Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
279/13.8TBEPS-A.G1
Relator: MARGARIDA ALMEIDA FERNANDES
Descritores: RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE REVISÃO
CADUCIDADE
LEGITIMIDADE
FALTA DE CITAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/29/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- O recurso extraordinário de revisão tem como razão de ser exigências de justiça material que se sobrepõem às razões de segurança ou de certeza inerentes ao caso julgado.
II- Daí que o art. 697º nº 2 do C.P.C. tenha previsto dois prazos de caducidade para a sua interposição, salvo se respeitar a direitos de personalidade: a) o prazo máximo de cinco anos sobre a data do trânsito em julgado da decisão a rever; e, sem prejuízo deste prazo, b) o prazo de 60 dias contados, no caso do fundamento previsto na al. c) do art. 696º do C.P.C., desde que o recorrente obteve o documento que serve de base à revisão.
III- Tem legitimidade para interpor recurso de revisão com fundamento na falta de citação ou nulidade de citação o réu que não foi citado ou o foi irregularmente e que não interveio na acção ou execução.
IV- Numa acção declarativa entrada em 07/03/2013 ao acto da citação é aplicável o anterior C.P.C. nos termos do art. 5º nº 1 e 3 da Lei nº 41/2013 de 26 de Junho, que aprovou o Código de Processo Civil Revisto.
V- A falta de cumprimento do disposto no art. 248º do anterior C.P.C. e o cumprimento do disposto no art. 240º do C.P.C. Revisto, por não ter a virtualidade de prejudicar a defesa do réu, não consubstancia nulidade de citação e fundamento de revisão de sentença.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório

R. M., por apenso aos autos de acção declarativa de condenação, sob a forma sumária, em que é autora M. B. e réus R. M., A. L. e Escola de Condução X, Lda., interpôs o presente Recurso de Revisão da sentença proferida em 10/11/2015.

Para tanto apresentou as seguintes conclusões:

“I. Pugna o Réu pelo reconhecimento que todo o processo se encontra inquinado desde a raiz, não tendo sido cumpridos todos os pressupostos legais para efectivação da citação edital.
II. A citação pessoal por oficial de justiça não esgotou todos os procedimentos que deveria ter esgotado.
III. Nomeadamente, a morada conhecida do R./Recorrente era do conhecimento do Sr. Oficial de Justiça e obteve a confirmação de que a habitação indicada se encontrava habitada.
IV. Pelo que deveria ter procedido à citação por afixação nessa mesma morada, não tendo, por tal, esgotado todas as diligências possíveis ao seu alcance.
V. O Tribunal a quo tentou, de facto, apurar a efetiva residência do R. aqui Recorrente, através do recurso a várias bases de dados informáticas, como sendo a Segurança Social, Finanças, identificação por BI e carta de condução.
VI. Contudo, ainda que tendo verificado existir uma diferença entre a morada constante da Segurança Social, Finanças e na identificação por BI comparativamente à residência constante da carta de condução do Réu, não logrou o Tribunal proceder à citação via postal para a morada indicada na carta de condução do Réu.
VII. Por tal, o Tribunal a quo não procedeu à realização de uma diligência que se demonstrava como essencial para citar regularmente o Réu aqui Recorrente.

