Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ANSELMO LOPES | ||
Descritores: | CONTRA-ORDENAÇÃO VALOR REJEIÇÃO DE RECURSO RECURSO PARA O TRIBUNAL DA RELAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 11/05/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | REJEITADO O RECURSO | ||
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Sumário: | I – Sendo aplicada, relativamente a uma sociedade, uma coima de € 50,00, por uma infracção em que ela não pode ser arguida mas sim um seu gerente, que veio, nessa qualidade, a ser notificado para a defesa, deve ser a impugnação da sociedade julgada procedente. II – Quanto à impugnação do gerente, fundada em que a decisão da Conservatória não indica a quem foi aplicada a coima e essa falta não podia ter sido suprida pelo auto de notícia, onde também não é indicada a sociedade como arguida, sendo proferida decisão que a rejeite por ilegitimidade, não há recurso para o Tribunal da Relação, por estar em causa uma coima de valor inferior a 50.000$00 – artº 73, nº 1, al. a) do DL 433/82 de 27/10. III – Na citada al. a) do nº 1 do artº 73º do RGCO estabelece-se um limite quantitativo (no caso das als. b) e c) também esse mesmo limite condiciona a admissão de recurso) para haver recurso para a Relação: se o que estiver em causa (aplicada ou em discussão) for uma coima não superior a 50.000$00, simplesmente, e ressalvada a excepção prevista no nº 2 do artº 73º, a questão não pode ser levada à Relação. IV – Trata-se, por um lado, de uma (reduzidíssima) margem de confiança nas decisões de 1ª instância, com o consequente ónus de eventual injustiça para os visados e, por outro lado, de uma (compreensível) regra de economia. V – A regra abrange qualquer situação de improcedência ou de rejeição, sob pena de se frustrarem os seus pressupostos e finalidades, como, por exemplo, aconteceria se, estando em causa uma coima não superior a 50.000$00, fosse admissível recurso de uma decisão de rejeição (al. d) do nº 1 do artº 73º) para, …depois, aquele valor impedir a admissão de novo recurso. | ||
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Decisão Texto Integral: | Após conferência, acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: TRIBUNAL RECORRIDO Tribunal Judicial de Viana do Castelo – 1º Juízo Criminal – Pº nº 3496/06.3TBVCT RECORRENTE Rui RECORRIDO O Ministério Público OBJECTO DO RECURSO Nestes autos, relativamente à sociedade M., Ldª, com o fundamento na violação do disposto no art.º 376.º do C.S.C., foi aplicada uma coima de € 50,00. De seguida, o ora recorrente, na qualidade de gerente da sociedade, foi notificado da aplicação da coima e de que tinha o prazo de 20 dias para a impugnar. Não se conformando com a decisão, dela interpuseram recurso o Rui e a sociedade, no sentido de que, porque nela se não indica a quem foi aplicada a coima, deveria ser declarada nula a decisão e ser arquivado o processo. Quanto à impugnação interposta pela sociedade, foi proferida decisão em que, considerando a insusceptibilidade de ela poder ser arguida, foi decidida a sua imediata absolvição e o arquivamento do processo nos termos do art.º 64.º, n.º 3, do RGCO. Quanto ao impugnante Rui, com fundamento na sua ilegitimidade – com o entendimento de que ele não era arguido no processo –, foi rejeitada sua impugnação, com condenação nas custas pelo incidente que provocou. Desta decisão, o impugnante Rui interpôs recurso para esta Relação, pedindo a revogação da decisão recorrida. Conhecendo do recurso interposto pelo recorrente Rui, esta Relação, atendendo a que “nos termos do n.º 1 do artigo 63° do Dec.Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro "o juiz rejeitará, por meio de despacho, o recurso feito fora do prazo ou sem respeito pelas exigências de forma” e considerando que a ilegitimidade do recorrente se não enquadra em nenhum dos casos de rejeição enumerados no n.º 1 do art.º 63.