Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
220/13.8TTBCL.G1
Relator: MANUELA FIALHO
Descritores: MOBBING
ASSÉDIO MORAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/24/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário: A definição legal de assédio não exige que o comportamento censurável tenha um determinado objetivo ou intenção. Basta que tenha o efeito de intimidar, hostilizar, humilhar…
Decisão Texto Integral: Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Guimarães:

A…, LDA., Ré, não se conformando com a Sentença proferida vem interpor recurso com reapreciação da prova gravada.
Pede a revogação da sentença recorrida que deve ser substituída por decisão que declare a resolução feita pelo Autor como ilegal, com as demais consequências legais.
Funda-se na seguinte ordem de razões:
a) Face à prova produzida nos autos, nomeadamente os meios probatórios constantes de gravação, impunha-se decisão diversa sobre a matéria de facto daquela que foi proferida constante nos itens 6, 11 e 12, no que concerne ao salário auferido pelo A. e a evolução do mesmo no tempo, o que desde já se indica nos termos e para os efeitos do previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC.
b) Não podia o Tribunal a quo dar como provada a evolução salarial alegada pelo A. e a retribuição à data da cessação, com base nos documentos juntos aos autos pelo A., como manuscritos anexos e agrafados aos recibos de vencimento, que foram impugnados, nem sequer em conjugação dos depoimentos das seguintes testemunhas, todas elas com relações de parentesco e próximas do A., a saber: A…, mulher do A.; M…, mãe do A.; M…, irmã gémea do A.; T…, primo da mulher do A. e S…, primo do A., que não merecem a credibilidade atribuída pelo Tribunal a quo.
c) Segundo as regras da experiência não se pode ignorar que eles podem ter sido produzidos por qualquer pessoa, já que nenhuma prova foi feita sobre a autoria dos mesmos, e pelo menos equacionar a possibilidade de terem sido “feitos à medida dos presentes autos”, sendo razoável pelo menos levantar sérias reservas sobre tais documentos.
d) E quer a testemunha M…, empregada administrativa da Ré, quer C…, gerente de facto da Ré, como os trabalhadores da Ré (veja-se o depoimento da Testemunha A…) asseguraram ao Tribunal que nenhum montante era pago ao A. além do declarado e que não existiam quaisquer manuscritos juntos com os recibos de vencimento, não sendo de ignorar que a testemunha M…, sem qualquer relação familiar ou sequer de amizade a quaisquer intervenientes dos autos, era quem tratava de tudo relacionado com salários, férias, folhas e faltas dos trabalhadores da Ré.
e) Na sentença recorrida não consta porque motivo o Tribunal não valorou o depoimento prestado por tal testemunha, em manifesta e total contradição com o prestado pelas testemunhas familiares do A. nas quais o Tribunal se baseou para dar como provado que o A. tinha um salário de 1.010,00 € e que recebia quantias em numerário além do recibo conforme manuscritos anexos aos recibos, o que não pode suceder.
f) Tanto mais que os depoimentos das testemunhas do A., todas eles com relações de parentesco e próximas do A., a saber: A…, mulher do A.; M…, mãe do A.; M…, irmã gémea do A.; T…, primo da mulher do A. e S…, primo do A., não merecem a credibilidade atribuída na sentença recorrida.
g) Tanto quanto das outras testemunhas, sem quaisquer relações de parentesco, resulta claro e inequívoco que nenhum montante em numerário era pago quer ao A. quer demais trabalhadores que não fosse o constante nos recibos, inicialmente por cheque e depois por transferência bancária.
h) Na sentença recorrida não consta o motivo porque não valorou o depoimento da testemunha M…, em manifesta contradição com os depoimentos interessados dos familiares diretos do A.
i) Pelo que tendo os papéis manuscritos sido impugnados, e não tendo sido produzida nenhuma prova sobre a autoria dos mesmos, face aos depoimentos das testemunhas M…, demais trabalhadores da Ré deveria ter sido dada a resposta não provados aos itens 6, 11 e 12 que foram levados à fundamentação de facto.
j) Acresce que, mesmo que não se entenda que a prova dos autos impunha decisão diversa sobre a retribuição e evolução salarial do A., nos termos do artigo 337.º n.º 2 do Código do Trabalho tais créditos só podem ser provados por documento idóneo.
k) Ao ter dado como provada a retribuição e evolução salarial com base em prova testemunha, pois os papeis manuscritos não se podem considerar prova idónea violou o Tribunal a quo o artigo 337.º n.º 2 do CT.
