Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
618/20.5T8VRL.G1
Relator: ANTERO VEIGA
Descritores: MARCAÇÃO DE FÉRIAS
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
SANÇÃO ABUSIVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/01/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
Quando o Código do Trabalho, no n.º 1 do artigo 241.º, se refere à marcação do período de férias por acordo entre empregador e trabalhador, reporta-se à marcação de férias em concreto, em cada ano, e não à possibilidade de no cotrato individual de trabalho se estabelecer um modelo de marcação de férias.
Qualquer cláusula estabelecendo um modo de fixação de férias deve respeitar o regime legal imperativo.
A lei aplicável à marcação de férias é a que estiver em vigor à data em que o direito a férias se constituiu.
O caráter abusivo da sanção, além da natureza indevida ou excessiva da sanção aplicada, reside na natureza persecutória do procedimento disciplinar e da sanção, residindo na motivação, no animus que levou a empregadora a deduzir o procedimento e a sancionar o trabalhador.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

Nos presentes autos veio C. T. intentar contra I. M. e LAVANDARIA X, Unipessoal, Lda, ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, sob a forma de processo especial pedindo para o efeito que se declare a ilicitude do despedimento de que foi alvo e a condenação das RR. no pagamento das quantias indemnizatórias daí decorrentes. Para o efeito a aqui demandante veio apresentar o formulário correspondente ao seu pedido de impugnação judicial do despedimento que lhe foi aplicado enquanto sanção disciplinar, acompanhado da respetiva decisão.
As demandadas vieram deduzir o seu articulado inicial, alegando que a A. celebrou contrato de trabalho com a R. pessoa singular em 1993, para exercer as funções correspondentes à categoria de rececionista/engomadora, tendo-se mantido no exercício das suas funções até dezembro de 2019. Em 21/11/2019 a R. constituiu uma sociedade unipessoal, tendo transferido para a mesma os vínculos laborais que mantinha com os seus funcionários, entre eles a A.
Quanto ao objeto do procedimento disciplinar instaurado à demandante, afirma a R. que foi elaborada nota de culpa, onde constam os factos imputados à mesma que pela sua gravidade são, no entender da demandada, incompatíveis com a manutenção do vínculo laboral e que reiterou no articulado em apreço.
Conclui, assim, no sentido de que a presente ação deverá ser julgada improcedente e as RR. absolvidas, considerando-se o despedimento lícito.
Por seu turno, a A. veio deduzir articulado de contestação/reconvenção, alegando para o efeito e em síntese, que a R. pessoa singular deverá ser julgada parte legítima para intervir na presente lide e quanto ao procedimento disciplinar que lhe foi instaurado a demandante afirma que foi sempre uma trabalhadora responsável e zelosa, nunca se tendo dirigido à R. de forma desrespeitosa. Tendo-lhe sido comunicado em 17/01/2020 que deveria ir de férias no dia 20 desse mesmo mês, a A. recusou-se a fazê-lo, por não ter organizado a sua vida pessoal nesse sentido. Tendo-se apresentado ao serviço naquele dia, foi impedida de retomar o seu posto de trabalho pela R. e pelo seu cônjuge que a forçaram a sair. Quanto aos demais factos que lhe são imputados, a A. nega a sua veracidade e afirma que alguns daqueles se encontram já caducados face ao prazo de 60 dias imposto pelo art. 329º nº 2 do Cód. do Trabalho.
Em sede de pedido reconvencional a A. alega que trabalhou para a R. pessoa singular durante 27 anos e 4 meses de forma ininterrupta, até 28/03/2020, sendo que o seu último montante de remuneração mensal ascendia a € 635,00, pelo que em termos de indemnização pela antiguidade, decorrente da ilicitude do seu despedimento, a respetiva indemnização ascenderá a € 34.713,33.
A este montante acrescem ainda as retribuições vencidas e vincendas desde a data do seu despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão final aqui a proferir.
Realizado o julgamento foi proferida decisão julgando a ação improcedente.

Inconformada a autora interpôs recurso apresentado em extensas conclusões e resumidamente as seguintes questões:


2º A recorrente insurge-se contra a matéria de direito, considerando quo o Tribunal a quo procedeu a uma incorreta aplicação da lei, e quanto à matéria de facto, considerando-se que verificou uma incorreta análise e valoração da prova e, consequentemente, incorreta interpretação e aplicação da lei, pois deveria ter dado como não provado os factos n.º 2, 22, 29 e 30 e como provado o facto n.º 1.
3º A Autora não tem quaisquer antecedentes disciplinares.

6º O despedimento com justa causa imputável à aqui Autora consubstanciou-se no único facto de esta se ter recusado a gozar férias no seguimento da Ré ter ordenado, numa sexta-feira ao final da tarde, o início do gozo de férias na segunda-feira seguinte.
7º A Autora recusou-se a gozar férias pelo facto de as mesmas não estarem agendadas no mapa de férias, além da Ré ter ordenado a Autora a gozar férias de um “dia para o outro.”
8º. Portanto, o processo disciplinar instaurado à Autora e resultando na decisão de despedimento com justa causa foi consequência, apenas, por esta ter reivindicado junto da Ré o direito à marcação do gozo de férias no mapa de férias e com a devida antecedência.
9º O Tribunal a quo, na sentença, deu indevidamente importância a uma suposta não utilização de um crachá identificativo da Autora.
10º Do depoimento de parte da Autora, resulta, desde logo, a forma como a Ré marcava as férias das suas funcionárias, inclusive da aqui Autora.
11º Tendo a Autora comunicou e fundamentado à Ré os motivos pelos quais se recusou a gozar férias ordenadas de um dia para o outro.
12º As únicas férias agendadas e marcadas no mapa de férias eram aquelas que a Autora e demais funcionárias escolhiam para o gozo de férias, o que não acontecia com as férias agendadas pela entidade patronal, pois ordenava o gozo de férias de forma arbitrária e a seu belo prazer e de acordo com as suas conveniências de circunstância.

14º No entanto, ao atendermos às declarações da testemunha I. C. ficamos totalmente elucidados quanto à forma arbitrária como o gozo das férias eram ordenadas pela Ré e contrária à vontade das suas funcionárias, incluindo a Autora, tendo sido manifestado a devida discordância, ao contrário da interpretação do Tribunal a quo…

16º No que diz respeito à alegada não utilização do crachá por parte da Autora, a Ré no articulado da Petição Inicial não faz qualquer referência temporal (hora/dia/mês/ano) ao momento em que supostamente não cumpriu as ordens da Ré ao não utilizar à lapela do crachá identificativo.
17º Além de, não é verdade que a Autora, em momento algum, se tenha recusado a usar o crachá identificativo com o seu nome na sua lapela, tendo este alegado facto sido contestado através do artigo 39º da Contestação…

20º
No entanto, o Tribunal a quo relevou este facto indevidamente ao considerar que “o mesmo se diga quanto à inobservância da obrigação na utilização do crachá com o seu nome, que embora não se possa considerar como uma transgressão grave em termos da análise do comportamento da A. é ainda assim relevante para que se pondere do modo como claramente não acatava todas as instruções/diretivas emitidas pela sua entidade empregadora, persistindo numa conduta violadora dessas instruções que reiteradamente lhe eram transmitidas.”