º, concedeu provimento ao recurso e, em consequência, revogou o despacho recorrido, aí se consignando também que, ficando prejudicada a questão de saber se o recorrente tem ou não legitimidade para interpor recurso da decisão administrativa, se impõe que se substitua aquele despacho por outro, compatível com o desenrolar dos autos entretanto verificado. Debruçando-se sobre os efeitos que neste contexto poderiam advir do trânsito em julgado do despacho que ordenou o arquivamento dos autos, o Acórdão desta Relação pronuncia-se no sentido de que, ao contrário do propugnado pelo Ministério Público junto do Tribunal recorrido, tal decisão não gera a inutilidade superveniente do julgamento do recurso porquanto, como bem sublinha o Ex.mo PGA no seu douto parecer, a procedência deste sempre terá relevância para o recorrente, dada a sua condenação em custas. Tomando em conta o que ficou decidido no Acórdão desta Relação, o Mmº Juiz, considerando que ao abrigo do disposto no art.º 64.º, n.º 1 e 2 do RGCO se encontrava habilitado a decidir mediante simples despacho, com fundamento na sua ilegitimidade, indeferiu o recurso interposto pelo recorrente Rui. Concretamente, é o seguinte o teor da decisão: No seguimento desta douta decisão, sem sede de despacho liminar, para feitos do artº 63º do RGCO, seguindo a doutrina de Simas Santos e Lopes de Sousa, não pode o Juiz conhecer das excepções dilatórias ou peremptórias existentes, pelo que não era legítimo conhecer da situação de interposição de recurso pelo recorrente Rui em termos de o considerar parte ilegítima para tal. Tal questão de ilegitimidade só pode ser conhecida em sede de decisão – por despacho ou sentença -, é ao quanto se retira do douto Ac. do TRG de 26FEV2007. Ou seja, em conclusão de raciocínio, do que retiramos do douto Ac. do TRG de 26FEV2007, a questão em causa não podia ser conhecida liminarmente, só podendo ser conhecida no presente momento. Daqui decorre que, face ao decidido pelo TRG e face à aceitação do recorrente para que opere decisão por despacho, vamos agora conhecer o que já antes conhecemos e só agora podemos conhecer. Como tal, quase nos limitaremos a reproduzir o dito a fls. 33, apenas efectuando relatório para a tal chegar, dado o formalismo do despacho. *** O auto de notícia está datado de 6JUL2006 e reporta-se à sociedade M. Ldª.A notificação a que se reporta o artº 50º do RGCO - assim se tem que entender ser esse o efeito processual - está datada de 6JUL2006, foi efectuada na pessoa do recorrente Rui e reporta-se à arguida M., Ldª. A arguida M., Ldª ou o recorrente Rui não efectuaram pagamento voluntário da coima, não apresentaram defesa, não se pronunciaram. A decisão de fls. 9, proferida pela CRPC de Viana do Castelo em 14AGO2006, sancionou a arguida M., Ldª com a coima de €50,00, por violação do artº 526º do CSC. O recorrente Rui não conformado, recorreu desta decisão no prazo legal, fundamentando e concluindo. Admitido o recurso a fls. 75, face ao douto Ac. do TRG de 26FEV2007, o Tribunal propõe-se decidir ao abrigo do disposto no artº 64º do RGCO por mero despacho, não havendo oposição. Mantém-se a validade e regularidade da instância, nada obstando ao conhecimento do mérito da causa. O Tribunal é competente e o processo é próprio. Questão prévia A: Foi o recorrente Rui notificado para se pronunciar sobre se aceitava, ou não, a decisão mediante despacho. Veio invocar ISL do processado. Conhecendo desta questão, sempre se dirá que a mesma foi levantada pelo Ministério Público em sede de recurso e conhecida pelo TRG no ponto da fundamentação do Ac. de 26FEV2007, tal decisão transitou em julgado, não será, consequentemente alterada (quanto mais não seja face ao artº 4º da LOFTJ e do EMJ) a que acresce que a mesma não diz aquilo que o recorrente afirma a fls. 80 e ss. Questão prévia B: Apreciação, propriamente dita, face ao artº 64º do […] 27OUT (RGCO). Nos termos do ar. 59º, nº 2 do RGCO o recurso de impugnação poderá ser interposto pelo arguido ou pelo seu defensor. De acordo com o auto de notícia de fls. 5 é arguida M., Ldª. A decisão de fls. 9 refere M., Ldª. O presente recurso está apresentado pelo recorrente Rui. O dito recorrente Rui não é arguido nos presentes autos pelo que carece de legitimidade para a apresentação do recurso. Termos em que, por ilegitimidade, indefiro o recurso interposto. Decisão: Em consequência, ordeno o arquivamento dos autos, nos termos do artigo 64º, nº 3 do RGCO. Fixo a taxa de justiça devida em 2UC – artº 87º, nº 1 c) do Código das Custas Judiciais – e as custas no mínimo – artº 94º do RGCO, a cargo do recorrente Rui. Notifique e deposite. Comunique à CRPC Viana do Castelo nos termos do artº 70º, nº 4, do RGCO. Forneça à CRPC Viana do Castelo cópia do apenso de recurso independente em separado. * Desta decisão, foi interposto recurso para esta Relação, pedindo-se a revogação da decisão recorrida e, em consequência, que seja declarado extinto o presente processo, sem custas para o recorrente, por inutilidade superveniente do seu recurso de impugnação judicial, imputável ao Estado, ou, então, que seja declarada nula a decisão condenatória da autoridade administrativa, com o consequente arquivamento dos autos, sempre sem custas para o recorrente.Baseando-se em que a decisão recorrida se não enquadra em qualquer das alíneas do art.