l) Acresce que, face aos factos dados como provados nunca poderia o Tribunal ter concluído e reconduzido tais factos à situação de mobbing prevista no artigo 29.º n.º 1 do Código do Trabalho.
m) Pois os factos que constam dos itens 25, 26 e 27 consubstanciam tarefas no âmbito funcional da categoria do A. e demais trabalhadores da Ré ligados à jardinagem
n) Além de que para se concluir por uma situação de mobbing tem de estar provada a prática intencional e repetida de cariz persecutório, o que não consta dos factos provados.
o) Termos em que não podia o Tribunal ter concluído como concluiu pela verificação de justa causa na resolução do contrato.
p) Ao ter decidido como decidiu o Tribunal violou os artigos 337.º n.º 2, 394.º, 396.º do Código do Trabalho e o artigo 364.º, 374.º n.º 2 e 376.º, todos do Código Civil.

F… contra-alegou, pugnando pela manutenção da sentença.
O MINISTÉRIO PÚBLICO emitiu parecer de acordo com o qual se deve manter inalterada a matéria de facto e, quanto ao mais, defendendo a improcedência do recurso.
A Recrte. respondeu.

Exaramos, abaixo, e para melhor compreensão, um breve resumo dos autos.
F… veio intentar a presente ação de processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra A..., Lda., peticionando o reconhecimento da justa causa da resolução do contrato por si apresentada e a condenação da ré no pagamento do montante global de 33.168,21€, sendo 15.402,50€ a título de indemnização, 5.000€ a título de compensação por danos não patrimoniais, 943,53€ de diferenças salariais nos meses de Outubro e Novembro de 2013, 5.650€ de remuneração de férias relativa aos anos de 2003 a 2010, 3.422,53€ de diferenças nos subsídios de férias e de natal dos anos de 2009 a 2012, 279,84€ de trabalho suplementar prestado em Outubro de 2012, 2.020€ de férias e subsídio de férias vencidas a 01/01/02 e 58,11€ de férias, subsídio de férias e subsídio de natal proporcionais ao trabalho prestado no ano de 2013, tudo acrescido de juros de mora.
Alega como fundamento ter sido contratado pela ré a 12/11/2002 para exercer funções de aprendiz de jardineiro, mediante uma remuneração que, à data da cessação do vínculo, ascendia a 1.010€ mensais, acrescidos de 6,17€ diários a título de subsídio de alimentação. Exerceu as respetivas funções até ao dia 07/01/2013, data na qual resolveu o vínculo laboral com os fundamentos constantes do documento de fls. 52 e ss.
A ré veio contestar, invocando desde logo que o vínculo laboral apenas se iniciou em Fevereiro de 2003 e que o autor apenas auferia o salário mínimo legal para a respetiva categoria. Impugna a versão dos factos apresentada pelo trabalhador, negando todos os créditos reclamados. Invoca as figuras jurídicas da “prescrição” e da “caducidade”, bem como má-fé do autor.
Conclui pela improcedência da ação.
O autor respondeu pronunciando-se quanto à matéria referente à má-fé e quanto às exceções de prescrição/caducidade.
Por despacho exarado a fls. 246 e ss. foi proferido despacho saneador, no âmbito da qual foram julgadas improcedentes as exceções de prescrição/caducidade.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, após, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, por provada, e, nessa sequência:
1 – Julgou lícita, por provida de justa causa, a resolução apresentada pelo autor;
2 – Condenou a ré a pagar ao autor o montante global de 23.551,18€, acrescido dos legais juros de mora.
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Sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso, as conclusões delimitam o objeto do recurso, o que decorre do que vem disposto nos Art.º 608º/2 e 635º/4 do CPC. Nestes termos, considerando a natureza jurídica da matéria visada, são as seguintes as questões a decidir, extraídas das conclusões:
1ª – O Tribunal errou no julgamento da matéria de facto?
2ª – Não existe justa causa para resolução do contrato?
***
A 1ª questão que enunciámos e que passaremos a apreciar prende-se com o erro de julgamento da matéria de facto.
Tal erro incide, alegadamente, sobre os pontos 6, 11 e 12 da decisão, cujo teor é o seguinte:
6. Tal remuneração foi posteriormente aumentada para 600€ (em Janeiro/04), para 650€ (em Janeiro/05), para 715€ (em Janeiro/09), para 1.000€ (em Outubro/09) e para 1.010€ (em Fevereiro/11).