28º O facto de a Ré ter tido permanentemente este comportamento ao longo da sua atividade empresarial de ordenar às suas trabalhadoras, de um dia para o outro, para irem gozar férias não pode significar que fosse aceitável infinitamente por parte da Autora e, sobretudo, caucionado legalmente pelo Tribunal a quo.
29º O Tribunal a quo fundamentou a licitude do despedimento com justa causa imputável à Autora, essencialmente, com a justificação de que esta ao recusar-se a ir de férias de um dia para o outro e ao apresentar-se ao trabalho nos dias seguintes desafiou “…a autoridade da sua entidade empregadora e tentando fazer prevalecer a sua vontade, quer quanto ao gozo de férias, quer quanto ao uso do crachá identificativo das trabalhadoras da R.”
30º Desde logo, já se demonstrou na impugnação da matéria de facto que nunca houve qualquer desentendimento entre a Autora e a Ré quanto ao uso do crachá identificativo.
31º Pelo que, o Tribunal a quo considerou este alegado facto indevidamente como justificação para fundamentar a licitude do despedimento.
32º Quanto à marcação do período de férias, o Tribunal a quo faz uma interpretação e aplicação da lei inadequada ao presente caso concreto.
33º Resulta claramente provado da audiência de julgamento que a Ré nunca afixava o mapa de férias com o agendamento das férias por si estipuladas.
34º Ou seja, apenas era afixado no mapa de férias o agendamento do gozo das férias das funcionárias e da aqui Autora.
35º No entendimento do Tribunal a quo, o facto de “…a R. empregadora logrou demonstrar que o procedimento nesta comunicação foi sempre o mesmo ao longo dos 26 anos de vigência do contrato de trabalho…” é motivo suficiente para a mesmo continuar a violar o estipulado na lei quanto à marcação do período de férias.

39º Ora, este entendimento não pode nem deve ser aceitável à luz da norma do art.º 241º do Código do Trabalho.

42º Ou seja, competia à entidade patronal encetar, anualmente, um acordo com a Autora para a marcação do período de férias a ser gozado por esta.
43º E, na eventualidade de não ser possível este acordo, então, a Ré podia marcar o período de férias por sua iniciativa e afixando o mesmo no mapa de férias dentro do período de férias entre 1 de maio e 31 de outubro (n.º 3 do art.º 241º do Código do Trabalho), o que nunca aconteceu.
44º Nem tão pouco a Ré tomou a iniciativa de chegar a acordo na marcação do gozo das férias Autora após esta se ter oposto ao gozo das férias ordenadas de um dia para o outro.
45º No entanto, no entendimento, errado, do Tribunal a quo, este acordo parece poder ser vitalício, ou seja, durante toda a vigência do contrato de trabalho.
46º O facto de durante muitos anos seguidos a Ré ter ordenado arbitrariamente o gozo de férias da Autora e esta ter gozado as férias, apesar de mostrar a sua discordância, no entendimento do Tribunal a quo, significa que existia um acordo vitalício quanto ao agendamento da marcação do período de férias.
47º Ora, esta interpretação da lei não pode nem deve ser aceitável.
48º Por outro lado, no entendimento do Tribunal a quo, a Autora nunca poderia opor-se, de forma perentória, quanto ao método arbitrário da Ré de marcar o gozo de férias.
49º A partir do momento em que a Autora se opôs ao gozo das férias nas circunstâncias provadas em julgamento, competia à Ré cumprir o estipulado legalmente, pois “na falta de acordo, o empregador marca as férias…” (n.º 1 do art.º 241 do Código do Trabalho).
50º Significa isto que a Ré deveria agendar as férias da Autora com a devida antecedência, afixando-as no respetivo mapa de férias, o que não sucedeu.

53º
O direito a férias está consagrado na Constituição pelo art.º 59º e a conciliação da atividade profissional com a vida familiar.
54º Além de que, a forma como a Ré agendou e ordenou arbitrariamente o gozo de férias da Autora violou ostensivamente o princípio de que “o direito a férias deve ser exercido de modo a proporcionar ao trabalhador a recuperação física, e psíquica, condições de disponibilidade pessoal, integração na vida familiar e participação social e cultural”, conforme estipula o n.º 4 do art.º 237º do Código do Trabalho.
55º E foi, também, ao abrigo desta norma legal que a Autora se sentiu impelida a opor-se à forma arbitrária do agendamento de um dia para o outro do gozo de férias, pois ficava impedida de conciliar o gozo de férias com a sua vida familiar, para além de toda a participação social e cultural a que tem direito de usufruir durante o gozo de férias.

Pelo que, o Tribunal a quo deveria ter interpretado o processo disciplinar e a sanção de despedimento com justa causa imputável à Autora como uma sanção abusiva, ao abrigo das alíneas a) e e) do n.º 1 do art.º 331º do Código do Trabalho, “considera-se abusiva a sanção disciplinar motivada pelo facto do trabalhador: a) ter reclamado legitimamente contra as condições do trabalho; e) em geral, exercer, ter exercido, pretender exercer ou invocar os seus direitos ou garantias.”

Por outro lado, a Ré manifestou que não aceitaria a reintegração da Autora na eventualidade do despedimento com justa causa ser considerado ilícito.
64º Além de que, devendo a sanção de despedimento com justa causa imputável à Autora ser considerada uma sanção abusiva, ao abrigo do n.º 4 do art.º 331 do Código do Trabalho, esta tem direito a optar entre a reintegração e uma indemnização calculada nos termos do n.º 3 do art.º 392 do Código do Trabalho.
65º E como a Ré, também, não pretende a reintegração laboral da Autora, esta deverá ser indemnizada ao abrigo do n.º 3 art.º 392 º do Código do Trabalho.

69º Assim, a ilicitude do despedimento com justa causa, confere à Autora o direito a receber o valor da indemnização já vencido, devendo receber 60 (sessenta) dias de retribuição base por cada ano completo ou fração de antiguidade (27 anos e 4 meses).
70º Pelo que, ao abrigo do n.º 3 do art.º 392º do Código de Trabalho, a Autora deverá receber uma indemnização por antiguidade no valor de €34.713,33 (trinta e quatro mil, setecentos e treze euros e trinta e três cêntimos).
71º Em virtude da ilicitude do despedimento com justa causa, a Autora deixou de auferir o rendimento mensal de €635,00 (seiscentos e trinta e cinco euros), desde o dia 28/03/2020 até à presente data.
72º Em consequência da ilicitude do despedimento com justa causa, a Autora reclama o pagamento dos vencimentos e dos subsídios de férias e Natal que se vencerem até ao transito em julgado de decisão judicial.

75º
Consequentemente, a sentença recorrida violou, por incorreta interpretação e aplicação da lei, entre outros, as normas do n.º 4 do art.º 237º, dos n.º 1, 2, 3 e 9 do art.º 241 e das alíneas a) e e) do n.º 1 do art.º 330º, todos do Código do Trabalho.
76º Além de que, a interpretação do Tribunal a quo do poder de autoridade da entidade patronal em confronto com o direito ao gozo de férias em conciliação da atividade profissional com a vida familiar, dando primazia ao poder de autoridade da entidade patronal ter o direito de ordenar o gozo de férias de um dia para o outo, viola o consagrado no art.º 59º da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade que aqui se invoca.