Por outro lado,
VIII. O Tribunal a quo também não esgotou todas as autoridades policiais e administrativas a que deveria ter recorrido para apurar o paradeiro do Réu, como seja a Junta de Freguesia, a GNR e até a Conservatória do Registo Comercial.
IX. Nomeadamente, apresentava-se fundamental a verificação da Conservatória do Registo Comercial, uma vez que o último emprego conhecido do Réu se consubstanciava numa atividade comercial (vendedor de automóveis), o que também não foi devidamente diligenciado.
X. O que, por si só, deverá conduzir à nulidade da citação edital a que se procedeu posteriormente.
XI. Na verdade, tendo-se recorrido à Polícia de Segurança Pública para verificar o paradeiro do Réu, e tendo esta entidade encontrado o próprio Réu e confirmado junto dele a sua residência, não mais o Tribunal a quo procedeu à citação via postal do Réu.
XII. Procedeu o Tribunal à citação edital do Réu, bem sabendo que o Réu não se encontrava ausente em parte incerta, devendo tal modalidade de citação apenas ocorrer quando se adquire a segurança de que realmente não é conhecido o paradeiro do citando.
XIII. Recorreu o Tribunal a uma modalidade de citação completamente desadequada à situação do caso concreto, não atendendo à natureza de última ratio da citação edital.
XIV. Além de o Tribunal a quo ter empregado mal a citação edital, também não cumpriu os pressupostos que tal modalidade de citação exigia ao abrigo do artigo 248.º, n.º 2 do revogado CPC, nomeadamente, não procedeu à afixação de editais em todos os locais estatuídos por lei, designadamente na Junta de Freguesia do Réu aqui Recorrente.
XV. Motivo pelo qual deve ser considerada nula a citação edital efetuada, ao abrigo do art. 198.º do CPC revogado, uma vez que não foram observadas todas as formalidades prescritas na lei, concretamente exigidas para a citação edital.
XVI. A verificação de que mal andou o Tribunal a quo ao longo de todo o processo pode retirar-se do próprio facto de o Réu ter sido condenado a situação impossível, não podendo entregar os documentos peticionados, uma vez que esses se encontram na posse da Ré sociedade que o Tribunal absolveu em despacho liminar.”
Conclui que deve ser considerada nula a citação edital e que deve ser ordenada a repetição da citação e do processado.
*
Por despacho de 14/10/2019 foi admitido o presente recurso e foi ordenada a notificação nos termos do art. 699º nº 2 do C.P.C..
*
A recorrida pronunciou-se apresentando as seguintes conclusões:

“I. A citação edital não é nula, pois foram cumpridas todos os pressupostos legais.
II. A citação pessoal por oficial de justiça foi efetuada duas vezes, uma em 7/5/2013 e outra no dia 23/10/2013, na segunda vez o oficial de justiça comunicou que não citou o citado, em virtude do citando já não residir na morada indicada.
III. Em 23/10/2013 o sr. oficial de justiça comunicou que o citado Réu/Recorrente não vivia nessa residência e o referido apartamento encontrava-se desabitado.
IV. Em 23/10/2013, o sr. oficial de justiça comunicou que não citou o citado em virtude do citando já não residir na morada indicada, tendo declarado nesta diligência que o referido apartamento se encontrava desabitado tendo, por tal motivo, sido ordenada a citação edital.
V. O Tribunal a quo tentou apurar a efetiva residência do Réu/Recorrente, através do recurso a várias bases de dados informáticas, como sendo a Segurança Social, Finanças, identificação por BI e carta de condução.
VI. Conforme se pode verificar pela procuração que o Réu/Recorrente outorgou ao seu ilustre mandatário, datada de 2 de Abril de 2019, a residência ou morada do Réu/Recorrente é Travessa ..., Braga, e não a que consta da morada da carta de condução.
VII. O Tribunal a quo não tem que contatar todas as autoridades policiais e administrativas, nem a junta de freguesia, a GNR, nem a Conservatória do Registo Comercial para apurar o paradeiro do Réu/Recorrente.
VIII. No dia 23/10/2013, depois do PSP ter verificado que o paradeiro do Réu/Recorrente era Travessa ..., Braga, o sr. oficial de justiça procedeu a nova citação pessoal do Réu/Recorrente para tal residência e verificou que o Réu/Recorrente não vivia nesta residência, tendo-se assumido, a partir deste momento, que o Réu/Recorrente se encontrava em parte incerta.
IX. O Tribunal a quo em 23 de Outubro de 2013, procedeu a segunda citação pessoal por um funcionário judicial que verificou que não era conhecido o paradeiro do citando e que o apartamento se encontrava desabitado.
X. O Tribunal a quo ordenou a citação edital, após tal informação, pois não sabia o paradeiro do Réu/Recorrente.
XI. A modalidade da citação edital utilizada no processo foi adequada.
XII. A citação edital é válida, tendo sido cumpridos todos os pressupostas, que tal citação exigia, ao abrigo de 248, nº 2 do CPC.
XIII. Não deve ser considerada nula a citação edital nos autos.”
Termina pedindo a improcedência do recurso.
*
Em 22/11/2019 (conclusão de 18/11/2019) foi proferida sentença cuja parte decisória, na parte que interessa, reproduzimos:

“(…)Em consequência, não se verificando a nulidade da citação, não se verifica o fundamento do recurso de revisão invocado, o que dita, por si só, a total improcedência do recurso.
Termos em que se julga totalmente improcedente o recurso de revisão. (…)”
*
O recorrente veio pedir a reforma da sentença.
A recorrida pronunciou-se pelo indeferimento do requerido.
*
Não se conformando com aquela sentença veio o recorrente R. L. dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:

“I - Em 18/11/2019, foi proferida sentença pelo Tribunal a quo, que julgou totalmente improcedente o recurso de revisão apresentado pelo Réu, aqui Recorrente, em 10/07/2019.
II - No referido recurso de revisão, o Réu requereu que fosse declarada nula a citação edital a que se procedeu no âmbito do processo principal, por se tratar de um meio desnecessário, uma vez que a residência do Réu foi verificada junto deste.
III - Ademais, não foram respeitados todos os pressupostos estatuídos para a citação edital, previstos no artigo 248.º do anterior Código de Processo Civil.
IV - Foi, contudo, tal recurso de revisão julgado totalmente improcedente pelo Tribunal a quo, por entender que já estaria em vigor o atual C.P.C. e que, por tal, já não seria de aplicar o anterior artigo 248.º, fundamentando esta sua posição no artigo 5.º, n.º 1 da Lei 41/2013.
V - Mal andou o Tribunal a quo na sentença que julgou totalmente improcedente este recurso de revisão.
VI - Salvo melhor opinião, entende o Réu, aqui Recorrente, que seria de aplicar à sua citação edital o previsto no artigo 248.º do anterior C.P.C., em virtude de o artigo 5.º, n.º 3 da Lei 41/2013 estatuir que «as normas reguladoras dos atos processuais da fase dos articulados não são aplicáveis às ações pendentes na data de entrada em vigor do Código de Processo Civil, aprovado em anexo à presente lei» (sublinhado nosso).
VII - Verificando-se que o processo principal onde o Réu terá sido editalmente citado se encontra na fase dos articulados aquando da entrada em vigor do novo C.P.C., designadamente, quando se procedeu à referida citação edital.”
Pugna pela revogação da decisão e a sua substituição por outra que julgue procedente o referido recurso de revisão.
*
Foram apresentadas contra-alegações.
*
Foi indeferida a reforma da sentença.
O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
*
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
*
A questão a decidir é saber se andou bem a sentença recorrida ao julgar improcedente o recurso de revisão da sentença proferida em 10/11/2015 na acção declarativa em apenso.
*
II – Fundamentação

Foram considerados provados os seguintes factos, os quais foram completados com a consulta física da acção declarativa:

1.Em 07/03/2013 M. B. instaurou acção declarativa, sob a forma sumária, contra R. M., A. L. e Escola de Condução X, Lda..
2. A carta de citação do réu ora recorrente foi enviada para a morada Travessa ..., Braga e foi devolvida com a menção “não atendeu” – cfr. fls. 26 desses autos.
3. Foi determinada a citação por oficial de justiça naquela morada, não se tendo logrado a mesma e tendo sido consignado: “não ter sido atendido por ninguém nas diversas diligências que efectuei ao local. Em averiguações feitas no local contactei com alguns moradores do referido prédio que me informarem de que o apartamento está habitado mas que desconhecem os moradores, em consequência deixei aviso no sentido dos residentes do apartamento informarem se os citandos residiram no apartamento indicado ou não, o que não ocorreu até à presente data. Não procedi à citação por afixação por incerteza de residência” – cfr. fls. 58.
4. Foi determinado que se consultassem as bases de dados a fim de averiguar o paradeiro do réu ora recorrente não se tendo apurado morada diferente – todas as moradas das bases de dados consultadas – Segurança Social, Cartão de Cidadão, Autoridade Tributária - são a supra referida – cfr. fls. 63, 65, 72, com excepção da que resulta da carta de condução, em que se refere, em vez de 3º esq., 3º trás – cfr. fls. 70.
5. Foi determinado que se solicitasse à autoridade policial competente a averiguação do paradeiro do réu ora recorrente por referência à morada indicada na petição inicial e em resposta a PSP forneceu a completa identificação do ora recorrente, com indicação do cartão de cidadão, número de telemóvel e morada actual, sendo que esta é a que constava já dos autos, com a referência a 3º esq., e na parte final do ofício consta: “As informações acima mencionadas foram fornecidas pelo R. M. (…)”– cfr. fls. 78 verso;
6. Por requerimento de 15/07/2013 a autora pediu o seguinte:
“1. Conforme consta da informação fornecida pela PSP de Braga, o R. R. M. reside na residência indicada na Petição Inicial.
2. Em virtude do senhor oficial de justiça do Tribunal Judicial de Braga já ter se deslocado a tal residência, requer seja ordenada a citação por afixação da citação em local legalmente adequado.”.
7. Por despacho de 04/10/2013 foi ordenada a citação “nos termos requeridos em 15/07/2013”.
8. Foi deprecada a citação do ora recorrente tendo-se consignado: “Caso se verifique a impossibilidade de citação pessoal do réu, deverá ser dado cumprimento ao disposto no artº. 232º do CPC.”.
9. Em 23/10/2013 foi lavrada certidão negativa onde se lê: “Certifico que não levei a efeito a citação de Réu: R. M. (…), domicílio: Travessa … BRAGA, em virtude do citando já não residir na morada indicada, nesta diligência pude constatar que o referido apartamento encontra-se desabitado.” – cfr. fls. 107 dos autos principais
10. Por decisão de 05/11/2013 foi ordenada a citação edital do ora recorrente – cfr. fls. 117.
11. Foi afixado um edital à porta do tribunal (cfr. fls. 113 e verso), um edital na última morada conhecida do réu ora recorrente (fls. 122), e foi publicitada a citação no portal citius (fls. 114).
12. Foi ordenada a citação do Ministério Público nos termos do artigo 21º do C.P.C., o que ocorreu em 26/02/2013.
13. Foi proferida sentença em 10/11/2015, a qual transitou em julgado.
*
Nos termos do art. 627º do C.P.C., diploma a que pertencerão os preceitos citados sem menção de origem, “As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos” (nº 1) “ordinários e extraordinários, sendo que são ordinários os recursos de apelação e de revista e extraordinários o recurso para uniformização de jurisprudência e a revisão” (nº 2).
Assim, os recursos ordinários são interpostos de decisão não transitada em julgado para tribunal hierarquicamente superior e visam o reexame da causa podendo, em caso de procedência, levar a anulação, revogação ou modificação da mesma (ocorre uma prorrogação da instância). Os recursos extraordinários são interpostos de decisão já transitada em julgado, são julgados pelo mesmo tribunal que proferiu a sentença ou acórdão (constituem uma renovação da instância já finda).
O recurso de revisão encontra-se previsto nos art. 696º a 702º.

Refere Amâncio Ribeiro, in Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª ed, Almedina, p.323-324:
“O recurso extraordinário de apelação é uma expediente processual que permite a quem tenha ficado vencido e prejudicado num processo anteriormente terminado a sua reabertura, mediante a invocação de certas causas taxativamente indicadas na lei. (…)
Será o último remédio contra os erros que atingem uma decisão judicial, já insusceptível de impugnação pela via dos recursos ordinários.
Ao lançar-se mão da revisão pretende-se a substituição da decisão revidenda por outra sem a anomalia que justificou a impugnação ou a sua anulação (…)”.
A sua justificação prende-se com particulares exigências de justiça material que se devem sobrepor às razões de segurança ou de certeza inerentes ao caso julgado.

