Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6973/19.2T8GMR.G1
Relator: ALCIDES RODRIGUES
Descritores: NULIDADE DA SENTENÇA
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRA CONTRATUAL
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
TERCEIROS PREJUDICADOS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS – EQUIDADE
DANO PATRIMONIAL PELA INCAPACIDADE FUNCIONAL
PEDIDO ILÍQUIDO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/07/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Em matéria de responsabilidade civil extra-contratual, a regra geral que decorre do princípio geral enunciado no art. 483.º, n.º 1, do Código Civil é a de que beneficiário da indemnização é, em regra, apenas o titular do direito violado ou do interesse imediatamente lesado, o que exclui o terceiro, que só mediata, reflexa ou indiretamente foi prejudicado.
II - Excepcionalmente, a lei considera também com direito a indemnização certas pessoas que só mediatamente são afetadas pelo facto lesivo, como seja nos casos previstos e regulados nos arts. 495.º (no que se reporta a certos danos patrimoniais que terceiros sofram em caso de morte ou lesão corporal de outrem) e 496.º, n.ºs 2, 3 e 4 (versando sobre danos não patrimoniais suportados por alguém em consequência - ou reflexo - de lesão directamente sofrida por outrem), ambos do Cód. Civil.
III - A interpretação fixada pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 6/2014, de 09-01-2014 para os arts. 483.º, n.º1 e 496.º, n.º 1 do Código Civil, no tocante à sua delimitação objetiva (danos incluídos na indemnização), tem «como pressuposto que os danos do lesado sejam particularmente graves e que tenham determinado no outro sofrimento muito relevante».
IV - Não se apurando que as lesões que sofreu o sinistrado foram gravíssimas, nem que tais danos tenham causado nos seus pais um sofrimento intenso ou particularmente relevante, não têm estes direito ao ressarcimento por danos não patrimoniais («reflexos»).
V - O facto de o lesado ser estudante e não exercer, à data do facto lesivo, qualquer profissão remunerada não afasta a existência de dano patrimonial pela incapacidade funcional de que o mesmo ficou a padecer em consequência da lesão, pois que esta afetará o lesado para o resto da vida, podendo criar-lhe diversos constrangimentos na consideração de oportunidades profissionais futuras.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

J. M. e I. M., por si e na qualidade de legais representantes de seu filho menor, I. G., intentaram, no Juízo Local Cível de Guimarães – Juiz 2 – do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, a presente ação, sob a forma de processo comum, contra 1) X Imobiliária, Lda e 2) Y Supermercados – Sociedade Unipessoal Lda, peticionando a condenação solidária das Rés no pagamento aos autores (a) da quantia global de 40.931,32€, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento e ao Autor I. G. (b) a importância que se liquidar em execução de sentença em correspondência com o valor que vier a resultar do apuramento concreto e definitivo da sua situação clínica consequente do acidente sofrido.
Para tanto alegaram, em resumo, que as Rés são, respetivamente, proprietária e arrendatária do prédio onde existe uma rede que, em face das más condições de manutenção, cedeu quando o Autor I. G. a ela se encostou, tendo caído cerca de 5 metros até ao estacionamento das Rés.
O Autor perdeu a consciência, foi internado e teve consequências físicas e psicológicas permanentes, e os Autores, seus pais, tiveram despesas, perderam rendimentos e sofreram danos não patrimoniais.
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Regularmente citadas, ambas as Rés deduziram contestação (cfr. fls. 51 a 56 e 64 a 67), concluindo pela improcedência da ação.
A 1.ª Ré, X Imobiliária, Lda, alegou, em síntese, que a vedação foi colocada em 2008, de acordo com a autorização do município e que desde aí é feita uma inspeção trimestral, designadamente a última antes do acidente em outubro de 2016, estando na altura em boas condições, só tendo caído exclusivamente por culpa do Autor, que empreendeu peso e força não habitual.
Requereu a intervenção principal provocada da companhia de seguros W, Companhia de Seguros de Vida, S.A., alegando que havia transferido os danos de responsabilidade civil através de seguro multirriscos.
