Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3870/20.2T8GMR-A.G1
Relator: CONCEIÇÃO SAMPAIO
Descritores: PROCEDIMENTO EUROPEU
ARRESTO DE CONTAS
O REGULAMENTO (UE) Nº 655/2014
COBRANÇA TRANSFRONTEIRIÇA DE CRÉDITOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/20/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora):

I - O Regulamento (UE) nº 655/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, estabelece um procedimento europeu que permite a um credor obter uma decisão europeia de arresto de contas (DEAC) que impeça que a subsequente execução do crédito seja inviabilizada pela transferência ou pelo levantamento de fundos detidos pelo devedor ou em seu nome numa conta bancária mantida num Estado-Membro, visando facilitar a cobrança transfronteiriça de créditos em matéria civil e comercial.
II - As condições de concessão da decisão de arresto deverão proporcionar um equilíbrio adequado entre o interesse do credor em obter uma decisão e o interesse do devedor em prevenir abusos da decisão.
III - Por conseguinte, quando o credor apresenta um pedido de decisão de arresto antes de obter uma decisão judicial, cabe-lhe demonstrar que é provável que obtenha ganho de causa no processo principal contra o devedor e que o seu crédito tem necessidade urgente de proteção judicial e que, sem o arresto, a execução da decisão judicial pode ser frustrada ou consideravelmente dificultada.
III - Tendo em conta a natureza ex parte do processo para a concessão da decisão de arresto, permite-se ao devedor impugnar a decisão com base nos fundamentos previstos no Regulamento, sendo um deles o crédito do credor não necessitar de proteção urgente sob a forma de uma decisão de arresto, por não existir o risco de a execução subsequente desse crédito ser impedida ou ser substancialmente dificultada.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I - RELATÓRIO

X – TÊXTEIS, SA, com sede na Rua …, Fafe, veio instaurar procedimento de decisão europeia de arresto de contas, nos termos previstos no Regulamento (EU) n.º 655/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de maio de 2014 contra Y, com sede em …., França.

Alega para o efeito que estabeleceu com a Requerida um acordo comercial para prestação de serviços de confeção e fornecimento de máscaras. Que ficou obrigada a prestar os serviços e a entregar a mercadoria à devedora nas suas instalações, o que sucedeu, e que, em contrapartida, a devedora ficou obrigada a levantar a aludida mercadoria nas instalações da credora, a contratar o transporte e a pagar à credora os serviços prestados e os bens entregues em Portugal.
Realizada a produção de prova indicada pela Requerente, com dispensa da audiência prévia da Requerida, foi decretado o arresto europeu do valor dos depósitos bancários, até ao limite total de € 2.926.460,71, das contas aí melhor identificadas tituladas pela Requerida, sujeito à condição de prévia prestação, pela credora/Requerente, de caução no valor de €39.544,76 (trinta e nove mil, quinhentos e quarenta e quatro euro e setenta a seis cêntimos), na modalidade de penhor dos equipamentos industriais, de valor igual ou superior ao montante caucionado, pertencentes à Requerente.
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Veio a Requerida “Y”, manifestar oposição à providência de arresto decretada, invocando que a Requerente X não informou o tribunal de que está em curso uma ação judicial em França, na qual se discutem os valores dos fornecimentos a que se reportam os presentes autos e que não há perigo de não cobrança de dívida.
Indicou dois meios de prova documental, constituídos por: - certificação YX de que não há perigo de não cobrança de dívida; e - cópia traduzida da citação da feita à X para realização de audiência no dia 15.09.2020, no Tribunal de Comércio de Paris.
Por despacho proferido a 08.09.2020 (fls. 209) foi a Requerida convidada a, entre outras coisas, aperfeiçoar o seu articulado: - descrevendo os factos que, em seu entender, afastam a situação de perigo de não cobrança da dívida; - juntar tradução da petição inicial da cação alegadamente proposta contra a Requerente no Tribunal do Comércio de Paris, bem como, do articulado de contestação / oposição da Requerida, se já constar dos autos, de modo a permitir avaliar os respetivos pedido e causa de pedir.
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Na sequência do convite, a Requerida apresentou oposição aperfeiçoada:
- esclarecendo que a ação que corre termos nos Tribunais Franceses, proposta pela Requerida contra a aqui Requerente, se funda no incumprimento, pelas máscaras fornecidas pela “X”, das especificações técnicas e padrões de qualidade ajustados com a Requerida, determinantes da sua retirada do mercado após queixas dos consumidores e de prejuízos avultadíssimos sofridos pela “Y” pois que foi resolvido com justa causa contrato que tinha celebrado com outro fornecedor francês, de 9 milhões de máscaras no valor de € 36.620.000,00 com o que a Requerida deixou de auferir lucros de 22 milhões de euros, a que acrescem € 1,8 milhões de retirada do mercado das máscaras defeituosas e € 100.000,00 de danos reputacionais;
- invocou inexistência do receio de perda de garantia patrimonial do crédito da Requerente, já que não padece de falta de liquidez, sendo empresa consolidada no mercado e financeiramente, tendo optado por não responder à carta remetida pela Requerente por entender que deveria ter por interlocutor o W Groupe, sendo o não pagamento dos valores reclamados por outras empresas produtoras de máscaras em Portugal devido a defeitos idênticos aos detectados nas da Requerente. Mais alegou que é detida a 100% pela sociedade anónima de direito francês denominada K, integrada no Grupo C., cotado na Bolsa de Valores de Paris, com reputação de solidez e destacada actividade internacional nos sectores da protecção temporária de superfícies, entretela para vestuário, têxteis técnicos e lã penteada de luxo.
No inicio da audiência de julgamento o Mmº Juiz proferiu despacho sobre a junção de documentos pela Requerente, indeferindo a junção por considerar que, para além de intempestiva, não é relevante para a questão que importa apurar nesta audiência final, com reflexo na decisão de arresto internacional ordenada.
Após a produção de prova testemunhal, a Requerente insistiu na pertinência da junção dos documentos, o que veio a ser novamente indeferida pelos mesmos fundamentos.
O Mmº Juiz proferiu ainda o seguinte despacho:
“Nos termos do despacho proferido a 08.09.2020, foi a Requerida convidada para aperfeiçoar o seu articulado de oposição que juntou, descrevendo os factos que em seu entender afastam a situação de perigo da não cobrança da dívida, para além de outros elementos que se destinavam regularizar a instância e a permitir ao tribunal conhecer o objecto do litígio, alegadamente pendente em tribunais franceses.
Na oposição aperfeiçoada junta pela Requerida, para além de matéria que se inscreve no âmbito do convite dirigido pelo tribunal, há também matéria que o extravasa, nomeadamente relativa à existência ou não do crédito alegado pela Requerida. Nesta parte, por exceder o âmbito da oposição apresentada, o tribunal entende não ser admissível produção de prova sobre o teor dos artigos não directamente relacionados com o perigo de perda da garantia patrimonial do alegado crédito da Requerente.
Termos em que determino que a prova incidirá sobre os seguintes artigos da oposição: 20º, 21º, 26º, 72º, 73º, 75º, 87º a 89º, 92º a 95º.-
Notifique.
Em aditamento ao despacho acabado de proferir, esclareço as partes que, tal como em qualquer procedimento cautelar em que o contraditório é exercido posteriormente ao decretamento, é admitida também a produção de prova relativamente à matéria de facto que foi alegada pela Requerente no requerimento inicial e que foi considerada provada pelo Tribunal.
Para além do âmbito já definido, a prova incidirá também sobre esta matéria”.
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Dos despachos que antecedem foram todos os presentes devidamente notificados, do que disseram ficar bem cientes.
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Realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que julgou improcedente a oposição deduzida, mantendo o arresto europeu de contas determinado nos autos.
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Inconformada com a sentença, a Requerida interpôs recurso, finalizando com as seguintes conclusões:

Do despacho proferido no início da audiência final:

1. Conforme se alegou e demonstrou, o despacho proferido pelo Tribunal a quo no início da audiência final padece de clamorosos erros de direito;
2. A Recorrente apresentou nos autos, a 27 de agosto de 2020, formulário de oposição (impugnação) ao abrigo da faculdade prevista no artigo 33.º, n.º 1, alínea a) do Regulamento (EU) n.º 655/2014, no qual, desafiando a verificação dos dois requisitos de que depende a decisão europeia de arresto de contas bancárias (a probabilidade de a Recorrida, ali Requerente, vir a obter ganho de causa no processo principal e a necessidade urgente da decisão, sob pena de, sem ela, a cobrança do alegado crédito vir a ser frustrada ou consideravelmente dificultada), alegou que:
(i) está atualmente pendente, nos tribunais franceses, acção judicial instaurada pela Recorrente na qual se discutem os fornecimentos a que se reportam os presentes autos (exceção de litispendência) (cfr. 6.1.1.5. do formulário);
(ii) o pedido da Recorrida baseia-se em facturas sem suporte ou correspondência com qualquer ordem de compra (cfr. 6.1.1.5. do formulário);
(iii) a Recorrente, sociedade com capital social no valor de EUR 6.328.660,00, goza de perfeita saúde patrimonial e financeira, pelo que não existe qualquer risco de não cobrança do alegado crédito (cfr. 6.1.1.4. do formulário); e
(iv) as circunstâncias de facto subjacentes à decisão de arresto não foram estabelecidas com precisão (cfr. 6.1.1.8. do formulário);
3. Mais tarde, respondendo ao convite que lhe foi dirigido pelo Tribunal a quo, a Recorrente apresentou nos autos versão aperfeiçoada da sua oposição, através da qual, partindo dos fundamentos já invocados no formulário anteriormente remetido:
(i) juntou aos autos os documentos cuja apresentação lhe havia sido ordenada pelo Tribunal a quo, nomeadamente versões traduzidas do certificado YX e da petição inicial relativa à ação proposta, junto dos tribunais franceses, contra o W Group, a Recorrida e outras entidades portuguesas;
(ii) informou os autos a respeito do estado dessa ação, bem como dos factos e fundamentos que estiveram na sua origem, em particular os avultados prejuízos por si sofridos em consequência da entrega de máscaras defeituosas confecionadas pela Recorrida, ali Ré (resolução do contrato-quadro celebrado com o operador francês P. Répartition);
(iii) após descrever sumariamente o objeto da sua atividade e dar conta das razões e do contexto que a levaram a dedicar-se à produção de máscaras de proteção sanitária, narrou, de forma sintética, os factos da relação comercial por encetada com o W Group, operador francês do ramo da indústria da moda, esclarecendo também que foi no âmbito dessa relação que o fabrico das máscaras dos autos veio a ser confiado à Recorrida;
(iv) em estreita relação com o referido em (iii) e, bem assim, com a ação então pendente nos tribunais franceses, deu conta das razões por que se recusara a liquidar o crédito invocado nos autos, a saber:
- por um lado, o carácter defeituoso (falta de resistência à lavagem) de parte significativa das máscaras entregues pela X;
- por outro, o facto de o pedido da X se basear em faturas sem correspondência com qualquer ordem de compra, visto que as máscaras a que tais faturas se reportam foram fabricadas ao arrepio das instruções transmitidas pela Recorrente ao W Group;
(v) alegou factos que, atestando da robustez da sua situação patrimonial e também da solidez da sua situação financeira, permitem comprovar a inexistência de qualquer risco de não cobrança da quantia arrestada, caso o crédito alegado venha a ser reconhecido à Recorrida;
(vi) arrolou testemunhas e juntou documentos;
4. Assim, ao determinar, no início da audiência final, «não ser admissível produção de prova sobre o teor dos artigos não diretamente relacionados com o perigo de perda da garantia patrimonial do alegado crédito da Requerente», o Tribunal a quo desconsiderou factualidade essencial alegada no formulário de oposição, designadamente: a respeitante ao carácter defeituoso das máscaras dos autos, que motivou a instauração, nos tribunais franceses, de ação judicial contra o W Group, a Recorrida e outras nove empresas portuguesas; e, bem assim, a existência de instruções expressas da Recorrente, pela mão dos seus responsáveis, designadamente do Senhor D. N., seu antigo diretor geral, para interrupção do processo de fabrico;
5. O Tribunal a quo fez tábua rasa de parte – e parte relevantíssima, porque atinente à própria existência do crédito invocado nos autos – dos fundamentos de defesa aduzidos pela Recorrente, ditando, de forma arbitrária e nunca explicada, que só a defesa deduzida quanto ao chamado periculum in mora deveria ser sujeita a prova e discussão;
6. Por ter ficado a Recorrente impedida de produzir prova dos restantes factos por si alegados, fosse inquirindo direta e livremente as suas testemunhas, com o detalhe, a extensão e a profundidade que se impunham, fosse confrontando-as com os documentos juntos com a oposição, só poderá concluir-se que não foi dado cumprimento ao estatuído no artigo 36.º, n.º 3 do Regulamento (EU) n.º 655/2014;
7. Em virtude do erro do Tribunal a quo, resultaram igualmente lesados os princípios do dispositivo (5.º, n.º 1 do CPC), do contraditório e da igualdade das partes (artigos 3.º, n.º 3 e 4.º do CPC), o direito de defesa da Recorrente e o próprio processo equitativo (20.º, n.º 4 da CRP);
8. Tal lesão veio a mostrar-se tanto mais grave quanto é certo que, no decurso da audiência, o Meritíssimo Juiz a quo não se coibiu de, em mais do que uma ocasião, questionar as testemunhas sobre matéria por si excluída do objeto da instância (cfr., a título meramente exemplificativo, gravação de depoimento constante do sistema de gravação digital Habilus media, prestado na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 11.ª gravação, ficheiro áudio “20210114120734_5831184_2870529”, trecho 00:31:59-00:43:34);
9. Veio, pois, o Meritíssimo Juiz a quo, depois de coartar, ab initio, o direito de prova que a esta assistia, solicitar às testemunhas da Recorrente, em violação da sua própria decisão, esclarecimentos a respeito de factos que ele mesmo, Meritíssimo Juiz a quo, impedira a Recorrente de abordar;
10. Mais se veio a constatar, terminado o interrogatório da primeira testemunha e dada a palavra à Ilustre Mandatária da Recorrida para esclarecimentos, que o Tribunal a quo admitiu, por via de novo despacho, e em violação flagrante da lei processual (artigo 516.º, n.º 2 do CPC), que a Recorrida fizesse uso das testemunhas da Recorrente para tentar fazer prova dos factos invocados no requerimento inicial;
11. A sufragar-se este entendimento, que será objeto de impugnação autónoma, ter-se-ia que todos os intervenientes processuais poderiam fazer uso das testemunhas arroladas pela Recorrente, menos a própria Recorrente, que, sujeita no início a uma autêntica “camisa de varas” no tocante à sua alegação, teria ainda de se ver confrontada com a negação do direito de prova que lhe assistia;
12. O desnorte e a arbitrariedade do Tribunal a quo ficam ainda patentes no facto de este, votando uma vez mais ao desprezo a sua própria decisão, ter vindo a consignar na sentença final, em sede de fundamentação da decisão de facto, várias afirmações a respeito de factos excluídos do objeto da prova, tal como definido no despacho recorrido, como sejam os defeitos presentes nas máscaras confecionadas pela Recorrida;
13. A par do erro cometido ao ignorar a alegação constante do formulário de oposição, incorreu o Tribunal a quo num outro, igualmente grave e manifesto, que consistiu em recusar à Recorrente a possibilidade de, através de apresentação de oposição aperfeiçoada, apresentar todos os seus argumentos» de defesa, conforme prescrito no já referido no artigo 36.º, n.º 3 do Regulamento (EU) n.º 655/2014;
14. É que, como bem assinalou, em acórdão datado de 14 de janeiro de 2021, este Venerando Tribunal, «considerando o que consta do formulário [da Recorrente], o despacho [de convite ao aperfeiçoamento] proferido» pelo Tribunal a quo «peca (…) por defeito, pois apenas convida a Requerida a descrever os factos que afastam a situação de perigo de não cobrança da divida, quando devia ser dada a oportunidade à mesma para apresentar todos os seus argumentos»;
15. Como se sabe, com a aprovação do novo CPC, o convite ao aperfeiçoamento nos termos do n.º 4 do artigo 590.º passou a revestir a natureza de poder-dever, isto é, ato vinculado a praticar pelo juiz, cuja falta de observância dá origem a nulidade processual, entendimento amplamente confirmado pela doutrina e jurisprudência nacionais;
16. Poder-dever este que assumia, no caso vertente, natureza reforçada, atenta, desde logo, a própria configuração do formulário prescrito pelo Regulamento (EU) n.º 655/2014, que, sendo composto de códigos, pequenos campos e quadrículas, não se compadece com a narração completa, pormenorizada e exaustiva dos factos do litígio;
17. Mas também pelo facto de, na situação dos autos, se estar em presença de procedimento que comporta importante desvio ao princípio do contraditório – a decisão de arresto não foi antecedida de audição da Recorrente –, consubstanciado assim o convite ao aperfeiçoamento o único mecanismo de garantir, na prática, o restabelecimento da igualdade das partes;
18. Por assim ser, sempre se teria de admitir se à Recorrente que viesse oferecer, em toda a sua extensão, os fundamentos de facto e de direito da sua defesa, em particular quanto à (in)existência do crédito invocado;
19. Negar à Recorrente a faculdade de apresentar as razões da sua defesa (não só as atinentes à invocada dificuldade de cobrança do crédito alegado como também as respeitantes à própria existência desse crédito), nas circunstâncias dos autos, equivaleria, mais do que a um desrespeito pelo contraditório e pela igualdade das partes, a uma verdadeira e própria denegação da tutela jurisdicional efetiva, consagrada no n.º 1 do artigo 20.º da nossa Lei Fundamental (e prevista também nos n.ºs 1 e 2 do artigo 2.º do CPC);
20. De tal sorte que se pode dizer que a interpretação que o Tribunal a quo faz do disposto no artigo 590.º, n.º 4 do CPC é inconstitucional, por violação da tutela jurisdicional efetiva e do direito a processo equitativo;
21. Arguida se deixa assim, expressamente e para os devidos efeitos legais, a inconstitucionalidade da referida interpretação: é inconstitucional, por violação do disposto no artigo 20.º, n.º 1 e n.º 4 da CRP, a interpretação que o Tribunal a quo extrai da norma contida no artigo 590.º, n.º 4 do CPC, segundo a qual, estando em causa procedimento de decisão europeia de arresto de contas previsto no Regulamento (EU) n.º 655/2014, é inadmissível a apresentação de articulado de impugnação (oposição) aperfeiçoada pela parte requerida onde sejam oferecidos todos os fundamentos de facto e de direito da sua defesa, não se limitando esta ao estrito âmbito do convite ao aperfeiçoamento previamente formulado pelo tribunal;
22. Do mesmo passo, mal se compreenderia que, depois de a Recorrida ter beneficiado, numa primeira sessão de inquirição de testemunhas, da possibilidade de, sem contraditório da Recorrente, produzir a sua prova, esta última viesse a ficar impedida, em sede de audiência final, de inquirir direta e livremente as suas testemunhas sobre os factos da sua defesa;
23. Aceitar que assim fosse significaria converter os autos, de início ao fim, num procedimento não contraditório, algo que a Constituição e a lei evidentemente não admitem;
24. Assim, ao decidir como decidiu, o despacho recorrido violou o disposto nos referidos artigos 36.º, n.º 3 do Regulamento (EU) n.º 655/2014, 3.º, n.º 3, 4.º, 5.º, n.º 1 e 590.º, n.º 4 do CPC e 20.º, n.º 1 e n.º 4 da CRP, impondo-se a sua revogação e substituição por outro que, admitindo a produção de prova sobre todos os factos alegados na oposição aperfeiçoada, ordene a anulação do processado subsequente e determine, por consequência, a repetição da audiência final;