Sem contra-alegações.
Neste tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, referido dever ser considerado provado que “a A. justificou a sua recusa em gozar o período de 6 dias de férias a que tinha direito gozar por entender que a entidade patronal a tinha que avisar com antecedência de alguns dias em relação ao dia em que ia ficar de férias”.
Em resposta a recorrida vem sustentar o julgado.
Colhidos os vistos das Ex.mas Srªs. Adjuntas, há que conhecer do recurso.
***
Factualidade:

1. Em 1993, a Autora e a Ré I. M. celebraram um contrato de trabalho sem termo, para sob a autoridade e direção desta, exercer as funções inerentes à categoria rececionista/engomadora.
2. alterado: À data da cessação do vínculo contratual, a Autora auferia uma retribuição base ilíquida de € 653,00 (seiscentos e cinquenta e três euros).
3. O despedimento da Autora foi precedido de procedimento disciplinar, por decisão da gerência da LAVANDARIA X, UNIPESSOAL, Lda. datada de 27 de janeiro de 2020, foi instaurado contra a A. um procedimento disciplinar, com remessa de articulado com Nota de Culpa em 29 de janeiro de 2020.
4. Com a Nota de Culpa, a A. foi suspensa preventivamente, com efeitos imediatos, porquanto a Ré Lavandaria X, Unipessoal, Lda., entendeu que a presença daquela nas instalações da empregadora – máxime, as correspondentes ao exercício das suas funções – se afigurava prejudicial e inconveniente ao normal desenvolvimento da atividade, assim como ao cabal apuramento de todos os factos subjacentes ao exercício do poder disciplinar.
5. A nota de culpa, foi enviada à A. mediante carta registada com aviso de receção com data de expedição postal a 29 de janeiro de 2020 e pela mesma recebida no dia 30 de janeiro de 2020.
6. A R. tem como objeto social a atividade de lavandaria e limpeza a seco de têxteis e peles, detendo para o efeito estabelecimento comercial aberto ao público na Av.º … em Vila Real.
7. A A. foi admitida ao serviço de I. M. no ano de 1993, mediante contrato de trabalho sem termo, para exercer as funções correspondentes à categoria de rececionista/engomadora.
8. Por razões de exigência de mercado a I. M. em 21.11.2019 constituiu a sociedade unipessoal por quotas denominada “LAVANDARIA X, UNIPESSOAL, LDA”, para a qual transferiu os diversos vínculos laborais que mantinha com os seus trabalhadores na qual se inclui a trabalhadora ora arguida e a I. M..
9. A referida sociedade arguida tem como única sócia e gerente a Sr.ª I. M..
10. As funções desempenhadas pela A. passavam por atender telefonemas, receber roupas, têxteis e peles para limpeza a seco, proceder à limpeza dos artigos entregues pelos clientes, engomar roupas, receber dinheiros, bem como proceder à restituição e entrega das roupas deixadas para limpeza, prestar assistência e colaboração à gerência e de um modo geral assessorar a mesma, bem como praticar atividades administrativas e operacionais no âmbito da organização já adotada pela R.
11. A A. exerce, pois, funções de responsabilidade e confiança no desempenho de tarefas a que está afeta ao serviço da arguente, sendo que, a seguir à gerente da entidade patronal é a funcionária com mais tempo de serviço detendo inclusive chave para abrir e fechar o estabelecimento da R.
12. No dia 17/01/2020 (sexta-feira) ao final do dia a gerente da R. disse à A. que no dia 20/01/2020 iria ficar de férias para gozar os dias que faltava gozar (6 dias) do ano anterior 2019.
13. A A. disse que não, sendo que a gerente lhe ia dizendo que tinha de ir de férias, a A. por sua vez dizia que não ia e este discurso foi sendo repetido por diversas vezes, tanto pela demandante como pela sua superiora hierárquica e gerente da entidade patronal.
14. Alterado: A A. recusou-se a ir de férias, referindo que queria as férias por escrito ou ser avisada com antecedência de alguns dias em relação ao dia em que ia ficar de férias.
15. No dia 20 de janeiro de 2020 a arguida apareceu para trabalhar no período da tarde, pois às segundas-feiras no período da manhã é costume estar de folga e nesse mesmo dia, a gerente da R. chegou ao trabalho um pouco mais tarde e deparando-se com a A. a trabalhar perguntou-lhe “(…) o que se passava? …, não devia estar ali pois estava de férias. (…)” e uma vez mais a A. disse “(…) que não ia obedecer, que não saía da loja.(…)”.
16. A gerente da R. ia repetindo que “(…) tinha que ir embora” e a A. sempre a repetir “(…) que não ia(..)”, tudo isto a acontecer em frente às outras funcionárias, já com alguma exaltação.
17. Como a A. no dia 20 de janeiro de 2020 tinha trabalhado cerca de duas horas a R. disse-lhe que “(…) lhe pagava a tarde mas que não a queria a trabalhar, que fosse embora do local de trabalho pois estava em gozo de férias (…)”.
18. Após a realização de dois telefonemas por parte da A. o marido da R. I. M., M. A., chegou às instalações da arguente e também ele reforçou a ideia que a demandante estava de férias e que como tal devia acatar as ordens, tendo a A. muito custo lá acabou por aceitar a indicação de terminar o seu trabalho no dia 20.01.2020 e acabou de igual modo por sair da lavandaria.
19. A A. no dia 21 de janeiro de 2020 no período da manhã volta a comparecer ao trabalho na lavandaria, dizendo que “(…) vinha trabalhar (…)”; por sua vez, a R. disse-lhe que “(…) não podia pegar ao serviço uma vez que estava de férias (…)” ao que a arguida respondeu que “(…) ia enviar uma carta à gerência (…)”.
20. Contrariada e a muito custo a A. com a indicação de que estava a gozar um período de férias acabou por sair da lavandaria…; só que, uma vez mais no dia 22.01.2020 a arguida compareceu novamente ao trabalho a perguntar: ”(…) se podia trabalhar (…)”, ao qual lhe foi respondido que não pois continuava de férias.
21. Questionada a A. acerca das razões das suas atitudes quanto a gozar o período de férias em causa, esta respondeu que a entidade patronal a tinha que avisar com antecedência de alguns dias em relação ao dia em que ia ficar de férias.
22. Foi-lhe respondido que há 26 anos que era assim que se processavam as férias na lavandaria, sem nunca haver contestação, ou seja, 15 dias de férias eram gozadas por marcação das funcionárias e os restantes dias de férias são gozadas no Inverno (altura de menos trabalho) e eram marcadas pela entidade patronal.
22.a. aditado: Desde início era assim que se processavam as férias na lavandaria, ou seja, 15 dias de férias eram gozadas por marcação das funcionárias e os restantes dias de férias são gozadas no Inverno (altura de menos trabalho) e eram marcadas pela entidade patronal. Relativamente às férias marcadas pela empregadora as funcionárias e ao longo dos anos, iam manifestando o seu descontentamento, por não serem avisadas com alguns dias de antecedência.”
23. Em dia que não se consegue concretizar, mas na última semana de setembro de 2019 a A. disse para a R. I. M. que quando marcasse as férias (os 6 dias que faltava gozar), lhe comunicasse com alguns dias de antecedência, ao qual a R. anuiu.
24. Não obstante o acordado entre as duas partes a verdade é que na primeira semana de outubro de 2019 a arguida disse que queria as férias na semana seguinte, ou seja, na segunda semana de outubro, a gozar entre os dias 7 e 11 de outubro, quando já havia gozado as férias que havia marcado com a entidade patronal.
25. Foi-lhe de pronto respondido pela R. I. M. que não era possível e que não sabia se até ao final do ano iria ser possível, pois por motivos pessoais a mesma demandada não podia estar na loja a maior parte do tempo e só restavam as outras duas funcionárias, as quais eram insuficientes para o volume de trabalho na altura.
26. Confrontada com esta resposta a A. foi adiantando em tom de desafio à R. com os seguintes termos “(…) vai ver se vou ou não de férias (…)”.
27. A A. no dia 07/10/2019, pelas 12.49h mandou uma sms para o telemóvel n.º ………. propriedade da R. I. M. a dizer o seguinte: “Bom dia estou doente não posso ir trabalhar tenho consulta aberta de tarde.”.
26. A A. faltou ao trabalho no dia 7 de outubro de 2019 e esteve uma semana de baixa, voltando ao trabalho por um dia e, após este, meteu nova baixa durante um mês, ou seja, de 7 de outubro até 11 de novembro de 2019, na totalidade de cerca de 40 dias.
27. Alterado: Todas as funcionárias da lavandaria têm de usar um crachá identificativo do nome da funcionária, o qual deve ser colocado nas suas batas de trabalho, mas que a A. frequentemente não coloca.
28. Alterado: Quando confrontada a demandante para colocar o crachá a mesma dizia “(…) já ponho, esqueci-me (…)” e não obstante todas as ordens que lhe eram dadas para usar o crachá com o seu nome inscrito à lapela da bata, frequentemente não o usa.”
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FACTOS NÃO PROVADOS

