Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ANA CRISTINA DUARTE | ||
Descritores: | SERVIDÃO POR DESTINAÇÃO DO PAI DE FAMÍLIA PRÉDIO RÚSTICO PRÉDIO URBANO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 11/16/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | 1 – Não é admissível uma impugnação genérica e global da matéria de facto julgada em primeira instância, estando vedado ao apelante solicitar a reapreciação da prova produzida, manifestando uma genérica discordância com a decisão da 1ª instância e sem esclarecer quais as decisões que, no seu entender, deveriam ser proferidas sobre cada ponto em concreto da matéria de facto impugnada. 2 - A constituição da servidão por destinação do pai de família apenas se dá quando os prédios deixem de pertencer ao mesmo dono. 3 - O primeiro pressuposto para a constituição desta servidão é que os dois prédios tenham pertencido ao mesmo dono, sendo irrelevante que os prédios sejam rústicos ou sejam urbanos, ou que um seja rústico e o outro urbano. 4 - O segundo pressuposto é a existência de sinais visíveis e permanentes que revelem inequivocamente uma relação ou situação estável de serventia de um prédio para com outro, não sendo indispensável que os sinais existam em ambos os prédios. Os sinais hão-de ter sido postos ou deixados com a intenção de assegurar certa utilidade a um à custa ou por intermédio do outro e o que releva é que existam no momento da transmissão. 5 - Finalmente, exige-se que os prédios se separem quanto ao seu domínio e não haja no documento respetivo nenhuma declaração oposta à constituição do encargo. Trata-se de uma servidão que se constitui no preciso momento em que os prédios passam a pertencer a proprietários diferentes. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO AA e mulher BB deduziram ação declarativa contra CC pedindo que seja declarado e reconhecido o direito de propriedade dos autores sobre o prédio descrito no artigo 1.º e que seja declarado e reconhecido o direito de servidão de passagem a pé, com animais e veículos de tração animal e mecânica sobre o caminho descrito nos artigos 14.º e 15.º a onerar o prédio do réu identificado no artigo 10.º a favor do dito prédio dos autores, constituído por “destinação do pai de família”. Subsidiariamente, para o caso de não proceder o pedido anterior, pedem que seja declarado e reconhecido o direito de servidão de passagem sobre o caminho descrito nos artigos 14.º e 15.º, a onerar o prédio do réu identificado no artigo 10.º a favor do dito prédio dos autores, constituído por “usucapião”. Em qualquer caso, que o réu seja condenado a reconhecer os aludidos direitos dos autores e a retirar a corrente e aloquete que colocou no portão de ferro e, bem assim, quaisquer outros obstáculos que entretanto venha a colocar no dito caminho de servidão, de modo que os autores o possam utilizar, sem qualquer obstáculo, para acesso a pé, com animais e veículos de tração animal e mecânica para aceder ao logradouro do prédio identificado no artigo 1.º, desde o caminho público situado a poente e vice-versa, o que deve fazer no prazo de 10 dias contados do trânsito em julgado da sentença que o condene. Finalmente, pedem que o réu seja condenado a pagar aos autores, a título de danos patrimoniais, uma indemnização calculada à razão anual de € 615,00 (por ano agrícola), a qual por ora se computa no mencionado montante e, a título de reparação pelos danos não patrimoniais sofridos, a quantia de € 5.000,00, sendo € 2.500,00 para cada um dos autores. O réu contestou excecionando a ilegitimidade da autora mulher. Alegou que o prédio dos autores não se encontra encravado. Impugnou a existência de qualquer servidão a onerar o seu prédio, quer constituída por destinação de pai de família, quer por usucapião. Os autores responderam à matéria de exceção, pugnando pela sua improcedência. Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, julgada improcedente a exceção de ilegitimidade da autora, definido o objeto do litígio e elencados os temas da prova. Teve lugar a audiência de julgamento, com inspeção ao local, após o que foi proferida sentença, cujo dispositivo tem o seguinte teor: “Atento tudo o exposto e nos termos das disposições legais supra citadas, julgo a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência: A-) Declaro e reconheço o direito de propriedade dos AA. sobre o prédio descrito no ponto 1º dos factos provados; B-) Declarado e reconheço o direito de servidão de passagem a pé, com animais e veículos de tração animal e mecânica sobre o caminho supra descrito nos pontos 11º a 15º dos factos provados, a onerar o prédio do réu identificado no ponto 8º a favor do prédio dos AA., identificado no ponto 1.