Do despacho proferido no decurso da produção de prova:
25. SEM PRESCINDIR, e à cautela, a Recorrente impugna também, nesta sede, o despacho proferido pelo Tribunal a quo no decurso da produção de prova, o qual, na medida em que admitiu que as testemunhas da Recorrente fossem questionadas sobre factos não compreendidos no âmbito do interrogatório, em particular factos alegados no requerimento inicial, padece igualmente de clamoroso erro de direito;
26. Nos termos da lei, a testemunha é interrogada sobre os factos que tenham sido articulados pela parte que a oferece (artigo 516.º, n.º 2, primeira parte, do CPC), sendo que, terminado o interrogatório, o mandatário da outra parte pode fazer-lhe, quanto aos factos sobre que tiver deposto, as instâncias indispensáveis para se completar ou esclarecer o depoimento (artigo 516.º, n.º 2, segunda parte);
27. O regime do depoimento constante da lei processual veda, pois, à parte que faz as instâncias a utilização das testemunhas da contraparte para fazer prova dos factos por si alegados, proibição decorrente das exigências do contraditório e da igualdade das partes (artigos 3.º, n.º 3 e 4.º do CPC);
28. Ao admitir que as testemunhas da Recorrente fossem utilizadas pela Recorrida para prova dos factos do requerimento inicial, maxime depois de ter coartado à Recorrente, nos termos que se deixaram expressos supra, a faculdade de produzir prova dos factos constantes da sua oposição, incorreu o Tribunal a quo em violação flagrante e grosseira do processo equitativo, por imposição de tratamento diferenciado arbitrário:
29. Com efeito, a Recorrente não pôde inquirir as testemunhas por si arroladas sobre a matéria de facto alegada no formulário de oposição e na oposição aperfeiçoada; ao mesmo tempo, consentiu-se à Recorrida inquirir as testemunhas da Recorrente não apenas sobre factos que estas nunca afloraram no interrogatório realizado pela mandatária da Recorrente, ora signatária, como ainda sobre matéria alegada no requerimento inicial;
30. Decisão ainda mais grave se se pensar que o procedimento dos autos, marcado pela ausência de contraditório a priori, acarreta já de si, como se referiu, certa desigualdade originária;
31. Longe, assim, de acautelar, como era dever seu, a igualdade das partes, o Tribunal a quo cuidou mesmo de aniquilar: primeiro, fixando objeto da prova incompatível com as exigências do dispositivo, do contraditório e do processo equitativo, pelo qual impediu a Recorrente, à partida, de demonstrar os factos por si alegados; depois, interrompendo as testemunhas da Recorrente sempre que estas, de modo espontâneo, se dirigiam à matéria da Recorrente; e, por fim, mais tarde, consentindo à Recorrida que utilizasse as testemunhas da Recorrente para finalidade que a lei não admite, qual seja, a de produzir prova da alegação vertida no requerimento inicial;
32. A acolher-se esta posição, a consequência daí resultante seria, claro está, a negação do contraditório judicial e, com ela, do processo equitativo e justo;
33. Pelo que também o despacho ora recorrido deve ser revogado e substituído por outro que, dando cumprimento ao estipulado no artigo 516.º, 2, segunda parte do CPC, e acautelando, bem assim, as exigências do contraditório e da igualdade das partes (artigos 3.º, n.º 3 e 4.º do CPC, respetivamente), declare inadmissíveis as perguntas formuladas pela Ilustre Mandatária da Recorrida (conforme identificadas no requerimento submetido nos autos no dia 1 de fevereiro de 2021, referência Citius “37902879);
34. SEM PRESCINDIR, uma vez mais, quanto à impugnação do despacho proferido no início da audiência final, cuja revogação, que se está em crer inevitável, deverá conduzir à anulação do processado subsequente, dir-se-á também que, por padecer também de variadíssimos e manifestos erros (de facto e de direito), também a sentença proferida nos autos é merecedora de forte censura;

Da decisão sobre a matéria de facto
35. Assim acontece, desde logo, com o ponto 2 da decisão sobre a matéria de facto, do qual consta afirmação que, além de infundada, porque contrária à prova carreada para os autos (desde logo, o documento n.º 3 do requerimento inicial, mas também os depoimentos prestados), contém ainda juízo de teor jurídico-conclusivo («prestação de serviços») que ali não se pode aqui admitir;
36. À luz da prova produzida, da qual resulta, sem margem para dúvidas, que a única relação contratual encetada pela Recorrente foi a que a ligou ao W Group, impõe-se a retificação do referido segmento da matéria de facto, sugerindo-se, para o efeito, a seguinte redação: «A Requerida e o W Group estabeleceram um acordo para a prestação de serviços, de forma continuada, de confecção e fornecimento de um elevado número de máscaras “Y PROTECTION” e “Y SANTÉ", com parte da matéria-prima definida e entregue pela Requerida (tecidos, elásticos e ganchos de metal) e conforme as características e especificações técnicas também definidas pela Requerida.»;
37. Também quanto aos pontos 3 e 4 da decisão sobre a matéria de facto se impõe retificar a formulação adotada pelo Tribunal a quo, a qual, por não refletir fielmente o teor da prova (designadamente o aludido documento n.º 3 do requerimento inicial), deve ser substituída pela seguinte: «3 - Para a confeção e fornecimento das máscaras tipo Y PROTECTION a Requerida e o W Group acordaram o preço de € 0,80 / unidade, com um custo adicional de € 0,05 / unidade relativo ao custo do elástico. 4 - Para a confeção e fornecimento das máscaras tipo Y SANTÈ PROTECTION a Requerida e o W Group acordaram o preço de € 1.32/unidade.»;
38. No ponto 5 da decisão de facto, por sua vez, são proferidas afirmações sem qualquer suporte factual ou probatório, porquanto, conforme se apurou nos autos, todos os termos e condições do fornecimento de máscaras, incluindo a definição das respetivas quantidades, foram direta e exclusivamente ajustados com o W Group, tendo sido junto deste, nessa medida, que a Recorrente procurou certificar-se de que seriam fabricadas e entregues as quantidades por si pretendidas (destinadas a fazer face às obrigações assumidas no âmbito do contrato celebrado com a P. Répartition);
39. Nessa medida, por não se encontrar demonstrado, deve o ponto 5 ser eliminado da decisão sobre a matéria de facto;
40. Do ponto 6 da decisão de facto constam (i) vocábulos de teor jurídico-conclusivo que, por não terem lugar neste segmento decisório, devem ser eliminados do elenco de factos dados como provados, (ii) afirmações de carácter genérico e conclusivo que, além de carecerem de apoio na prova, tão pouco podem ter lugar no segmento da sentença dedicado à matéria de facto, e, bem assim, (iii) afirmações infirmadas pela prova carreada, seja no tocante a supostos “incentivos” da Recorrente à Recorrida para aquisição de maquinaria, seja a respeito da alegada entrega de «máscaras em quantidades e prazos aceites» pela Recorrente, o que, como se sabe, atentos os repetidos atrasos da Recorrida, não sucedeu (Cfr. gravações no sistema de gravação digital Habilus media dos depoimentos prestado na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trechos 00:21:50-00:25:18, e 11.ª gravação, ficheiro áudio “20210114120734_5831184_2870529”, trechos 00:21:41-00:33:15);
41. Em face do que antecede, necessário se torna retificar também o ponto 6 da decisão sobre a matéria de facto, para o qual se propõe a seguinte redação: «Com vista a cumprir o volume dos serviços contratados pelo W Group, a Requerente adquiriu maquinaria e equipamento específico para a realização da operação de corte e vinco do tecido.»;
42. Também no ponto 7 do elenco de factos provados se encontra consignada afirmação sobre a qual não foi produzida prova, sendo certo que os elementos trazidos aos autos (documentos n.º 12 e n.º 13 da oposição), se demonstram alguma coisa, é precisamente o contrário;
43. Por essa razão, deve o sobredito ponto 7 passar a ter nova redação, nos termos que aqui se sugerem: «No dia 05/06/2020 a Requerida deu indicações ao W Group para cessar imediatamente todas as operações de corte de tecidos e, no dia 17/06/2020, após constatar que tais operações continuaram a ser executadas, a Recorrente solicitou ao W Group a suspensão imediata da produção de máscaras.»;
44. O ponto 10 da decisão de facto contém expressão conclusiva («(…) as facturas em atraso»), a que subjaz juízo jurídico decisório cuja sede própria é, claro está, o segmento da sentença dedicado ao direito;
45. Impõe-se, por conseguinte, retificá-lo, para o que se sugere a seguinte redação: «A Requerida não pagou um conjunto de facturas emitidas pela Requerente, cujos montantes perfaziam, no dia 15/06/2020, a quantia total de € 813.776,00.»;
46. Não menos censurável é a expressão «seguindo as instruções da Requerida» constante do ponto 11 da decisão, expressão que, além de implicar, de novo, juízo de teor conclusivo, não encontra qualquer respaldo na prova produzida, da qual se retira, sem dificuldade, que a Recorrente, longe de instruir a Recorrida a concluir quaisquer produções em curso, transmitiu ao W Group que o processo de fabrico deveria ser prontamente interrompido: primeiro, através de indicações para a suspensão do corte de tecidos; depois, dado que as suas instruções não foram atendidas, solicitando a cessação de toda e qualquer atividade de produção;
47. Tão pouco o termo “devedora” constante do mesmo ponto 11, na medida em que tem subjacente um juízo jurídico-conclusivo, poderá permanecer neste segmento da sentença recorrida, havendo ainda que assinalar que, conforme se encontra corretamente dado como provado no ponto 26 da matéria de facto, a Recorrente transmitiu ao W Group, em devido momento, que entendia nada dever por conta das máscaras fabricadas pela Recorrida;
48. Em vista do exposto, deve o ponto 11 ser dado como não demonstrado, com a sua consequente eliminação do acervo de factos provados;
49. Também o ponto 16, na medida em que contém consideração eminentemente subjetiva – «a Requerente não conhece» – que, enquanto tal, não apresenta qualquer relevo para a boa decisão da causa, deve ser eliminado da decisão de sobre a matéria de facto;
50. Relativamente ao ponto 17 da decisão, são vários os erros a apontar ao Tribunal a quo:
51. Desde logo, constata-se que, com exceção dos documentos relativos à acção judicial proposta pela Recorrente nos tribunais franceses, não constam dos autos quaisquer elementos que permitam atestar a existência de litígio entre esta e as empresas ali referidas;
52. Ainda a este respeito, salienta-se que não é de excluir que, ao referir-se a “litígio”, o Tribunal a quo pudesse não ter tido em mente um litígio judicial, ou seja, processo pendente, mas meramente existência de conflito entre as empresas;
53. A eventual falta de rigor na terminologia empregue, na medida em que lança a dúvida sobre o sentido e alcance do facto provado no ponto 17 da decisão, é suscetível de configurar, por si só, nulidade deste ponto da decisão, por obscuridade, a qual se deixa arguida, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), segunda parte, do CPC;
54. Acresce que, ao fazer constar o sobredito ponto da decisão sobre a matéria de facto depois de ter limitado a produção de prova da Recorrente aos factos «relacionados com o perigo de perda da garantia patrimonial do alegado crédito», o Tribunal a quo volta a cometer violação grosseira do princípio do contraditório e da igualdade das partes (artigos 3.º, n.º 3 e 4.º do CPC);
55. Violação tanto mais grave quanto é certo que o mesmo critério não foi seguido no que respeita à contra instância da Recorrida, a qual, contra o previsto no artigo 516.º, n.º 2 do CPC, pôde colocar às testemunhas da Recorrente questões sobre matéria que, pese embora alegada na oposição, ficou excluída do objeto da instância (gravações no sistema de gravação digital Habilus media dos depoimentos prestados na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trechos 00:47:01-00:51:59, e 11.ª gravação, ficheiro áudio “20210114120734_5831184_2870529”, trechos 00:35:37-00:42:26);
56. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo desrespeitou também o objeto da instância que previamente fixara, conhecendo, nessa medida, de questões de que não podia tomar conhecimento, pelo que arguida vai assim, neste ponto, a nulidade parcial da sentença recorrida, por excesso de pronúncia, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), segunda parte, do CPC;
57. SEM PRESCINDIR, sempre se dirá que o Tribunal a quo só pode ter incorrido num manifesto erro de julgamento ao dar como provada a afirmação constante do ponto 17, visto que não só a Recorrente não manteve «relações comerciais» com «outras sociedades têxteis com sede em Portugal», nem tão pouco lhes é devedora de qualquer quantia (cfr. gravação no sistema de gravação digital Habilus media do depoimento prestados na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trecho 00:47:36), como foi a Recorrente que, em 3 de agosto de 2020, moveu ação judicial no Tribunal de Comércio de Paris contra o W Group, a Recorrida e as restantes sociedades portuguesas (vide petição inicial junta aos autos em resposta à notificação do Tribunal a quo);
58. Neste sentido, e caso este Venerando Tribunal não julgue procedentes as nulidades que se vem de arguir, requer-se, à cautela, que o ponto 17 seja excluído dos factos provados;
59. Dos pontos 11 (bis) e 19 do elenco de factos provados constam afirmações claramente contrárias ao teor da prova que – não obstante as restrições de objeto impostas pelo Tribunal a quo – foi produzida nos autos:

60. Antes de mais, não tendo a Recorrida prestado serviços à Recorrente, devem ser excluídas as expressões «prestou os seguintes serviços» e «relativamente a serviços que prestou»;
61. Depois, é falso que a Recorrente seja “devedora” da Recorrida (expressão que, de resto, por ter natureza jurídico-conclusiva, teria sempre, em qualquer caso, de ser excluída do segmento da sentença dedicado à matéria de facto);
62. Com efeito, e apesar da autêntica “proibição de prova” a que a Recorrente se achou submetida, dada a estreiteza do objeto da instância fixado pelo Tribunal a quo, os depoimentos prestados pelas testemunhas D. N. e S. L. permitiram, em todo o caso, apurar um certo número de factos: (i) desde logo, a circunstância de que parte muito significativa das máscaras entregues pela Recorrida, fabricadas no âmbito do acordo estabelecido entre a Recorrente e o W Group, se veio a revelar defeituosa, padecendo de falta de resistência à lavagem; (ii) em segundo lugar, que o aludido defeito ficou a dever-se à falta de cumprimento das especificações técnicas que a Recorrente transmitira ao W Group, designadamente no tocante à operação de corte dos tecidos; (iii) terceiro, que as máscaras em apreço tiveram de ser retiradas do mercado francês, com vista a prevenir o que poderia vir a representar um grave problema de saúde pública (cfr., neste sentido, gravações no sistema de gravação digital Habilus media dos depoimentos prestados na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trechos 00:24:45-00:29:14, e 11.ª gravação, ficheiro áudio “20210114120734_5831184_2870529”, trechos 00:27:11 e 00:36:12-00:37:42);
63. Decorre igualmente da prova que: (i) a Recorrente ajustou com o W Group um caderno de encargos e um sistema de controlo precisos; (ii) a Recorrida não cumpriu as especificações constantes desse caderno de encargos, dado que, se o tivesse feito, efetuando o corte do tecido corretamente, as máscaras não padeceriam do defeito que veio a ser detetado; e (iii) a Recorrida tão pouco levou a cabo os controlos de qualidade que se impunham, porquanto, se assim fosse, ter-se-ia apercebido, no mínimo, da falta de resistência das máscaras à lavagem;
64. Mais se apurou que, tendo a Recorrente, neste contexto, e por estas razões, dado indicações ao W Groupe para cessar de imediato as operações de corte de tecidos, a que se seguiu, atenta a falta de cumprimento das instruções transmitidas, o pedido de suspensão imediata de todo e qualquer processo produtivo, a Recorrida adotou atuação contrária, continuando a cortar o tecido e continuando, bem assim, a produzir máscaras, emitindo depois faturas, por conta dessas mesmas máscaras, à Recorrente (cfr., neste sentido, gravação no sistema de gravação digital Habilus media do depoimento prestado na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 11.ª gravação, ficheiro áudio “20210114120734_5831184_2870529”, trechos 00:21:46-00:23:23 e 00:24:42-00:27:11);
65. Contra a clareza e segurança dos depoimentos prestados, veio o Tribunal a quo, em sede de fundamentação, expender considerações totalmente desajustadas:
66. O que Tribunal a quo designa como “abrupto cancelamento” foi, na verdade, o que a Recorrida, com a sua culposa conduta, obrigou a Recorrente a fazer: mercê da entrega de máscaras defeituosas fabricadas pela Recorrida, a Recorrente veio a sofrer perda financeira na ordem dos EUR 22.000.000,00 (lucros cessantes emergentes da resolução do contrato com a P. Répartition), a que acresceram custos de cerca de EUR 1.800.000,00 com a recolha (essa sim abrupta) das máscaras do mercado;
67. Os relatórios da B. V. a que o Tribunal a que alude nunca chegaram a ser entregues à Recorrente (cfr. gravação no sistema de gravação digital Habilus media do depoimento prestados na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trecho 00:38:25) ou, se o foram, foram-no depois de a Recorrida, com a sua conduta, ter levado à resolução do contrato com a P. Répartition (cfr. gravação no sistema de gravação digital Habilus media do depoimento prestado na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trecho 00:40:55);
68. Sendo ainda certo que, no tocante às máscaras não encomendadas pela Recorrente (todas aquelas cuja produção se iniciou após 5 de junho de 2021), estando em causa produto não encomendado, por conta do qual nada poderá ser devido, é irrelevante saber se houve ou não certificação da respetiva conformidade;
69. Terceiro, só pode causar perplexidade que, ao considerar a atuação da Recorrente, o Tribunal a quo tenha decidido socorrer-se, não das explicações que foram dadas pelos representantes da própria Recorrente, mas de uma fantasiosa conjetura formulada pelo Senhor M. W, atinente a uma suposta «mudança (…) da conjuntura do mercado francês para este tipo de produtos»,
70. Conjetura cabalmente desmentida, desde logo, pela testemunha D. N., que deu conta do facto de a Recorrente continuar a fabricar e fornecer novas máscaras, encontrando-se, nesta data, a operar direta e autonomamente com parte das empresas nacionais selecionadas pelo W Group (cfr. gravação no sistema de gravação digital Habilus media do depoimento prestados na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trecho 00:48:49);
71. E desmentida, outrossim, pela testemunha S. L., que esclareceu que a Recorrente, longe de querer desonerar-se das obrigações a que se vinculara perante o W Group, pretendia apenas, como é bom de ver, não pagar máscaras defeituosas e/ou fabricadas ao arrepio das suas instruções (cfr. gravação no sistema de gravação digital Habilus media do depoimento prestado na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 11.ª gravação, ficheiro áudio “20210114120734_5831184_2870529”, trechos 00:20:40-00:22:21);
72. Por último, dir-se-á que, resultando o volume total de máscaras farmacêuticas – defeituosas – facilmente evidenciado do teor das faturas juntas com o requerimento inicial (faturas n.º FMA 20/266, n.º FMA 20/267, n.º FMA 20/276, n.º FMA 20/285, n.º FMA 20/297, n.º FMA 20/301, n.º FMA 20/306, n.º FMA 20/314, n.º FMA 20/319, n.º FMA 20/321 e fatura n.º FMA 20/336), bastaria que o Tribunal a quo tivesse analisado, com o cuidado e rigor que se impunham, o acervo dos autos para concluir, sem dificuldade, que o peso relativo da parcela de máscaras defeituosas no conjunto total de máscaras fabricadas pela Recorrida é superior a 50% (EUR 1.572.486,00);
73. Estivesse o Tribunal a quo realmente interessado na descoberta da verdade e ter-se-ia dado conta também de que a última das aludidas faturas (fatura n.º FMA 20/336), no valor de EUR 897.600,00, foi emitida a 22 de junho 2020, largamente depois, já se vê, das instruções da Recorrente para a interrupção e suspensão do processo de fabrico;
74. E mais tivesse o Tribunal a quo prestado atenção à prova carreada, teria verificado ainda que as faturas n.º FMA 20/312, FVA 20/60, FMA 20/316, FMA 20/320, FMA 20/322 e FMA 20/333, que totalizam nada mais nada menos que EUR 948.420,00, foram todas emitidas após 9 (e parte delas após 15) de junho de 2020, ou seja, bem depois, também aqui, das indicações da Recorrente para interrupção do corte de tecidos e suspensão de toda e qualquer etapa do processo de fabrico
75. Mal andou, assim, o Tribunal a quo ao considerar que a Recorrida se encontra “desprovida” de qualquer montante relativamente a serviços prestados, impondo-se a eliminação dos pontos 11 e 19 do elenco de factos provados;
76. No ponto 25 da decisão, é consignada afirmação que deturpa não apenas o sentido da alegação da Recorrente como também o teor da prova que sobre ela recaiu: a relação encetada entre a Recorrente e o W Group, recorde-se, teve por objeto o fornecimento e entrega de mercadorias (máscaras de proteção), segundo as condições e termos ajustados entre as duas entidades;
77. Nessa medida, deve o ponto 25 ser alterado de modo a refletir fielmente o teor da prova produzida, propondo-se, para tanto, a seguinte redação: «No âmbito do acordo identificado em 2, competia ao W Groupe gerir e intermediar a relação com as empresas portuguesas por este encarregues da confeção das máscaras.»;
78. Finalmente, no ponto 28 da decisão sobre a matéria de facto, é consignada afirmação equívoca de que resulta sugerido que a Recorrente só «tem em depósitos bancários disponibilidade financeira de cerca de € 3.000.000,00»;
79. Todavia, resulta da prova produzida nos autos (cfr. gravações no sistema de gravação digital Habilus media dos depoimentos prestados na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trechos 00:06:36-00:11:38 e 00:16:22-00:21:28, e 11.ª gravação, ficheiro áudio “20210114120734_5831184_2870529”, trechos 00:14:41-00:20:17) que:
80. A Recorrente conta com mais de um século de atividade sem nunca ter enfrentado problemas financeiros;
81. O capital social da Recorrente é superior a EUR 6.000.000,00;
82. Em 2019, o volume de negócios da Recorrente ascendeu a cerca de EUR 42.000.000,00, sendo que a divisão geral a que pertence a Recorrente no seio do grupo C. realizou, no mesmo período, volume de negócios de aproximadamente EUR 200.000.000,00;
83. A Recorrente detém importantes ativos, seja no plano do ativo fixo ou imobilizado (edifícios, terras e equipamento industrial), no qual se destaca «uma fábrica gigantesca a uma hora de Paris», seja ao nível do chamado ativo intangível (conhecimento ou know-how);
84. A Recorrente goza de boa saúde financeira, dispondo dos recursos suficientes para fazer face a todas as suas obrigações, vencidas e vincendas;
85. Capital social e volume de negócios, além de importantes indicadores da dimensão de uma empresa, fornecem também – em particular o volume de negócios – sólidos indícios das disponibilidades mínimas com que essa empresa tem de contar;
86. Com efeito, na atividade normal de uma empresa do setor têxtil, há a considerar inúmeras variáveis, como sejam mão-de-obra, equipamento, matéria-prima, custos de manutenção de toda a estrutura fabril e custos de energia;
87. Para mobilização de tais variáveis, é evidentemente necessária enorme disponibilidade financeira, sem a qual toda a laboração ficaria comprometida;
88. Pelo que para sustentar volume de negócios na ordem dos EUR 42.000.000,00, nunca a Recorrente poderia dispor de liquidez tão reduzida;
89. Afigura-se igualmente temerário considerar que uma empresa com ativos cujo valor ascende a largas dezenas milhões de euros, que emprega mais de duzentas pessoas e que é líder de mercado na sua área pode desenvolver com sucesso a sua atividade estando limitada a disponibilidades líquidas de EUR 3.000.000,00;
90. Só em despesas diretas com pessoal, a Recorrente despende anualmente quantia superior a EUR 3.694.560;
91. Não custa, pois, antever que, caso estivesse limitada a pouco mais de EUR 3.000.000,00 no banco, a Recorrente não poderia realizar os investimentos necessários à prossecução da sua atividade (matéria-prima, equipamentos, custos energéticos, etc.) e satisfazer, ao mesmo tempo, as suas obrigações legais (fiscais, patrimoniais, etc.), como, de facto, acontece e foi amplamente referido, nos seus depoimentos, pelas testemunhas D. N. e S. L.;
92. Consignar, assim, sem mais, que a Recorrente «tem em depósitos bancários disponibilidade financeira de cerca de € 3.000.000,00» afigura-se um manifesto erro de julgamento;
93. Igualmente se diga que o facto de, nos presentes autos, a Recorrida ter logrado arrestar depósitos bancários no valor de EUR 2.926.460,71 não habilita o Tribunal a quo a concluir que o montante de disponibilidades financeiras detido pela Recorrente é apenas de cerca de EUR 3.000.000,00;
94. No âmbito da providência decretada, a Recorrida logrou a apreensão de saldos bancários no valor do limite máximo determinado no arresto, ou seja, EUR 2.926.460,71;
95. A partir desse momento, coberto o valor total do crédito invocado, cessaram as diligências de arresto, donde se dirá que o único facto que estas permitem comprovar é que a Recorrente é titular de saldos bancários que incluem a quantia de EUR 2.926.460,71 (e nunca que esta cifra representa a totalidade dos ativos pecuniários da Recorrente);
96. Pelas razões expostas, impõe-se retificar o ponto da decisão de facto a que se vem aludindo, sugerindo-se desde já, para o efeito, a seguinte redação: «A Requerida goza de boa saúde financeira e conta, entre as disponibilidades financeiras de que é titular, com os saldos bancários de EUR 2.926.460,71 arrestados no âmbito dos presentes autos.»;
97. Na decisão sobre a matéria de facto, nada é dito a respeito dos artigos 52.º, 53.º, 54.º e 55.º da oposição da Recorrente, todos atinentes à falta de cumprimento das instruções da Recorrente para a interrupção do processo de fabrico;
98. Tratando-se de matéria constante do formulário de oposição (cfr. 6.1.1.5. do formulário) e sobre a qual veio a recair prova, verifica-se que a sentença recorrida incorre em omissão de pronúncia, vício gerador de nulidade, que aqui se deixa arguida, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea d), primeira parte, do n.º 1 do artigo 615.º do CPC;
99. Mais se dirá que, por estar em causa factualidade provada (cfr. documentos n.º 12 e n.º 13 da oposição, bem como as gravações no sistema de gravação digital Habilus media dos depoimentos prestados na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trecho 00:50:59, e 11.ª gravação, ficheiro áudio “20210114120734_5831184_2870529”, trechos 00:24:42-00:26:25) e com indiscutível relevância para a boa decisão da causa, impõe-se o seu aditamento ao elenco dos factos considerados provados, para o que se sugere a seguinte redação: «As indicações da Requerida referidas em 7 não foram executadas pela Requerente, que continuou a cortar os tecidos e a produzir máscaras, emitindo, por conta dessas máscaras, faturas à Requerida.».
100. A par do exposto, deveria também a sentença recorrida ter atendido outros factos essenciais (ainda que não nucleares) e/ou instrumentais dos alegados na oposição (artigo 5.º, n.º 2 do CPC), desta feita atinentes à situação financeira e patrimonial da Recorrentes e sobre os quais foi produzida ampla prova (vide, entre outros, 79, 83 e 84 supra);
101. Pede-se, pois, a este Venerando Tribunal que corrija o evidente erro de julgamento em que o Tribunal a quo incorreu neste ponto, aditando os seguintes factos ao elenco de factos considerados provados: «A Recorrente é proprietária de um conjunto de ativos, em que se incluem edifícios (nomeadamente fábrica localizada em …-…), terras e equipamento industrial (designadamente uma centena de teares).»; «A Recorrente emprega duzentos trabalhadores.»; «A Recorrente é líder de mercado na sua área, fornecendo marcas como a ..., a ... ou a ..., bem como insígnias como a ....»; «A Recorrente nunca enfrentou dificuldades de ordem financeira.».
102. Em sede de fundamentação de facto, o Tribunal a quo, votando, uma vez mais, ao desprezo a sua própria decisão, fez constar considerações várias sobre matéria excluída do objeto da instância (defeitos das máscaras, resolução do contrato-quadro celebrado com a P. Répartition, etc.);
103. Ao mesmo tempo, ainda em sede de decisão de facto, deixou o Tribunal a quo expressamente referido que, em decorrência dos despachos proferidos, designadamente o despacho proferido no início da audiência final, «matéria de excepção alegada pela Requerida na oposição aperfeiçoada relativamente ao crédito titulado pela Requerente - defeituoso cumprimento do contrato – não seria objecto de consideração pelo tribunal, razão pela qual os factos contidos, entre outros, sob os artigos 38º a 45º e 48º, 49º e 66º da oposição aperfeiçoada, não se encontram no elenco dos provados e não provados da presente decisão»;
104. Na medida em que os fundamentos da decisão de facto se acham, neste particular, em oposição com a própria decisão (o Tribunal a quo pronuncia-se sobre factos que, no início da audiência, foram por si excluídos expressamente do objeto da prova), é manifesto que a sentença recorrida se encontra parcialmente ferida de nulidade, que aqui se deixa arguida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), primeira parte, do CPC;
105. Tendo em conta, bem assim, que, ao fazê-lo, o Tribunal a quo conheceu, em sede da apreciação dos factos, de questões que, por terem sido excluídas do âmbito da prova, não podiam ser conhecidas, arguida fica também, para os devidos efeitos legais, a nulidade parcial da sentença, desta feita à luz do previsto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), segunda parte, do CPC;
106. SEM PRESCINDIR, e à cautela, sempre se dirá que são manifestos, mais uma vez, os equívocos em que o Tribunal a quo labora, cumprindo destacar, pela sua relevância, o desacerto da sentença recorrida quando se afirma que, «[q]uanto aos alegados defeitos das máscaras de filtragem elevada 90%, a prova não é esclarecedora se resultaram de incumprimento, pelo fabricante, de instruções técnicas que lhe foram transmitidas quanto ou processo de fabrico (posição mantida pelas testemunhas da Requerida) ou, pelo contrário, de deficiência dos materiais e / ou das instruções de fabrico fornecidos / dadas pela Requerida (posição assumida pela prova por declarações e testemunhal indicada pela Requerente, ouvida na primeira sessão)»;
107. Isto porque, se os defeitos das máscaras tivessem resultado das «instruções técnicas (…) transmitidas» pela Recorrente, ficaria por explicar que outros fabricantes, localizados noutros países, a quem a Recorrente entregou os mesmos tecidos e transmitiu as mesmas instruções, tenham sido capazes de produzir máscaras de boa qualidade (cfr. gravação no sistema de gravação digital Habilus media do depoimento prestados na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trechos 00:30:04-00:30:19 e 00:26:57);
108. Por outro lado, sempre se dirá que fica por saber como pretendia o Tribunal a quo dispor aqui de «prova esclarecedora» se ele mesmo, no início da audiência, decidiu impedir a Recorrente de, quanto a esta matéria, produzir toda a prova que se impunha;
109. Para além do que se vem de descrever, decidiu ainda o Tribunal a quo desatender as várias referências a atrasos nas entregas que foram sendo feitas pelas testemunhas da Recorrente, consignado que esse facto «não encontra expressão na prova documental constituída pelas comunicações dirigidas pela Requerida a M. W pelo menos até 20 de Junho de 2020 (vejam-se os emails reproduzidos nos documentos números 12 e 13 – fls. 463 e 464) ocorrendo, neste particular, contradição entre os testemunhos indicados pela Requerida e a prova produzida pela Requerente na primeira sessão».
110. Não esclarece, todavia, o Tribunal a quo a razão de, havendo contradição entre depoimentos, optar – ainda que só implicitamente – pela versão dos factos oferecida pelas testemunhas da Recorrida;
111. Sendo a fundamentação da decisão, a este respeito, totalmente omissa, arguida vai também, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, a nulidade parcial da sentença;
112. SEM PRESCINDIR, cumpre lembrar que tanto D. N. como S. L. aludiram, em diversas ocasiões, a atrasos nas entregas das máscaras confecionadas pela Recorrida (cfr. gravações no sistema de gravação digital Habilus media dos depoimentos prestado na audiência final de dia 14 de janeiro de 2021, sessão única, 6.ª gravação, ficheiro áudio “20210114104727_5831184_2870529”, trechos 00:21:50-00:25:18, e 11.ª gravação, ficheiro áudio “20210114120734_5831184_2870529”, trechos 00:21:41-00:33:15);
113. Em face do exposto, conclui-se que a Recorrente alegou e logrou provar (tanto quanto o Tribunal a quo lho permitiu) matéria idónea a infirmar a verificação dos requisitos de que depende o decretamento do presente procedimento: por um lado, a alegação e prova de indícios razoáveis da existência do crédito invocado; por outro lado, a demonstração da existência de real risco de frustração, ou dificuldade considerável, na posterior execução desse crédito;
114. Da Recorrida dir-se-á, pelo contrário, que não alegou (e muito menos demonstrou) factos integradores do perigo de não cobrança do crédito que, na sua tese, a determinaram recorrer ao procedimento dos autos;
115. Em relação ao outro dos fundamentos da decisão europeia de arresto, relacionado com a aparência do crédito, haverá que reconhecer que tão pouco resultou indiciariamente demonstrado, tendo a Recorrente logrado infirmar que seja devedora de qualquer montante à Recorrida;

