Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1573/17.4T8BGC-C. G1
Relator: JORGE TEIXEIRA
Descritores: DEPOIMENTO DE PARTE
VALORAÇÃO COMO MEIO DE PROVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/24/2019
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (do relator):

I- O depoimento de parte que se revele não possuir a virtualidade de servir como confissão, pode/deve ser livremente apreciado pelo julgador, no momento da apreciação de toda a prova produzida para a, ou na, formação da sua convicção.

II- Assim, é admissível a valoração do depoimento de parte, no segmento em que não produz confissão, à luz da livre apreciação do tribunal.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: (..), S.A..
Recorrido: António (..) E OUTROS.

Nos presentes autos, pela Reclamada (..). S.A., a prestação de depoimento de parte do Credor Reclamante (..) e do Executado/Reclamado (…) , “a recair sobre toda a matéria de facto com interesse para a decisão da causa e, designadamente, sobre a matéria constante dos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º e 13.º do seu articulado de reclamação de créditos, bem como, da oposição apresentada nos autos pelos Executados A. M. e M. C., quanto à matéria constante dos artigos 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º, 11.º, 13.º, 14.º, 15.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º e 23.º.

E mais requereu a Reclamada Caixa ..., S. A. a prestação de depoimento de parte do Credor Reclamante V. M. e dos Executados A. M. e M. C. “a recair sobre toda a matéria de facto com interesse para a decisão da causa e, designadamente, sobre a matéria constante dos artigos 1.º a 17.º do seu articulado de reclamação de créditos”.

Foi proferido despacho que, pelos fundamentos nele expressos, não admitiu estes meios de prova nos seguintes termos:

“(…) Sendo assim, porque lhes é favorável, a matéria constante dos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º e 13.º da petição do Credor Reclamante A. C., a mesma não pode ser objecto de confissão mediante depoimento de parte, pelo que não admito esse meio de prova.
Porque os factos alegados pelos Executados/Reclamados A. M. e M. C. nos artigos 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º, 11.º, 13.º, 14.º, 15.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º e 23.º do seu articulado constituem matéria de mera impugnação, não admito o requerido depoimento de parte a essa matéria.
(…)
Porém, porque se trata de matéria é favorável ao reclamante, a mesma não pode ser objecto de confissão mediante depoimento de parte, não admito esse meio de prova.”

Inconformada com esta decisão, dela interpôs recurso a Requerente, sendo que, das respectivas alegações desse recurso extraiu, em suma, as seguintes conclusões:

1. O n.º 2 do art. 452.º do CPC e o n.º1 do art. 454.º do CPC não determinam que o depoimento de parte só pode versar sobre matéria não favorável à parte.
2. Por tal preceito normativo é imposto à parte requerente do depoimento, única e exclusivamente, o ónus de indicar discriminadamente os factos que dele serão objecto.
3. No caso dos autos, a Caixa ... peticionou, desde logo, no próprio articulado de contestação, os depoimentos de parte dos Credores Reclamantes e dos Executados sobre os determinados factos alegados nos seus articulados de reclamação de créditos e de oposição.
4. “O depoimento de parte e a confissão são realidades jurídicas diferentes.” (in Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 19.01.2015).
5. “Quando a parte presta o seu depoimento não se visa exclusivamente a confissão.” (in Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 19.01.2015).
6. “O depoimento pode incidir sobre todos os factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento, desde que não sejam criminosos ou torpes, arts. 452º e 454º, do CPC, podendo ou não conduzir à confissão, cfr. art. 453º, nº2, do mesmo código e arts. 352º e 361º do CC.” (in Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 19.01.2015).
7. “(…) nada obsta, a que o tribunal na sequência dos poderes que tem de ouvir qualquer pessoa, incluindo as partes, por sua iniciativa, na busca da verdade material, tome em consideração, para fins probatórios, as declarações não confessórias da parte, as quais serão livremente apreciadas, nos termos do art. 607º, nº 5.” (in Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 19.01.2015).
8. “A confissão e o depoimento de parte são, pois, realidades jurídicas distintas, sendo este mais abrangente do que aquela, por ser um meio de prova admissível mesmo relativamente a factos que não sejam desfavoráveis aos depoentes, caso em que ficará sujeito à livre apreciação do tribunal, cfr., referem entre outros, o Ac. do STJ de 02.10.2003, proc. 03B1909, in www.dgsi.pt e Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil”, 2.ª ed., pág. 573.” (in Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 19.01.2015).
9. “Ainda, no sentido de que os simples esclarecimentos ou afirmações que não possam valer como confissão, podem valer como elementos probatórios sujeitos à livre apreciação do Tribunal (…)”(in Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 19.01.2015).
10. Notificada que foi para, querendo, alterar o seu requerimento probatório, a Caixa ... limitou-se, por mera cautela de patrocínio, a reiterar e reproduzir o teor do requerimento de prova que havia feito incluir no seu articulado de contestação.
11. É, assim, inegável que a Caixa ... cumpriu o ónus imposto pelo n.º 2 do art. 452.º de indicar os factos sobre os quais deverá recair o depoimento de parte.
12. Não pode falar-se em inadmissibilidade legal do depoimento de parte requerido pela Caixa ....
13. Isto porque: i) a Caixa ... indicou os factos sobre os quais o depoimento deverá recair e ii) a lei não determina que o depoimento de parte apenas possa incidir sobre factos exclusivamente desfavoráveis às partes.
14. A decisão recorrida é, pois, violadora das disposições constantes dos artigos 452.º e 454.º do CPC.
*
O Apelado não apresentou contra-alegações.
*
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
*
II- Do objecto do recurso.

