Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
701/20.7T8BRG-A.G1
Relator: ANTERO VEIGA
Descritores: EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
COMPENSAÇÃO
NULIDADE
CADUCIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/17/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
I - Não fere de nulidade o despedimento por extinção do posto de trabalho a decisão proferida sem que tenha sido junto o parecer da ACT, se foi proferida depois de decorrido o prazo legal estipulado no nº 3 do artigo 370º do CT, para a ACT remeter o seu parecer.
II - Como quer que se considere o prazo referido no artigo 371º do CT, nunca o seu incumprimento conduzirá à caducidade ou prescrição do exercício do direito de proferir decisão de despedimento.
III - A licitude do despedimento não é afectada pela circunstância de poderem vir a ser reconhecidos créditos ao trabalhador, que eram litigiosos, não incluídos na compensação a que alude o artigo 384º do CT.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

M. H., id. nos autos, intentou ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra, Empresa do Diário do X, Ldª impugnando os factos fundamento do despedimento, por extinção do posto de trabalho, e invocando que:

- o procedimento de extinção do posto de trabalho não cumpre com a tramitação imposta por lei, tornando o despedimento nulo, porque o empregador proferiu decisão de despedimento sem ter rececionado o parecer da ACT;
- a Ré ultrapassou o prazo previsto no artigo 371º, o que conduz à caducidade ou prescrição do exercício do direito de proferir decisão de despedimento;
- o pagamento efetuado pelo empregador a 27/12/2019 não contempla a totalidade dos créditos devidos pelo trabalhador; e
- a decisão de despedimento está deficientemente fundamentada, por omitir quaisquer factos que permitam aferir o nexo de causalidade entre a necessidade da extinção do posto de trabalho e os motivos invocados.

Foi proferido despacho saneador no qual se decidiu; “em suma, pelas razões supra elencadas, julgo inviáveis as objeções formais supra enunciadas.
E, analisado o procedimento junto aos autos constata-se, de facto, que a nível procedimental a Ré cumpriu as formalidades previstas na lei, inexistindo, nessa parte, qualquer violação geradora de ilicitude do despedimento. Concluímos, assim, não se verificar em concreto a inobservância de qualquer das formalidades previstas na lei, suscetíveis de determinar a ilicitude do despedimento por extinção do posto de trabalho que o autor ocupava.”

Inconformada a autora interpôs recurso invocando nas suas conclusões:

- Incumprimento da tramitação imposta por lei, por ter sido proferida decisão sem ter sido rececionado o parecer da ACT.
- Ultrapassagem do prazo previsto no artigo 371º do CT, conduzindo à caducidade ou prescrição do exercício do direito ide proferir decisão de despedimento.
- Pagamento efetuado a 27/12/2019 não comtempla a totalidade dos créditos devidos à trabalhadora.
- Deficiente fundamentação do despedimento por omissão de factos que permitam aferir do nexo de causalidade entre a necessidade da extinção do posto de trabalho e os motivos invocados.

Em contra-Alegações sustenta-se o julgado.
Neste tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
A recorrente respondeu ao parecer.
Colhidos os vistos das Ex.mas Srªs Adjuntas há que conhecer do recurso.
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Factualidade com interesse para a resolução da questão.

1. Foi comunicada à autora por registo de 11/11/2019 a decisão de despedimento, da mesma data, com fundamento em extinção do posto de trabalho, a produzir efeitos a partir de 31/01/2020. Mais foi informada que a partir de 30/11/2019 seria colocada em pagamento a compensação legal e “demais créditos que se vençam com a cessação do contrato de trabalho”.
2. Consta da fundamentação da decisão:






