Da decisão de direito
116. A respeito do primeiro pressuposto da fundamentação de direito, dir-se-á que, tal como sobejamente referido e demonstrado na presente apelação, a Recorrente não fez qualquer “encomenda” à Recorrida;
117. Por sua vez, no que tange à alegada «mora na liquidação do respectivo preço», afigura-se evidente que a Recorrente não pode ser considerada devedora – e muito menos devedora constituída em mora – relativamente a EUR 1.572.486,00 de máscaras defeituosas, cuja distribuição no mercado farmacêutico francês lhe acarretou tão graves prejuízos (patrimoniais e não patrimoniais);
118. Por conseguinte, ainda que pudesse reconhecer-se a existência de contrato de fornecimento entre a Recorrente e a Recorrida – o que, sem conceder, só por cautela de patrocínio se concebe –, o certo é que se estaria, no caso vertente, perante cumprimento defeituoso da obrigação (vista no seu todo), circunstância que habilitaria a Recorrente não apenas a recusar o pagamento das máscaras entregues (artigo 428.º do Código Civil), como também a operar, de imediato, a resolução do vínculo contratual (artigo 801.º, n.º 2 do CC), com o consequente cancelamento de encomendas futuras;
119. Tão pouco pode a Recorrente, qualquer que seja o caso, vir a ser chamada a liquidar o preço de máscaras que (podendo ser também defeituosas) foram, como se viu, fabricadas ao arrepio das suas instruções, transmitidas após ter sido confrontada com a resolução do contrato-quadro celebrado com a P. Répartition;
120. Tendo a Recorrida fabricado, culposamente, EUR 1.572.486,00 de máscaras defeituosas, facto que acarretou avultadíssimos prejuízos à Recorrente (desde logo, perdas financeiras na ordem dos EUR 22.000.000,00), tendo, como se isso não bastasse, ignorado (a par com o W Group) as instruções da Recorrente para a suspensão do corte de tecidos e a interrupção da produção, inutilizando assim largas quantidades de tecido e emitindo, depois, faturas no valor de EUR 948.420,00, e tendo, ainda, incumprido repetidamente prazos de entrega, a conclusão que se impunha adotar era precisamente a contrária, ou seja, que a Recorrente nada deve à Recorrida;
121. Alcançada essa conclusão, a única possível, impunha-se ainda, por sua vez, concluir pela falta do primeiro requisito de que depende o arresto europeu de contas, a saber, a elevada probabilidade de o requerente (in casu, a Recorrida) vir a obter ganho de causa no processo declarativo (artigo 7.º, n.º 2 do Regulamento (EU) n.º 655/2014);
122. Já no tocante ao segundo requisito de que depende a decisão de arresto, não é menor – bem pelo contrário – o desnorte do Tribunal a quo:
123. Afirmar que, relativamente à saúde financeira da Recorrente, «nenhum facto foi alegado, nem produzida prova», só pode resultar de miopia ou desatenção: (i) a Recorrente detém um importante conjunto de ativos (edifícios, terras e equipamento industrial), destacando-se, nesse património, uma enorme fábrica a 150 km da capital francesa; (ii) a Recorrente é líder de mercado na sua área, fornecendo marcas como a ..., a ... ou a ..., bem como insígnias da grande distribuição como a ...; (iii) a Recorrente emprega duzentos trabalhadores;
124. Demonstrado ficou outrossim, como não deixa de reconhecer Tribunal a quo, que a Recorrente conta com «ampla experiência e reputação consolidada no sector dos têxteis técnicos especiais, sendo detida a 100% pela sociedade anónima de direito francês denominada K, integrada no Grupo C., cotado na Bolsa de Valores de Paris, com reputação de solidez e destacada actividade internacional nos sectores da protecção temporária de superfícies, entretela para vestuário, têxteis técnicos e lã penteada de luxo»;
125. Ao desconsiderar por completo a factualidade referida, o Tribunal a quo fez aplicar um padrão ou nível de prova incompatível com a natureza deste procedimento, em que, por estar em causa forma de tutela célere e urgente, a prova exigida é meramente perfunctória ou indiciária;
126. Além de ter decidido ignorar a prova carreada, resolveu Tribunal a quo entregar-se a exercícios especulativos sobre a atividade da Recorrente, indo a ponto de sugerir que esta se dedicou ao fabrico de máscaras sanitárias em virtude de «reflexos negativos no negócio do sector do têxtil para vestuário»;
127. Assim não foi, como o atesta o facto de ter sido em março de 2020, momento em que a atual pandemia estava ainda longe de ter produzido quaisquer «reflexos negativos no negócio do sector do têxtil para vestuário», que a Recorrente e o Grupo C. tomaram a decisão conjunta de apostar na produção de máscaras de proteção;
128. Acresce que não só a Recorrente não abdicou do seu tradicional segmento de negócio, como tem vindo a lidar bem com os «reflexos negativos» da crise pandémica, não enfrentando nesta data, conforme as testemunhas amplamente confirmaram, qualquer dificuldade financeira;
129. Por tudo isto, não podia nunca o Tribunal a quo ter concluído pela existência de «razões para reputar …a execução subsequente do crédito do credor contra o devedor (…) consideravelmente dificultada… em caso de levantamento do arresto concretizado»;
130. Decidindo nestes termos, o Tribunal a quo violou flagrantemente o artigo 7.º, n.º 1 e n.º 2 do Regulamento (UE) n.º 655/2014, impondo-se, por consequência, que a sentença recorrida seja revogada e substituída por outra que, fazendo aplicação correta do sobredito preceito, determine a revogação do arresto dos autos.
Pugna a Recorrente pela integral procedência do recurso e consequentemente pela revogação da sentença recorrida.
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A Recorrida contra alegou e requereu a ampliação do âmbito do recurso, formulando as seguintes conclusões:

1º - Na sua oposição, a Requerida alegou como fundamento de defesa a pendência de um processo por si instaurado junto do tribunal francês contra a Requerente.
2º - Na sequência dessa oposição, a Requerida foi convidada pelo Tribunal para proceder à junção aos autos tradução da petição inicial da acção alegadamente proposta contra a Requerente no Tribunal do Comércio de Paris, bem como, do articulado de contestação / oposição da Requerida, se já constar dos autos, de modo a permitir avaliar os respectivos pedido e causa de pedir.
3º - Por requerimento junto aos autos a 14.09.2020 – oposição aperfeiçoada – a Requerida juntou aos autos a tradução da petição inicial da acção alegadamente proposta contra a Requerente no Tribunal do Comércio de Paris e, requerimento junto aos autos na data de 7.01.2021, a Requerida YX juntou a tradução de diversos documentos.
4º - Em consequência e no exercício do seu direito ao contraditório, a Requerente X, no dia 13.01.2021, requereu a junção aos autos:
(1) cópia da citação completa recebida pela X para acção que correu termos no Tribunal de Comércio de Paris, uma vez que o documento junto aos autos pela YX é apenas composto pelo articulado e não pelos documentos que instruem esse articulado;
(2) sentença proferida pelo Tribunal de Comércio de Paris proferida data na data de 09.12.2020 (traduzida por certificado emitido em 06.01.2020).
5º - Na exacta medida em que:
(i) a Requerente requereu ao Tribunal fosse junta aos autos prova tendente ao apuramento de matéria que é objecto do processo,
(ii) estão em causa documentos/informações que se referem a factos alegados pelas partes nos seus articulados;
(iii) estão em causa documentos/informações que se referem a factos identificados pelo Tribunal como relevantes,
(iv) a sentença proferida pelo Tribunal de Comércio de Paris proferida data na data de 09.12.2020 (traduzida por certificado emitido em 06.01.2020) constitui um documento superveniente,
(v) a junção do documento mostrou-se necessária atenta uma ocorrência posterior, decorrente do facto da Requerida YX não ter esclarecido o tribunal que essa causa tinha sido, entretanto, objeto de decisão - n.º 3 do art. 423º do CPC.
Mostram-se verificados os critérios de oportunidade, tempestividade e relação dos documentos com a causa (requisitos formais) e, bem assim, os critérios de essencialidade, pertinência e importância dos documentos (requisitos substanciais) para a concreta e efectiva decisão da matéria de facto e a decisão em crise padece de erro de julgamento, por violação do disposto nos arts. 3º, 5º n.º a) e b), 410º e 423º n.º e 3 do Código de Processo Civil.
6º - Por se tratar de matéria que é objecto do processo, na medida em que se refere a factos alegados pelas partes nos seus articulados, e que se mostra relevante e com interesse para a decisão dos autos, deve ser aditada à matéria de facto provada um Ponto onde constem os seguintes factos:
A Requerida YX intentou junto do Tribunal de Comércio de Paris uma acção contra a Requerente X e as sociedades referidas em 17), com os fundamentos vertidos no documento n.º 2 junto a oposição aperfeiçoada, sobre a qual recaiu decisão final, já transitada em julgado, proferida data de 09.12.2020 (junta aos autos por requerimento REFª: 37703838), cujo teor se dá por reproduzido.
7º - Da prova produzida nos autos pela Requerida YX, quer documental (designadamente impressões extraídas do sítio de internet do Grupo C., juntas como documento n.º 4 da oposição - fls. 424 e ss), quer testemunhal (designadamente teor do depoimento prestado pela testemunha -S. L.) não se extrai qualquer prova concreta, efectiva e segura de que a requerida YX tenha qualquer relação societária com a sociedade K e que esta, por sua vez, tenha qualquer relação societária com o Grupo C. e, nesse sentido, devem os factos vertidos nos Pontos 22 e 23 ser eliminados da matéria de facto provada.