Sabendo-se que o objecto do recurso é definido pelas conclusões no mesmo formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso, as questões decidendas são, no caso, as seguintes:

- Analisar da admissibilidade ou não dos depoimentos de partes requeridos.
*
III- FUNDAMENTAÇÃO.

Fundamentação de facto.

Além dos factos que constam do relatório que antecede, e com relevância para a decisão do recurso, consta da fundamentação de direito da decisão recorrida o que a seguir se transcreve:
“(…)
A Reclamada Caixa ..., S. A. veio requerer a prestação de depoimento de parte do Credor Reclamante A. C. e do Executado/Reclamado A. T., “a recair sobre toda a matéria de facto com interesse para a decisão da causa e, designadamente, sobre a matéria constante dos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º e 13.º do seu articulado de reclamação de créditos, bem como, da oposição apresentada nos autos pelos Executados A. M. e M. C., quanto à matéria constante dos artigos 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º, 11.º, 13.º, 14.º, 15.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º e 23.º.
No entanto, “O depoimento de parte constitui um meio processual cujo objectivo fundamental é o de provocar e obter de alguma das partes a confissão judicial, enquanto declaração de ciência através da qual se reconhece a realidade de um facto desfavorável ao declarante e favorável à parte contrária” (cfr. Código de Processo Civil Anotado, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís de Sousa, Almedina, 2018, volume I, pág. 519).
Sendo assim, porque lhe é favorável, a matéria constante dos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º e 13.º da petição do Credor Reclamante A. C., a mesma não pode ser objecto de confissão mediante depoimento de parte, pelo que não admito esse meio de prova.
*
Porque os factos alegados pelos Executados/Reclamados A. M. e M. C., nos artigos 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º, 11.º, 13.º, 14.º, 15.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º e 23.º do seu articulado constituem matéria de mera impugnação, não admito o requerido depoimento de parte a essa matéria.

A Reclamada Caixa ..., S. A. veio requerer a prestação de depoimento de parte do Credor Reclamante V. M. e dos Executados A. M. e M. C. “a recair sobre toda a matéria de facto com interesse para a decisão da causa e, designadamente, sobre a matéria constante dos artigos 1.º a 17.º do seu articulado de reclamação de créditos”.
Porém, porque se trata de matéria é favorável ao reclamante, a mesma não pode ser objecto de confissão mediante depoimento de parte, não admito esse meio de prova.
(…)”

Fundamentação de direito.

Entende a aqui Recorrente que a decisão recorrida, ao não ter admitido os depoimentos de parte à materialidade relativamente à qual foi requerida, por considerar que tal meio de prova não pode incidir sobre factualidade favorável à parte que depõe, faz errónea interpretação e aplicação dos artigos 452.º e 454.º do CPC, revelando, igualmente, a adopção de um prisma de actuação absolutamente incompatível quer com a filosofia imanente à dinâmica do processo civil, quer com o primado do juiz activo, prioritariamente envolvido na descoberta da verdade e na eleição da solução justa independentemente das falhas - reais ou virtuais - cometidas pelas partes.