- A A. não justificava nem justificou até hoje a sua recusa em gozar o período de 6 dias de férias a que tinha direito gozar.
- Ao mesmo tempo que ia proferindo diversos comentários em total falta de respeito para com a R.
- No dia 22 de janeiro de 2020, pelas 15.00h o marido da A. (A. T.), cruzou-se na via pública com o marido da gerente da R. e aquele com os carros em paralelo, faz com as mãos um gesto para o M. A., gesto esse revelador da ideia de que lhe ia cortar o pescoço.
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Conhecendo do recurso:
Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.
As questões a resolver prendem-se com a apreciação da matéria de facto (factos provados do n.º 2, n.º 22, n.º 29 e n.º 30 e facto 1 não provado), e com a verificação de justa causa de despedimento e suas consequências.
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Quanto à reapreciação da decisão relativa à matéria de facto:
Facto 2 “ À data da cessação do vínculo contratual, a Autora auferia uma retribuição base ilíquida de €560,00 (quinhentos e sessenta euros).”
Refere a recorrente que no seguimento de reclamação (Ref. n.º 36534730) do despacho saneador, foi dado como assente, através de Despacho (Ref. n.º 34778999), que “à data da cessação do vínculo contratual, a A. auferia uma retribuição base ilíquida de €635,00 (seiscentos e trinta e cinco euros).” Assim é.
Consequentemente altera-se o facto tal como requerido.
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Facto 22 - Foi-lhe respondido que há 26 anos que era assim que se processavam as férias na lavandaria, sem nunca haver contestação, ou seja, 15 dias de férias eram gozadas por marcação das funcionárias e os restantes dias de férias são gozadas no Inverno (altura de menos trabalho) e eram marcadas pela entidade patronal.”
“29 - Todas as funcionárias da lavandaria têm de usar um crachá identificativo do nome da funcionária, o qual deve ser colocado nas suas batas de trabalho, mas que a A. se recusa a colocar.
30 - Quando confrontada a demandante para colocar o crachá a mesma dizia “(…) já ponho, esqueci-me (…)” e não obstante todas as ordens que lhe eram dadas para usar o crachá com o seu nome inscrito à lapela da bata, a verdade é que a A. não o usa.”
Pretende-se sejam considerados não provados.
O item 1 dos considerados não provados tem relação com os factos 21 e 14. consta do item que se pretende seja considerado provado:
- A A. não justificava nem justificou até hoje a sua recusa em gozar o período de 6 dias de férias a que tinha direito gozar.
Refere-se no facto 14 que “a A. não só se recusou a ir de férias como impedia a pergunta que se lhe pretendia fazer para explicar as razões de tal recusa”. No facto 21, relativo ao terceiro dia em que se apresentou ao serviço, consta que “questionada a A. acerca das razões das suas atitudes quanto a gozar o período de férias em causa, esta respondeu que a entidade patronal a tinha que avisar com antecedência de alguns dias em relação ao dia em que ia ficar de férias.”
A recorrente invoca o depoimento de I. C..
Vejamos a prova.
Quanto ao modo de marcar as férias e não reclamação quanto a tal modo por banda das funcionárias, na decisão recorridas fundamenta-se com os depoimentos de I. C. e M. C.. Alude-se na fundamentação a que “confirmaram o modo como habitualmente ao longo dos anos eram marcadas as férias entre as várias trabalhadoras do mesmo estabelecimento, sem que tenha sido alguma vez apresentada qualquer reclamação a este respeito por qualquer uma das mesmas trabalhadoras; o mesmo sucedia quanto à antecipação na comunicação para o gozo de férias que habitualmente era de 6ª para a 2ª feira seguinte.”
Vejamos os depoimentos:
A testemunha I. C., atualmente desempregada, trabalhou na lavandaria quase 14 anos, tendo saído a 6 outubro 2020. Referiu que estava a trabalhar naquela sexta feira em que a empregadora deu conhecimento à autora que iria de férias na segunda feira. Quando a D. I. M. falou à autora nas férias esta disse que “queria as férias por escrito já que não estavam no mapa” e que “tinha que a avisar com antecedência”, “com uma semana de antecedência”, “que tinha a vida dela para organizar”. Referiu que a conversa foi em tom de voz normal. Confirmou o modo de marcação das férias tal como consta da factualidade, referindo que a D. I. M. dizia que tinham direito a 15 dias de escolha e elas a outros 15. A depoente aludiu, contudo a que “a gente nunca concordou muito bem, porque as férias são nossas” e pelo menos “devem ser comunicadas uns dias antes para organizarmos a nossa vida”. Referiu que nunca foram muito a favor de a patroa comunicar numa sexta feira para iniciar as férias na segunda. Aludiu ainda a que as férias que a patroa marcava era quase sempre entre janeiro e fevereiro, que era quando em havia menos trabalho.
Tal modo de marcação era assim desde que entrou a trabalhar para lá, e que as funcionárias diziam muitas vezes que precisavam ser avisadas pelo menos com uma semaninha, para organizarem as coisas. Referiu que a autora tem marido filho e a mãe acamada. Quanto aos acontecimentos de segunda feira, referiu que a autora disse de novo que queria as férias por escrito ou avisadas com antecedência. No começo o de voz era normal, depois subiu o tom voz das duas partes. A autora acabou por ir embora quando já estava lá o Srº M. A.. Na terça não presenciou.
Perguntada se em setembro ouviu a autora a pedir para ser avisada com antecedência das férias que lhe faltavam, referiu ouvir, não se recordando a data precisa, e que e D. I. M. disse que ia pensar.
Quanto ao crachá referiu o seu uso, e que a autora no verão não usava, fazia-lhe alergia. Não tem noção que a D. I. M. a avisasse que chamasse a atenção. Nunca ouviu falar nada do crachá.
O depoente M. A., marido da D. I. M., referiu ter-se deslocado ao estabelecimento dia 20 de janeiro, segunda feira, porque a esposa lhe ligou. Refere que tinham combinado que o tempo de férias em termos de escolha era repartido. Esta combinação apenas foi por si e sua esposa confirmada, dos restantes depoimentos resulta apenas que era assim que se processava, não se aludindo a acordos. Naquele dia a autora com algum custo acabou por ir embora. Refere que segunda feira havia algum tom exaltado, dizendo que a D. H. refila muito é muito exaltada e pouco humilde. No seu entender houve uma tentativa de provocar o conflito, dizendo que ela nunca apresentou nenhuma razão para não ir de férias. Refere que em setembro a questão fora abordada.
Quanto ao crachá refere que usavam todas menos ela autora. A esposa é que a questionava e ela dizia ou “esqueci-me… ou não o tenho cá…”, nunca tendo invocado alergia na pele.
A Depoente I. M., legal representante da ré, refere que quando comunicou à autora para ir de férias ela não disse a razão porque não queria ir, o que contraria o depoimento da autora e da testemunha I. M.. A depoente justificou a atitude da autora, por não lhe ter permitido ir de férias em outubro, mas nada sustenta esta interpretação, tanto que a autora em setembro havia pedido à depoente, como confirma a depoente, para ser avisada com antecedência, isto ainda antes de ter solicitado férias em outubro. A depoente refere não só que a autora não justificou a razão porque não aceitava ir de férias, como referiu que “até hoje não justificou a recusa”. Ora, durante a inquirição e quando se abordou o terceiro dia de comparência da autora, confirmou que a autora perguntada sobre as razões, referiu que “tinha que avisar” com antecedência, aludindo a que ela referiu uma semana e depois duas semanas. A depoente confirma que disse à autora que sempre fora assim que se processara. Quanto a setembro confirmou o pedido da autora para ser avisada com antecedência, e que respondeu que se pudesse lhe diria com uma semana de antecedência, “mas não pude”, referiu a terminar. Quanto ao crachá, todas usam. Ela umas vezes usa outras vezes não, interpelada dizia “esqueci-me”.
A depoente C. T., autora, referiu que sempre disse que queria as férias escritas, que não aceitou porque entendia que tinha que ser avisada com antecedência. Confirma o modo de marcação, 11 dias úteis os trabalhadores, ficavam no mapa e o resto marcava patronal, verbalmente e de um dia para o outro. Refere que já muito anos que se vem a debater para ter marcadas as férias com antecedência. Referiu que muitas vezes havia falado com D. I. M. sobre isso. Estas conversas não foram confirmadas por outros depoimentos, contudo o depoimento da D. I. C. confirma que não lhes agradava o modo de marcação, que entendiam que deviam ser avisadas com antecedência.
Quanto ao que aconteceu na segunda feira, referiu que quando a patroa entrou não lhe disse nada, saiu e só após regressar a interpelou, respondendo-lhe a autora em bom tom, que estava a trabalhar. Confirma o item sobre as motivações que deu. Refere que todos os anos reclamavam deste método de marcação. Confirma que em setembro pediu para a avisar com antecedência, o que a própria D. I. M. confirmou. Perguntada qual o tempo de aviso que acharia adequado, respondeu uma semana. Quanto ao crachá referiu que tinha dias que se esquecia do crachá, mas depois ia pô-lo, referindo, “nunca me recusei a usá-lo”, a patrona advertia “e eu ia por”.
A testemunha M. C., trabalhadora da ré há 25 anos, referiu que quando entrou a autora já estava lá há dois anos. Na sexta feira da comunicação a depoente estava ao trabalho. Ouviu a D. I. M. dizer autora que entraria de férias na segunda. Só ouviu a autora dizer que não entrava de férias, não ouviu mais porque, referiu, ainda “estava no meu trabalho”. Referiu que não estavam exaltadas. Não ouviu dizer porque recusava ir de férias. Dia 20 a autora apresentou-se ao trabalho. Quando a I. M. chega não tem presente o que lhe disse, referindo que a inquiriu porque não estava de férias. A Autora respondeu que estava a trabalhar. Refere que não se conseguia aperceber bem do que se passava. Depois a D. I. M. saiu. Quando regressou repetiu que estava de férias. Refere aqui um tom um bocadinho exaltadas, da parte de ambas. No dia seguinte quando entrou a D. H. a D. I. M. já estava lá, e volta a repetir para a autora que estava de férias que não trabalhava. Refere não ter ouvido pedido para marcar por escrito.
Diz que sempre dividiram as férias em termos de escolha por quinzenas, uma pelo trabalhador e outra pela patroa. Esta comunicava à saída da loja, comunicação de sexta para segunda aconteceu muitas vezes. Perguntada se a autora pediu em setembro para lhe ser comunicado com antecedência, refere não se recordar disso. Quanto ao crachá refere que usam aí uns 10 anos. Refere que autora não usava o crachá, aludindo a que “diretamente à minha frente nunca foi confrontada pela patroa”.
O depoimento da M. C. quanto à justificação da autora não é credível, foge a responder à questão, hesita quando inquirida sobre isso, justificando que não estava junto, que estava a trabalhar e não ouviu tudo.
Assim e quanto ao facto 22, o mesmo corresponde ao que efetivamente se passou. Corresponde o facto à resposta dada pela D. I. M. à autora. Contudo a autora o que pretende é contestar a afirmação de que nunca houve contestação, facto que sempre defendeu no processo, e foi confirmado pela testemunha I. C.. Apenas a ré e seu marido aludem a acordo quanto à marcação de férias, dos restantes depoimentos não se retira qualquer acordo, mas apenas que eram assim processadas desde sempre.