º, constituído por “destinação do pai de família”; C-) Não conheço do pedido de constituição de servidão por usucapião, atenta a procedência do pedido de reconhecimento da servidão por destinação de pai de família; D-) Condeno o réu a reconhecer os direitos referidos em A e B; E-) Condeno o réu a retirar a corrente e aloquete que colocou no portão de ferro e, bem assim, quaisquer outros obstáculos que, entretanto, venha a colocar no caminho de servidão referido em B), de modo que os AA. o possam utilizar, sem qualquer obstáculo, para acesso a pé, com animais e veículos de tração animal e mecânica para aceder ao logradouro do prédio identificado no artigo 1.º desde o caminho público situado a poente e vice-versa; F-) O que deve fazer no prazo de 10 dias contados do trânsito em julgado da presente sentença; G) Absolvo o réu do demais peticionado. Custas pelas partes, na proporção do decaimento, que se fixa em 28% para os autores e 72% para o réu”. O réu interpôs recurso, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes Conclusões: A - A Douta Sentença padece de vícios graves, no que respeita à matéria considerada como provada “Factos Provados” e “Factos Não Provados” e respetiva “Motivação da Matéria de Facto”, pois o Tribunal “a quo” fez uma incorreta apreciação da prova produzida nos autos, resultante da audiência de discussão e julgamento, dos documentos juntos aos autos e ainda da Inspeção ao Local. B – Padecendo, também, de vícios graves no que diz respeito à interpretação e aplicação do direito aos factos que constituem a causa de pedir e o pedido nos presentes autos. C - Violando o disposto nos artº 342º, nº 1, 1547º, nº 1, 1548º, 1549º do CC e 607º nº 4 e 5, 608º nº 2 e 615º c) do CPC. D - Tais vícios conduzem à nulidade da sentença. E - Numa apreciação genérica da sentença ora recorrida, verifica-se que as ora testemunhas dos recorridos são consideradas credíveis, descredibilizando-se as testemunhas do recorrente, incompreensivelmente. F - Atenta a motivação apresentada, relativamente à prova testemunhal apresentada pelo recorrente, a mesma não foi valorada, mesmo tratando-se de depoimentos credíveis e isentos, contrariamente à prova testemunhal dos recorridos, que foi atendida como se de única verdade se tratasse. G - É merecedor de critica, o Tribunal “a quo” na valoração da prova, quer da testemunhal, da inspeção ao local e da documental, uma vez que considerou determinados elementos e desconsiderou outros, não fazendo uma correta apreciação dos mesmos, do ponto de vista legal, desconsiderando o valor legal e firmeza que sobre os mesmos pende. H – Foi reconhecida a existência de uma servidão de passagem por destinação de pai de família, nos termos do disposto no artº 1549º do CC e daí o presente recurso; I – Para tal servidão ser constituída, têm de ser provados cumulativamente, todos os requisitos constantes no citado artº 1549º do CC. Dos factos: J – Sucede que, não se provou, a existência de sinais visíveis e permanentes, quer atualmente, quer reportados à data da separação dos prédios, que ocorreu em 2015, por escritura de partilha. L - As testemunhas dos autores, DD, EE e FF, nada disseram e não provaram nenhum dos factos, elencados como Factos Provados nos artº 11º a 19º, designadamente, a existência de um caminho, com a configuração declarada na sentença, designadamente, quanto às dimensões, extensão e composição do referido caminho, bem como a prática de atos inerentes à conservação do mesmo; M – A matéria constante nos referidos artigos 11º a 19º, dos Factos Provados, são a matéria alegada pelos autores; N - Existe confusão entre a alegação e a prova dos factos. Incide sobre os autores, nos termos do disposto no artº 342, nº 1 do CC, o ónus de prova dos factos alegados, o que não aconteceu e em consequência, não deveria ter sido reconhecido o direito peticionado; O – As citadas testemunhas dos autores, DD, EE e GG, referiram que os prédios do autor marido e réu, foram propriedade dos pais destes e ainda dos avós; P – Sendo, também, dito, que os antecessores de autores e réu, entravam e saíam por onde era necessário, dizendo a testemunha DD, que “o caminho era fabricado”, “que era relvado”, que “o caminho era uma propriedade, mas não era para andar para trás e para a frente”; Q – A testemunha EE, referiu que os antecessores “lavravam o local por onde passavam”, nada dizendo, quanto à existência de sinais visíveis e permanentes, da existência de um caminho, designadamente, quanto à sua extensão, largura e tipo de piso. R – Limita-se a declarar que os antecessores de autor marido e réu, passavam de um prédio para o outro, quando precisavam. S – A testemunha GG, assim, como as anteriores incidiram os seus depoimentos sobre factos relativos ao uso, que os antecessores de autores e réu, davam aos seus prédios. T – Esta testemunha, só sabe dizer que é um caminho, porque tinha início numa cancela, que veda o acesso do prédio à