Conclui a Recorrida que deve:
a) ser conhecida e julgada procedentes as questões suscitadas pela Recorrida em sede de ampliação do âmbito do recurso, completando-se a decisão recorrida em conformidade,
b) ser o recurso interposto pela Requerida julgado totalmente improcedente, mantendo-se o arresto.
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A Recorrente respondeu à resposta à matéria da ampliação do âmbito do recurso pugnando pela sua improcedência.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

As questões decidendas a apreciar, delimitadas pelas conclusões do recurso, consistem em determinar se:
- é tempestiva a impugnação do despacho que não admitiu a junção de documentos;
- houve violação dos princípios do dispositivo, do contraditório e da igualdade das partes, do direito de defesa da Recorrente e do processo equitativo (20.º, n.º 4 da CRP);
- a sentença enferma de nulidade por omissão
- deve ser modificada a decisão proferida sobre a matéria de facto;
- o âmbito do recurso deve ser ampliado;
- se verificam os requisitos da providência cautelar que foi decretada.
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III - FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Os factos
3.2.1. Factos Provados

Na 1ª instância foi dada como indiciariamente demonstrada a seguinte factualidade:
Do requerimento inicial:
1 - A Requerente é uma sociedade comercial, cuja actividade consiste no branqueamento e tingimento, estampagem, acabamento de tecidos e artigos têxteis, comércio por grosso de têxteis, confecção de artigos e acessórios de vestuário têxtil, exportação e importação de artigos têxteis.
2 - Requerente e Requerida estabeleceram um acordo para a prestação de serviços, de forma continuada, de confecção e fornecimento de um elevado número de máscaras “Y PROTECTION” e "Y SANTÉ", com a matéria-prima definida e entregue pela devedora (tecidos, clip nasal, saco plástico individual, autocolante higiénico, reguladores e folheto informativo) e conforme as características e especificações técnicas também definidas pela devedora.
3 - Para a confeção e fornecimento das máscaras tipo Y PROTECTION as partes acordaram o preço de € 0,80 / unidade, com um custo adicional de € 0,05 / unidade relativo ao custo do elástico.
4 - Para a confeção e fornecimento das máscaras tipo Y SANTÈ as partes acordaram o preço de € 1.32/unidade.
5 - A Requerida solicitou à Requerente que fosse capaz de garantir o fornecimento de máscaras Y PROTECTION à razão semanal de cerca de 500.000 e máscaras Y SANTÉ à razão de 750.000 por semana, tendo transmitido à credora que pretendia estender as encomendas semanais, nesta ordem de grandeza, até ao final de 2020, revendo as quantidades no mês de Julho de 2020.
6 - A fim de poder cumprir o elevado volume dos serviços contratados , a credora viu-se obrigada a realizar investimentos em maquinaria (para os quais foi incentivada pela devedora - equipamento específico para a realização da operação do corte e vinco do tecido), reorganizou toda a sua atividade, moveu todos os seus contactos, estabeleceu todas as parcerias comerciais e centralizou e focou toda a sua estrutura de forma a poder cumprir as obrigações assumidas perante a devedora, procedendo ao fornecimento das máscaras em quantidades e prazos aceites pelas Requerida.
7 - No dia 05/06/2020 e 09/06/2020 a Requerida informou a Requerente que devia finalizar as produções em curso das máscaras (não iniciando novas produções).
8 - Entretanto, no dia 08/06/2020, a Requerida deixou de proceder ao pagamento das faturas vencidas (266, 267, 276, 284, 285, 286 e 287 - € 330.920,00) e no dia 09/06/2020 informou que tinha procedido à transferência bancária desse valor, mas este nunca foi transferido.
9 - No dia anterior à data prevista para a entrega da encomenda prevista para 13/06/2020, a Requerida informou (no dia 12/06/2020) que transferiu o pagamento do valor de 293.376,00 € e que tem em processo de pagamento o valor de 787.776,00, valores que nunca foram pagos.
10 - A Requerida não pagou as facturas em atraso que perfaziam, no dia 15/06/2020, € 813.776,00.
11 - A Requerente, seguindo as instruções da Requerida, concluiu as produções em curso, procedeu à emissão das respectivas faturas e envio à devedora, as quais não foram contestadas ou devolvidas.
11 - A Requerente prestou os seguintes serviços à devedora, constantes das seguintes faturas que perfazem a quantia de 2.987.802,00€: Fat. n.º 266, de 39.520,00€; Fat. n.º 267, de 76.000,00€; Fat. n.º 276, de 42.560,00€; Fat. n.º 284, de 81.000,00€; Fat. n.º 285, de 88.160,00 €; Fat. n.º 286, de 60.480,00€; Fat. n.º 287, de 13.440,00€; Fat. n.º 297, de 23.100,00€; Fat. n.º 301, de 31.680,00€; Fat. n.º 302, de 61.344,00€; Fat. n.º 306, de 99.660,00€; Fat. n.º 307, de 106.488,00€; Fat. n.º 308, de 144.144,00€; Fat. n.º 312, de 130.032,00€; Fat. nº 314, de 92.400,00€; Fat. n.º 316, de 158.760,00€; Fat. n.º 319, de 168.606,00€; Fat. n.º 320, de 7.560,00€; Fat. n.º 60, de 12.492,00€; Fat. n.º 321, de 13.200,00€; Fat. n.º 322, de 166.320,00€; Fat. n.º 333, de 473.256,00€; Fat. n.º 336, de 897.600,00€.
12 - A Requerente emitiu ainda as seguintes notas de crédito a favor da Requerida: N. crédito n.º NC1, de 3.800,00 €; N. crédito n.º NC2, de 930,60 €; N. crédito n.º NC3, de 22.185,00 €; N. crédito n.º NC4, de 838,20 €. Num total de 27.753,80 €.
13 - A Requerida adiantou à Requerente o valor de 50.000,00€ para pagamento dos serviços.
14 - A Requerida não respondeu às tentativas de contacto feitas pela Requerente.
15 - A Requerente tem procurado obter informações sobre a devedora, mas todos os endereços de mail e contactos que lhe foram fornecidos dizem respeito a outras empresas.
16 - A Requerente não conhece património à Requerida, quer em Portugal, quer em França.
17 - A Requerida mantinha, à data da propositura deste procedimento, litígio perante outras sociedades têxteis com sede em Portugal com quem manteve relações comerciais semelhantes, de máscaras produzidas num valor global de cerca 12 milhões de euros - entre elas a S. - Trade, S.A., T. Confecções SA, SD. -DESIGN E PRODUÇÃO TÊXTIL, LDA, A. – Comércio Indústria de Confecções, Lda., E. – Confecções, Lda., G.- Comércio e Indústria de Confecções Lda., Malha … LDA e PB. - Importação e Exportação de Vestuário, Ld.ª.
18 - O não pagamento da Requerida acarretou problemas de liquidez à Requerente que foi obrigada a cumprir as suas obrigações junto dos seus fornecedores.
19 - A Requerente encontra-se desprovida de cerca de três milhões de euros relativamente a serviços que prestou, suportou os custos da prestação de serviços (internamente e junto dos seus fornecedores) em valor superior a 2 milhões de euros.
20 - A prestação de garantia no valor do montante em dívida causaria à Requerente prejuízo irreparável.

Da oposição:
21 - A Requerida é uma sociedade anónima de direito francês que tem por objecto a produção de têxteis técnicos especiais (artigos 20º e 87º da oposição).
22 - A K integra o Grupo C., com destacada actividade internacional nos sectores da protecção temporária de superfícies, entretela para vestuário, têxteis técnicos e lã penteada de luxo (artigos 21º e 94º da oposição).
23 - A Requerida é detida a 100% pela sociedade anónima de direito francês denominada K (artigos 26º e 94º da oposição).
24 - A qual, por sua vez, celebrou, em 29 de Abril de 2020, um contrato-quadro com a P. Répartition, grupo francês na distribuição na área farmacêutica, com vista à produção de máscaras de proteção de três camadas destinadas às profissões médicas e não médicas e ao público em geral, comercializadas sob a marca “Y Santé”, para fornecimento de 9 milhões de máscaras, pelo preço total de EUR 36.620.000,00 (artigos 27º e 28º da oposição).
25 - A Requerida incumbiu o W Groupe, como seu agente, de intermediar a relação entre si e as empresas portuguesas encarregues da confecção das máscaras (artigo 73º da oposição).
26 - A Requerida fez saber ao W Groupe que entendia não ser devedora de qualquer montante (artigo 75º da oposição).
27 - A Requerida é uma sociedade com mais de 20 anos de existência, ampla experiência e reputação consolidada no setor dos têxteis técnicos especiais (artigos 88º e 89º da oposição).
28 - A Requerida tem em depósitos bancários disponibilidade financeira de cerca de € 3.000.000,00, arrestados no âmbito dos presentes autos (artigo 90º da oposição).
29 - O capital social da Requerida é atualmente de EUR 6.328.660,00 (artigo 92º da oposição).
30 - O volume de negócios da Requerida no ano de 2019, foi de EUR 42.087.556,38 (artigo 93º da oposição).
31 - O Grupo C. é um sólido grupo do sector empresarial francês, sendo cotado na bolsa de valores francesa (artigo 95º da oposição).

3.1.2. Factos Não Provados

Inversamente, foi dada como não indiciada a seguinte factualidade:
Da oposição:
1 - A Requerida nunca teve contacto directo com a Requerente (artigo 71º da oposição).
2 - Todos os contactos entre Requerente e Requerida foram feitos através do W Groupe e do representante deste, Sr. M. W (artigo 72º da oposição).
3 - A Requerida não respondeu à carta enviada pela Requerente porque a intermediação estava a cargo do W Groupe (artigo 75º da oposição).
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3.2. O Direito

32.1. Da intempestividade da impugnação do despacho que não admitiu a junção de documentos.

Por despachos proferidos no inicio e no decurso da audiência final realizada no dia 14 de janeiro de 2021, o Tribunal a quo indeferiu a junção de documentos referentes à decisão proferida pelo tribunal francês por considerar que, para além de intempestiva, não era relevante para a questão que importava apurar na audiência, com reflexo na decisão de arresto internacional ordenada.
Discordando destes despachos impunha-se à Recorrida a interposição de recurso de apelação autónoma, nos termos do disposto no artigo 644.º, n.º 2, alínea d), do CPC, dispondo para o efeito do prazo de 15 dias (artigo 638.º, n.º 1, do CPC).
A Recorrida não o fez, tendo o despacho adquirido força de caso julgado, sendo agora intempestiva a sua impugnação em sede de ampliação do objeto do recurso, e como tal inatendível a matéria a que se reporta.

3.2.2. Da violação dos princípios do dispositivo, do contraditório e da igualdade das partes, do direito de defesa e do processo equitativo.
No início da audiência final, o Tribunal a quo proferiu o seguinte despacho:
«Nos termos do despacho proferido a 08.09.2020, foi a Requerida convidada para aperfeiçoar o seu articulado de oposição que juntou, descrevendo os factos que em seu entender afastam a situação de perigo da não cobrança da dívida, para além de outros elementos que se destinavam a regularizar a instância e a permitir ao tribunal conhecer o objecto do litígio, alegadamente pendente em tribunais franceses.
Na oposição aperfeiçoada junta pela Requerida, para além de matéria que se inscreve no âmbito do convite dirigido pelo tribunal, há também matéria que o extravasa, nomeadamente relativa à existência ou não do crédito alegado pela Requerida. Nesta parte, por exceder o âmbito da oposição apresentada, o tribunal entende não ser admissível produção de prova sobre o teor dos artigos não diretamente relacionados com o perigo de perda da garantia patrimonial do alegado crédito da Requerente.
Termos em que determino que a prova incidirá sobre os seguintes artigos da oposição: 20º, 21º, 26º, 72º, 73º, 75º, 87º a 89º, 92º a 95º.»
Considera a Recorrente que esta decisão viola o seu direito de defesa, o princípio do contraditório e o respeito pelo processo equitativo.
A alegação da apelante convoca para a sua resolução a questão do figurino procedimental como um processo ex parte adotado no âmbito do procedimento de decisão europeia de arresto de contas e o justo equilíbrio entre as dimensões da tutela jurisdicional efetiva. Dito de outro modo, o equilíbrio entre o direito de ação do credor e a defesa do devedor.

Apreciemos.

A presente ação configura um procedimento de decisão europeia de arresto de contas, nos termos previstos no Regulamento (EU) n.º 655/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de maio de 2014.
O Regulamento (UE) n.º 655/2014, estabelece um procedimento europeu que permite a um credor obter uma decisão europeia de arresto de contas (a que corresponde o acrónimo DEAC) que impeça que a subsequente execução do crédito do credor seja inviabilizada pela transferência ou pelo levantamento de fundos detidos pelo devedor ou em seu nome numa conta bancária mantida num Estado-Membro (cfr. artigo 1º n.º 1).
O Regulamento destina-se a permitir, em processos transfronteiriços, o arresto de forma eficiente e rápida dos fundos detidos em contas bancárias mantidas nos estados-membros, evitando que o devedor, através da transferência de uma conta bancária para um outro estado-membro, possa frustrar o interesse do credor na satisfação do seu crédito - Considerandos (5) e (7).
Este procedimento configura-se como o primeiro instrumento europeu inteiramente vocacionado à criação de um mecanismo de execução forçada de carácter transfronteiriço, ainda que de carácter provisório, que permite ao credor chegar ao processo executivo com uma garantia patrimonial assegurada através do arresto das contas bancárias do devedor. A opção legislativa europeia ao proclamar um procedimento cautelar especificado para efeitos de apreensão judicial de contas bancárias, deu ao credor um meio mais eficaz para assegurar os seus créditos na plenitude, em contexto transfronteiriço.
De toda a sua regulamentação sobressai prima facie a preocupação em conferir operatividade ao direito à ação do credor promovendo uma eficaz garantia à cobrança posterior de créditos transfronteiriços. Consta no Considerando (15) que “A fim de assegurar o efeito de surpresa da decisão de arresto e assegurar que ela será um instrumento útil para um credor que tenta cobrar dívidas de um devedor em processos transfronteiriços, o devedor não deverá ser informado do pedido do credor, nem ser ouvido antes da concessão da decisão de arresto ou dela notificado antes da sua aplicação. Se, com base nos elementos de prova e nas informações prestadas pelo credor ou, se aplicável, pela(s) sua(s) testemunha(s), o tribunal considerar que não se justifica o arresto da conta ou das contas em causa, não deverá proferir a decisão”.
A DEAC é proferida ex parte (arts. 11.º e 21.º, n.º 3), pelo que o devedor só é notificado após o proferimento da decisão e a emissão da declaração de arresto da conta ou das contas bancárias (art. 28.º, n.º 2), só depois desta notificação podendo impugnar a decisão ou a sua execução (arts. 33.º, 34.º e 35.º). Como salienta Miguel Teixeira de Sousa, este regime de contraditório diferido e eventual destina-se a garantir um efeito-surpresa [cf. consid. (15)] (1).
Uma vez que não há audição prévia do devedor, o regulamento previu salvaguardas específicas a fim de evitar abusos com base na decisão e de proteger os direitos do devedor.
Uma importante salvaguarda dessa natureza é a possibilidade de exigir que o credor constitua uma garantia destinada a assegurar que o devedor possa ser indemnizado posteriormente por quaisquer prejuízos que lhe tenham sido causados pela decisão de arresto - Considerando (18).
Outro elemento importante para atingir um equilíbrio adequado entre os interesses do credor e os do devedor é a regra sobre a responsabilidade do credor por qualquer dano causado ao devedor pela decisão de arresto – Considerando (19).
A nível procedimental, configurando-se como um processo ex parte, cabe ao credor apresentar elementos probatórios suficientes que criem, no tribunal, a convicção de bom direito (fumus boni iuris), onde consiga reproduzir a urgência do acautelamento judicial procurado por se verificar um perigo real de que a execução do seu crédito seja impedida ou dificultada caso o arresto não seja decretado (periculum in mora) – art. 7.º, n. 1. A fim de sedimentar a convicção de bom direito, o art. 7.º, n.º 2 estabelece um adensamento ao critério do fumus boni iuris para os casos em que o arresto seja peticionado antes de ser decidida a ação principal: nesta circunstância, o credor tem de ser capaz de demonstrar, no tribunal competente para emanar a decisão de arresto, a probabilidade elevada que tem em obter ganho de causa no processo declarativo.
Como sintetiza Joana Covelo Abreu “a opção pela ausência de contraditório a priori determinou que o legislador da União se tivesse visto na contingência de contemplar um conjunto de mecanismos variados que visassem reestabelecer a igualdade das partes, sendo estes de natureza patrimonial, compensatória, processual e informativa”, concluindo a autora que o legislador “conseguiu manter um tendencial equilíbrio entre o direito à ação (inerente ao próprio escopo da decisão de arresto) e os direitos de defesa”. (2)
Postas estas considerações sobre a tensão dos direitos à ação e de defesa no contexto do procedimento de decisão europeia de arresto de contas, o ponto dissidente trazido pelo recurso reside na inadmissibilidade parcial da oposição aperfeiçoada quanto à matéria que extravasava o âmbito do convite dirigido pelo tribunal.