A 2.ª Ré, Y Supermercados, invocou a sua ilegitimidade processual, por não ser arrendatária daquele prédio, onde se situa um takeaway.
Acrescentou que o contrato de arrendamento que celebrou não obrigava à realização de obras de conservação, tendo avisado a 1.ª Ré quando aconteceu outro incidente na rede em maio de 2015 para que esta procedesse à reparação. Desconhece os termos e danos do acidente, acrescentando que a rede não poderia servir de encosto aos passageiros de autocarro, existindo estrutura própria para o efeito, pelo que conclui pela improcedência da ação.
Requereu a intervenção principal provocada da companhia de seguros K – Companhia de Seguros S.A., alegando que havia transferido os danos de responsabilidade civil da sua atividade de supermercado.
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Admitidas as requeridas intervenções principais (cfr. fls. 94), a W apresentou contestação, admitindo o contrato de seguro Multirrisco Empresas, com cobertura até 25.000 € relativa a responsabilidade civil, com franquia de 5%. Invocou por exceção a ilegitimidade substantiva dos pais do menor, por danos próprios e a prescrição, por ter sido citada mais de três anos depois do acidente, não lhe tendo sido participado pelo que adere à contestação da segurada (cfr. fls. 100 a 104).
Por sua vez, a K apresentou contestação, admitindo o contrato de seguro com cobertura até 50.000 € por sinistro e 2.000 € de danos corporais, relativo à responsabilidade civil, com franquia de 250 € por sinistro, no caso de danos materiais, não cobrindo danos reflexos, como os alegados pelos pais do Autor I. G.. Invocou por exceção a prescrição, por ter sido citada mais de três anos depois do acidente, que não lhe foi participado, mas alega que como arrendatária a 2.ª Ré não estaria obrigada às obras de conservação e que a rede era de vedação não se suporte, não podendo servir para apoiar pessoas (cfr. fls. 159 a 163).
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Notificados, os Autores pronunciaram-se pela improcedência da exceção, alegando que o parque é utilizado indistintamente pelos dois estabelecimentos, sendo um único prédio.
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Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, em que se julgaram improcedentes as exceções de ilegitimidade; afirmou-se a validade e regularidade da instância, de seguida foi fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova, bem como foram admitidos os meios de prova (cfr. fls. 184 e 185).
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Foi realizada a audiência de discussão e julgamento (cfr. fls. 258 a 261 e 265).
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Posteriormente, a Mm.ª Julgadora “a quo” proferiu sentença (cfr. fls. 266 a 275), nos termos da qual julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, condenou as Rés X Imobiliária, Lda e W, Companhia de Seguros de Vida, S.A., no pagamento solidário aos Autores J. M. e I. M., do montante de 450,00 € e ao Autor I. G., o montante de 8.000,00 €, quantias acrescidas de juros de mora legais desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Mais absolveu as Rés Y Supermercados – Sociedade Unipessoal, Lda e K – Companhia de Seguros S.A. dos pedidos.
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Inconformados, os autores interpuseram recurso da sentença (cfr. fls. 282 a 300) e, a terminar as respectivas alegações, formularam as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«1ª – Os Autores J. M. e mulher I. M., por si e na qualidade de legais representantes de seu filho menor I. G., demandaram a Ré X Imobiliária Lda., que viria a requerer a intervenção principal provocada da sua seguradora W, Companhia de Seguros de Vida S.A, para quem transferira a responsabilidade pelo ressarcimento dos danos invocados pelos Autores, através de seguro multirriscos, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhes uma indemnização por danos patrimoniais próprios dos pais de 931,32 € e por danos não patrimoniais de 10 000 € para cada um deles, e uma indemnização por danos não patrimoniais do filho de 20 000 €, bem como uma indemnização por danos patrimoniais por este sofridos, que, por ainda não completamente determinados, deveria ser liquidada, conforme requerido, posteriormente.