via pública. Não descreve a existência de sinais visíveis e permanentes da existência do caminho, designadamente, quanto ao leito próprio, se era trilhado e calcado pelas pessoas e animais, quer quanto ao seu traçado. U – As testemunhas dos autores não provaram a existência de sinais visíveis e permanentes, aquando da separação do domínio dos prédios de autores e réu. V - Da ata de inspeção ao local, realizada no dia 22.03.2023, sob o nº 5, ficou a constar “que no terreno do réu não é visível, neste momento, qualquer trilho demarcado, encontrando-se a terra lavrada” ou seja, total ausência de sinais visíveis e permanentes. X – Pelo que, merece censura, o Tribunal “ a quo”, cometendo manifesto erro de julgamento, quando dá como assentes os factos elencados sob os nº 11º a 21º, tendo em conta, que nenhuma das testemunhas dos autores, provaram os factos neles plasmados. Z – Nos factos provados, designadamente no artº 26º, foi dada como provada a existência de uma unidade agrícola. Y – Pelas testemunhas, nada foi dito, quanto à existência de uma unidade agrícola, sendo certo que os prédios dos autores e réu, são duas casas de habitação, com logradouro. AA – O facto de os antecessores cultivarem os seus quintais, não faz dos prédios em causa, uma unidade agrícola, até porque o conceito de uma unidade agrícola envolve requisitos próprios, quando a áreas, equipamento, instalações e afetação, ocorrendo errada aplicação do Direito à realidade factual. BB – As testemunhas do réu, HH, II e JJ, familiares dos autores e réu, não foram consideradas, por revelarem, não terem boas relações com os autores; CC – As referidas testemunhas foram honestas e verdadeiras, sendo certo, que o julgador, tem capacidades para ajuizar da isenção do depoimento prestado. DD – Aliás, dois pesos e duas medidas, pois as testemunhas dos autores, declararam não se darem bem com o réu. EE – Assim, a testemunha HH, declarou que nunca existiu caminho, que os seus pais e irmão, passavam de um prédio para o outro, quando precisavam, pois foram proprietários de ambos os prédios. FF – Revelou, nunca ter havido qualquer caminho trilhado, marcado e calcado, tendo em conta, que reside ao lado da casa do réu e é conhecedor do uso, que os pais e irmão, deram aos seus prédios. GG – A testemunha II, conhecedora dos prédios de autores e réu há mais de 40 anos, pois é tia de ambos, revelou que no tempo do sogro e do cunhado, nunca houve caminho. Referiu ainda que existe uma borda, que separa os prédios, borda que na extrema a poente tem cerca de 2 metros e depois vai diminuindo até ao citado pequeno desnível, o que impossibilita a passagem. HH - Quando ia ajudar, a esfolhar o milho, passavam a pé, junto a uma mina e onde existiam uns degraus em pedra. II – A testemunha JJ, irmã do autor marido e do réu, confirmou a existência do talude, mais alto a poente e que depois vai diminuindo, até à zona onde existe o desnível. JJ – Confirmou que transportavam o milho em cestos, às costas para o espigueiro existente no prédio atualmente dos autores. Declarou que não havia caminho, por causa da borda que delimitava os prédios. Nunca houve um caminho trilhado, em piso batido e calcado, numa extensão de 50 metros e ainda disse que a casa do pai – Sr. KK – sempre teve uma cancela de ferro, por onde se entrava e saía. LL – A testemunha referiu que as hortas de ambas as casas são de pequena dimensão, mas que sempre foram cultivadas, com batatas e couves. Referiu que o milho que se desfolhava na casa onde nasceu, era milho que trazido de um campo que o pai tinha noutro local e que depois era carregado em cestos para o espigueiro, existente no prédio, que agora pertence aos autores. DO DIREITO: MM – A servidão constituída por destinação de pai de família, está sujeita à verificação cumulativa de vários requisitos: a) a existência de dois ou mais prédios ou duas ou mais frações de um mesmo prédio, pertencentes ao mesmo dono; b) a existência de sinais visíveis e permanentes, que revelem de modo inequívoco, uma relação de serventia entre os prédios ou frações do mesmo prédio, ou seja de afetação de utilidades de um a outro; c) a separação dos prédios (dominante e serviente) ou frações do mesmo prédio quanto ao seu domínio, passando a pertencer a donos diferentes; d) a não existência, no ato da separação dos prédios, qualquer acordo de afastamento da constituição da servidão. NN – É preciso que no prédio serviente ou no prédio dominantes exista um estado de facto aparente nitidamente característico da servidão reclamada e que revele, da parte do proprietário comum a vontade de estabelecer de uma maneira definitiva e permanente a sujeição de um dos prédios relativamente ao outro, cfr. Ac. TRG, de 29.10.2020, Proc. 1336/18.0T8PTL.G1, in DGSI. OO – Da Acta de inspeção ao local, ficou consignado, que no terreno do