11. Os montantes pagos e não declarados (valor que excede o constante dos recibos de vencimento) eram liquidados em numerário.
12. Para cálculo das quantias referidas no facto anterior, a ré anotava manualmente as mesmas num papel que anexava aos recibos de vencimento (cfr. tais anexos, os quais estão agrafados aos recibos de vencimento juntos aos autos).
Pretende a Recrte. que, por um lado, dos depoimentos proferidos por M…, C… e A…, resulta claro que nenhum montante era pago que não fosse o constante dos recibos; por outro, que dos depoimentos proferidos por A…, M… e M…, T… e S… não pode extrair-se a convicção de provado e, por fim, que, dado o disposto no Artº 337º/2 do CT, mesmo considerando a idoneidade da prova testemunhal, nunca se poderia considerar que os papelinhos manuscritos traduzem documento idóneo, pelo que não foi efetuada prova válida.
Comecemos pelo fim, apenas para salientar que não se vê em que é que o disposto no Artº 337º/2 do CT seja aplicável à prova do valor da retribuição auferida, que é, no fundo, o que está em causa. Não só tal dispositivo não consigna qualquer prova vinculada para efeitos de conclusão acerca da retribuição, como todos os meios – documentos e depoimentos – são admissíveis, do ponto de vista legal, para aquilatar do respetivo valor.
Situação distinta é se tais meios convencem ou não.
Para que possamos aquilatar do bem ou mal fundado da decisão que incidiu sobre a matéria de facto, urge que a parte insatisfeita com a decisão dê cumprimento a quanto se consigna no Artº 640º/1 e 2 do CPC, ou seja, que indique os concretos pontos de facto incorretamente julgados, os concretos meios de prova que impõem decisão diversa e qual a decisão a proferir sobre aqueles concretos pontos de facto. Para além disso, é ainda necessário, caso a prova tenha sido gravada, que se indiquem com exatidão as passagens da gravação em que se funda o recurso.
Ora, não só a Recrte. não indica os concretos pontos de facto incorretamente julgados, como também não indica as passagens da gravação que contém a parte do depoimento a reapreciar.
Vejamos!
No caso concreto enunciou-se como tema da prova a questão das retribuições auferidas pelo autor.
Donde, os concretos pontos de facto atinentes a esta matéria são aqueles que, nos articulados respetivos, se detém sobre ela. Será, pois, a resposta que incida sobre quanto se alegava – provado ou não provado -, que pode ser objeto de impugnação. É sobre a resposta dada a tal matéria que se pode aquilatar do bem ou mal fundado da decisão de provado ou não provado. É relativamente aos pontos de facto articulados que deve ser proferida uma decisão e, logo, é essa decisão que pode ser impugnada. Deste modo, a decisão que deve ser proferida sobre as questões impugnadas, é a decisão de provado ou não provado relativamente à matéria articulada.
Assim, a impugnação da matéria de facto faz-se por referência aos artigos das peças processuais relevantes, porquanto aí se encontra a base que serviu de mote ao julgamento. E, assim, em sede de impugnação, o recorrente terá que indicar os artigos onde se encontra a matéria de facto objeto de erro no seu julgamento, pois é aí que estão os concretos factos que, tendo sido alegados, foram submetidos a julgamento. E é a decisão que tais pontos de facto mereceram que pode ser impugnada.
Ou, conforme decidiu o STJ, no Ac. de 8-3-2006, Proc. 05S3823, o recorrente "tem de concretizar um a um quais os pontos de facto que considera mal julgados, seja por terem sido dados como provados, seja por não terem sido considerados como tal. (…) Se um dos fundamentos do recurso é o erro de julgamento da matéria de facto, compreende-se que os concretos pontos de facto sobre que recaiu o alegado erro de julgamento tenham de ser devidamente especificados nas conclusões do recurso. Na verdade, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, importa que os pontos de facto que ele considera incorretamente julgados sejam devidamente concretizados nas conclusões, pois se aí não forem indicados o tribunal de recurso não poderá tomar conhecimento deles".
No caso sub judice, a Recrte. não faz qualquer indicação com referência à factualidade submetida a instrução, remetendo diretamente para a enumeração que a factualidade veio a tomar na decisão final, no que terá sido sugestionada pela própria decisão que também não é esclarecedora nesta parte.
