinar, reconhecendo que a benfeitoria autorizada daterraplanagem da Bouça da Água, já foi efetuada pelo valor de três milhões e setecentos milescudos e visto que a benfeitoria realizada elevou substancialmente o valor real do prédio, aoinquilino atribuem o direito, pelo que reconhecem, o poder de exigir dos seus proprietários a títulode indemnização aquela quantia, acrescida dos valores a apurar segundo o coeficiente do índice deinflação fornecido pelo Instituto Nacional de Estatística e, bem assim, que as dependênciasagrícolas no terreno anexo à casa de habitação, que também já foram executadas, encontram-se emfase de conclusão de pequenas obras.
18 - O requerente é casado com a requerida O, com quem seassocia após chamamento e as obras foram realizadas com os proveitos e no interesse de ambos,razão pela qual a Olívia assinou o referido Aditamento, além do que esta há data já interveio naqualidade de herdeira e interessada na herança de sua mãe A.
19 -Além do que foram também realizadas as obras pelo recorrente e admitidas na qualidadede casado com a O, as benfeitorias no prédio de habitação objeto de divisão, afim de este poderser habitado e que melhor se descrimina no articulado 18 do seu requerimento de contestação.
20 - Assim, o recorrente pede no seu articulado que a requerente D,na qualidade de comproprietária de 5/12 indivisos seja condenada a pagar-lhe a quantia de €18.003,20 pela benfeitoria realizada na Bouça da Água, bem como a quantia correspondente a 5/12do valor que vier a apurar-se em peritagem pericial quanto às demais benfeitorias que melhor seencontram mencionadas no seu articulado.
21 - Foi proferido despacho, em 29-09-2016 (Ref. 149269508), que indeferiu a reconvençãooferecida, com o teor seguinte: “Para além disso, vista a reconvenção formulada e o que prevê oartº266º, nº2, do Cód. Proc. Civil, constata-se que a pretensão não seria nos termos reconvencionais,admissível, o que, considerando o objeto da ação fácil se tornaria de concluir”.
22 - Bem como a requerida O e o J, a primeirana qualidade de interessada e herdeira e cessionária da herança ilíquida e indivisa aberta por óbitode sua mãe, A e a mesma O e o habilitado J, ambosna qualidade de interessados e herdeiros da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de seu pai,M, herança às quais pertencem os restantes 7/12 indivisos, serem condenadosa pagar a quantia de € 25.204,47 referente a 7/12 do valor da benfeitoria na Bouça da Água, bemcomo a quantia correspondente a 7/12 do valor que se vier a apurar em peritagem pericial quanto atodas as demais benfeitorias, melhor identificadas nos seus articulados.
23 - Embora não seja devidamente fundamentado o conteúdo do despacho, o que aMeritissíma Juiza do Tribunal a quo pretende dizer é que o pedido feito pelo recorrente, referente aocusto das benfeitorias realizadas em dois prédios dividendos não é admissível em termosreconvencionais, por não se enquadrar no previsto no nº2, do artº 266º, do NCPC, e que, ainda,dado o objeto da ação por se tratar de uma ação com processo especial, que segue regras próprias,não se encontra prevista a possibilidade de dedução de reconvenção (artº 925º e seguintes doNCPC). No entanto e com devido respeito, não é essa a interpretação que o requerente faz da lei e aque melhor se adequa ao seu espírito e à justa composição do litígio entre as partes, pelo que, apesarde formas diferentes de processos, o juiz pode autorizar a reconvenção, já que as formas doprocesso não são manifestamente incompatíveis e há um interesse relevante, na apreciação conjuntadas pretensões, evitando futuros litígios entre as partes.