Assim sendo, e em síntese, a questão que se coloca é da própria amplitude do depoimento de parte em ordem a aquilatar se, como se entende na decisão recorrida, ele apenas pode recair sobre factos considerados confessáveis, que serão apenas os desfavoráveis à parte que depõe, ou se pode também recair sobre factos favoráveis a essa mesma parte.

Ora, como se refere no Acórdão do S.T.J., de 9/10/2014, “De acordo com o princípio da indivisibilidade da confissão a que alude o art. 360.º do CC, se uma declaração complexa feita em depoimento de parte, requerido pela contraparte, contiver afirmações de factos desfavoráveis ao depoente, mas também factos que lhe são favoráveis, a contraparte que se quiser aproveitar de tal confissão como meio de prova plena deve, de igual modo, aceitar a realidade dos factos que lhe são desfavoráveis. Tendo que produzir oportuna declaração em que se reserva o direito de provar o contrário dos factos que lhe são desfavoráveis. Adquirindo, então, a confissão dos factos favoráveis, mediante a prova contrária dos factos que lhe desfavoráveis, a eficácia de prova plena.
A indivisibilidade da confissão complexa tem, pois, como consequência a inversão do ónus da prova quanto à parte favorável ao confitente.
Afirmando o declarante, por um lado, a realidade de factos constitutivos que lhe são desfavoráveis, e, por outro, a realidade dos factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito dos primeiros
Sendo certo que, ao contrário da confissão simples, tal declaração complexa só faz prova depois da parte se pronunciar, produzindo-se, assim, diferidamente o efeito da confissão, com a aceitação da parte contrária ou perante o seu silêncio.

Três vias vêm sendo permitidas à parte contrária (à do confitente):

(i) prescindir da confissão, não tendo a mesma a eficácia da prova plena, mas apenas como meio de prova sujeito à livre apreciação do julgador (art. 361.º);
(ii) aceitar como tendo-se verificado os factos e as circunstâncias que lhe são desfavoráveis, ganhando, então, a confissão a eficácia de prova plena;
(iii) declarar que se quer aproveitar da confissão, mas que se reserva o direito de provar a inexactidão dos factos que lhe são desfavoráveis, caso em que a confissão adquire também a eficácia da prova plena, mas a realidade de tais factos ou circunstâncias que a ela, parte contrária, são desfavoráveis só ficará completamente estabelecida se não fizer a prova do contrário. Dando-se, assim, a inversão do ónus da prova que passa a caber à contraparte. (1)
A indivisibilidade da confissão complexa tem, assim, bem vistas as coisas, como consequência a inversão do ónus da prova quanto à parte favorável ao confitente.
Tendo a parte contrária, se não quiser ser prejudicada pela parte da confissão favorável ao confitente, de provar que ela não é verdadeira. (2)

Assim, “apesar de parecer contrário de alguma doutrina, uma jurisprudência (3) que se crê maioritária – conclui, à luz do princípio da livre apreciação das provas, pela admissibilidade da valoração do depoimento de parte, mesmo no segmento em que as respectivas declarações lhe eram favoráveis (artº 607 nº 5 do nCPC). Feitas todas as contas, a conclusão a tirar é, realmente, a da admissibilidade da produção e da valoração das declarações de parte, mesmo que respeitem a enunciados de facto que lhe sejam favoráveis. Segundo certo entendimento do problema, com uma ressalva importante – referida não à admissibilidade do meio de prova, mas à avaliação da sua força probatória: aquela valoração é admissível, contanto que o tribunal não se baseie exclusivamente nessas declarações para formar a sua convicção sobre a veracidade ou inveracidade dos factos controvertidos (4).
Quer dizer: a proibição de valoração deve considerar-se afastada, desde que as declarações, mesmo referidas a enunciados de facto que sejam favoráveis ao declarante, obtenham, de outros meios de prova – ou mesmo de regras de experiência ou de critérios sociais – um grau de confirmação adequado.