Com vista a conciliar estes valores a lei, no art. 697º nº 2, prevê dois prazos de caducidade para a interposição deste recurso, salvo se respeitar a direitos de personalidade:
- o prazo máximo de cinco anos sobre a data do trânsito em julgado da decisão revidenda (proémio);
- e, sem prejuízo deste prazo, ainda o prazo de 60 dias contados nos termos das suas alíneas: no caso da al. a), do trânsito em julgado da sentença em que se funda a revisão; no caso da al. b), desde que a decisão que funda a revisão se tornou definitiva; no caso da al. g), desde que o recorrente teve conhecimento da sentença (nº 3); e nos outros casos, desde que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão.
Os tribunais superiores têm defendido que estes prazos correm em paralelo e a exaustão de qualquer deles provoca a extinção, por caducidade, do direito de interpor o recurso.
Estes prazos constituem requisitos de admissibilidade deste recurso cujo esgotamento conduz à sua rejeição nos termos do art. 641º nº 2 a) ou, num momento posterior, ao não conhecimento do seu objecto. Neste sentido vide Ac. do S.T.J. de 22/03/2018 (Tomé Gomes), in www.dgsi.pt, endereço ao qual pertencerão os acórdãos citados sem menção de origem.
Outro requisito de admissibilidade deste recurso é a legitimidade do recorrente que se afere nos termos da norma geral do art. 631º pelo que tem legitimidade para interpor recurso de revisão a parte vencida e prejudicada.

Este recurso é interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever - art. 697º nº 1. Assim, “(…) a competência (…) pode pertencer ao tribunal de 1ª instância, à Relação ou ao Supremo Tribunal de Justiça. Tudo depende do órgão jurisdicional que proferiu a decisão transitada em julgado.” – Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª ed., Almedina, p. 497. No caso de decisão final ser proferida por um tribunal superior é indiferente que aquela seja revogatória ou confirmatória. Esta é a jurisprudência uniforme do S.T.J..

No art. 696º estão previstos de forma taxativa os fundamentos deste recurso que se podem agrupar nas seguintes categorias referentes:

1) à actividade material do juiz (a));
2) à situação das partes (d), e));
3) à formação do material instrutório (b), c));
4) à inconciliabilidade com decisão definitiva de uma instância internacional (f);
5) a acto simulado das partes (g)).

Neste sentido Amâncio Ribeiro, ob. cit., p. 327-339.

O recurso de revisão tem duas fases:

- a fase rescidente que visa apurar se se verifica o fundamento da revisão previsto no citado art. 698º. Se o recurso for improcedente o processo termina aqui;
- a fase rescisória, para a eventualidade de o recurso ser procedente, que renova a anterior instância, expurga o vício de que padecia (mantendo-se tudo o mais) e julga novamente a acção.
*
Uma vez que a presente apelação tem por objecto a decisão proferida no recurso de revisão em que se invoca como fundamento o disposto no art. 696º e) importa analisar este preceito.

Dispõe o mesmo:

“A decisão transitada em julgado só pode ser objecto de revisão quando: (…)
c)Tendo corrido a ação e a execução à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, se mostre que faltou a citação ou que é nula a citação feita; (…)”.
Revelia “significa falta absoluta de intervenção, por si ou por meio de representante, no processo em que foi proferida a sentença a rever” e “a falta de citação autoriza e legitima este pressuposto: o réu não se defendeu porque não pôde; e não pôde, porque não teve conhecimento de que contra ele fora proposta a acção (…) a sentença formou-se sem que ao réu fosse facultado o exercício do direito de defesa, o processo, de que ela saiu, acusa anomalia muito grave: supressão do contraditório” – Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. VI, p. 363 e ss.
Por vezes a diferença entre a falta absoluta de citação e a nulidade da citação é ténue daí que se equipararem as duas situações e se atribua a mesma consequência em caso de revelia.
Refere Amâncio Ferreira, ob. cit., p. 331, que estão abrangidas as situações previstas no art. 188º - a omissão completa do acto de citação, o erro de identidade do citado, o emprego indevido da citação edital, a citação efectuada depois do falecimento do citando ou depois da extinção da pessoa colectiva ou sociedade, a demostração de que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento, por facto que não lhe seja imputável – e art. 191º do C.P.C. – inobservância das formalidades prescritas na lei para a realização da citação.