réu, não é visível, neste momento, qualquer trilho demarcado, encontrando-se a terra lavrada. PP – As testemunhas não revelaram a existência de sinais visíveis e permanentes da existência do alegado caminho. QQ – Pelo que, o direito peticionado não devia ter sido reconhecido, fazendo-se na sentença “a quo” errada aplicação do Direito, violando o disposto no artº 607, nº 4 e 615 c) do CPC o que gera a nulidade da sentença, o que se invoca para os devidos efeitos legais. RR – O desnível existente, comprova a não existência de passagem de pessoas e veículos, de forma continua, pois se tivesse existido caminho, o desnível não se mantinha, ia ficando rampeado. SS – O ónus de prova é dos autores e não lograram fazer prova do peticionado, nos termos do disposto no artº 342º do CC, pelo que não podia ter sido proferida a sentença “ a quo”. TT - A sentença de que se recorre, assenta em erro de julgamento notório, fazendo errada aplicação do Direito, violando o disposto no artº 607º do CPC. UU – A sentença de que se recorre, dá como assente os factos elencados sob o nº 22) e 24) dos factos assentes. Para ser constituída uma servidão de passagem, sobre um prédio urbano destinado a habitação é preciso alegar a insuficiência da comunicação com a via pública, tendo em contas as necessidades do prédio, face à sua afetação, o que não aconteceu. VV – A referida sentença padece de falta de fundamentação e erro de julgamento, pelo que, incorre numa nulidade, nos termos do disposto no artº 615, c). XX – O Tribunal “a quo” baseou a sua convicção na prolação da sentença, em provas documentais – fotografias – que não foram consideradas, por falta de rigor, pelo que, incorre a referida sentença em contradição, nos termos do disposto no artº 607º e 615º do CPC. ZZ – Violou a sentença recorrida, o disposto nos artº 342º nº 1, 1547º nº 1, 1548º, 1549º do CC e artº 607º, nº 4 e 5, 608º nº 2 e 615º c) do CPC Por tudo isso, Deve conceder-se provimento, ao presente recurso, assim se fazendo uma correta aplicação da Lei e a mais elementar JUSTIÇA. Os autores contra-alegaram, pugnando pela confirmação da sentença recorrida. O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. O Sr. Juiz pronunciou-se pela inexistência das nulidades invocadas. Foram colhidos os vistos legais. As questões a resolver prendem-se com a nulidade da sentença, impugnação da decisão de facto e averiguação sobre a constituição de servidão por destinação do pai de família. II. FUNDAMENTAÇÃO Na sentença foram considerados os seguintes factos: Atenta a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, bem como os documentos juntos aos autos dão-se como assentes os seguintes factos: 1.º) Encontra-se registada a favor dos AA., através da Ap. ...63, de 06/02/2015, o prédio urbano, situado na Rua ..., freguesia ..., do concelho ...: Casa de ... e ... andar com logradouro, com a área coberta de 65m2 e descoberta de 530m2, descrito na conservatória do registo predial ... sob o n.º ...11 e inscrito na matriz sob o artigo ...27; 2.º) O prédio foi adquirido pelos AA. por escritura pública de partilha outorgada a fls. 141 a 143 verso do livro de notas para escrituras diversas n.º 61-A, em 02 de Fevereiro de 2015, no cartório notarial da notária LL, situado na Rua ..., ... esquerdo, na cidade ..., ali constituindo a verba n.º 3 da relação de bens; 3.º) Há mais de 15 e 20 anos que os AA., por si e antecessores, estão na posse, uso e fruição do aludido prédio, habitando a casa, nela confecionando e tomando refeições, repousando e dormindo, recebendo familiares e amigos e cultivando o logradouro com produtos da região, designadamente erva, batata, milho, feijão, vinha e outros; 4.º) Fazendo obras e benfeitorias e suportando os custos; 5.º) Dando-o de arrendamento e recebendo as rendas; 6.º) Pagando os impostos e contribuições que sobre ele incidem; 7.º) O que sempre têm feito pacificamente, à vista e com o conhecimento de todos, sem oposição e interrupção, na firme convicção de que estão e sempre estiveram, bem como toda a gente, no exercício pleno e exclusivo do seu direito de propriedade sobre o prédio referido em 1º; 8.º) O Réu é proprietário do prédio urbano, situado na Rua ..., freguesia ..., do concelho ...: Casa com logradouro, com a área coberta de 133m2 e descoberta de 780m2, descrito na conservatória do registo predial ... sob o n.º ...25 e inscrito na matriz sob o artigo ...11; 9.º) Também adquirido na escritura pública supra identificada no artigo 2.º, ali constituindo a verba n.º 9 da relação de bens; 10.º) Os prédios supra identificados nos artigos 1.º e 8º foram dos mesmos donos e antepassados comuns, MM e KK, pais dos A. marido e do Réu; 11.º) Para acesso a pé, com animais e veículos de tração animal e mecânica ao logradouro do prédio supra identificado no artigo 1.