2ª – Com efeito, sendo a Ré X proprietária de um prédio urbano confinante com a Rua ..., em Pevidém, da qual esse prédio é separado por uma rede de vedação, encimada em muro com altura de cerca de 40cm contados do pavimento da rua, e cerca de 4 metros, contados do interior do prédio, sucedeu que no dia 15-12-2016, o Autor I. G., quando eram cerca de 16h30 e aguardava, junto de uma paragem de autocarros existente no local, a chegada do autocarro que pretendia tomar para se dirigir a sua casa, encostou-se à rede de vedação, e sem que nada o fizesse prever, a rede cedeu, provocando a sua queda para o interior do prédio daquela Ré, em consequência de se terem soltado os suportes de ligação da mesma rede, que se encontravam degradados, queda essa desamparada e que o fez bater violentamente com a cabeça no solo do interior do prédio, causando-lhe graves lesões.
3ª – Discutida a causa, o tribunal considerou a primeira Ré responsável, em termos de responsabilidade extracontratual, por omissão do dever de conservação e vigilância daquela rede, e, em consequência, julgou a ação parcialmente procedente por provada, condenando ambas as Rés solidariamente a pagarem aos Autores J. M. e mulher I. M. o montante de 450,00 € a título de danos patrimoniais por si sofridos, e ao Autor I. G., o a título de danos não patrimoniais, o montante de 8 000,00 €, um e outro acrescidos de juros moratórios à taxa legal desde a citação, absolvendo as Rés do demais peticionado (que consistia no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais sofridos pelos pais do I. G. e numa indemnização por danos patrimoniais sofridos pelo próprio I. G.).
4ª – Inconformados, quer com a exiguidade dos valores arbitrados, quer pela absolvição dos pedidos restantes, os Autores interpuseram o presente recurso de apelação invocando a nulidade por omissão de pronúncia quanto à fixação de uma indemnização por danos patrimoniais do I. G., em execução posterior, conforme se requerera, e, quanto ao decidido, por entenderem que estavam provados e se justificavam danos não patrimoniais relevantes sofridos quer pelos pais, quer pelo I. G., que deviam ter sido considerados, dando lugar à competente condenação, e ainda pela manifesta insuficiência dos valores arbitrados.
5ª – A arguida nulidade por omissão de pronúncia funda-se no facto de o Autor I. G. ter pedido, na inicial, a condenação dos Réus a pagarem-lhe “a importância que se liquidar em execução de sentença, em correspondência com o valor que vier a resultar do apuramento concreto e definitivo da sua situação clínica consequente do acidente sofrido”, ao que se seguiu um arbitramento por exame médico, em consequência do qual, a sentença considerou provado (facto 22) que “em virtude das lesões sofridas, o Autor I. G. ficou com sequelas permanentes, tendo-lhe sido fixado como Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais em 3 pontos (Na0310 – labilidade da atenção, lentificação ideativa, dificuldades de memorização, fatigabilidade intelectual, intolerância ao ruído, instabilidade do humor, persistindo para além de dois anos)”, e daí que ou o tribunal se considerava logo em condições de fixar uma indemnização ante esses elementos e fixava-a, ou, se não estivesse nessas condições, deveria fixar a indemnização que viesse a ser liquidada, conforme se pedia, mas não fez uma nem outra coisa, decidindo genericamente que “improcederá o pedido de qualquer indemnização a liquidar ulteriormente”, o que significa que, ao decidir assim, incorreu a sentença em nulidade por omissão de pronúncia, a que se refere o artigo 615.º, n.º1 al. d) do Código de Processo Civil (ou em erro de julgamento), de que deve conhecer-se com a consequência de ou se relegar para momento ulterior a liquidação da indemnização devida ou fixá-la imediatamente, com os elementos disponíveis.