Neste caso “(…) tem legitimidade para recorrer precisamente o réu que não foi citado ou o foi irregularmente naquela ação e que se tem por afectado pelo caso julgado ali formado” – citado Ac. do S.T.J. de 22/03/2018.

Com vista a apurar se a decisão recorrida andou bem importa, antes do mais, saber que regime jurídico é aplicável à citação em causa.
A Lei nº 41/2013 de 26 de Junho, que aprovou o Código de Processo Civil Revisto, entrou em vigor em 01/09/2013.

O art. 5º, referente à acção declarativa, dispõe:

“1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o Código de Processo Civil, aprovado em anexo à presente lei, é imediatamente aplicável às acções declarativas pendentes. (…)
3 – Nas normas reguladoras dos atos processuais da fase dos articulados não são aplicáveis às acções pendentes na data de entrada em vigor do Código de Processo Civil, aprovado em anexo à presente lei. (…)

Assim sendo, tendo a acção dado entrada em 07/03/2013, ao acto da citação, acto processual da fase dos articulados, é aplicável o C.P.C. na versão anterior a esta revisão, i.e., é aplicável o disposto nos art. 228º e ss dessa versão.
Vejamos então se, quanto à citação do ora recorrente, foi cumprido o disposto nesta versão do C.P.C..
Foi expedida carta registada com aviso de recepção para citação na morada indicada na petição (art. 228º, nº 1, 233º, nº 1 e 2 b), 234º, 236º nº 1), mas a mesma não foi possível, tendo sido aposta nessa carta a menção “Não Atendeu” e tendo a carta sido devolvida ao remetente.
Foi dado cumprimento ao disposto no art. 239º nº 9 tendo sido tentada a citação mediante funcionário de justiça, a qual não foi possível porque ninguém atendeu, e como este não conseguiu apurar se o citando residia efectivamente naquele local, não pôde deixar nota com indicação de hora certa para a diligência nalguma pessoa que estivesse em condições de a transmitir ao citando e/ou afixar o respectivo aviso no local mais indicado (art. 240º nº 1 e 4 a contrario).
Por se ter considerado que a citação não se mostrava possível por o citando estar ausente em parte incerta, foi ordenado que se averiguasse o actual paradeiro do citando nas bases de dados. A secretaria assim diligenciou tendo verificado que, na base de dados da Segurança Social, identificação civil e da Direcção-Geral dos Impostos, a morada do ora recorrente é a mesma que aquela que constava dos autos. A morada que constava da base de dados do IMTT é parcialmente coincidente sendo que, em vez de 3º esq., consta 3º trás, sendo que claramente se trata de lapso e não de outra morada. Deste modo foi dado cumprimento ao disposto no art. 244º nº 1.
Após, nos termos da parte final do nº 1 deste preceito, foi ordenado que se diligenciasse junto da entidade policial competente no sentido de apurar a última residência conhecida do citando, o que foi feito.
Do ofício da PSP resulta que as informações obtidas foram prestadas pelo próprio R. L. que indicou como sua residência a mesma morada que consta da p.i. e que foi confirmada pela consulta às bases de dados.
Após, foi deferido o requerido pela autora tendo sido deprecada a citação do ora recorrente nos mesmos termos em que o havia sido, i.e., nos termos do art. 239º nº 9 por referência à morada fornecida pelo próprio. Nesse momento o oficial de justiça lavrou certidão negativa consignando que o citando já lá não residia e que o mencionado apartamento estava desabitado.
Perante esta informação foi finalmente ordenada a citação edital ora em análise dando-se assim cumprimento ao disposto no art. 233º nº 6.
Procedeu-se a esta citação tendo sido elaborado o competente edital e anúncio nos termos do art. 248º nº 1 e 249º.
Foi deprecada a afixação dos editais “nos locais designados por lei”, o que veio a ser feito à porta do tribunal e na última morada conhecida do réu. O anúncio foi publicado no Portal Citius.
Constata-se, assim, que a secretaria, no que concerne às formalidades da citação edital, cumpriu o disposto no art. 240º do N.C.P.C. e não o disposto no anterior art. 248º n 2 e 3 que preceituava a afixação de três editais (na porta do juízo, da última residência conhecida e da junta de freguesia) e a publicação de anúncio em dois números seguidos de um jornal, regional ou nacional, mais lido na localidade em que esteja em casa da última residência do citando.
Ora, nos termos do art. 198º nº 1 do C.P.C., sem prejuízo do disposto no art. 195º, é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei, contudo, nos termos do nº 4 do mesmo preceito A arguição desta nulidade só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado.