24 - Assim, os valores que o recorrente em reconvenção reclama dos requeridos sãoreferentes a benfeitorias que realizou em dois prédios dividendos, os quais, conforme se verifica doprocesso, são indivisíveis por natureza. Benfeitorias que foram realizadas pelo recorrente, naqualidade de casado com a requerida O, esta na qualidade de interessada nas referidas herançasda A e do M, benfeitorias que foram custeadas por proveitos de ambos, sendo umasdevidamente autorizadas e já reconhecidos os seus valores, a coberto dos citados contratos e outras,por necessárias e úteis no prédio de habitação objeto de divisão, afim de que o mesmo pudesse serhabitado pelo recorrente, sua mulher, a requerente D e o requerido M. Entretanto, os referidos contratos foram oportunamente denunciados e sendo osdois prédios onde foram efetuadas as benfeitorias indivisíveis, com a adjudicação ou a venda e, emespecial nesta, a lei não faculta ao requerente outro meio de ser indemnizado ou restituído, além deque os prédios encontram-se sobre avaliados com as benfeitorias que nos mesmos foram realizadas,por incorporadas.
25 - O facto de se estar perante um processo especial não é fundamento bastante para obstarà admissão da reconvenção, já que, se o processo de divisão de coisa comum tem regras próprias nasua tramitação, não deixa de estar sujeito às demais regras e normas gerais e comuns do processocivil.
26 - A satisfação do dever de gestão processual destina-se a garantir uma mais eficiente eeficaz tramitação da causa, a satisfação do fim do ato processual ou do processo e consiste no poderdever do juiz de praticar e ordenar todos os atos necessários à justa, célere e económica resoluçãodo litígio. Pelo que, o dever de gestão processual implica a possibilidade de desvios ao formatolegal, onde ele for necessário à justa composição da causa, pois, atualmente, não assenta nastradicionais e até rígidas formas processuais para poderem ser mudadas segundo o critério do juiz,dentro de legalmente previsto.
27 - Dispõe o artº 267º, nº1, do NCPC, que o juiz deve providenciar, em regra e mesmooficiosamente, pela agregação ou cumulação de processos, de modo a possibilitar a instrução ediscussão conjuntas, com evidentes ganhos de economia processual.
28 - O NCPC reforçou os poderes de direção, agilização, adequação e gestão processual aojuiz, afim de que atividade processual seja orientada para obter decisões que privilegiem o méritoou a substancia sobre a forma, com nítido objetivo de que a resolução de questões de fundo nãodevem ser prejudicadas por aspetos formais.
29 - O princípio da adequação formal exarado no artigo 547º do NCPC deve permitir aprática dos atos que melhor se ajustem aos fins do processo, quando a tramitação processualprevista na lei não se adeque às especificidades da causa ou não seja a mais eficiente, manifestando se na possibilidade do juiz adaptar a tramitação normal prevista na lei ao caso concreto,consubstanciando-se o dever de adequação formal na cumulação de objetos.
30 - O princípio da economia processual determina que na resolução da maior quantidadepossível de litígios seja efetuada com o mesmo processo, assim evitando o número de processos,custos mínimos e evitando-se eventuais futuras litigâncias.
31 - O regime jurídico da ação divisão de coisa comum está previsto no artº 925º e seguintesdo NCPC e nada se determina que obste ou impeça a admissibilidade de dedução de reconvenção.