º 73.º, n.º 1 do RGCO, este recurso não foi admitido pelo Mmº Juiz, mas veio a ser decidida a sua admissão na reclamação entretanto interposta. MOTIVAÇÃO/CONCLUSÕES Em resumo, são as seguintes as conclusões do recurso: .- Face ao Ac. de 26FEV2007, nada obstava o Mmº Juiz declarasse extinto o presente processo por inutilidade superveniente da lide; .- A decisão da Conservatória não indica a quem foi aplicada a coima e essa falta não podia ter sido suprida pelo auto de notícia, onde também não é indicada a sociedade como arguida; .- Acresce que as notificações foram feitas ao ora recorrente, para o seu domicílio pessoal e não para a sede social, ao contrário do que legalmente deveria suceder no caso de a sociedade ser arguida; .- Assim, atento o teor do artº 528º, nº 1 do CSC, era legítima a dúvida do recorrente sobre se não teria sido sancionado pela mencionada decisão; e .- Por consequência, impõe-se reconhecer a legitimidade do recorrente para impugnar judicialmente a decisão condenatória. RESPOSTA O Mº Pº do Tribunal a quo respondeu para concluir que, dado que o imbróglio originado pelo processo contra-ordenacional não lhe é imputável [ao recorrente] não deverá ser tributado em custas e que, face à anomalia processual provocada pela existência de duas impugnações, sempre teria o Tribunal de se pronunciar sobre o objecto da impugnação apresentada pelo recorrente, cuja responsabilidade na intervenção processual não é excluída pela decisão de arquivamento dos autos quanto à sociedade. PARECER Nesta instância, o Ilustre PGA emitiu a opinião que adiante se vai inserir. FUNDAMENTAÇÃO Superando, e, mais que isso, considerando prejudicadas as (inúmeras) questões suscitadas, o Ilustre Procurador Geral-Adjunto suscita a questão prévia da inadmissibilidade do recurso, o que faz nos termos seguintes: Nada temos a apontar quanto à tempestividade do recurso interposto por Rui, ao modo de subida do mesmo e efeitos. Porém, cremos verificar-se uma causa que obsta ao conhecimento do mérito do mesmo. Entendemos que as decisões postas sob sindicância – são duas, não admitem recurso. O recurso deverá ser, consequentemente rejeitado. b) QUESTÃO PRÉVIA 1. A relevante tramitação processual verificada, que dá luz ao destino destes autos, é a seguinte: a) Por decisão do 1º ajudante da Conservatória do Registo Predial e Comercial de Viana do castelo foi a sociedade “M., Lda” condenada na coima de 50 euros por infracção ao disposto no art. 376 do Código das Sociedades Comerciais – vd. fls. 9; b) Esta decisão foi notificada ao gerente daquela sociedade – vd. fls. 10 e 11; c) A sociedade em causa e o próprio gerente da mesma, apresentaram impugnação judicial desta decisão – vd. fls. 13 e seguintes; d) Esta impugnação da sociedade foi admitida – vd. fls. 33, e por despacho de fls. 65 foi decidido absolver a sociedade da contra-ordenação citada e, por isso, arquivar o processo por insusceptibilidade da sociedade “ser arguida no presente procedimento contra-ordenacional”; e) A impugnação do Rui, por despacho de 02/10/2006, foi rejeitada, porém, por acórdão de 26/02/2007 deste Tribunal da Relação, foi a mesma admitida – vd. fls. 80 do apenso; f) E por despacho de 02/05/2007 – vd. fls. 94 foi decretada a ilegitimidade do impugnante e ordenado o arquivamento dos autos, não sem antes ter apreciado um requerimento daquele indeferindo uma requerida inutilidade superveniente da lide (ISL). Por divergir da não declaração de inutilidade superveniente da lide e por não ter sido arquivado o processo com tal fundamento, surge o presente recurso. 