Omitiu, pois, a Recrte., a menção aos concretos pontos de facto incorretamente julgados e a menção à concreta decisão pretendida sobre tais pontos, o que viola claramente o disposto no Artº 640º/1-a) e c) do CPC, já que era sua obrigação efetuar a correspondência entre a enumeração constante da sentença e a articulação factual.
Além disso, transcrevendo, embora, parte de alguns depoimentos, a Recrte. não situou as transcrições, ou seja, não indicou com exatidão, como lhe impõe o nº 2-a) do Artº 640º do CPC, as passagens da gravação em que funda o seu recurso, o que, dado o elevado número de depoimentos e a respetiva extensão ainda mais se impunha (note-se que há depoimentos com a duração de mais de uma hora).
A Recrte. limita-se a exarar o início e o termo de tais depoimentos, atividade que não cumpre o desiderato pretendido com a exigência acima reportada.
Tal exigência prende-se com a necessidade de introduzir maior rigor no recurso de impugnação da matéria de facto, pelo que, podendo o recorrente identificar precisa e separadamente os depoimentos deve indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, com o que se pretende evitar o uso abusivo e injustificado deste meio.
Isto mesmo foi esclarecido no preâmbulo do Decreto-Lei 303/2007 de 24 de Agosto, quando se mencionou que "é ainda de referir a alteração das regras que regem o ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão de facto, determinando que cabe ao recorrente, sempre que os meios probatórios invocados como fundamento de erro na apreciação das provas tenham sido gravados, proceder à identificação da passagem da gravação em que funde essa impugnação, sem prejuízo da possibilidade de proceder, se assim o quiser, à respetiva transcrição".
Ora, a indicação precisa das passagens da gravação concretiza-se através da menção do minuto em que cada uma de tais passagens tem o seu início, sem prejuízo (e isto fica na disponibilidade da parte) da transcrição de excertos relevantes.
Assim, não se tendo dado cumprimento às exigências legais, a consequência a retirar é a da rejeição do recurso nesta parte, o que se decide.
Razão pela qual, se rejeita o recurso nesta parte.
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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
1. A ré é uma sociedade comercial por quotas que se dedica à comercialização e prestação de serviços de jardinagem (cfr. doc. de fls. 75 a 80, para o qual se remete e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
2. No exercício da sua atividade, a ré explora um estabelecimento de venda ao público e viveiro de plantas (horto) – filial -, sito na Rua…, Póvoa de Varzim (cfr. doc. de fls. 22, para o qual se remete e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
3. Em dia não concretamente apurado do mês de Novembro de 2002, por acordo verbal celebrado por tempo indeterminado, a ré admitiu o autor para, sob as suas ordens, direção e fiscalização, exercer funções inerentes à categoria de aprendiz de jardineiro.
4. Tal admissão apenas foi comunicada à Segurança Social no mês de Março de 2003 (cfr. doc. de fls. 23 a 27, para o qual se remete e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
5. Mais ficou acordada uma remuneração mensal de 450€, acrescida de subsídio de alimentação.
6. Tal remuneração foi posteriormente aumentada para 600€ (em Janeiro/04), para 650€ (em Janeiro/05), para 715€ (em Janeiro/09), para 1.000€ (em Outubro/09) e para 1.010€ (em Fevereiro/11).
7. À data da cessação do vínculo, o subsídio de alimentação auferido pelo autor ascendia a 6,17€ por cada dia efetivo de trabalho.
8. Por carta registada datada de 07/01/2013, recebida no dia seguinte pela ré, o autor resolveu o respetivo vínculo laboral com efeitos imediatos, nos moldes constantes do doc. de fls. 52 a 56 (cfr. fls. 58/59), para o qual se remete e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
9. Tal documento foi igualmente remetido à ré via fax, no dia 07/01, tendo sido pela mesma rececionado nessa mesma data (cfr. doc. de fls. 57).
10. Até Fevereiro de 2008, os montantes constantes dos recibos de vencimento do autor foram pagos através de cheque e, a partir de então, por transferência bancária.
11. Os montantes pagos e não declarados (valor que excede o constante dos recibos de vencimento) eram liquidados em numerário.
12. Para cálculo das quantias referidas no facto anterior, a ré anotava manualmente as mesmas num papel que anexava aos recibos de vencimento (cfr. tais anexos, os quais estão agrafados aos recibos de vencimento juntos aos autos).