º existe e foi construído pelos aludidos inventariados, há mais de 20, 30 e 50 anos, quando eram proprietários dos prédios do A. e do Réu, um caminho que se inicia a poente, no caminho público, numa cancela de ferro aí existente no prédio supra identificado no artigo 8º, atravessando-o de poente para nascente, encostado ao seu limite norte, até atingir o prédio dos AA., na zona do desnível referida em 25º; 12.º) O qual tem uma largura de cerca de 2,5 metros e um comprimento de cerca de 50 metros desde o caminho público até ao prédio dos AA.; 13.º) Com leito próprio, permanente, trilhado e calcado pela passagem das pessoas e animais e pelo trânsito de veículos de tração animal e mecânica, sendo bem visível, com piso regular e sem buracos, que permite o acesso, sem qualquer obstáculo, ao prédio dos AA. 14.º) Estando sempre disponível para os AA. acederem do caminho público, situado a poente, ao logradouro do seu prédio supra identificado no artigo 1º, a qualquer hora do dia e da noite e durante todo o ano; 15.º) Caminho que aqueles inventariados destinaram para o acesso a pé, com animais e veículos de tração animal e mecânica ao logradouro do prédio referido em 1º e que se manteve após o seu decesso; 16.º) Consta da escritura referida em 2º que os prédios foram transmitidos com todas as suas águas e servidões conforme os usos e costumes; 17.º) Há mais de 15, 20 e 30 anos que os AA., por si e antecessores, utilizam o referido caminho e tratam da sua conservação, cegando a erva que nele cresce, tapando buracos que nele surjam e aplainando-o, de forma a não existirem obstáculos à passagem; 18.º) Passando por ele a pé, com animais e veículos de tração animal e mecânica, a qualquer hora do dia e da noite, sempre que o desejam, durante todo o ano e desde o caminho público para o seu prédio e vice-versa; 19.º) Praticando esses atos, até ao início do ano de 2021, à vista e com o conhecimento de todos, sem oposição e interrupção, na firme convicção de que estão e sempre estiveram, bem como toda a gente, no exercício de um direito de passagem a favor do seu descrito prédio e a onerar o prédio do Réu; 20.º) No início do ano de 2021, o réu impediu os AA. de passar no referido caminho; 21.º) Tendo fechado a cancela de ferro com um cadeado preso por aloquete, não tendo dado aos AA. uma chave. 22.º) O prédio referido em 1º tem acesso à via pública, à Rua .... 23.º) Pela Rua ... não é possível entrar com veículos no prédio referido em 1º, apenas sendo possível entrar a pé. 24.º) Os AA. não podem aceder ao logradouro do seu prédio com veículos a não ser pelo prédio referido em 8º; 25.º) Na fronteira do terreno dos autores e do réu existe um pequeno desnível. 26.º) Os prédios de autor e réu formaram, em vida dos seus pais e avós, uma unidade agrícola. Com relevância para a decisão da causa, não se provou que: a) A unidade agrícola referida em 26º também englobava outros prédios dos pais e avós de autor e réu; b) Os antecessores dos autores passavam com animais pelo acesso referido em 22º para cultivarem o seu logradouro. c) O caminho referido em 11º tem uma largura de 100 metros. d) Aquele logradouro, em média, se pudesse ser explorado e cultivado pelos AA., podia produzir: i. 1/2 pipa de vinho; ii. 18 rasas de milho; iii. 2 rasas de feijão; e iv. 18 rasas de batata. e) Na região, uma pipa equivale a 500 litros e uma rasa a 15 quilos; f) Os preços médios daqueles produtos são: i. Uma pipa de vinho: €500,00; ii. Uma rasa de milho: €10,00; iii. Uma rasa de feijão: €25,00; iv. Uma rasa de batata: €7,50. g) Os AA. sentem-se menosprezados naqueles seus direitos de servidão e de propriedade, sentindo ansiedade, nervosismo, perturbação, tristeza, humilhação e estigma. O apelante discorda da decisão de facto. Entende que foram incorretamente julgados os pontos 11.º a 21.º, 23.º, 24.º e 26.º dos factos provados. Para o efeito, transcreve pequenos extratos da prova testemunhal, considera que, da mesma não resulta provada a citada matéria e tenta afastar a credibilidade dos depoimentos das testemunhas dos autores. Invoca, também a nulidade da sentença prevista no artigo 615.º c) do CPC por manifesto erro de julgamento quanto à apreciação da prova produzida. O artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC estabelece que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Tal nulidade ocorre quando existe incompatibilidade entre os fundamentos e a decisão “ou seja, em que a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final”. Por outro lado, a decisão judicial é obscura “quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível” e é ambígua “quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes” (Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís de Sousa, CPC Anotado, vol. I, pág. 737 e 738). Ora, independentemente de o apelante não justificar devidamente o porquê de