Assim, mantendo-se embora o facto cumpre esclarecer o mesmo, aditando-se o facto 22.a do seguinte teor:

“Desde início era assim que se processavam as férias na lavandaria, ou seja, 15 dias de férias eram gozadas por marcação das funcionárias e os restantes dias de férias são gozadas no Inverno (altura de menos trabalho) e eram marcadas pela entidade patronal. Relativamente às férias marcadas pela empregadora as funcionárias e ao longo dos anos, iam manifestando o seu descontentamento, por não serem avisadas com alguns dias de antecedência.”
Quanto aos factos 29 e 30, resulta da prova que a autora por vezes não usava o crachá, a própria ré referiu que quando interpelada referia ter-se esquecido, nunca havendo uma recusa clara na sua utilização. Assim altera-se o facto nos seguintes termos:
“Todas as funcionárias da lavandaria têm de usar um crachá identificativo do nome da funcionária, o qual deve ser colocado nas suas batas de trabalho, mas que a A. frequentemente não coloca.
- Quando confrontada a demandante para colocar o crachá a mesma dizia “(…) já ponho, esqueci-me (…)” e não obstante todas as ordens que lhe eram dadas para usar o crachá com o seu nome inscrito à lapela da bata, frequentemente não o usa.”
Pretende-se seja considerado provado o item 1º dos factos não provados.
Consta do item, “a A. não justificava nem justificou até hoje a sua recusa em gozar o período de 6 dias de férias a que tinha direito gozar”, matéria considerada não provada, consequentemente favorável à recorrente.
Do teor das alegações (e dá logica das coisas), resulta patente o erro em que incorre a recorrente quanto a este item, pretendendo sim que seja considerado provado que apresentou justificação para a recusa. As peças processuais estão sujeitas a interpretação nos termos normais, artigos 217º ss do CC, conforme artigo 295º do CC. Do teor das alegações resulta clara a pretensão da recorrente.
O item 1 dos considerados não provados tem relação com os factos 21 e 14.
Refere-se no facto 14, relativo ao momento da comunicação das férias, “a A. não só se recusou a ir de férias como impedia a pergunta que se lhe pretendia fazer para explicar as razões de tal recusa!”, e no 21, relativo ao terceiro dia em que se apresentou ao serviço, “questionada a A. acerca das razões das suas atitudes quanto a gozar o período de férias em causa, esta respondeu que a entidade patronal a tinha que avisar com antecedência de alguns dias em relação ao dia em que ia ficar de férias”.
Quanto à justificação da recusa no gozo das férias marcadas pela empregadora, resulta da prova que a autora sempre referiu que pretendia as férias por escrito ou com antecedência para poder organizar a sua vida. Embora a depoente I. M. tenha referido que ela não apresentou justificação, acabou por confirmar que no terceiro dia fez tal referência. A autora e a testemunha I. C. aludiram a essa justificação, logo aquando da comunicação para ir de férias, sendo conforme às regras da experiência a apresentação dessa justificação, tanto mais quando resulta provado que em setembro a autora havia solicitado que fosse avisada com antecedência.