6ª – Em consequência do referido acidente, os Autores pediram, reconhecida que fosse, como foi, a responsabilidade civil extracontratual da Ré X, a condenação desta no pagamento de uma importância global de 40 931, 32 €, acrescidos de juros à taxa legal desde a citação, correspondentes a:
a) danos não patrimoniais sofridos pelo I. G. – 20 000 € (verba para a qual a sentença julgou adequada a importância de 8 000 €);
b) danos não patrimoniais sofridos pelo pai e pela mãe do I. G. – 10 000 € para cada um (danos que a sentença julgou não dever arbitrar por insuficiente gravidade);
c) danos patrimoniais sofridos pelo pai e pela mãe do I. G., em conjunto – 931, 32 € (que a sentença verificou, mas reduziu, por equidade a 450€).
7ª – Não obstante assim ter decidido, a sentença recorrida considerou, entre o mais, ao fixar os factos materiais da causa, relativamente ao menor I. G. que:
a) O I. G. deu entrada na urgência do Hospital da Nossa Senhora da Oliveira, com traumatismo occipital, com queixa de cefaleias, dor cervical e gonalgia direita, sonolência, mas facilmente despertável; reconhecendo a mãe; e com amnésia para o sucedido (facto 14), apresentando extensa hemorragia subaracnoideia traumática e pequena diástase da sutura lambdóide direita (facto 15), tendo sido transferido para a urgência pediátrica para vigilância por traumatismo crânio-encefálico e profilaxia de convulsões, e depois ficou internado no Serviço de Neurocirurgia, Cuidados Intermédios de Pediatria do Hospital de Braga. (facto 16)
b) Regressou a casa em 30-12-2016, com queixas de irritabilidade e dificuldade de manter atenção nas tarefas diárias (factos 18 e 19)
c) Ficou, em virtude do acidente, com repercussão temporária na sua atividade, durante 16 dias, de forma total, e parcial até 27/10/2017 (num total de 301 dias) e com sequelas permanentes tendo-lhe sido fixado como Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais, em 3 pontos (Na0310 - labilidade da atenção, lentificação ideativa, dificuldades de memorização, fatigabilidade intelectual, intolerância ao ruído, instabilidade do humor, persistindo para além de 2 anos) – factos 21 e 22
d) O I. G., em virtude das lesões e tratamentos, sofreu dores, teve consultas médicas durante 2 anos e meio, ficou privado do convívio com os seus colegas e familiares, sofreu perturbações na vida escolar, quer pela falta de frequência das aulas, quer pela redução da atenção à aprendizagem, tendo-lhe sido fixado, em perícia, um Quantum Doloris de 4 pontos numa escala crescente de 7 (factos 25 e 26).
8ª – E quanto aos pais do I. G., o tribunal considerou provado que:
a) Acompanharam toda a evolução clínica do I. G., sofreram com ele e por causa dele, desgosto que os acompanhou meses a fio, que lhes causou também insónias e transtornos e profunda tristeza e apreensão (facto 27).
b) A mãe do I. G., acompanhou-o dia e noite, no Hospital, na primeira semana após o acidente, enquanto o autor, pai do I. G., passou quatro noites no Hospital, e a partir daí ambos os progenitores alternaram as respetivas noites para não deixarem o filho só, com os inerentes incómodos na sua vida pessoal e profissional. (facto 28)
9ª – Perante esses factos, a sentença recorrida:
a) Embora considerando relevantes os danos não patrimoniais sofridos pelos Autores pais do menor, entendeu que estes não eram de excecional gravidade, pelo que não deviam ser ressarcidos;
b) Embora entendendo que os pais do menor devem ter uma compensação material pelos reflexos negativos da situação descrita no seu património, considerou excessivo o montante de 931, 32 €, arbitrando-lhes antes uma compensação fixada por equidade de 450 €, a título de ressarcimento de todos os seus danos patrimoniais;
c) Embora considerando que o I. G. sofreu um quantum doloris de grau 4 numa escala de 7, um défice funcional temporário total de 16 dias, um défice funcional temporário parcial de 301 dias e um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, fixado em 3 pontos, atendendo à sua idade, à culpa da Ré, e a ter considerado não provada qualquer necessidade futura de acompanhamento médico, a título de danos não patrimoniais, fixou ao I. G. uma indemnização de apenas 8 000 €.