13. Pelo menos com relação a mais dois trabalhadores do Grupo A… – S… e T… -, o procedimento descrito nos dois factos anteriores era praticado.
14. A partir do mês de Outubro de 2012 (trabalho prestado nesse mês e nos seguintes) a ré passou a pagar ao autor apenas os montantes declarados nos respetivos recibos de vencimento – tendo liquidado 541,42€ e 535,37€ nos dias 02/11 e 03/12 de 2012 e 447,15€ no dia 03/01/13, respetivamente (cfr. fls. 60/61 e 64).
15. O exerceu funções até ao dia 10/12/2012, gozando férias entre 11 e 26 do mesmo mês.
16. A partir de Dezembro de 2009, a ré passou a ser gerida de facto pelo genro do legal representante – C….
17. Não consta dos autos que, pelo menos a partir do ano de 2009, o autor efetuasse quaisquer outros serviços para entidades distintas da ré, não obtendo, assim, quaisquer outros rendimentos.
18. Para além do período referido no facto 15º, o autor, pelo menos, gozou uma semana de férias em Maio de 2012 e um período não concretamente apurado em Dezembro de 2011.
19. Não consta dos autos que a ré tenha pago ao autor algum montante a título de férias.
20. Entre Maio/09 e Dezembro/11, a ré pagou ao autor, pelo menos, 700€ por conta do subsídio de férias e igual montante por conta do subsídio de natal.
21. No ano de 2012, pagou-lhe igual montante a título de subsídio de férias e 434,32€ a título de subsídio de natal (cfr. fls. 61).
22. Não consta dos autos que a ré tenha pago ao autor algum montante por conta das férias vencidas a 01/01/13 e respetivo subsídio, ou por conta das férias, subsídio de férias e subsídio de natal devidos pelo trabalho prestado no ano da cessação do vínculo.
23. O autor trabalhou um número não apurado de sábados, em horário igualmente desconhecido.
24. O autor era o jardineiro responsável pela criação de um jardim de raiz, trabalhando, na maior parte das vezes, sozinho, mediante um projeto previamente delineado para esse efeito.
25. A partir de Novembro/12, C… passou a atribuiu ao autor outras tarefas, como a de arrancar ervas, tarefa essa que implica que o mesmo ficasse de joelhos e/ou de cócoras.
26. Pelo menos por uma vez, em circunstâncias não concretamente apuradas, C… ordenou ao autor que: - estendesse um tapete de relva e que depois o voltasse a enrolar, para ser guardado; e – enchesse sacos e paletes de “gravilha de tijolos” para, de seguida, os esvaziar.
27. Em Outubro de 2012, C… ordenou ainda ao autor que fosse cavar, sozinho, com uma sachola (sem recurso a qualquer máquina) um terreno sito em Paradela, Barcelos, o qual tem, pelo menos, 1.000m2 e é explorado pela ré.
28. Em Maio de 2012, o autor foi operado a um joelho, o que o impedia de ser sujeito a grandes esforços, factos estes do conhecimento da ré e do referido C….
29. Em data não concretamente apurada, mas situada no último trimestre do ano de 2012, o autor esteve a exercer funções, por conta da ré, no Monte de S. Félix, Laúndos, Póvoa de Varzim.
30. Todos os funcionários da ré se encontravam de manhã, no horto, e daí partiam para os respetivos locais nos quais teriam que desempenhar as respetivas funções.
31. Era habitual o transporte de/para horto/locais a jardinar ser efetuado em veículos propriedade da ré ou do Grupo A….
32. Os factos acabados de descrever e que motivaram a resolução apresentada pelo autor, causaram a este último abalo psicológico, mau estar físico e emocional.
33. O autor esteve em situação de baixa médica entre 26/12/12 e 04/01/13 (cfr. doc. de fls. 66).

Mais resultou provado que:
34. Por carta registada com a/r, datada de 21/02/13, a ré comunicou ao autor que lhe havia aplicado a sanção disciplinar de despedimento com justa causa, na sequência do processo disciplinar instaurado contra o mesmo no dia 11/01 do mesmo ano (cfr. doc. de fls. 143 e ss, para o qual se remete e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
35. Tal decisão foi impugnada judicialmente pelo autor através da ação especial de regularidade e licitude do despedimento que corre termos por esta Secção sob o n.º 261/13.5TTBCL (cfr. fls. 153 e ss.).