(…)
3- Por carta de 19/12/2019 foi enviado cheque à autora no montante de € 13.563,06 para pagamento da compensação, férias não gozadas e subsídio de férias vencidas a 1/1/2019 e relativas ao trabalho prestado entre 1/1/2019 e 28/4/2019. Correspondem € 11876,98 a compensação, 1.118,04 a subsidio de férias e 1118,01 a férias não gozadas, com desconto em sede de IRS de 152,00. A autora tinha o último vencimento base de 733,53.
4- A ré comunicou à autora a intenção de despedimento por comunicação de 17/9/2019.
5- A autora por carta de 30/9/2019 informou a empregadora de que havia solicitado a verificação dos requisitos previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 368 do CT à IGT – doc. Junto a 21/2/2020.
6- A 30-12/2019 a trabalhadora transferiu a quantia para a empregadora.
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Conhecendo do recurso:
Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.

Questões colocadas:
- O procedimento de extinção do posto de trabalho não cumpre com a tramitação imposta por lei, tornando o despedimento nulo, porque o empregador proferiu decisão de despedimento sem ter rececionado o parecer da ACT;
- A Ré ultrapassou o prazo previsto no artigo 371º do CT, o que conduz à caducidade ou prescrição do exercício do direito de proferir decisão de despedimento;
- O pagamento efetuado pelo empregador a 27/12/2019 não contempla a totalidade dos créditos devidos pelo trabalhador; e
- A decisão de despedimento está deficientemente fundamentada, por omitir quaisquer factos que permitam aferir o nexo de causalidade entre a necessidade da extinção do posto de trabalho e os motivos invocados.
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Vejamos:
Invoca-se que o procedimento de extinção do posto de trabalho não cumpre com a tramitação imposta por lei, tornando o despedimento nulo, porque o empregador proferiu decisão de despedimento sem ter rececionado o parecer da ACT.

Refere o artigo 370.º do CT:
Consultas em caso de despedimento por extinção de posto de trabalho

2 - Qualquer trabalhador envolvido ou entidade referida no número anterior pode, nos cinco dias úteis posteriores à comunicação do empregador, solicitar ao serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral a verificação dos requisitos previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 368.º, informando simultaneamente do facto o empregador.
3 - O serviço a que se refere o número anterior elabora e envia ao requerente e ao empregador relatório sobre a matéria sujeita a verificação, no prazo de sete dias após a receção do requerimento.
Invoca a recorrente a nulidade do procedimento por ter sido proferida decisão sem receção do parecer da ACT.
Sobre a ilicitude do despedimento refere em geral o artigo 381.º
Fundamentos gerais de ilicitude de despedimento

Sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes ou em legislação específica, o despedimento por iniciativa do empregador é ilícito:
a) se for devido a motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos, ainda que com invocação de motivo diverso;
b) se o motivo justificativo do despedimento for declarado improcedente;
c) se não for precedido do respetivo procedimento;
d) em caso de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante ou de trabalhador durante o gozo de licença parental inicial, em qualquer das suas modalidades, se não for solicitado o parecer prévio da entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres.

Relativamente à al. c) do artigo 381º, reporta-se à ausência de procedimento, o que poderá incluir a falta de decisão final ou falta de fundamentação nos termos dos artigos 368º, 1 e 2 e 371º, 2, a), b) e c), do CT, e não a qualquer desvio durante este.

Quanto a tais desvios rege o artigo 384º, que refere:
Ilicitude de despedimento por extinção de posto de trabalho

O despedimento por extinção de posto de trabalho é ainda ilícito se o empregador:
a) Não cumprir os requisitos do n.º 1 do artigo 368.º;
b) Não observar o disposto no n.º 2 do artigo 368.º;
c) Não tiver feito as comunicações previstas no artigo 369.º;
d) Não tiver posto à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação por ele devida a que se refere o artigo 366.º, por remissão do artigo 372.º, e os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho.