A circunstância de a essas declarações não poder ser atribuído o valor de confissão, não impede a sua livre valoração, dado que se não for possível atribuir ao meio de prova qualquer dos valores que a lei lhe atribui em abstracto, é sempre possível atribuir-lhe um desses valores, o que é confirmado pela regra de que o reconhecimento de factos desfavoráveis que não possa valer como confissão, sempre vale como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente (artº 361 do Código Civil).
E a correcção deste entendimento do problema é confirmada pela consagração, no Código de Processo Civil dito novo, de um novo meio de esclarecimento e convicção: a prova por declarações de parte (artº 466 do nCPC).

Deve, portanto, julgar-se perfeitamente admissível a valoração do depoimento de parte, no segmento em que não produz confissão, à luz da livre apreciação do tribunal, como sempre sucederá, de resto, no caso de acção relativa a direitos indisponíveis em que a confissão se tem por inadmissível (artº 354 b) do Código Civil).
(…)

E assim sendo, ”É admissível a valoração do depoimento de parte, no segmento em que não produz confissão, à luz da livre apreciação do tribunal. (5)

Como igualmente se refere no Acórdão do S.T.J., de 5/05/2015, “O depoimento de parte prestado por um dos litisconsortes que se revele não possuir a virtualidade de servir como confissão, ainda que reduzido a escrito no momento em que é prestado, pode/deve ser livremente apreciado pelo julgador, no momento da apreciação de toda a prova produzida para a, ou na, formação do seu juízo conviccional. (6)

No que concerne à sua valoração, nos termos do Artigo 466, nº 3), do Código de Processo Civil, o tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão.

No segmento em que não constituem confissão, as declarações de parte são – na definição legal – livremente apreciadas.

(…)
Reconhecendo esta amplitude do depoimento de parte refere-se no Ac. do STJ de 16.03.2011 (7), o Juiz no depoimento de parte não está espartilhado pelo escopo da confissão, podendo ali colher alguns elementos para a boa decisão da causa de acordo com o princípio da “livre apreciação da prova”.
“Pois, na sequência de correspondente opção legislativa, a lei processual civil tem feito florescer cada vez mais os poderes inquisitórios, em detrimento do princípio do dispositivo, com vista à maior aproximação do juiz à verdade material, sendo disso afloramento os art.s 6º, 7º, 411º e 452º, nº 1, que correspondem aos art.s 265º nº3, 266º nº2 e 552º nº1 do Código de Processo Civil de 1961.
“Permite-se que o Tribunal, em qualquer altura do processo, possa determinar a comparência pessoal das partes para a prestação de depoimento sobre factos que interessem à decisão da causa, cfr. resulta dos art.s 452, nº 1 e 607º, nº 1.
“Acrescendo, que do art. 463º, nº 1, “a contrário”, resulta que quando a parte presta o seu depoimento não se visa exclusivamente a confissão.
“Donde, há que concluir que nada obsta, a que o tribunal na sequência dos poderes que tem de ouvir qualquer pessoa, incluindo as partes, por sua iniciativa, na busca da verdade material, tome em consideração, para fins probatórios, as declarações não confessórias da parte, as quais serão livremente apreciadas, nos termos do art. 607º, nº 5.
“A confissão e o depoimento de parte são, pois, realidades jurídicas distintas, sendo este mais abrangente do que aquela, por ser um meio de prova admissível mesmo relativamente a factos que não sejam desfavoráveis aos depoentes, caso em que ficará sujeito à livre apreciação do tribunal”.

Conforme refere o Ac. Do STJ de 02.10.2003, proc. 03B1909, in www.dgsi.pt e Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil”, 2.ª ed., pág. 573, “Ainda, no sentido de que os simples esclarecimentos ou afirmações que não possam valer como confissão, podem valer como elementos probatórios sujeitos à livre apreciação do Tribunal, podem ver-se, Lopes do Rego, in “Comentários ao Código de Processo Civil”, 1999, Almedina, pág. 387, Manuel de Andrade, in “Noções Elementares de Processo Civil”, 1976, pág. 248, Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, Vol. II, pág. 211 e os Ac.s do STJ, todos disponíveis in www.dgsi.pt, de 5.11.2008, procº 1902/2008, de 21.01.2009, procº 3966/2008, 10.12.2009, e de 20.01.2004, procº 03S3474.
Neles se adoptou o entendimento de que o depoimento de parte, que não redunde em confissão - por respeitar a factos favoráveis ao depoente -, é de livre apreciação pelo tribunal”. (8)
(…)

De tudo decorre que o depoimento de parte, conduzindo ou não à confissão, pode ser livremente valorado pelo tribunal a quo para fundar a sua convicção acerca da veracidade de factos controvertidos favoráveis a qualquer das partes, pelo que, podendo ser valorado, evidente resulta, como precedente lógico, que tem igualmente de poder ser admitidas apenas com esse fundamento, ou seja, recaindo apenas sobre factos favoráveis.