Apreciemos do acerto ou desacerto da decisão.

Quanto aos princípios que orientam o procedimento de DEAC, tem-se considerado que o procedimento se rege, fundamentalmente, pelo princípio dispositivo, de celeridade e simplicidade, da equiparação e adequação formal.

Assim, quanto ao impulso das partes, escreve Miguel Teixeira de Sousa (3), verifica-se que o procedimento de DEAC se inicia com um pedido do credor (art. 8.º), que as informações sobre contas bancárias têm de ser pedidas pelo credor (art. 14.º, n.º 1, § 1.º), que a impugnação da DEAC incumbe ao devedor (art. 33.º), ao credor ou ao devedor (art 35.º) ou a um terceiro (art. 39.º), que a oposição à execução cabe ao devedor (art. 34.º) e que é atribuído ao devedor o direito de constituir uma garantia em alternativa ao arresto (art. 38.º). Acrescenta, porém, o autor que apesar da relevância da disponibilidade das partes, o Regulamento 655/2014 também reserva um importante poder de iniciativa ao tribunal. Assim, por exemplo, o tribunal pode exigir ao credor provas documentais suplementares (art. 9.º, n.º 1), o tribunal deve revogar ou levantar a DEAC se não tiver recebido prova da instauração do processo principal (art. 10.º, n.º 2, § 1.º) e o tribunal deve exigir ao credor que constitua uma garantia num montante suficiente para prevenir a utilização abusiva do procedimento (art. 12.º, n.º 1, § 1.º).
O procedimento de DEAC orienta-se também por um vincado princípio de celeridade, expresso em vários preceitos que impõem que os tribunais, as autoridades competentes, os bancos e as partes atuem com celeridade, que os prazos processuais não sejam derrogados a não ser em circunstâncias excecionais, como sucede, por exemplo, em casos jurídica ou factualmente complexos, e quando não for possível ao tribunal ou à autoridade envolvida respeitar os prazos estabelecidos devem tomar as medidas necessárias para cumprir as disposições assim que seja possível.
O Regulamento 655/2014 impõe uma equiparação entre a DEAC e uma medida nacional equivalente (cf. art. 17.º, n.º 5, 23.º, n.º 1, 32.º, 42.º, 43.º e 44.º). Esta equiparação impede que os estados-membros tornem a obtenção de uma DEAC mais difícil ou onerosa do que a obtenção de uma equivalente medida nacional e constitui, por isso, uma condição da eficácia prática da DEAC nos estados-membros (4).
A DEAC é proferida num procedimento escrito e para aumentar a eficiência do processo, a posição das partes é manifestada através do preenchimento de formulários normalizados permitindo-se o maior uso possível de tecnologias de comunicação modernas aceites pelas regras processuais dos estados-membros – considerandos (40) e (41).
Esta metodologia, que vem sendo comum nos procedimentos europeus de segunda geração, tem sido uma opção que assenta na celeridade e facilidade de acesso ao procedimento, na melhor forma encontrada para a sua harmonização e na simplicidade e compatibilidade que proporciona, sobretudo no que respeita à circulação do título nas várias línguas.
Todas as questões processuais não especificamente tratadas no Regulamento são regidas pela lei do Estado-Membro onde o processo tem lugar (art. 46.º, n.º 1).
Por outro lado, na falta de adaptação do ordenamento interno ao Regulamento 655/2014, há que recorrer, se necessário, aos poderes de gestão processual e de adequação formal do juiz do processo (art. 6.º, n.º 1, e 547.º, CPC, aplicáveis ex vi art. 46.º, n.º 1).
Postos estes princípios, concentremo-nos no âmbito do direito de defesa.
O Regulamento garante ao devedor/requerido a possibilidade de recorrer contra a decisão e contra a execução do arresto, e a possibilidade de requerer a sua alteração ou revogação; pode ainda solicitar a liberação dos fundos arrestados se prestar caução ou constituir garantia alternativa, de valor equivalente e aceitável, junto do tribunal que proferiu a decisão (cfr. artigo 38º) e requerer junto da autoridade competente do Estado-Membro de execução que seja posto fim à execução da decisão de arresto se esta for manifestamente contrária à ordem pública desse Estado-Membro (cfr. n.º 2 do artigo 34º).

Os mecanismos de impugnação de que o devedor se pode socorrer contra a decisão de arresto constam do artigo 33º dispondo no seu n.º 1 que “[a] pedido do devedor ao tribunal competente do Estado-Membro de origem, a decisão de arresto é revogada ou, se for caso disso, alterada com fundamento no seguinte:

a) Não estarem preenchidas as condições ou os requisitos constantes do presente regulamento;
b) A decisão de arresto, a declaração nos termos do artigo 25.º e/ou os demais documentos referidos no artigo 28.º, n.º 5, não terem sido notificados ao devedor no prazo de 14 dias a contar do arresto da sua conta ou das suas contas;
c) Os documentos que foram notificados ao devedor nos termos do artigo 28.º não cumprirem os requisitos de línguas estabelecidos no artigo 49.º, n.º 1;
d) Os montantes arrestados que excedem o montante fixado na decisão de arresto não terem sido liberados nos termos do artigo 27.º;
e) O crédito cuja execução o credor visa obter com a decisão de arresto ter sido pago no todo ou em parte;
f) Ter sido proferida uma decisão judicial relativa ao mérito da causa que negou provimento ao crédito cuja execução o credor visava obter com a decisão de arresto; ou
g) Ter sido revogada ou, conforme o caso, anulada a decisão judicial relativa ao mérito da causa ou a transação judicial ou o instrumento autêntico cuja execução o credor visava obter com a decisão de arresto”.

A forma de proceder à impugnação encontra-se prevista no artigo 36º que estabelece, além do mais, que a mesma deve ser feita utilizando o formulário, deve ser levada ao conhecimento da outra parte e a decisão sobre o pedido só deve ser proferida depois de ter sido dada a ambas as partes oportunidade de apresentarem os seus argumentos.

A Requerida juntou aos autos o formulário apropriado no qual solicita que a decisão seja revogada invocando os seguintes fundamentos:
i) não haver necessidade de decisão urgente de arresto por não existir risco de a execução subsequente do credor contra a Requerida ser frustrada ou consideravelmente dificultada pois a Requerida, empresa com capital social de 6 328 660 euros, registada em 2001, está de perfeita saúde financeira, sendo o risco de não recuperação nulo;
ii) o credor não apresentar elementos de prova suficientes para demonstrar que é provável que obtenha ganho de causa no processo principal contra a Requerida, pois é parte num processo instaurada no tribunal francês pela Requerida o que gera a exceção de litispendência;
iii) a reclamação baseia-se em facturas sem uma ordem de compra subjacente; iv) a alteração das circunstâncias com base nas quais a decisão de arresto foi proferida por as circunstâncias factuais não terem sido estabelecidas com precisão, remetendo para a prova 2 que indica.

E como elementos de prova indicou: Prova 1: certificação da “YX” de não haver risco de não cobrança; Prova 2: Intimação expondo as circunstâncias factuais da disputa entre a “YX” e a “X”.
A exposição constante do formulário poderá ser sumária, o que decorre da própria configuração do formulário que visa essencialmente uniformizar o procedimento e o respetivo conteúdo, facilitando a sua elaboração nas diversas línguas da união europeia e o seu reconhecimento pelos diversos Estados-Membros.
A impugnação da Requerida foi dada a conhecer à Requerente, tendo, pois, sido dada a ambas as partes a oportunidade de apresentarem os seus argumentos, em conformidade com o artigo 36º, nº3.
O Juiz do processo considerou que da sumária exposição feita pela Requerida poderia resultar exceção de litispendência relativamente à ação principal que, em caso de procedência, poderia ditar a absolvição da Ré da instância, com reflexo na subsistência do arresto decretado nos autos e que poderia ainda reputar-se inexistente o perigo de incapacidade financeira da Requerida para liquidar o eventual crédito da Requerente. Em face disso, convidou a Requerida a aperfeiçoar o seu articulado descrevendo os factos que afastam a situação de perigo de não cobrança da dívida e a juntar determinados elementos de modo a permitir avaliar os respetivos pedido e causa de pedir.
Este convite ao aperfeiçoamento do articulado, não constando expressamente do direito processual da DEAC, insere-se nos poderes/deveres do juiz sendo aplicável subsidiariamente o processo civil português, por força do art. 46º do Regulamento.
Face ao que dispõe o art. 590.º, nºs 2, al. b), e 4, do Código de Processo Civil, o poder do juiz de convidar as partes a aperfeiçoar os seus articulados quando estes revelem insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada não é um poder discricionário, antes um poder vinculado.
A deficiência dos articulados há-de ter por referência os factos essenciais da causa, e tanto pode revelar-se numa insuficiência de factos como numa insuficiente concretização. Como afirmam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa “o convite ao aperfeiçoamento procura completar o que é insuficiente ou corrigir o que é impreciso, na certeza de que a causa de pedir existe (na petição) e é percetível (inteligível); apenas sucede que não foram alegados todos os elementos fácticos que a integram, ou foram-no em termos pouco precisos. Daí o convite ao aperfeiçoamento, destinado a completar ou a corrigir um quadro fáctico já traçado nos autos» (5).
Correspondendo ao convite, a parte é admitida a apresentar um articulado destinado a colmatar as imperfeiçoes fácticas para as quais o juiz a alertou. Na verdade, o nº 6º do art. 590º define os parâmetros em que o aperfeiçoamento é admissível.
À parte está vedada a possibilidade de, a pretexto do aperfeiçoamento, introduzir a alegação de outros factos essenciais e estruturantes da causa de pedir. A admissão de uma tal faculdade conduziria a “reabrir a possibilidade de reformulação substancial da própria pretensão ou da impugnação e dos termos em que assentam (artigos 590.º, n.º 6 e 265.º, do CPC) (6).
Ora, revertendo ao caso, primeiramente, não tem assento em qualquer posição ou construção jurídica tomada pelo tribunal a quo a imputação feita pela Recorrente de que foi considerado que o âmbito da produção de prova, quando haja lugar a convite ao aperfeiçoamento, está limitado aos factos alegados no articulado aperfeiçoado ficando excluída da instância a factualidade consignada no articulado que antes se apresentou. Não é este claramente o sentido e o alcance do despacho impugnado. A versão fáctica da parte constituiu um todo, que se determinou pela conjugação das duas peças apresentadas, a original e a subsequente ao convite.
Depois, se é certo que os formulários tipo do Regulamento, pela sua estrutura e configuração, não possibilitam à parte a alegação exaustiva e pormenorizada das razões de facto da sua posição, a verdade é que a Requerida na sua exposição não precisou sequer de esgotar os caracteres disponíveis do anexo VII, pelo que se a exposição foi limitada a determinados argumentos tal se deve a estratégia processual e não a constrangimentos impostos pelo formulário do Regulamento.
Finalmente, e porventura mais importante, o convite ao aperfeiçoamento não assentou na necessidade de ultrapassar a limitação imposta pelo formulário, no sentido de que não se mostrava assegurada a oportunidade de a Requerida apresentar os seus argumentos, nos termos do art. 36.º, n.º 3 do Regulamento, antes resultando da necessidade de suprir as insuficiências na exposição da matéria de facto alegada pela Requerida.
A Requerida extravasou manifestamente o convite ao aperfeiçoamento, apresentando um novo articulado de oposição com a alegação de outros factos essenciais, em desrespeito aos limites contidos no normativo do art. 590º, nº 6 do Código de Processo Civil.
A consequência não podia ser outra que não a sua rejeição parcial.
Nessa conformidade, e consequentemente, mostra-se correta a decisão de limitar a produção de prova aos factos alegados pela Recorrente em sede de oposição (na parte em que foi admitida), excluindo da instrução os factos inovatoriamente alegados e, como tal, não admitidos nos autos.
Como se se extrai do acórdão do S.T.J. de 12.11.2002 (7) (citado pela Recorrida): sendo o processo uma série de atos dirigidos a um fim - decisão judicial -, deve obedecer a formas e requisitos adequados a esse escopo, sob pena de sem regras o processo ser uma anarquia e uma indisciplina das partes - nº4 do art.º 20º da C.R.P.; o processo tem exigências técnicas, designadamente sujeitando as partes a um tecido de ónus necessários à boa administração da justiça, daí a justificação da necessária intervenção dos profissionais do foro em representação das partes (patrocínio judiciário); alguns dos ónus impostos às partes pelas regras processuais decorrem do princípio dispositivo, da igualdade das partes, da cooperação e boa fé processuais, assegurando um processo equitativo.
Resulta do exposto, que não houve no caso violação dos princípios do dispositivo, do contraditório e da igualdade das partes, do direito de defesa da Recorrente e do processo equitativo (20.º, n.º 4 da CRP).
De igual modo, a interpretação que o Tribunal a quo fez do disposto no artigo 590.º, n.º 4 do CPC não é inconstitucional, pois que foi garantida a tutela jurisdicional efetiva e do direito a processo equitativo, materializado nos princípios da equivalência e da efetividade.
Improcede, por isso, nesta parte, a pretensão da Recorrente.

3.2.3. Da violação do disposto no art. 516º, nº 2 do Código de Processo Civil por ter sido excedido o âmbito da contra instância

Considera a Recorrente que foi violado o art. 516º, nº 2 do Código de Processo Civil, e com ele o principio do contraditório e da igualdade de armas, na medida em que o Tribunal admitiu que as testemunhas da Recorrente fossem questionadas sobre factos não compreendidos no âmbito do interrogatório, em particular factos alegados no requerimento inicial.
A questão remete-nos para o regime do depoimento das testemunhas.
A este propósito estabelece o art. 516º, nº 1 do Código de Processo Civil que “a testemunha depõe com precisão sobre a matéria dos temas da prova, indicando a razão da ciência e quaisquer circunstâncias que possam justificar o conhecimento; a razão da ciência invocada é, quando possível, especificada e fundamentada”. Acrescenta o nº 2 que o interrogatório é feito pelo advogado da parte que ofereceu a testemunha, podendo o advogado da outra parte fazer-lhe, quanto aos factos sobre que tiver deposto, as instâncias indispensáveis para se completar ou esclarecer o depoimento.
Deste normativo resulta que a parte contra a qual for produzida a testemunha pode inquirir a testemunha relativamente ao seu depoimento no sentido de sindicar a razão de ciência invocada e o grau de credibilidade do depoimento. Para abalar a credibilidade do depoimento, é-lhe permitido atacar o depoimento propriamente dito, ou seja, os factos depostos, as circunstâncias intrínsecas ao depoimento.

Ressalta do despacho ora impugnado que se considerou que:

- o âmbito da produção de prova inscreve-se não só nos factos admitidos da oposição, como também nos factos alegados no requerimento inicial;
- compulsado o requerimento inicial bem como a decisão que declarou o arresto estão aí alegados factos relativos a dívidas a outras empresas, que têm relevância no âmbito da demonstração do perigo da perda da garantia patrimonial que é objeto desta diligência e do procedimento em questão;
- por essa razão, foi consentido que a testemunha fosse questionada sobre dívidas a outras empresas, relevante para a decisão a proferir;
- o âmbito da resposta da testemunha é algo que o tribunal não pode controlar, aquando da prolação da decisão final o tribunal basear-se-á naquilo que as testemunhas trouxeram ao processo, dentro dos limites que foram fixados, e portanto, só depois da decisão final poderá ocorrer ou não nulidade, na medida em que o Tribunal, baseando-se em meios de prova que não sejam admissíveis, os tenha utilizado para fundamentar a decisão.