Assim altera-se o facto 14 nos seguintes termos:
“a A. recusou-se a ir de férias, referindo que queria as férias por escrito ou ser avisada com antecedência de alguns dias em relação ao dia em que ia ficar de férias”
***
Da justa causa:
Vejamos quanto à licitude do despedimento.
Nos termos do artigo 351º do Cód. do Trabalho, "1- Constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.”
O nº 2 do mesmo artigo enumera alguns dos comportamentos que poderão ser tidos como justa causa de despedimento. Tal enumeração é exemplificativa, não dispensando a prova dos requisitos consagrados no nº 1 do normativo.
O comportamento deve assumir uma gravidada tal que seja impossível a manutenção da relação de trabalho, e é, que, segundo as regras da boa-fé, não seja exigível do empregador a manutenção da relação de trabalho, só devendo aplicar-se a pena máxima quando outra não baste para "sanar a crise contratual aberta pelo comportamento desviante do trabalhador".
A impossibilidade de subsistência da relação laboral há-de resultar da repercussão do comportamento do trabalhador no futuro da relação.
Na apreciação da inexigibilidade da manutenção do vínculo laboral, deve atender-se ao comando do nº 3 do artigo 351º.
Apenas deve optar-se pelo despedimento quando num juízo de prognose sobre a viabilidade da manutenção do vínculo, ponderando-se todas as circunstâncias envolventes e os interesses em jogo, se concluir que a permanência do contrato constitui, de um ponto de vista objetivo, uma insuportável e injusta imposição ao empregador. Tal ocorrerá quando a manutenção do vínculo fere de forma inaceitável a sensibilidade e liberdade psicológica do empregador, não considerando a especial sensibilidade do concreto empregador, mas sim a de uma pessoa normal colocada na posição deste.
No PD imputam-se comportamentos integrantes als. a), c), e) e h) do n.º 2 do artigo 128º do CT integrando as previsões das als. a), c) e d) do nº 2 do artigo 351º do mesmo diploma. Tendo em conta a matéria provada, importa apreciar as imputações de desobediência quanto ao gozo das férias marcadas pela empregadora e quanto ao uso do crachá e quanto a este o desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, de obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho a que está afeto.

Quanto à questão das férias:
A recorrida na resposta ao parecer refere que as férias sempre foram marcadas da mesma forma, referido acordo entre trabalhadores e empregadora. Alude a que tal compromisso decorre da Lei (Dec. Lei n.º 874/76 de 28/12), como decorre de uma prática instituída entre as partes envolvidas desde o ano de 1993, nunca tendo sido objeto de contestação. Reitera que ocorre desobediência injustificada. A sentença baseia-se no mesmo diploma.
Consta do artigo 8º daquele D.L. nºs 1, 2 e 3;
(Marcação do período de férias)
1 - A marcação do período de férias deve ser feita, por mútuo acordo, entre a entidade patronal e o trabalhador.
2 - Na falta de acordo, caberá à entidade patronal a elaboração do mapa de férias, ouvindo para o efeito a comissão de trabalhadores ou a comissão sindical ou intersindicatos ou os delegados sindicais, pela ordem indicada.
3 - No caso previsto no número anterior, a entidade patronal só pode marcar o período de férias entre 1 de maio e 31 de outubro, salvo parecer favorável em contrário das entidades nele referidas e o disposto em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
(…)

Dos nºs 1, 2, 3 do artigo 241º do CT atual consta:
1 - O período de férias é marcado por acordo entre empregador e trabalhador.
2 - Na falta de acordo, o empregador marca as férias, que não podem ter início em dia de descanso semanal do trabalhador, ouvindo para o efeito a comissão de trabalhadores ou, na sua falta, a comissão intersindical ou a comissão sindical representativa do trabalhador interessado.
3 - Em pequena, média ou grande empresa, o empregador só pode marcar o período de férias entre 1 de maio e 31 de outubro, a menos que o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou o parecer dos representantes dos trabalhadores admita época diferente.

Conquanto não releve ao caso, dado o teor idêntico das normas, importa dizer que relativamente à marcação de férias são aplicáveis as normas legais em vigor à data.

Refere o artigo 7º, 1 da L. 7/2009 de 12/2:
Aplicação no tempo
1 Sem prejuízo do disposto no presente artigo e nos seguintes, ficam sujeitos ao regime do Código do Trabalho aprovado pela presente lei os contratos de trabalho e os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho celebrados ou adotados antes da entrada em vigor da referida lei, salvo quanto a condições de validade e a efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente àquele momento.

De igual modo dispunha o artigo 8º da L. 99/2003 que aprovou o CT de 2003.
Trata-se de matéria regulada em conformidade com o que dispõe o artigo 12º do Código civil.

Refere este:
(Aplicação das leis no tempo. Princípio geral)
1. A lei só dispõe para o futuro; ainda que, lhe seja atribuída eficácia retroativa, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
2. Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser diretamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor. (Itálico nosso).
Nas relações jurídicas duradouras, decorre destas normas, que a lei nova se aplica às situações constituídas anteriormente, que abstraiam dos factos que lhes deram origem. Trata-se das normas que regulam o “conteúdo das situações jurídicas já constituídas”, situações essas que não pressupõem os factos anteriores à dada de início de vigência dessa lei, que abstraem desses factos, como é o caso da marcação de férias no âmbito de um contrato de trabalho.
A nova lei aplica-se à marcação de férias cujo direito se tenha formado (vencido) após à sua data de entrada em vigor, não obstante o facto que origina o direito, a relação contratual laboral, ser de constituição muito anterior.