32 - O artº 926º, nº 2 e 3 e seguintes do citado diploma dispõe que, se houver contestação oua revelia não for operante, o juiz, produzidas as provas necessárias, profere logo decisão sobre asquestões suscitadas pelo pedido de divisão, aplicando-se o disposto nos artºs 294º e 295º. Se o juizverificar que a questão pode ser sumariamente decidida, mandará seguir os termos subsequentes àcontestação do processo comum. Assim, do estipulado legalmente, a ação começa por seguir ostermos aplicáveis aos incidentes da instância e só assim não seguirá se o juiz não pudersumariamente decidir, sendo que então mandará seguir os termos subsequentes à contestação doprocesso comum.
33 - Dispõe o artº 266º, nº 3, do NCPC: “ Não é admissível a reconvenção, quando o pedidodo réu corresponde uma forma de processo diferente da que corresponde ao pedido do autor, salvose o juiz o autorizar, nos termos do nº 2 e 3, do artº 37º, com as necessárias adaptações”, preceitosque permitem ao juiz admitir a reconvenção, apesar de aos pedidos corresponderem formas deprocessos diferentes, não seguirem tramitação manifestamente incompatível, sempre que hajainteresse relevante ou quando a apreciação conjunta das pretensões seja indispensável para a justacomposição do litígio, incumbido ao juiz, quando admitida a reconvenção, adaptar o processo àcumulação autorizada.
34 - Conforme doutamente decidido por vária jurisprudência e por esse Venerando TribunalAC RG de 25/09/2014, Proc. 260/12.4TBMNC- A – G1, os princípios de gestão processual e daadequação formal, supra referidos, impõem a admissibilidade da reconvenção apresentada pelorecorrente, pelo interesse que há em discutir e decidir todas as questões que envolvam os doisreferidos prédios dividendos que, para além da decisão quanto à sua divisão, importa apreciar odireito por benfeitorias invocado pelo chamado, associado a uma interessada comproprietária,evitando, assim, que seja compelido a intentar outra ação para ver o seu direito reconhecido, peloque, após admissão da reconvenção deverá o processo seguir os seus termos, subsequentes àcontestação, do processo comum.
35 - Os princípios subjacentes aos poderes deveres de gestão e adequação processualatribuída ao juiz impõe que, se for deduzida reconvenção em que o demandado associado formulapedido de indemnização por benfeitorias feitas nos prédios dividendos, deverá a reconvenção seradmitida, ao abrigo do disposto nos artºs 266º, nº3 e 37º, nºs 2 e 3 do citado código ordenando-se,em consequência que o processo siga os termos subsequentes à contestação, do processo comum,como supra referido.
36 - A Meritíssima Juiza a quo, entretanto, no seu despacho não se pronunciou sobre ofundamento legal do pedido reconvencional, feito nos termos dos referidos artigos 266º, nº3 e 37º,nºs 2 e 3, apenas fundamentou-se no nº2 do citado artº 266º, o que gera falta de fundamentação defacto e de direito, susceptível de influir no exame e decisão da causa, pelo que nos termos do artº195º, nº1 o mesmo despacho é nulo.
37 - O douto Despacho padece de erro na interpretação e aplicação do direito,nomeadamente dos artºs 266º, 267º, 294º, 295º, 318º, 319º, 547º e 926º e seguintes, todos do NCPC,pelo que se requer a V. Exªs a sua revogação.
Neste termos e nos melhor de direito e sempre com odouto suprimento de V. Exªs, deverá ser admitido o presenterecurso, revogando o douto despacho do tribunal a quo,declarando que o articulado apresentado pelo recorrente étempestivo e admissível, bem como proferida decisão queordene o recebimento da reconvenção ou, em alternativa, seconheça da nulidade do despacho.
Só assim se fazendo a costumada, boa e sãJUSTIÇA.