O despacho proferido não merece assim qualquer censura, porque conforme ao disposto no art. 516º do Código de Processo Civil, que define o regime do depoimento das testemunhas.
O incumprimento duma regra procedimental da produção do meio de prova testemunhal, concernente ao seu âmbito de extensão, tem o seu campo de apreciação em sede de decisão sobre a matéria de facto.

3.2.4. Das nulidades da sentença

Considera a Recorrente que a decisão enferma dos seguintes vícios:
- não especifica os fundamentos de facto que justificam a decisão (art. 615º, nº1, al. b) do CPC);
- os fundamentos da decisão de facto acham-se em clara oposição com a própria decisão (art. 615º, nº1, al. c) do CPC);
- não conheceu de factos que deveria conhecer e conheceu de outros que não podia ter conhecido (art. 615º, nº1, al. d) do CPC).

Quanto ao primeiro vicio considera a Recorrente que o Tribunal a quo desatendeu as várias referências a atrasos nas entregas que foram sendo feitas pelas testemunhas da Recorrente, afirmando ter ocorrido, neste particular, contradição entre os testemunhos indicados pela Requerida e a prova produzida pela Requerente na primeira sessão. Não esclarece, todavia, o Tribunal a razão de, havendo contradição entre depoimentos, optar – ainda que só implicitamente – pela versão dos factos oferecida pelas testemunhas da Recorrida, sendo a fundamentação da decisão, a este respeito, totalmente omissa.
Vejamos.
As causas de nulidade da sentença vêm taxativamente enunciadas no artigo 615º nº 1 do Código de Processo Civil, onde se estabelece, além do mais, que a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (al. b)), quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível (al. c)), ou quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (al. d)).
O Prof. Castro Mendes (8), após a análise dos vícios da sentença conclui que uma sentença é nula quando “não contém tudo o que devia, ou contém mais do que devia”.
Na senda da delimitação do conceito, adverte o Prof. Antunes Varela (9), que “não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário”.
Quanto ao vício de falta de fundamentação, ensina o Prof. Alberto dos Reis (10), que “uma decisão sem fundamentos equivale a uma conclusão sem premissas”, conformemente a nulidade por falta de fundamentação só ocorre quando há “ausência total de fundamentos de direito e de facto”, sendo certo que “o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade”.
Para que a sentença esteja eivada deste vício de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.
Tendo presentes estas noções, é manifesto que a decisão recorrida não enferma da nulidade que lhe é apontada, visto que nela se mostram devidamente especificados os fundamentos quer de facto quer de direito em que assenta.
Analisada a decisão, após a consignação dos factos considerados provados, motivou-se de forma pormenorizada e clara fazendo-se menção ao depoimento das testemunhas da Requerida.
A valoração do depoimento destas testemunhas foi feita em conjugação com a demais prova produzida, tendo sido devidamente sindicada a sua razão de ciência.
A fundamentação da sentença é clara, escorreita e precisa.
Não padece de qualquer deficiência, muito menos de falta de fundamentação.
Pelo exposto, não ocorre esta invocada nulidade da decisão.
Considera, ainda, a Recorrente que o Tribunal a quo pronuncia-se sobre factos, tecendo considerações sobre a convicção que formou quanto a esses mesmos factos, que, no início da audiência, foram por si excluídos expressamente do objeto da prova, concluindo daqui que a sentença é nula por os fundamentos estarem em oposição com a decisão.
Assim não é.
Estarem os fundamentos em oposição com a decisão ocorre quando entre os fundamentos e a decisão houver contradição lógica. Assim “se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correta, a nulidade verifica-se (11).
Donde, também aqui não ocorre a invocada nulidade.
Finalmente, entende a Recorrente ter ocorrido omissão e excesso de pronuncia, na medida em que por um lado, o Tribunal a quo conheceu, em sede da apreciação dos factos, de questões de que, por terem sido excluídas do âmbito da prova, não podia tomar conhecimento e por outro lado nada é dito a respeito de factos alegados pela Requerida ( artigos 52.º, 53.º, 54.º e 55.º da oposição) da Recorrente, todos atinentes à falta de cumprimento das instruções da Recorrente para a interrupção do processo de fabrico.
As causas de nulidade da sentença são de caráter formal, dizendo respeito a desvios no procedimento ocorridos na sentença que impedem que se percecione uma decisão da concreta situação em disputa: não se confundem com todas as situações que podem inquinar uma decisão e conduzir à revogação da mesma. Não abarcam todas e quaisquer falhas de que uma sentença pode padecer.
O artigo 608º nº 2 do Código de Processo Civil, que se debruça sobre as questões a resolver na sentença, determina que se conheçam todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; por outro lado, impede a pronúncia sobre questões que as partes não tenham suscitado, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. As questões a que se refere esta norma, que a Recorrente entende ter sido violada, são os assuntos de fundo, que integram matéria decisória, os pontos de facto ou de direito relevantes no quadro do litígio, ou seja, os concernentes ao pedido, à causa de pedir e às exceções.
E assim, as questões que o tribunal deve e pode conhecer na sentença, para os efeitos da aplicação do disposto no artigo 615º do Código de Processo Civil, não se confundem com factos, argumentos, razões e motivações.
A Recorrente, no fundo, aponta à sentença o vício que influencia a decisão sobre a matéria de facto mencionada no artigo 607º nº 4 do Código de Processo Civil, a qual tem o regime, quanto à sua impugnação em sede de recurso, previsto no artigo 662º do Código de Processo Civil. Mas essa situação, podendo conduzir à anulação da sentença, não se traduz numa das nulidades da mesma, tipicamente previstas no artigo 615º do Código de Processo Civil.
Como bem se explana no acórdão do STJ de 03/23/2017 (12), “I. O não atendimento de um facto que se encontre provado ou a consideração de algum facto que não devesse ser atendido nos termos do artigo 5.º, n.º 1 e 2, do CPC, não se traduzem em vícios de omissão ou de excesso de pronúncia, dado que tais factos não constituem, por si, uma questão a resolver nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do CPC. II. Tais situações reconduzem-se antes a erros de julgamento passíveis de ser superados nos termos do artigo 607.º, n.º 4, 2.ª parte, aplicável aos acórdãos dos tribunais superiores por via dos artigos 663.º, n.º 2, e 679.º do CPC.”.
Nestes termos, a sentença não enferma de qualquer das nulidades que lhe são apontadas.

3.2.4. Da modificabilidade da decisão sobre a matéria de facto

Nos termos do artigo 662º. do Código de Processo Civil, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Assim, sem prejuízo de uma valoração autónoma dos meios de prova utilizados pelo tribunal e ainda de outros que se mostrarem pertinentes, essa operação não pode nunca olvidar os princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas.
A Recorrente considera incorretamente julgados os factos 2, 3, 4, 5, 6, 7, 10, 11, 16, 17, 19, 25 e 28 da matéria de facto provada.
Dada a sua interligação, comecemos pela apreciação dos factos 2, 3, 4, 5 e 25.

O facto 2 tem a seguinte redação:
2 - Requerente e Requerida estabeleceram um acordo para a prestação de serviços, de forma continuada, de confecção e fornecimento de um elevado número de máscaras “Y PROTECTION” e "Y SANTÉ", com a matéria-prima definida e entregue pela devedora (tecidos, clip nasal, saco plástico individual, autocolante higiénico, reguladores e folheto informativo) e conforme as características e especificações técnicas também definidas pela devedora.

Defende a impugnante que o facto deveria ser alterado e ter a seguinte redação:
«A Requerida e o W Group estabeleceram um acordo para a prestação de serviços, de forma continuada, de confecção e fornecimento de um elevado número de máscaras “Y PROTECTION” e “Y SANTÉ", com parte da matéria-prima definida e entregue pela Requerida (tecidos, elásticos e ganchos de metal) e conforme as características e especificações técnicas também definidas pela Requerida».
Em consequência defende também a alteração da redação dos factos 3 e 4 substituindo a expressão “as partes” por “Requerida e o W Group”, a eliminação do facto 5 e a alteração da redação do facto 25 no sentido de que competia ao W Group gerir e intermediar a relação com as empresas portuguesas por este encarregues da confeção das máscaras.
A impugnante baseia a alteração pretendida essencialmente no depoimento das testemunhas por si arroladas e no documento n.º 3 junto com o requerimento inicial.
A matéria impugnada refere-se à relação estabelecida entre a Requerida, o grupo W e a Requerente. Defende a impugnante que a relação comercial foi estabelecida apenas entre a Requerida e o W Group, por sua vez a Recorrida sustenta que a Requerida estabeleceu um vínculo contratual direto com a X, para a prestação de serviços de confeção de máscaras.

Quanto a esta questão escreveu-se na sentença que:
A propósito da relação mantida entre a Requerida, o grupo W e a Requerente, as testemunhas ouvidas na audiência final procuraram inicialmente, de forma que não se afigurou rigorosa, transmitir a ideia de que a Y nunca manteve qualquer contacto com a “X”, imputando ao seu agente em Portugal exclusiva responsabilidade nesse domínio.
Todavia, D. N. acabou por admitir que, tal como havia sido relatado na primeira sessão pelas testemunhas indicadas pela Requerente e ressalta do conjunto de fotografias juntas como documento n.º 3 do r.i. (fls. 33 e ss.) e dos emails reproduzidos nos documentos números 5 (fls. 34 v.º) e 8 (fls. 43) do mesmo r.i., se deslocou a Portugal, onde visitou as instalações e esteve com representantes da “X” (cfr. factos não provados números 1 e 2).
Quanto às razões pelas quais a Requerida não deu resposta à carta que lhe foi enviada pela Requerente solicitando o pagamento dos valores em dívida, não colheu a posição apresentada pelas supra identificadas testemunhas no sentido de que se deveu ao entendimento de que era com o grupo W que comunicavam, na medida em que, não só se constatou que houve contactos directos entre Requerente e Requerida, como o grupo W era apenas o agente da Requerida e esta foi directamente interpelada pela Requerente”.
Analisada a prova documental junta e os depoimentos prestados, não se nos afigura ser de alterar a factualidade apurada pelo Tribunal a quo.
Desde logo existem registos fotográficos e troca de comunicações de onde resulta claramente o contacto direto entre os representantes das duas partes.
Depois, o facto (aceite) de as máscaras confecionadas serem diretamente levantadas pela Requerida nas instalações da Requerente, tratando-se é certo de procedimento de carácter logístico, não deixa de ser em conjugação com os demais elementos um indicador da materialização de um acordo entre a Requerente e a Requerida, auxiliando na determinação da existência de um vinculo contratual.
Acresce a circunstância de as faturas serem emitidas em nome da Requerida, terem-lhe sido remetidas e por ela não terem sido devolvidas.
Por fim, da inquirição das testemunhas arroladas pela Requerida resulta que o W Group era um mero intermediário, no sentido de que foi quem indicou a Requerente, entre outras, como empresa portuguesa para a confeção das máscaras.
Considerando estes testemunhos e confrontando-os com o depoimento prestado por M. W, representante do W Group e S. O., legal representante da sociedade S. Trade, S.A, sociedade que também estabeleceu relações comerciais com a Requerida, resulta que a Y estabeleceu um vínculo contratual direto com a X para a prestação de serviços de confeção de máscaras, cujos preços e condições foram consensualizados entre as partes.
Assim, a resposta dada aos factos 2, 3, 4, 5 e 25 não merece qualquer censura, devendo como tal manter-se como factos provados.
Considera ainda a Recorrente que o facto 6 deveria ser alterado porquanto do mesmo constam (i) vocábulos de teor jurídico-conclusivo que, por não terem lugar neste segmento decisório, devem ser eliminados do elenco de factos dados como provados, (ii) afirmações de carácter genérico e conclusivo que, além de carecerem de apoio na prova, tão pouco podem ter lugar no segmento da sentença dedicado à matéria de facto, e, bem assim, (iii) afirmações infirmadas pela prova carreada, seja no tocante a supostos “incentivos” da Recorrente à Recorrida para aquisição de maquinaria, seja a respeito da alegada entrega de «máscaras em quantidades e prazos aceites» pela Recorrente.