Sobre os direitos reais, explicam Pires de Lima e Antunes Varela, no “Código Civil, Anotado”, Vol. I, pág. 61:
“Previnem-se no n.º 2, em primeiro lugar, os princípios legais relativos às condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos, ou referentes aos seus efeitos. Assim, por exemplo, as condições de validade de um contrato (capacidade, vícios de consentimento, forma, etc.), bem como os efeitos da respetiva invalidade, têm de aferir-se pela lei vigente ao tempo em que o negócio foi celebrado. (...). Se, porém, tratando-se do conteúdo do direito, for indiferente o facto que lhe deu origem, a nova lei é já aplicável. Assim, para fixar o conteúdo do direito de propriedade, ou de qualquer outro direito real, é aplicável a lei nova e não a lei da data da sua constituição. Não interessa, na verdade, saber qual foi o título constitutivo, nem qual foi, por consequência, a data da formação do direito. (...)”.
Sobre a matéria veja-se Batista Machado, “Sobre a aplicação no tempo do novo Código Civil”, Almedina, pág. 18 ss, onde defende que “a lei nova, ou regula a validade de certos factos ou os seus efeitos, e neste caso só se aplica a factos novos, ou define o conteúdo (os efeitos) de certa relação jurídica independentemente dos factos que a essa relação jurídica deram origem, e então é de aplicação imediata”, e que, “ a lei nova relativa ao conteúdo (ou efeitos) de uma relação jurídica só não abstrai dos factos que a essa relação deram origem quando define ou modela intrinsecamente esse conteúdo em função de tais factos... isto é, quando os efeitos ou consequências jurídicas que ela determina são o produto da valoração legal de tais factos e variam consoante essa valoração, de tal modo que se possa dizer que a aplicação da lei nova aos efeitos duma relação constituída com base num facto passado representaria uma nova valoração desse facto passado e, consequentemente, teria carácter retroativo”. Mesmo autor, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 2002, 13 ª reimpressão, 234 a 236.
Assim a lei aplicável é a do CT vigente. E não seria diferente caso tivesse sido demonstrada um acordo expresso, celebrado no âmbito da anterior lei. Tal cláusula sempre teria que se ater às normas legais, dada a imperatividade do regime de férias.
Por outro, quando a lei refere (como já referia o artigo 8º do D.L. 874/76), que a marcação das férias deve ser feita por mútuo acordo, reporta-se às férias concretas, em cada ano, não se referindo à possibilidade de uma cláusula a vigorar para todos os anos, daí que se refira, “a marcação do período de férias”.
Note-se, contudo, que, não obstante este entendimento, a admitir-se a possibilidade de tal cláusula, ou uso de empresa, sempre deveria entender-se que o trabalhador poderia em qualquer momento dela desvincular-se, exigindo o cumprimento das normas legais imperativas. Ou seja, tal cláusula, apenas valeria na medida em que ano a ano o trabalhador fosse acordando, ainda que tacitamente, com a marcação de férias.
A cláusula nunca poderia implicar uma perenidade do modo de marcação de férias, em desconformidade com a norma legal imperativa, que permite ao trabalhador o acordo, sim, mas ano a ano, em cada concreta marcação. Tal perenidade despojaria o trabalhador dessa liberdade, e encontrando-se este numa situação de dependência, seria fácil às empregadoras contornar a norma imperativa por via de tal tipo de cláusula.
Como se referiu as normas relativas às férias são normas imperativas, normas de interesse público, tendo em vista essencialmente razões médicas e psíquicas, visando a recuperação física e psíquica do trabalhador, conforme nº 4 do artigo 237º do CT e nº 2 do artigo 10º da Convenção da OIT nº 132, aprovada pelo DL. 52/80 de 29/7 (“para fixar a época em que serão gozadas as férias, ter-se-ão em, conta as necessidades do trabalho e as possibilidades de repouso e tranquilidade que se oferecem à pessoa empregada”).
As férias devem proporcionar ao trabalhador, como refere o nº 4 do citado artigo do CT, condições de disponibilidade pessoal, integração na vida familiar e participação social e cultural.
Estas condições devem ser efetivas e não apenas formais, devendo consequentemente o trabalhador saber previamente, com tempo adequado, quando gozará as suas férias. Só desse modo se garantem os objetivos pretendidos pelo direito a férias, designadamente para permitir uma programação ao nível da comunidade familiar.
Assim é no CT e era no regime do D.L. invocado.

Resulta do regime legal que as férias, todas as férias, devem constar do mapa. Assim referia o artigo 8º do D.L. nº 874/76:

2 - Na falta de acordo, caberá à entidade patronal a elaboração do mapa de férias, ouvindo para o efeito a comissão de trabalhadores ou a comissão sindical ou intersindicatos ou os delegados sindicais, pela ordem indicada.
3 - No caso previsto no número anterior, a entidade patronal só pode marcar o período de férias entre 1 de maio e 31 de outubro, salvo parecer favorável em contrário das entidades nele referidas e o disposto em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
4 - As férias poderão ser marcadas para serem gozadas em dois períodos interpolados.
5 - O mapa de férias definitivo deverá estar elaborado e afixado nos locais de trabalho até ao dia 15 de abril de cada ano.
Assim, as férias ainda que repartidas, deveriam constar de mapa a afixar até 15/4. O trabalhador a partir desse conhecimento poderia organizar com a sua família as suas férias.
Assim é atualmente conforme artigo 241º:

2 - Na falta de acordo, o empregador marca as férias, que não podem ter início em dia de descanso semanal do trabalhador, ouvindo para o efeito a comissão de trabalhadores ou, na sua falta, a comissão intersindical ou a comissão sindical representativa do trabalhador interessado.
3 - Em pequena, média ou grande empresa, o empregador só pode marcar o período de férias entre 1 de maio e 31 de outubro, a menos que o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou o parecer dos representantes dos trabalhadores admita época diferente.

5 - Em caso de cessação do contrato de trabalho sujeita a aviso prévio, o empregador pode determinar que o gozo das férias tenha lugar imediatamente antes da cessação.

8 - O gozo do período de férias pode ser interpolado, por acordo entre empregador e trabalhador, desde que sejam gozados, no mínimo, 10 dias úteis consecutivos.
9 - O empregador elabora o mapa de férias, com indicação do início e do termo dos períodos de férias de cada trabalhador, até 15 de abril de cada ano e mantém-no afixado nos locais de trabalho entre esta data e 31 de outubro.
Atente-se na previsão especial quanto ao dever de comunicação atempado das férias, que ocorre no caso de cessação do contrato de trabalho sujeita a aviso prévio. Como regra, e salvo acordo (nº 1 do artigo), a marcação deve ocorrer nos termos prescritos neste normativo.
Consequentemente e indo aos autos, a recusa da autora no gozo das férias não foi ilegítimo, tanto mais que em setembro pedira para ser avisada com antecedência.
O uso da empresa (já que não se provou qualquer acordo), relevaria apenas em sede de boa-fé e abuso de direito por banda da autora. Contudo, conforme resultar da factualidade a autora havia pedido em setembro para ser avisada com antecedência, pelo que a ré não pode invocar uma total surpresa na conduta da autora.
Por outro, conquanto os trabalhadores, incluindo a autora, trabalhadora mais antiga da casa, sempre tenham acatado este modo de marcação de férias, resulta dos factos que também manifestaram descontentamento e desagrado pelo facto de não serem avisadas com alguma antecedência de modo a poderem programar a sua vida. Assim sendo não se pode concluir por uma desobediência ilegítima.
Quanto à questão do crachá, a recorrente refere que da nota de culpa não vem indicação temporal relativamente a tal acusação. Não é assim. Resulta da nota de culpa que a recorrida empregadora refere tal desobediência e tal falta como continuada, mantendo-se até à data da suspensão por efeito do levantamento do processo disciplinar.
Quanto a esta matéria resulta da factualidade um desinteresse por parte da autora no cumprimento daquela obrigação, desculpando-se quando chamada à atenção, mas persistindo nesse desinteresse. Não resulta, contudo, uma afronta direta e uma recusa em usar o crachá. Nunca a autora referiu que o não usaria o crachá. Atendendo à antiguidade da autora, sem passado disciplinar, o facto por si não é de molde a justificar a cessação do vínculo contratual, tendo em conta o quadro de sanções disponíveis no artigo 328º do CT.
Conclui-se assim pela ilicitude do despedimento.
***
A autora pede, como consequência da ilicitude do despedimento e da exclusão de reintegração da Autora a pedido das Rés, ser a I e II Ré condenadas, solidariamente, (ao abrigo do n.º 6 do art.º 285º do Código do Trabalho), a pagar à Autora uma indemnização por antiguidade no valor de €34.713,33 (trinta e quatro mil, setecentos e treze euros e trinta e três cêntimos), calculada ao abrigo do n.º 3 do art.º 392º do Código de Trabalho, bem como a quantia da fração de antiguidade vincenda até à data do trânsito em julgado da sentença e a liquidar em execução da mesma, tudo acrescido de juros legais até efetivo e integral pagamento; bem como ser a II Ré condenada a pagar à Autora a quantia de €1.905,00 a título de vencimentos vencidos referentes aos meses de Abril, Maio e Junho de 2020, bem como todos os vencimentos vincendos até à data do trânsito em julgado da sentença e a liquidar em execução da mesma, tudo acrescido de juros à taxa legal até efetivo e integral pagamento.
sobre as consequências do despedimento ilícito rege o artigo 389º nos seguintes termos:
Artigo 389.º
Efeitos da ilicitude de despedimento
1 - Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado:
a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais;
b) Na reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, salvo nos casos previstos nos artigos 391.º e 392.º
(…)
nos termos do artigo 390º o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, a que se deduzem as importâncias que tenha auferido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento; a retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da ação, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento; o subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no mesmo período, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.