A autora contra alegou, concluindo que deve ser negado provimento ao recurso.
O recurso foi admitido, como de apelação, subida em separado e efeito suspensivo.

Foram colhidos os vistos legais.

A questão a resolver traduz-se em saber se é admissível a reconvenção formulada pelo chamado.

II. FUNDAMENTAÇÃO
Os factos com interesse para a decisão da causa são os que resultam do relatório supra.

Vejamos, então, se a reconvenção formulada nos autos, pelo chamado, pode ser admitida.

Em primeiro lugar, deve dizer-se que, perante a nova filosofia que emana do atual Código de Processo Civil, se deve pôr de parte a ilação simples, retirada no despacho recorrido, de que a reconvenção é inadmissível em ação especial de divisão de coisa comum.
A acção de divisão de coisa comum insere-se no Livro V do Código de Processo Civil, “dos Processos Especiais”, seu título VI, destina-se a por termo à indivisão de coisa comum, concretiza-se no pedido de divisão em substância da coisa comum (sendo divisível) ou adjudicação ou venda desta com repartição do respectivo valor (sendo indivisível)- art.º 925.º; os requeridos são citados para contestar em 30 dias com o oferecimento imediato das provas de que dispuserem e, se houver contestação ou a revelia não for operante, o juiz produzidas as provas profere logo decisão sobre as questões suscitadas pelo pedido de divisão, aplicando-se as disposições sobre incidentes de instância dos art.ºs 294.º e 295.º, mas se o juiz verificar que a questão não pode ser sumariamente decidida, conforme o preceituado no número 2 do art.º 926.º, manda seguir os termos, subsequentes à contestação do processo comum (cfr. n.º 3 do art.º 926.º); não sendo a coisa divisível, fixam-se os quinhões, realiza-se a conferência de interessados para se fazer a adjudicação por acordo e não havendo acordo para a adjudicação a coisa é vendida (art.º 929.º/2).
Ou seja, as questões suscitadas pelo pedido de divisão podem ser decididas pela tramitação mais simples do incidente de instância ou, não podendo ser sumariamente decididas devem ser decididas em processo comum; e só depois de decididas é que se passa à fase executiva da adjudicação ou venda. O que significa que sendo o processo de divisão de coisa comum um processo especial pode comportar uma fase de processo comum sem que haja incompatibilidade entre as duas formas de processo.
Daí que se venha hoje decidindo que: “Na ação de divisão de coisa comum, se for deduzida reconvenção em que o demandado formule pedido de indemnização por benfeitorias feitas no prédio dividendo, deverá a reconvenção ser admitida, ao abrigo do disposto nos artigos 266º, n.º 3 e 37º, n.ºs 2 e 3 do Código de Processo Civil, ordenando-se, em consequência, que o processo siga os termos, subsequentes à contestação, do processo comum” – Acórdão da Relação de Guimarães de 25/09/2014, processo n.º 260/12.4TBMNC-A.G1, disponível em www.dgsi.pt, também citado no Acórdão da Relação de Lisboa de 24/09/2015, processo n.º 2510/14.3T8OER-A.L1-2 e, no mesmo sentido, Acórdão da Relação de Lisboa de 04/03/2010, processo n.º 1392/08.9TCSNT.L1-6, disponíveis no mesmo sítio.
E isto porque, se o art.º 266.º/3 estatui que não é admissível a reconvenção quando ao pedido do réu corresponda uma forma de processo diferente da que corresponde ao pedido do autor, logo a seguir exceciona a hipótese de o juiz a autorizar nos termos dos artigos 37.º/2 e 37.º/3, ou seja, sempre que haja interesse relevante ou quando a apreciação conjunta das pretensões seja indispensável para a justa composição do litígio.
Precisamente, parece ser indispensável para a justa composição do litígio e para uma decisão consciente dos interessados na fase executiva, quanto à adjudicação ou venda dos prédios, que esteja previamente decidida a questão de saber se alguma das partes tem direito a haver dos outros interessados algum pagamento relativo a obras e/ou benfeitorias.
Tal está ao alcance do juiz, incumbindo-lhe adaptar o processo, ao abrigo dos princípios da gestão processual e adequação formal – artigos 6.º e 547.º do CPC – tendo sempre como limite o respeito pelos princípios estruturantes do direito processual civil, sobretudo daqueles que constituem emanações de princípios constitucionais, designadamente, a garantia de imparcialidade do tribunal, os princípios do dispositivo e do contraditório, da proibição das decisões surpresa e da igualdade substancial das partes e o caso julgado formal – veja-se Paulo Ramos Faria e Ana Luísa Loureiro, em Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, página 44, citado no Ac desta Relação já referido.
O interesse em discutir e decidir todas as questões que, para além da divisão, envolvem os prédios dividendos, como seja a apreciação de um direito por benfeitorias invocado por um interessado, evitando dessa forma que ele se veja compelido a recorrer à propositura de uma outra acção para ver o seu direito reconhecido, para além de não beliscar qualquer daqueles princípios estruturantes, assume indiscutível relevância e que justifica plenamente a admissão da reconvenção.