2. Só que o mesmo, em nosso entender e com salvaguarda de melhor e mais avisada opinião, não é admissível. O fundamento colhe-se no disposto no art. 73, nº1 do DL 433/82 de 27/10. De acordo com este normativo, a Relação só pode conhecer do recurso se a coima aplicada for superior a 50 mil escudos. Em causa não está um caso em que tenha havido uma impugnação judicial rejeitada, situação expressamente prevista no art. citado, sua alínea d). Note-se que foi esta circunstância que foi expressamente invocada na 1ª instância para permitir a admissão deste recurso – vd. fls. 122. Todavia, não se está diante de um despacho que tenha rejeitado a impugnação efectuada. Note-se que só há rejeição da impugnação quando, nos termos do art. 63, nº1 do DL 433/82 de 27/10, o recurso foi feito fora do prazo ou sem respeito pelas exigências de forma – “O juiz rejeitará, por meio de despacho, o recurso feito fora do prazo ou sem respeito pelas exigências de forma”. O despacho em causa não rejeitou a impugnação (nem o podia fazer em face da decisão do Tribunal da Relação que ordenou o recebimento da mesma). O que o despacho posto em crise concretizou foi apreciar a impugnação e decidir pelo seu indeferimento com base na ilegitimidade do recorrente – “Termos em que, por ilegitimidade, indefiro o recurso interposto” – fls. 94. Assim, a circunstância em causa não releva para o caso, assumindo interesse apenas o valor da coima e o facto resultante do disposto no art. 414, nº3 do CPPenal: a admissão do recurso pela 1ª instância não vincula o tribunal superior, malgrado a admissão da reclamação (art. 405 do CPPenal). Repete-se: o despacho apreciou a impugnação indeferindo-a, não a rejeitou dentro das circunstâncias legais em que o podia e devia fazer e que estão previstas no dito art. 63, nº1 do DL 433/82. Ora, e avançando, vendo-se a decisão da autoridade administrativa, fica-se ciente de que a coima aplicada nestes autos atingiu o montante de 50 euros. Assim sendo, porque o valor de 50 euros não é superior a 50 mil escudos, não tem recurso para o Tribunal da Relação a decisão acoimante em causa. 3. Porque o colocado em sindicância não é passível de recurso, o recurso interposto não é admissível e determina a sua rejeição tendo em vista o disposto no art. 420, nº1 do CPPenal. É o que importa declarar como questão prévia. 4. Donde e em conclusão: o recurso interposto da decisão que apreciou uma decisão acoimante que sancionou no montante de 50 euros é inadmissível por a tal se opor o disposto no art. 73, nº1, al. a) do DL 433/82 de 27/10, devendo, por isso, ser rejeitado – art. 414, nº2 do CPPenal, não se representando uma situação de rejeição da impugnação judicial proferida a coberto do art. 63, nº1 do mesmo DL. * Mandam as regras da economia processual, mas aqui, essencialmente, as do bom senso e do respeito devido ao trabalho alheio, que se não pratiquem actos inúteis ou ociosos.E de facto, no caso concreto, o brilho (que é consabido) da posição assumida pelo Ilustre PGA apenas merece plena adesão, sendo dispensáveis quaisquer alongues. Ainda assim, vão umas breves notas. Ao contrário do que parece resultar da douta decisão da reclamação, na al. a) do nº 1 do artº 73º do RGCO estabelece-se um limite quantitativo (no caso das als. b) e c) também esse mesmo limite condiciona a admissão de recurso) para haver recurso para a Relação: se o que estiver em causa (aplicada ou em discussão) for uma coima não superior a 50.000$00, simplesmente, e ressalvada a excepção prevista no nº 2 do artº 73º, a questão não pode ser levada à Relação. Trata-se, por um lado, de uma (reduzidíssima) margem de confiança nas decisões de 1ª instância, com o consequente ónus de eventual injustiça para os visados e, por outro lado, de uma (compreensível) regra de economia. Assim sendo, cremos como inquestionável que a regra abrange qualquer situação de improcedência ou de rejeição, sob pena de se frustrarem os seus pressupostos e finalidades, como, por exemplo, aconteceria se, estando em causa uma coima não superior a 50.000$00, fosse admissível recurso de uma decisão de rejeição (al. d) do nº 1 do artº 73º) para, …depois, aquele valor impedir a admissão de novo recurso. Era um perfeito absurdo! No caso do recorrente, o que está em causa, seja qual for o ângulo por que se aprecie o assunto, é uma coima de € 50,00 e, por isso, não sendo legítimo conhecer-se aqui do fundo da questão, o recurso tem que ser rejeitado, ao abrigo do disposto no nº 1 do artº 420º do C.P.Penal. ACÓRDÃO Pelas razões expostas, acorda-se em se rejeitar o recurso. Nos termos do nº 4 do citado artº 420º, vai o recorrente condenado no pagamento da importância de 3 (três) UC’s. Custas pelo recorrente. * Guimarães, 5 de Novembro de 2007 |