O artigo 391º que se refere à indemnização em substituição da reintegração dispõe:

Indemnização em substituição de reintegração a pedido do trabalhador
1 - Em substituição da reintegração, o trabalhador pode optar por uma indemnização, até ao termo da discussão em audiência final de julgamento, cabendo ao tribunal determinar o seu montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.º
2 - Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial.
3 - A indemnização prevista no n.º 1 não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.

No caso é aplicável o artigo 392º do CT que refere:

Indemnização em substituição de reintegração a pedido do empregador
1 - Em caso de microempresa ou de trabalhador que ocupe cargo de administração ou de direção, o empregador pode requerer ao tribunal que exclua a reintegração, com fundamento em factos e circunstâncias que tornem o regresso do trabalhador gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa.

3 - Caso o tribunal exclua a reintegração, o trabalhador tem direito a indemnização, determinada pelo tribunal entre 30 e 60 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, nos termos estabelecidos nos n.os 1 e 2 do artigo anterior, não podendo ser inferior ao valor correspondente a seis meses de retribuição base e diuturnidades.
A empregadora solicitou a exclusão da reintegração, pelo que verificando-se os pressupostos do normativo é aplicável o que resulta do seu nº 3 deste normativo.
A recorrente invoca ainda que a sanção foi abusiva, por ter exercício direito que lhe competia.

Sobre sanções abusivas dispõe o artigo 331º:
1 - Considera-se abusiva a sanção disciplinar motivada pelo facto de o trabalhador:

b) Se recusar a cumprir ordem a que não deva obediência, nos termos da alínea e) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 128.º;

e) Em geral, exercer, ter exercido, pretender exercer ou invocar os seus direitos ou garantias.
2 - Presume-se abusivo o despedimento ou outra sanção aplicada alegadamente para punir uma infração, quando tenha lugar:
a) Até seis meses após qualquer dos factos mencionados no número anterior;
b) Até um ano após a denúncia ou outra forma de exercício de direitos relativos a igualdade, não discriminação e assédio.
3 - O empregador que aplicar sanção abusiva deve indemnizar o trabalhador nos termos gerais, com as alterações constantes dos números seguintes.
(…)

Como se refere no Ac. STJ de 19/11/2014, processo 42/12.3TTMTS.P1.S1, “ a ratio legis do caráter abusivo da sanção reside na natureza persecutória da punição, ou dizer, no facto de a verdadeira razão e/ou animus, e/ou motivação da aplicação da sanção extravasar a punição da conduta ilícita e culposa do trabalhador, ou identificar-se mesmo com a aplicação de uma punição posto que inexistindo conduta ilícita.
O mesmo será dizer: não se pune, então, o incumprimento do contrato de trabalho, sancionando o trabalhador que desrespeita deveres contratuais, sejam estes principais, secundários ou acessórios; antes, pune-se, com caráter manifestamente indevido e abusivo, o incumprimento pelo trabalhador de ordem a que não deve obediência, o exercício de direito que lhe cabe, o exercício de funções em estrutura de representação coletiva dos trabalhadores.
Exigível é, então, para que de sanção abusiva se possa falar, que o animus persecutório”.
Conforme mesmo acórdão, “a deficiente subsunção fáctico-normativa levada a efeito pela Recorrida, de per se, não consentia um juízo favorável à existência de um tal “animus”.
No caso, resulta da factualidade o convencimento da ré no sentido de que a sua ordem era legítima, tanto que era praticada de forma relativamente pacífica desde sempre. De outro, a sanção assenta ainda numa conduta efetivamente ilícita por banda da autora, conquanto não suficiente para justificar a mais grave das sanções disciplinares. Assim não se aplicará o regime das sansões abusivas.
***
A graduação da indemnização deve fazer-se atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude. Vd. Ac. STJ de 26.05.2015, processo nº 373/10.7TTPRT.P1.S1.

Refere-se neste:

“ Qual o critério que preside a tal juízo de graduação do ‘quantum indemnizatur’?
Atende-se ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.º, considerando-se, para o efeito, todo o tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial – art. 391.º, n.ºs 1 (2.ª parte) e 2 do Cód. Trabalho.
É entendimento firmado neste Supremo Tribunal e Secção que os dois referidos vetores de aferição têm uma escala valorativa de sentido oposto, isto é: enquanto o facto retribuição é de variação inversa (quanto menor for o valor da retribuição, mais elevada deve ser a indemnização), a ilicitude é facto de variação direta (quanto mais elevado for o seu grau, maior deve ser a indemnização.
Da ordenação estabelecida no art. 381.º resulta, pela sequente ordem alfabética, que o caso sujeito se enquadra na alínea b), segunda das quatro situações previstas, escalonadas em função do grau/intensidade da ilicitude, reservada a primeira para os casos em que o despedimento, ainda que com invocação de motivo diverso, tenha sido determinado por razões de ordem política, ideológica, étnica ou religiosa.
O critério não se altera nas circunstâncias em que o despedimento/sanção seja considerado abusivo: apenas a moldura/latitude da graduação da indemnização é agravada, conforme decorre do estatuído no n.º 4 do art. 331.º do Cód. Trabalho, ou seja, os limites previstos de 15-45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano de antiguidade/fração, passam a ser de 30-60 dias, não podendo a indemnização ser inferior ao valor correspondente a seis meses de retribuição base e diuturnidades – arts. 392.º/3, ex vi do art. 331.º, n.ºs 3 e 4 do Cód. Trabalho”.
No caso o vencimento da autora era ultimamente de € 635. Considerando todo o circunstancialismo, designadamente de o despedimento não ter um único fundamento, como vimos, ocorrendo conduta incumpridora da autora, embora não justificativa do despedimento, entende-se adequado fixar a indemnização em 35 dias.
Assim a indemnização, considerando todo o tempo decorrido até hoje, monta a € 21.331,33 euros.
No que tange às retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, não sendo possível o seu apuramento, designadamente por força do disposto no artigo 390º do CT, relega-se o cálculo do montante devido para a fase de liquidação.

Quanto à responsabilidade solidária, refere o nº 6 do artigo 285º do CT:

“O transmitente responde solidariamente pelos créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, bem como pelos encargos sociais correspondentes, vencidos até à data da transmissão, cessão ou reversão, durante os dois anos subsequentes a esta”.
A norma reporta-se a créditos já vencidos à data da transmissão, não abrange consequentemente créditos por cessação do contrato que tenha ocorrido em data posteriora essa transmissão.
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DECISÃO:

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente a apelação, condenando-se a ré LAVANDARIA X, Unipessoal, Lda nos seguintes termos:

a. A pagar à autora a título que indemnização, considerando a data de hoje e sem prejuízo de atualização nos termos do artigo 391º, nº 2 do CT, o montante de € 21.331,33 euros.
b. a pagar as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, a calcular em incidente de liquidação.
c. Vai absolvida a primeira ré.
Custas pela recorrente e recorrida condenada, as de primeira instância na proporção de decaimento, nesta instância na proporção de ¼ pela recorrente e ¾ pela recorrida.
1/7/2021

Antero Veiga
Alda Martins
Vera Sottomayor