Outra questão é a que se prende com o facto de a reconvenção ter sido deduzida, não pelos réus contestantes, mas sim pelo chamado.
Sentencia-se no despacho recorrido que “sendo a intervenção posterior aos articulados – como no caso sucede – não é admissível a formulação de pretensão autónoma (cfr. artigo 319.º, n.º 4 do CPC)”.
Salvo o devido respeito, não entendemos a interpretação que se faz do citado artigo.
Determina o artigo 318.º, n.º 1, a) do CPC que o chamamento para intervenção só pode ser requerido, no caso de ocorrer preterição do litisconsórcio necessário, até ao termo da fase dos articulados, sem prejuízo do disposto no artigo 261.º (trânsito em julgado da decisão que julgue ilegítima alguma das partes por não estar em juízo determinada pessoa).
No caso dos autos, a ré, na contestação, excecionou a sua ilegitimidade passiva, por estar desacompanhada do marido.
No despacho que apreciou tal exceção, a Sra. Juíza, concluindo pela ilegitimidade da ré, convidou a autora a praticar os actos necessários a suprir tal ilegitimidade e, tendo esta requerido a intervenção principal do marido da ré, foi tal intervenção admitida
Ou seja, após a petição inicial e a contestação e para evitar o julgamento da ilegitimidade, o juiz providenciou pelo suprimento da exceção dilatória, conforme determina o artigo 590.º, n.º 2, a) do CPC e foi nessa sequência que foi deferida a intervenção provocada e o chamado apresentou a sua contestação, com reconvenção, à qual, aliás, a autora contrapôs a subsequente réplica.
Quando no n.º 4 do artigo 319.º do CPC se refere a ultrapassagem do prazo referido no número anterior, o que se está a dizer é que o chamado tem um prazo igual ao facultado para a contestação para oferecer o seu articulado, sendo que, se o não fizer nesse prazo, tem de aceitar os articulados da parte a que se associa e todos os atos e termos já processados. Prazo igual ao facultado para a contestação não quer dizer no prazo que os réus tiveram para a contestação, mas sim, o mesmo número de dias. Nem outra podia ser a interpretação deste artigo, sob pena de, nestes casos, o chamado nunca poder apresentar o seu articulado, uma vez que a questão da preterição do litisconsórcio necessário, apenas se coloca na contestação.
A este propósito, de forma esclarecedora, pode ler-se no Código de Processo Civil Anotado de Lebre de Freitas, Coimbra Editora, vol. I, pág. 575 ( a propósito do anterior artigo 327.º, com a mesma redação do atual artigo 319.º): “A citação faz-se nos termos gerais, indicando-se inclusivamente ao citado o prazo dentro do qual, nos termos do n.º 3, pode oferecer o seu articulado. O chamado pode não intervir no processo (…) pode, por outro lado, intervir em qualquer altura, declarando que faz seus os articulados do autor ou do réu, caso em que lhe é oponível tudo quanto já estiver processado, que não se repete nem anula. Mas, se intervier em prazo igual ao fixado para a contestação na forma processual em causa, pode oferecer articulado próprio (petição ou contestação), seguindo-se a notificação da parte contrária para responder e os mais articulados que a forma do processo ainda consinta”.
A conclusão a retirar é que é legítimo e tempestivo o articulado apresentado pelo chamado, articulado esse em que deduz a reconvenção que, como já vimos supra, deve ser admitida, nos termos expostos.

Daí que seja procedente a apelação, com a consequente revogação do despacho recorrido e a sua substituição por outro que admita a reconvenção deduzida.

Sumário:
1 - Na ação de divisão de coisa comum, se for deduzida reconvenção em que o demandado formule pedido de indemnização por benfeitorias feitas no prédio dividendo, deverá a reconvenção ser admitida, ao abrigo do disposto nos artigos 266º, n.º 3 e 37º, n.ºs 2 e 3 do Código de Processo Civil, ordenando-se, em consequência, que o processo siga os termos, subsequentes à contestação, do processo comum.
2 - Tal está ao alcance do juiz, incumbindo-lhe adaptar o processo, ao abrigo dos princípios da gestão processual e adequação formal – artigos 6.º e 547.º do CPC – considerando, além do mais, que o processo especial de divisão de coisa comum comporta, ele mesmo, a possibilidade, na sua fase não executiva, de se seguirem os termos do processo comum.
3 – O interveniente principal, se intervier em prazo igual ao fixado para a contestação na forma processual em causa, pode oferecer articulado próprio (petição ou contestação), seguindo-se entre as partes os demais articulados admissíveis.



III. DECISÃO
Em face do exposto, decide-se julgar procedente a apelação, revogando-se o despacho recorrido, e determinando-se a sua substituição por outro que admita a reconvenção deduzida, seguindo-se os termos subsequentes à contestação, do processo comum.
Custas pela apelada.
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Guimarães, 25 de maio de 2017


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Ana Cristina Duarte


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João Diogo Rodrigues


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Anabela Tenreiro