considerar que a sentença padece de tais nulidades, a verdade é que, como muito bem esclareceu o Sr. Juiz no despacho em que se pronunciou sobre as mesmas, elas não se verificam, uma vez que o tribunal fundamentou de forma clara as questões de facto em ordem a poder concluir como concluiu na parte decisória, não existindo qualquer oposição entre os fundamentos em que se alicerçou a decisão e esta, muito menos padecendo de qualquer obscuridade ou ambiguidade, uma vez que o percurso decisório é perfeitamente claro e inteligível, não se prestando a interpretações diferentes. Quanto à matéria de facto propriamente dita, verifica-se que o apelante discorda genericamente da decisão proferida pelo tribunal quanto à existência do caminho/servidão, sustentando-se em extratos dos depoimentos testemunhais, sem apresentar a concreta decisão que deveria ser proferida sobre cada um dos pontos impugnados, não dando assim, cumprimento ao disposto no artigo 640.º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPC, o que implica a imediata rejeição do recurso nessa parte. Conforme salienta Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2013, pág. 124: “…foram recusadas soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição do julgamento, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por abrir apenas a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências pelo recorrente”, prosseguindo, mais à frente (pág. 126) “em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões (…) deixando expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas” e concluindo (pág. 129) que “as referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor, tratando-se, afinal, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo” O que o apelante fez foi analisar genericamente a prova testemunhal produzida, bem como socorrer-se de vários considerandos que alega derivarem da experiência comum, de forma a concluir que houve erro de julgamento e que a ação devia ter sido julgada improcedente. Mas não esclarece qual a redação ou a decisão que, no seu entender devia ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Ora, não é de todo admissível uma impugnação genérica e global da matéria de facto julgada em primeira instância, estando portanto vedado ao apelante, pura e simplesmente, solicitar a reapreciação da prova produzida, manifestando uma genérica discordância com a decisão da 1ª instância. Não pode dizer só que discorda da decisão, não revelando qual o sentido da decisão que entende como correto para cada um dos factos impugnados e referir-se a extratos de depoimentos testemunhais, sem indicar, em concreto, qual o facto ou factos que entende incorretamente julgados e que deveriam obter decisão diversa com base nesses depoimentos. Veja-se, por outro lado, que a alteração da matéria de facto só deve ser efetuada pelo Tribunal da Relação quando este conclua, com a necessária segurança, que a prova produzida aponta em sentido diverso e impõe uma decisão diferente da que foi proferida em 1ª instância, quando tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento na matéria de facto; neste sentido salienta Ana Luísa Geraldes (in, Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Volume I, p. 609) que “Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte.”. De facto, a questão que se coloca relativamente à prova, quer na 1ª Instância quer na Relação, é sempre a da valoração das provas produzidas em audiência ou em documentos de livre apreciação, pois que, em ambos os casos, vigoram para o julgador as mesmas normas e os mesmos princípios. É claro que a “livre apreciação da prova” não se traduz numa “arbitrária apreciação da prova”, pelo que se impõe ao juiz que identifique os concretos meios probatórios que serviram para formar a sua convicção, bem como a “menção das razões justificativas da opção pelo Julgador entre os meios de prova de sinal oposto relativos ao mesmo facto” (cfr. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, obra cit., p. 655); o “juiz [de 1ª Instância] explicará por que motivo deu mais crédito a uma testemunha do que a outra, por que motivo deu prevalência a um laudo pericial em detrimento de outro, por que motivo o depoimento de certa testemunha tecnicamente qualificada levou à desconsideração de um relatório pericial ou por que motivo não deu como provado certo facto apesar de o mesmo ser referido em vários depoimentos. E é ainda assim por referência a certo depoimento e a propósito do crédito que merece (ou não), o juiz aludirá ao modo como o depoente se comportou em audiência, como reagiu às questões colocadas, às hesitações que não teve (teve), a naturalidade e tranquilidade que teve (ou não)” (vide, Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, Almedina, 2014, p. 325). É, por isso, comumente aceite que o juiz da 1ª Instância, perante o qual a prova é produzida, está em posição privilegiada para proceder à sua avaliação, e, designadamente, surpreender no comportamento das testemunhas elementos relevantes para aferir da espontaneidade e credibilidade dos depoimentos que frequentemente não transparecem da gravação. Ora, o que se verifica, é que, em 1.