36. A assinatura do autor constante da carta referida no facto n.º 8 foi entretanto alvo de reconhecimento notarial presencial, sendo tal facto comunicado à ré por carta registada com a/r.
37. Em resposta a esta última carta, a ré respondeu com uma outra, datada de 29/01/13 (cfr. doc. de fls. 187 a 189, para o qual se remete e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
38. Nos anos de 2003 a 2012, o autor apresentou as declarações de rendimento constantes de fls. 273 a 284, para as quais se remete e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
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APRECIAÇÃO DAS QUESTÕES JURÍDICAS:
A 2ª questão acima identificada reporta-se à inexistência de justa causa para resolução.
A Recrte. funda-se na circunstância de os factos constantes dos itens 25 a 27 consubstanciarem tarefas no âmbito funcional da categoria do A. e demais trabalhadores ligados à jardinagem, não se reconduzindo a uma situação de mobbing.
A ação teve como causa de pedir a existência de justa causa fundada, como emerge da sentença, em diversas circunstâncias, a saber:
“- diminuição da retribuição auferida a partir de Outubro de 2012;
- não gozo do direito a férias;
- não pagamento integral dos montantes devidos a título de férias e de subsídios de férias e de natal;
- trabalho suplementar prestado e não remunerado;
- declarações fiscais e sociais efetuadas por montantes inferiores;
- maus tratos físicos e psicológicos;
- atribuição de tarefas não adequadas às funções habitualmente desempenhadas pelo autor;
- situação de mobbing.”
A sentença apreciou e enquadrou cada um destes fundamentos à luz da matéria cuja prova se obteve, vindo a concluir pela existência de justa causa para resolução do contrato tendo por base a falta culposa de pagamento da retribuição, a violação do princípio da irredutibilidade da retribuição, a violação de garantias legais – no que tange quer à própria retribuição, quer aos subsídios de férias e de Natal -, a lesão de interesses patrimoniais sérios – no que concerne à não efetuação dos competentes descontos para a segurança social-, não gozo de férias e, por fim, também com fundamento em mobbing decorrente do tratamento dispensado ao A. no que se reporta às tarefas a cumprir.
No recurso não se questionam os diversos fundamentos em que assentou a decisão para concluir pela justa causa. Apenas se põe em causa que a factualidade emergente dos pontos 25 a 27 possa fundamentar uma situação de mobbing, pretendendo-se extrair a conclusão inversa á da sentença e fundamentar a inexistência de justa causa.
Ora, ainda que viéssemos a concluir que aquela factualidade é insuficiente para caracterizar uma situação de assédio, subsistiriam os demais fundamentos que integraram a decisão.
Afigura-se-nos, assim, manifestamente inútil a discussão trazida a recurso. E, sendo inútil, deve evitar-se, já que está vedada por lei (Artº 130º do CPC). Tanto mais que nem sequer se põe o enfoque na questão da indemnização que, a não subsistir algum dos invocados fundamentos, poderia vir a ser reduzida.
Não deixaremos, contudo, de mencionar que o raciocínio expresso na sentença se nos afigura acertado, porquanto, conforme aí bem se salientou, os factos, numa primeira leitura, e isolados do respetivo contexto, “podem parecer inofensivos. Mas, analisados em conjunto, numa visão global (da qual não pode ser dissociada a diminuição da retribuição a que o autor foi votado), assumem especial relevo e traduzem, sem dúvida, um comportamento persecutório por parte da ré”.
Ora, entende-se por assédio o comportamento indesejado… com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.
A definição não exige, pois, contrariamente ao que parece supor a Recrte., que o comportamento censurável tenha um determinado objetivo ou intenção. Basta que tenha o efeito de intimidar, hostilizar, humilhar…
Considerando todo o enquadramento factual, que outro efeito, senão o de humilhar, poderá ter o facto de, por um lado ordenar que se estenda um tapete de relva e, logo a seguir, dar a ordem em contrário, ou seja, que se enrole tal tapete? Ou ordenar que se encham sacos com gravilha de tijolos e, logo de seguida, ordenar que os mesmos se esvaziem? Já para não falar no que se reporta a cavar, a sachola, um terreno com uma área de 1.000m2!
Nenhuma censura nos merece a sentença, improcedendo, assim, a apelação.
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Em conformidade com o exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmar a sentença.
Custas pela Recrte..
Notifique.
Manuela Fialho
Alda Martins
Sérgio Almeida