No caso presente não se verifica qualquer irregularidade, porquanto a empregadora não proferiu a decisão sem ter decorrido o prazo legal para a ACT remeter o seu parecer, estipulado no nº 3 do artigo 370º.
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Refere-se ainda o incumprimento do prazo do artigo 371º do CT, o que conduz à caducidade ou prescrição do exercício do direito de proferir decisão de despedimento.
Refere o nº 1 do normativo:
“Decorridos cinco dias a contar do termo do prazo previsto no n.º 1 do artigo anterior, ou, sendo caso disso, a contar da receção do relatório a que se refere o n.º 3 do mesmo artigo ou do termo do prazo para o seu envio, o empregador pode proceder ao despedimento.”
Entendem alguns que a norma não fixa prazo para proferir a decisão, antes lhe indica um termo inicial a partir do qual ela pode ser proferida, tratando-se de um prazo mínimo de reflexão imposto à empregadora – Vd. Ac. RE de 13/12/2017, processo nº 8362/2007-4, disponível em dgsi.pt. Os termos literais da norma parecem apontar neste sentido – “decorridos cinco dias…” – O termo exprime uma ideia de “passagem do tempo”, de “tempo percorrido”.
Outros defendendo embora tratar-se de um prazo para decisão, entendem, dada a falta de qualquer cominação quer no sentido da caducidade quer no sentido da ilicitude do despedimento, tratar-se de prazo meramente indicativo, de prazo ordenador (veja-se, contudo, o nº 5 do normativo).
Atente-se em que o legislador comina com caducidade o não respeito de prazo de decisão nos casos dos artigos 330.º nº 2; 357º, nº 1 e 378º nº 1. Quanto ao prazo do artigo 363º, 1 comina o seu desrespeito com ilicitude do despedimento nos termos do artigo 383º, b).
Consequentemente, opte-se por um ou outro entendimento, sempre improcede a alegação.
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- O pagamento efetuado pelo empregador a 27/12/2019 não contempla a totalidade dos créditos devidos pelo trabalhador.

Sobre a compensação refere o artigo 384.º:
Ilicitude de despedimento por extinção de posto de trabalho
O despedimento por extinção de posto de trabalho é ainda ilícito se o empregador:

d) Não tiver posto à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação por ele devida a que se refere o artigo 366.º, por remissão do artigo 372.º, e os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho.
Como se refere na decisão recorrida; “quando a lei comina a falta de pagamento atempado dos créditos laborais com a ilicitude do despedimento, está a referir-se apenas aos créditos não litigiosos e liquidados. Como explica BERNARDO XAVIER, “a ilicitude do despedimento não poderá ser afetada pela circunstância de posteriormente (ou mesmo à data, ou antes) o trabalhador reclamar sem satisfação uma diferença salarial que o empregador não aceita, um suplemento retributivo contestável ou uma indemnização por facto ilícito, ainda que todos esses créditos venham a ser reconhecidos judicialmente mais tarde”. É o que acontece no caso dos autos, uma vez que a Autora reclama o pagamento de diferenças salariais que a Ré não reconhece. Por isso, é matéria diretamente conexa com o mérito ou fundo da causa, e não com o cumprimento das formalidades legais…”
Nem poderia ser de outro modo, sob pena de uma incontornável insegurança da empregadora quanto às quantias a liquidar, dada a possibilidade sempre existente de o trabalhador invocar créditos não reconhecidos pela entidade patronal, decorrentes de factos geradores não consensuais.
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Refere-se a terminar que a decisão de despedimento está deficientemente fundamentada, por omitir quaisquer factos que permitam aferir o nexo de causalidade entre a necessidade da extinção do posto de trabalho e os motivos invocados.
A decisão de despedimento descrever os motivos pelos quais a empresa entende dever extinguir o posto de trabalho da autora, invocando designadamente a transição para o digital que tornou as necessidades de secretariado residuais, sendo estas assumidas por jornalistas. Acompanha-se a invocação com dados relativas aos assinantes, dados económicos e dados relativos à evolução destes ao longo dos últimos anos. Improcede consequentemente o alegado.
Assim é de confirmar o decidido na totalidade.
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DECISÃO:

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão.
Custas pela recorrente.
17/12/20