E assim sendo, na procedência da apelação, decide-se revogar o despacho recorrido, admitindo-se os depoimentos de parte requeridos a toda a materialidade para que foram requeridos.

IV- DECISÃO.

Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente a apelação e, em consequência, decide-se revogar o despacho recorrido, admitindo-se os requeridos depoimentos a toda a materialidade para que foram indicados.

Sem custas.
Guimarães, 24/ 10 / 2019.
Processado em computador. Revisto – artigo 131.º, n.º 5 do Código de Processo Civil.

Jorge Alberto Martins Teixeira
José Fernando Cardoso Amaral.
Helena Gomes de Melo a qual vota de vencida, apresentando a seguinte declaração de voto:

Voto de vencida

Embora concordando com o entendimento referido no acórdão de que o depoimento de parte, no segmento em que não constitui confissão, é livremente apreciado pelo tribunal, é meu entendimento que o depoimento de parte não deve ser admitido quando verse sobre factos favoráveis aos depoentes. Só deverá ser admitido caso tenha por objecto factos desfavoráveis pois só estes poderá a parte confessar (neste sentido, v.g. AC. do TRL de 20.11.2014, proferido no proc. 24233/13.0T2SNT-A.LI-6). Admitido o depoimento, se a parte não confessar, então o seu depoimento será livremente apreciado pelo tribunal. A jurisprudência citada do STJ,no acórdão, na leitura que deles faço, colocam a questão da valoração do depoimento de parte, em momento posterior à sua admissão. Pelo que, teria confirmado o despacho recorrido.
Guimarães, 24 de outubro de 2019



1. Cfr Lebre de Freitas, ob. cit., p. 272 e ss..E, assim, se o réu confessar ter recebido a quantia que o autor afirma ter-lhe emprestado, mas acrescentando que já a restituiu ao autor, incumbirá a este provar o contrário, ou seja, que a mesma não lhe foi restituída, se quiser aproveitar-se da confissão. Sendo certo que de outro modo seria o réu que, na qualidade de devedor, haveria de provar o pagamento – A. Varela, ob. cit., p. 542. Cfr., também, Vaz Serra, Provas, Bol. 111, p. 57 e ss.
2. Cfr. Acórdão do S.T.J., de 9/10/2014, proferido no processo nº 311/11.0TCFUN.L1.S1, in www.dgsi.pt.
3. Acs. da RG de 19.05.11 e de 19.01.15, do STJ de 05.11.08, 21.01.09, 10.12.09, 09.05.06 e de 02.01.04, da RP de 18.01.01 e de 04.04.02 e da RC de 12.04.11, www.dgsi.pt
4. Cfr. João Paulo Remédio Marques, ”A aquisição e a valoração…”, cit., pág. 171. Todavia, a verdade é que, não existe qualquer obstáculo epistemológico para não reconhecer às declarações do depoente um meio válido de formação da convicção, esclarecida e racional do juiz, i.e., uma fonte válida de convencimento racional do juiz. Assim, ainda que no contexto da prova por declarações de parte, o Ac. da RE de 12.03.15, www.dgsi.pt, e Paulo Faria e Ana Loureiro, Primeiras Notas ao Código de Processo Civil, Vol. I, Almedina, Coimbra, 2014, pág. 364.
5. Cfr. Acórdão da Relação de coimbra.de 26/03/201e, proferido no processo nº 1534/09.7TBFIG.C1, in www.dgsi.pt
6. Cfr. Acórdão do S.T.J., de 5/0%/2015. Proferido no processo nº 607/06.2TBPMS.C1.S1, in www.dgsi.pt.
7. Cfr. o Ac. do STJ de 16.03.2011, proc. 237/04.3TCGMR.S1, in www.dgsi.pt.
8. Cfr, Acórdão do STJ de 02.10.2003, proc. 03B1909, in www.dgsi.pt e Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil”, 2.ª ed., pág. 573.