Entendemos que, no caso em apreço, a falta de cumprimento do disposto no art. 248º do anterior C.P.C. não é susceptível de prejudicar o direito de defesa do citado pelo que concluímos pela não nulidade da citação.

No C.P.C. Revisto o legislador tornou menos complexas e mais céleres as formalidades da citação edital passando a exigir apenas o anúncio em página informática de acesso público em termos a regulamentar por portaria do membro do governo responsável pela área da justiça e a afixação de um único edital na casa da última residência ou sede que o citando teve no país (art. 240º). Como se lê no preâmbulo deste diploma foi importado para o processo comum o regime de citação de ausentes em parte incerta instituído no regime processual civil de natureza experimental, aprovado pelo Dec.-Lei nº 108/2006, de 08 de Junho.

A versão inicial do art. 24º da Portaria nº 280/2013 de 26 de Agosto dispunha: O anúncio relativo à citação edital previsto no artigo 240.º do Código de Processo Civil é publicado no sítio da Internet de acesso público com o endereço eletrónico http://www.citius.mj.pt. Este preceito actualmente preceitua que O anúncio relativo à citação edital previsto no artigo 240.º do Código de Processo Civil é publicado na Área de Serviços Digitais dos Tribunais, acessível no endereço eletrónico https://tribunais.org.pt.
Considerou o legislador que tais formalidades eram aquelas que se revelavam adequadas a esse momento histórico e que eram susceptíveis de possibilitar o conhecimento pelo réu do processo contra si instaurado.
A equiparação entre as formalidades previstas no anterior e no actual C.P.C. permite concluir que a adopção das últimas no lugar das primeiras não tem a virtualidade de prejudicar a defesa do réu e ora recorrente.
E não sendo nula a sua citação é de manter a decisão recorrida que julgou improcedente o presente recurso de revisão.
*
As custas da apelação são da responsabilidade do recorrente atento o seu decaimento (art. 527º nº 1, 2 do C.P.C.).
*
Sumário – 663º nº 7 do C.P.C.:

I – O recurso extraordinário de revisão tem como razão de ser exigências de justiça material que se sobrepõem às razões de segurança ou de certeza inerentes ao caso julgado.
II - Daí que o art. 697º nº 2 do C.P.C. tenha previsto dois prazos de caducidade para a sua interposição, salvo se respeitar a direitos de personalidade: a) o prazo máximo de cinco anos sobre a data do trânsito em julgado da decisão a rever; e, sem prejuízo deste prazo, b) o prazo de 60 dias contados, no caso do fundamento previsto na al. c) do art. 696º do C.P.C., desde que o recorrente obteve o documento que serve de base à revisão.
III – Tem legitimidade para interpor recurso de revisão com fundamento na falta de citação ou nulidade de citação o réu que não foi citado ou o foi irregularmente e que não interveio na acção ou execução.
IV – Numa acção declarativa entrada em 07/03/2013 ao acto da citação é aplicável o anterior C.P.C. nos termos do art. 5º nº 1 e 3 da Lei nº 41/2013 de 26 de Junho, que aprovou o Código de Processo Civil Revisto.
V - A falta de cumprimento do disposto no art. 248º do anterior C.P.C. e o cumprimento do disposto no art. 240º do C.P.C. Revisto, por não ter a virtualidade de prejudicar a defesa do réu, não consubstancia nulidade de citação e fundamento de revisão de sentença.
*
III – Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e em confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo apelante.
**
Guimarães, 29/10/2020

Relatora: Margarida Almeida Fernandes
Adjuntos: Margarida Sousa
Afonso Cabral de Andrade