ª instância, para além dos depoimentos testemunhais, foram considerados os documentos juntos aos autos, a parte confessória do depoimento do réu e a inspeção ao local efetuada pelo tribunal, com fotografia aí inserta, tirada no momento, tendo ficado consignado, sem oposição de qualquer das partes, o que o Sr. Juiz viu e considerou relevante. O Sr. Juiz procedeu à análise critica dos depoimentos, conjugadamente com os documentos existentes nos autos, com a inspeção ao local e com as regras da experiência e da normalidade da vida, a fim de dar conta da sua convicção e explicar porque é que umas testemunhas lhe ofereceram maior credibilidade do que outras. E se é certo que a Relação dispõe da possibilidade de valorar de forma diversa da da 1.ª instância os meios de prova sujeitos à sua livre apreciação, também é verdade que os poderes de reapreciação da matéria de facto pela Relação estão circunscritos à reapreciação dos concretos meios probatórios invocados. Assim, a Relação aprecia livremente as provas, de acordo com o princípio constante do n.º 5 do artigo 607.º do Código de Processo Civil, valora-as e pondera-as, recorrendo às regras da experiência, aos critérios da lógica, aos seus próprios conhecimentos das pessoas e das coisas, ou seja, a tudo o que possa concorrer para a formação da sua livre convicção. Fá-lo, como já deixámos assinalado, desde que o apelante cumpra o ónus que para si decorre do disposto no artigo 640.º do CPC, o que não aconteceu e, sempre sem esquecer que, em casos como este, em que as testemunhas de cada uma das partes têm depoimentos opostos, confirmando a tese de quem as ofereceu, torna-se de particular relevância a inspeção ao local e o facto de o Sr. Juiz de 1.ª instância estar melhor posicionado para a valoração da prova testemunhal (veja-se que foi efetuada uma acareação entre duas testemunhas, que o tribunal considerou ter sido bastante relevante para a descoberta da verdade “na medida em que foi visível o desconforto da testemunha II quando confrontada com a testemunha EE”, o que vem explicado no despacho de motivação, mas que não vemos necessidade de aqui transcrever) “Como a experiência o demonstra frequentemente, tanto ou mais importante que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reações perante as objeções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, sendo que a mera gravação dos depoimentos não permite o mesmo grau de perceção das referidas reações que, porventura, influenciaram o juiz de 1.ª instância. Na verdade existem aspetos comportamentais ou reações dos depoentes que apenas são percecionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores” – Abrantes Geraldes, in “Recursos em Processo Civil”, Novo Regime, 3.ª edição, pág. 316 e 317. Do que fica dito resulta, assim, que não sendo admissível uma impugnação genérica e global da matéria de facto julgada em primeira instância, em que o apelante pura e simplesmente manifeste uma genérica discordância com a decisão da 1.ª instância, pretendendo a sua reversão total, sempre o recurso da matéria de facto estaria condenado ao insucesso, insucesso esse que, como também resulta do que supra deixámos explicado, sempre ocorreria no caso concreto, face ao circunstancialismo probatório dos autos e à forma como a conjugação das provas reunidas nos autos, conduziu à decisão da matéria de facto. Nada há, assim, a alterar nesta parte do recurso. Quanto à questão jurídica da existência da servidão de passagem por destinação de pai de família, diremos o seguinte. A servidão predial é o encargo imposto num prédio em proveito exclusivo de outro prédio pertencente a dono diferente; diz-se serviente o prédio sujeito à servidão e dominante o que dela beneficia – artigo 1543.º do Código Civil. Ou seja, trata-se de encargo (restrição ou limitação ao direito de propriedade) que recai sobre um prédio e aproveita exclusivamente a outro prédio, devendo os prédios pertencer a donos diferentes, assinalando assim a lei, expressamente, o caráter real da servidão, pois se traduz num poder direto e imediato sobre o prédio onerado, como é próprio de todo o direito real, não podendo os prédios coexistir na mesma pessoa. Daí que a constituição da servidão por destinação do pai de família apenas se dá quando os prédios deixem de pertencer ao mesmo dono – cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, vol. III, 2.ª edição revista e atualizada (reimpressão), páginas 613 e seguintes. As servidões prediais podem ser constituídas por contrato, testamento, usucapião ou destinação do pai de família – artigo 1547.