O facto tem a seguinte redação:
“6 - A fim de poder cumprir o elevado volume dos serviços contratados, a credora viu-se obrigada a realizar investimentos em maquinaria (para os quais foi incentivada pela devedora - equipamento específico para a realização da operação do corte e vinco do tecido), reorganizou toda a sua atividade, moveu todos os seus contactos, estabeleceu todas as parcerias comerciais e centralizou e focou toda a sua estrutura de forma a poder cumprir as obrigações assumidas perante a devedora, procedendo ao fornecimento das máscaras em quantidades e prazos aceites pelas Requerida”.
Começando pela alegada indemonstração, importará dizer que nenhuma prova foi carreada pela Requerida sobre os concretos factos vertidos neste ponto que infirmasse a prova produzida.
Quanto aos vocábulos de teor jurídico e às afirmações de carácter genérico e conclusivo, discordamos da impugnação.
A decisão sobre a matéria de facto deve, tanto quanto possível, estar expurgada de afirmações genéricas, conclusivas ou que comportem matéria de direito.
Sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas que definem o objeto da ação, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, o mesmo deve ser eliminado.
Não é o caso. Em causa não estão asserções de natureza jurídico-conclusiva reconduzíveis à formulação de um juízo de valor, ou definidoras da questão jurídica que constitui o objeto do procedimento, antes expressões que traduzem, densificam e concretizam uma realidade de facto.
A formulação muitas vezes forçada de expressões “terrenas” para fugir ao rótulo de genéricas ou conclusivas é artificial e sem qualquer utilidade prática.
Como afirma Miguel Teixeira de Sousa, depois de defender que a chamada proibição de factos conclusivos não tem hoje nenhuma justificação no plano da legislação processual, “a referida «proibição dos factos conclusivos» também não corresponde às modernas correntes metodológicas na Ciência do Direito, que não se cansam de referir que a distinção entre a matéria de facto e a matéria de direito é totalmente artificial, dado que, para o direito, apenas são relevantes os factos que o direito qualificar como factos jurídicos”. E conclui o autor que “o objeto da prova não pode deixar de ser um facto jurídico, com todas as suas características descritivas, qualitativas, quantitativas ou valorativas desse facto” (13).
Nestes termos, é de manter o facto 6.
No facto 7 o Tribunal deu por provado que no dia 05/06/2020 e 09/06/2020 a Requerida informou a Requerente que devia finalizar as produções em curso das máscaras (não iniciando novas produções), entendendo a impugnante que, de acordo com os documentos n.º 12 e n.º 13 da oposição, o facto 7 deveria ter a seguinte redação: no dia 05/06/2020 a Requerida deu indicações ao W Group para cessar imediatamente todas as operações de corte de tecidos e, no dia 17/06/2020, após constatar que tais operações continuaram a ser executadas, a Recorrente solicitou ao W Group a suspensão imediata da produção de máscaras.
Diz-se na sentença recorrida que no que concerne à matéria de facto apurada na primeira sessão de produção de prova, sem a presença da Requerida, os meios de prova agora produzidos não trouxeram alterações relevantes na convicção do tribunal.
Sufragamos o mesmo convencimento.
Analisados os documentos e ouvidos os depoimentos das testemunhas, concorda-se com a motivação da decisão: A troca de emails reproduzida nos documentos 12 e 13 da oposição confirma que M. W (tal como havia testemunhado), chamou a atenção da Requerida a 10 e a 17 de Junho de 2020, para a circunstância de se encontrarem pendentes grandes volumes de encomendas, com inerentes compromissos dos fabricantes e, apesar de cumprido na sexta-feira 05.06.2020 o inesperado pedido de paragem do corte dos tecidos, iriam proceder à entrega do material que estava pendente de execução até 20 de Junho, tendo enviado uma relação detalhada do mesmo. A justificação apresentada pelas testemunhas indicadas pela Requerida para a circunstância de, tendo por base a alegação de defeitos num tipo específico de máscaras fornecidas pela Requerente, cancelar subitamente, sem qualquer preparação ou informação prévia, o enorme volume de encomendas pendente de execução, constituído também por outros tipos de máscaras relativamente às quais nenhum defeito foi apontado e cujo processo de fabrico se encontra certificado pelo B. V., não se afigurou expressar a verdadeira motivação do abrupto cancelamento e, ainda menos, do não pagamento das máscaras cuja produção já se encontrava em curso. Como decorre do conjunto de emails trocados nos dias seguintes a 05.06.2020 – documento número 10 junto com o r.i. (fls. 45 v.º a 49) – a Requerida, não só não recusou pagar as encomendas já recebidas e pendentes de finalização, como deu erradas informações de que já tinha pago e que iria pagar, montantes que nunca liquidou à Requerente e outras empresas.
Donde, mantém-se inalterado o facto 7.
Pelas mesmas razões mantém-se no elenco dos factos provados o facto 11 cuja eliminação era pretendida pela Recorrente e não será aditada a matéria constante dos pontos 52, 53, 54 e 55 da oposição que a Recorrente queria ver integrada na factualidade provada.
A alteração pretendida ao facto 10 consubstancia preciosismo sem cabimento no âmbito de um procedimento cautelar, que como tal deve improceder.
Do mesmo modo que deve improceder a impugnação ao facto 16, apelidado de “consideração eminentemente subjetiva”, na medida em que se trata de facto com significação jurídica, no contexto de um procedimento de arresto.
O facto 17 resulta claramente demonstrado da conjugação do depoimento das testemunhas S. O. e M. W com a certidão do processo do Tribunal de Comércio de Paris de 04/08/2020 (documento nº 2 junto com a oposição aperfeiçoada) que atesta que a Requerida mantinha, à data da propositura do procedimento, litígio perante outras sociedades têxteis com sede em Portugal com quem manteve relações comerciais semelhantes, de máscaras produzidas num valor global de cerca 12 milhões de euros. É, pois, de manter inalterado este facto.
Os factos 11 e 19 impugnados pela Recorrente respeitam à existência do crédito e resultaram demonstrados pela prova produzida pela Requerente, não tendo a Requerida carreado factos e provas capazes de abalar aquela demonstração.
Por um lado, a prestação dos serviços constantes das faturas, não é verdadeiramente posto em causa, por outro, a imputação de defeitos às mascaras do tipo Y Santé Pharmacie não é suficiente para desobrigar ao pagamento, pois que fica por explicar o motivo do não pagamento das máscaras tipo Protection, relativamente às quais não foram apontados defeitos.
Também os ativos pecuniários da Requerida descritos no facto provado 28 decorrem do arresto dos saldos em depósitos bancários, no âmbito dos presentes autos, não havendo mais elementos documentais referentes a outra disponibilidade financeira da Requerida, sendo assim de desatender os termos da impugnação a este facto.
Finalmente quanto aos factos que entende dever ser aditados aos factos provados, relativos à solidez financeira e patrimonial da empresa, o depoimento de D. N. e S. L., desacompanhado dos pertinentes elementos documentais, apresentou-se insuficiente para a demonstração dessa factualidade.
Na decisão recorrida foram analisados cuidadosamente os elementos documentais e as declarações prestadas pelas partes e testemunhas; e tal análise foi efetuada de forma crítica, global e objetiva.
Aqui chegados importa expressar que ouvida toda prova prestada em sede de audiência final, a contra-instância realizada pela Requerente não extravasou o âmbito do interrogatório, mantendo-se nos limites da matéria objeto do processo visando completar ou esclarecer o depoimento das testemunhas.
Pelo exposto, nenhuma censura merece a decisão de facto proferida mantendo-se inalterada a matéria de facto fixada pela 1ª Instância.

Da ampliação do âmbito do recurso:

A Recorrida com as suas contra-alegações veio requerer a ampliação do âmbito do recurso.
Para tanto alega que por se tratar de matéria que é objeto do processo, na medida em que se refere a factos alegados pelas partes nos seus articulados, e que se mostra relevante e com interesse para a decisão dos autos, deve ser aditada à matéria de facto provada um Ponto onde constem os seguintes factos:
A Requerida YX intentou junto do Tribunal de Comércio de Paris uma ação contra a Requerente X e as sociedades referidas em 17), com os fundamentos vertidos no documento n.º 2 junto a oposição aperfeiçoada, sobre a qual recaiu decisão final, já transitada em julgado, proferida na data de 09.12.2020 (junta aos autos por requerimento REFª: 37703838), cujo teor se dá por reproduzido.
Acrescenta, ainda, que da prova produzida nos autos pela Requerida YX, quer documental (designadamente impressões extraídas do sítio de internet do Grupo C., juntas como documento n.º 4 da oposição - fls. 424 e ss), quer testemunhal (designadamente teor do depoimento prestado pela testemunha -S. L.) não se extraí qualquer prova concreta, efetiva e segura de que a requerida YX tenha qualquer relação societária com a sociedade K e que esta, por sua vez, tenha qualquer relação societária com o Grupo C. e, nesse sentido, devem os factos vertidos nos Pontos 22 e 23 ser eliminados da matéria de facto provada.
Sob a epigrafe “ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido”, dispõe o artigo 636º, nº1 do Código de Processo Civil que “No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação”, acrescenta o nº2 que “Pode ainda o recorrido, na respetiva alegação e a título subsidiário, arguir a nulidade da sentença ou impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas”.
A finalidade deste preceito é prevenir os riscos de uma eventual resposta favorável do tribunal de recurso às questões que tenham sido suscitadas pelo recorrente.
A ampliação do objeto do recurso no que respeita à matéria de facto tem de revestir relevo para a defesa dos interesses do recorrido.
No caso, a factualidade que se pretende aditar além de assentar em termos probatórios em documento não admitido não assume determinância para a defesa dos interesses do recorrido. Assim mesmo, os factos que se pretende sejam excluídos, desde logo, em face da improcedência da impugnação da decisão de facto pela Recorrente.
Termos em que improcede a pretendida ampliação do âmbito do recurso.
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3.3. Da subsunção jurídica

Em todos os Estados-Membros existem procedimentos nacionais para a obtenção de medidas cautelares, como as decisões de arresto de contas, mas as condições para a concessão dessas medidas e a eficácia da sua aplicação variam consideravelmente. Além disso, o recurso a medidas cautelares nacionais pode ser difícil nos casos que tenham incidência transfronteiriça, em especial quando o credor pretenda arrestar várias contas localizadas em diferentes Estados-Membros.
Estas foram as razões determinantes que levaram à adotação de um instrumento jurídico da União, vinculativo e diretamente aplicável, que institua um novo procedimento da União que permita, em processos transfronteiriços, o arresto de forma eficiente e rápida dos fundos detidos em contas bancárias.
Surge assim o Regulamento n.º 655/20141 que estabelece um procedimento de decisão europeia de arresto de contas bancárias para facilitar a cobrança transfronteiriça de créditos em matéria civil e comercial.
Com este instrumento um credor deverá poder obter uma medida cautelar sob a forma de uma decisão europeia de arresto de contas que impeça o levantamento ou a transferência de fundos que o seu devedor possui numa conta bancária mantida num Estado-Membro se existir o risco de, sem essa medida, a subsequente execução do seu crédito sobre o devedor ser frustrada ou consideravelmente dificultada. O arresto de fundos mantidos na conta do devedor deverá ter como efeito impedir que não apenas o próprio devedor, mas também as pessoas por este autorizadas a fazer pagamentos através dessa conta, por exemplo, por meio de uma ordem permanente, através de débito direto ou da utilização de um cartão de crédito, utilizem os ditos fundos (considerando 7).
Em suma, o arresto de contas bancárias tem em vista facilitar a cobrança rápida e eficaz de créditos não liquidados, assegurando, ao credor, que o património do devedor não é dissipado por este ou outrem, a seu mando.
As condições de concessão da decisão de arresto deverão proporcionar um equilíbrio adequado entre o interesse do credor em obter uma decisão e o interesse do devedor em prevenir abusos da decisão.
Por conseguinte, quando o credor apresentar um pedido de decisão de arresto antes de obter uma decisão judicial, o tribunal ao qual é apresentado o pedido deverá certificar-se, com base nos elementos de prova apresentados pelo credor, de que é provável que este obtenha ganho de causa no processo principal contra o devedor.

Além disso, o credor deverá ter a obrigação de, em todas as circunstâncias, mesmo quando já tiver obtido uma decisão judicial, demonstrar suficientemente ao tribunal que o seu crédito tem necessidade urgente de proteção judicial e que, sem a decisão, a execução da decisão judicial existente ou futura pode ser frustrada ou consideravelmente dificultada por existir um risco real de que, na altura em que o credor vir esta decisão executada, o devedor possa ter delapidado, ocultado ou destruído os bens ou tê-los alienado abaixo do seu valor, com uma amplitude inabitual ou de modo pouco habitual (considerando 14).
A propósito dos requisitos para a decisão de arresto, refere Joana Covelo que “cabe ao credor apresentar elementos probatórios suficientes que criem, no tribunal, a convicção de bom direito (fumus boni iuris), onde consiga reproduzir a urgência do acautelamento judicial procurado por se verificar um perigo real de que a execução do seu crédito seja impedida ou dificultada caso o arresto não seja decretado (periculum in mora) – art. 7.º, n. 1”.
E acrescenta, “a fim de sedimentar a convicção de bom direito, o art. 7.º, n.º 2 estabelece um adensamento ao critério do fumus boni iuris para os casos em que o arresto seja peticionado antes de ser decidida a ação principal: nesta circunstância, o credor tem de ser capaz de demonstrar, no tribunal competente para emanar a decisão de arresto, a probabilidade elevada que tem em obter ganho de causa no processo declarativo.
Do quadro factual apurado, resulta que se mantêm os fundamentos do reconhecimento do direito de crédito titulado pela Requerente sobre a Requerida, correspondente à execução de encomenda de máscaras por esta solicitada, e não pago, em montante superior a € 2.900.000,00.
A Requerida encontra-se em mora na liquidação do respetivo preço, não respondeu à solicitação de pagamento feita pela Requerente através dos representantes/intermediários no negócio e acumulou em Portugal, no curto espaço de tempo de dois meses, litígios referentes ao pagamento de encomendas a um conjunto de empresas têxteis que ascendem a 12 milhões de euros.
Por outro lado, informou a Requerida que havia procedido e ia proceder a transferências bancárias inexistentes, consentindo que esta prosseguisse a produção de máscaras que se encontravam em execução na data em que solicitaram o cancelamento das encomendas.
À Requerida, tendo em conta a natureza ex parte do processo para a concessão da decisão de arresto, foi permitido impugnar a decisão com base nos fundamentos previstos no regulamento, sendo um deles o crédito do credor não necessitar de proteção urgente sob a forma de uma decisão de arresto, por não existir o risco de a execução subsequente desse crédito ser impedida ou ser substancialmente dificultada.
Impunha-se, pois, à Requerida, em sede de oposição, demonstrar que não se verificavam um ou mais dos pressupostos que levaram à decisão de arresto europeu.
O que a Requerida logrou carrear para os autos é que é uma sociedade anónima de direito francês com mais de 20 anos de existência, ampla experiência e reputação consolidada no sector dos têxteis técnicos especiais, sendo detida a 100% pela sociedade anónima de direito francês denominada K, integrada no Grupo C., cotado na Bolsa de Valores de Paris, com reputação de solidez e destacada atividade internacional nos sectores da proteção temporária de superfícies, entretela para vestuário, têxteis técnicos e lã penteada de luxo.
Todavia, como se ressalvou na sentença recorrida, a demonstração de que a K integra o Grupo C., cotado na Bolsa de Paris, sem clarificação da construção jurídica que lhe subjaz, não permite retirar conclusões sobre a eventual responsabilização das demais empresas do grupo sobre as dívidas da Y perante terceiros.
Por isso, teremos que cingir as considerações à pessoa jurídica que, comprovadamente, responde perante a Requerente.
A Requerida tem capital social de EUR 6.328.660,00 e teve um volume de negócios de EUR 42.087.556,38 no ano de 2019.
A demonstração do capital social e do volume de negócios da Requerida dá-nos uma noção da sua dimensão, mas não, necessariamente, sua saúde financeira, dependente que está da demonstração de resultados líquidos, ou seja, dos lucros e da consequentemente libertação de recursos financeiros que tal que o seu exercício social vem proporcionando.
Acresce que o ano de 2020, com o cunho atípico da pandemia COVID 19, teve reflexos negativos no negócio do sector do têxtil para vestuário, de que a aposta de Requerente e Requerida na produção de máscaras de proteção é um reflexo.
O contexto, condicionante da atividade económica e da saúde financeira no sector, não se encontra refletido nos resultados de 2019.
Assim, como faz notar a Recorrida, o elevado volume de negócios não é demonstrativo da existência de lucro ou resultado operacional positivo, podendo até a empresa verificar prejuízos; o elevado capital social não é demonstrativo da existência de liquidez, podendo até a empresa ter uma situação liquida negativa; a integração num grande Grupo cotado na bolsa de valores francesa, não traz garantias acrescidas ao crédito da Requerente, podendo até pela estrutura de elevada complexidade ser demonstrativa da dificuldade acrescida da execução do crédito.
Faltou a demonstração concreta da existência ou disponibilidade de património suscetível de garantir o crédito da Requerente.
No âmbito da providência ordenada, foram arrestados depósitos bancários no valor determinado no arresto, de cerca € 3.000.000,00.
Esta circunstância é reveladora de que a Requerida tem uma disponibilidade financeira desse valor, sem dúvida expressivo, mas apenas suficiente para cobrir o crédito da Requerente, quando é certo que a Requerida mantinha valor muito superior – de € 12 milhões - em fornecimentos litigiosos junto de empresas do sector, por conta de máscaras encomendadas no curto lapso temporal de meses.
Associadas ao supra descrito comportamento da Requerida por ocasião do cancelamento das encomendas, negando ainda nesta sede judicial a existência de relação contratual entre as partes, crê-se que subsistem razões para reputar a execução subsequente do crédito do credor contra o devedor consideravelmente dificultada em caso de levantamento do arresto concretizado, pelo que deverá manter-se, nos termos determinados.
Concorda-se, pois, integralmente com a fundamentação produzida na sentença.
Em face de todo o exposto, improcede a apelação, sendo de confirmar a decisão recorrida.
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IV – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.
Guimarães, 20 de maio de 2021

Assinado digitalmente por:
Rel. – Des. Conceição Sampaio
1º Adj. – Elisabete Coelho de Moura Alves
2º Adj. - Des. Fernanda Proença Fernandes


1. In “O Reg. 655/2014 Sobre o Procedimento de Decisão Europeia de Arresto de Contas: Uma Apresentação Geral”, Revista AO i-ii, 2019.
2. In O Regulamento n.º 655/2014 que estabelece um procedimento de decisão europeia de arresto de contas: direitos à ação e de defesa em tensão reflexiva no contexto de uma integração judiciária em matéria civil – uma precoce antevisão”, E-book, Vol. I, Workshops CEDU 2016, págs 274.
3. Ob. Cit. pag. 221.
4. Neste sentido Miguel Teixeira de Sousa, ob cit, pag. 224.
5. Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, 2019, pág. 679.
6. Neste sentido, Ac. da Relação de Lisboa de 24.01.2019, disponível em www.dgsi.pt.
7. Disponível em www.dgsi.pt.
8. In “Direito Processual Civil”, Vol. III, pg. 308.
9. In “Manual de Processo Civil”, pg. 686.
10. In “Código de Processo Civil Anotado”, Volume V, páginas 139 e 140.
11. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª Edição Almedina, pag 736.
12. Disponível em www.dgsi.pt.
13. In https//blogippc.blogspot.com