º, n.º 1 do CC – sendo que, quanto a estas últimas, estabelece o artigo 1549.º que “Se em dois prédios do mesmo dono, ou em duas frações de um só prédio, houver sinal ou sinais visíveis e permanentes, postos em um ou ambos, que revelem serventia se um para o outro, serão esses sinais havidos como prova da servidão quando, em relação ao domínio, os dois prédios, ou as duas frações do mesmo prédio, vierem a separar-se, salvo se ao tempo da separação outra coisa se houver declarado no respetivo documento”. Conforme esclarecem Pires de Lima e Antunes Varela in obra citada, pág. 632, o primeiro pressuposto para a constituição desta servidão é que os dois prédios tenham pertencido ao mesmo dono “tanto faz que os prédios sejam rústicos ou sejam urbanos, que um seja rústico e o outro urbano e nenhum obstáculo constitui também à solução a diferente aplicação dada a cada um dos prédios. É também irrelevante que os prédios sejam contíguos ou que entre eles se situem outros prédios, uma via pública ou um terreno baldio. A servidão constituir-se-á desde que exista uma relação de serventia entre os dois prédios que deixam de ter o mesmo dono, sendo indiferente o título (servidão, mera tolerância, licença administrativa, contrato com eficácia obrigacional, etc) em que assenta a utilização dos prédios ou terrenos intermédios”. O segundo pressuposto é a existência de sinais visíveis e permanentes que revelem inequivocamente uma relação ou situação estável de serventia de um prédio para com outro, não sendo indispensável que os sinais existam em ambos os prédios. “Os sinais hão-de revelar a serventia de um prédio para com o outro. Isto significa que hão-de ter sido postos ou deixados com a intenção de assegurar certa utilidade a um à custa ou por intermédio do outro”. O que releva é que, no momento da transmissão, existam esses sinais Finalmente, exige-se que os prédios se separem quanto ao seu domínio e não haja no documento respetivo nenhuma declaração oposta à constituição do encargo. Trata-se de uma servidão voluntária que se constitui no preciso momento em que os prédios passam a pertencer a proprietários diferentes. Reportando-nos aos autos resulta, sem margem para dúvida dos factos provados, que os prédios dos autores e do réu, contíguos entre si, foram dos mesmos donos e antepassados comuns, pais do autor marido e do réu e lhes advieram pela mesma escritura pública de partilha, celebrada em 2015, constando de tal escritura que os prédios foram transmitidos com todas as suas águas e servidões conforme os usos e costumes, estando, assim, preenchidos os primeiro e terceiro pressupostos para a constituição da servidão por destinação do pai de família. A questão que mais foi debatida foi a da existência dos sinais visíveis e permanentes que revelem inequivocamente uma relação ou situação estável de serventia de um prédio para o outro e que, como já se disse, tenham sido postos com a intenção de assegurar certa utilidade à custa ou por intermédio do outro. Ora, quanto a este aspeto, se é certo que, quando o tribunal se deslocou ao local, não viu esses sinais, ficando a constar da ata que “No terreno do réu não é visível, neste momento, qualquer trilho demarcado, encontrando-se a terra lavrada”, a verdade é que tal deslocação ocorreu oito anos após a separação dos prédios e ano e meio após a instauração da ação (sendo que, no início de 2021, o réu impediu os autores de passar no referido caminho, tendo fechado a cancela de ferro com um cadeado preso por aloquete, não tendo dado aos autores uma chave – factos provados 20 e 21). O que também é inequívoco é o que resulta dos factos provados números 11, 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 23, 24, que revelam a existência de um caminho, com leito próprio, permanente, trilhado e calcado pela passagem das pessoas e animais e pelo trânsito de veículos de tração animal e mecânica, que passava do logradouro do réu para o do autor (que eram cultivados em conjunto) e que apenas por esse caminho era possível aceder a essa parte do prédio antigo, pois, pela via pública, os autores apenas conseguem aceder a pé ao seu logradouro, sendo que o único acesso de veículos ao terreno do autor era pelo terreno do réu, sendo o caminho trilhado e permitindo a passagem de animais, carros de bois e tratores. Daí que improceda a apelação que, diga-se, mesmo quanto à questão jurídica, se baseou, sobretudo, nos depoimentos das testemunhas e na convicção oposta à do julgador sobre a análise dos mesmos. III. DECISÃO Em face do exposto, decide-se julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida. Custas pelo apelante. *** Guimarães, 16 de novembro de 2023 Ana Cristina Duarte Eva Almeida Maria dos Anjos Melo Nogueira |