10ª – Ao invés, a sentença recorrida deveria ter estabelecido o direito dos pais do I. G. a receber o valor de dos danos patrimoniais que reclamaram (931,32 €), dos danos não patrimoniais que igualmente reclamaram (10 000 € para cada um), e o direito do I. G. a receber o valor dos danos não patrimoniais que reclamou (20 000 €), e o valor dos danos patrimoniais que lhe deveriam ser atribuídos em função da incapacidade parcial permanente de 3% de que ficou sofrendo, a liquidar posteriormente, porquanto:
a) O valor dos danos patrimoniais arbitrado pela sentença a favor dos pais – 450 € - não chega para cobrir sequer a perda de 23 dias de suspensão do trabalho da mãe que se encontra provada, e que importou em 460 €, sendo, no mais, absolutamente módico o pedido;
b) Conforme o decidido no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 6/2014 (DR I Série, n.º 28 de 22-5-2014), na sequência de inúmeras decisões jurisprudenciais, e no que respeita à ressarcibilidade de danos não patrimoniais sofridos por terceiros (Acórdão do STJ de 25-11-1998, BMJ 481,470, Projeto Vaz Serra, artigo 759.º do Código Civil, BMJ 101, p.138, Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 103, p.14 e Ano 104 p.15, Acórdão do STJ de 17-09-2009, Col. Jurisp. STJ 2009, 3.º, p.55, Acórdão do STJ de 28-02-2013, Proc. 60/2001, Sumários, 2013, p.163, Acórdão do STJ de 18-06-2013, Proc. 4021/04, Sumários 2013, p.429), a melhor doutrina sustenta que o artigo 496.º do Código Civil e os preceitos com ele relacionados “devem ser interpretados em ordem a encerrarem, pelo menos, nos casos mais graves, a compensabilidade dos danos não patrimoniais sofridos por pessoa diferente da vítima, quando esta se mantém viva”.
c) Os danos não patrimoniais sofridos pelos pais do I. G., atendendo à sua natureza e relevância, e à aflição por eles sofrida ante a eminência de uma morte prematura ou de lesões graves e irreversíveis têm suficiente gravidade para merecerem a tutela do direito;
d) Os danos não patrimoniais sofridos pelo I. G. não podem ser menosprezados, nem fixados segundo uma visão miserabilística, pois se revelaram de enorme gravidade e prolongamento no tempo, por forma a afetarem de modo irreversível a personalidade e a vida do acidentado, não podendo, de modo algum, ser compensados com uma indemnização de 8 000 €;
e) Atendendo à circunstância de o I. G. ter sofrido danos patrimoniais irreversíveis e permanentes, nem o tribunal pode considerar que tais danos não tem relevância, nem pode supor, como supôs, que não há lugar a fixação de qualquer indemnização que, pelo contrário, e conforme se requereu, deve ser relegada para liquidação posterior, muito menos podendo, como fez, sustentar que não resultou provada qualquer necessidade futura de acompanhamento, uma vez que do exame médico a que o I. G. foi sujeito apenas resulta que “não é de perspetivar a existência de dano futuro”.
Termos em que, na procedência do recurso, deve revogar-se a decisão recorrida, nas partes impugnadas, e a ação ser julgada inteiramente provada e procedente, condenando-se as Rés no pagamento das verbas já fixadas no pedido formulado na petição inicial e, bem assim, no que respeita à desvalorização sofrida pelo Autor I. G., no pagamento no que vier a liquidar-se posteriormente,
para se fazer JUSTIÇA!».
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Contra-alegou a recorrida W – Companhia de Seguros, S.A., pugnando pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida (cfr. fls. 302 a 306).
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cfr. fls. 308).
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Delimitação do objeto do recurso.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso e não tenham sido ainda conhecidas com trânsito em julgado [cfr. artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho].

No caso, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:

i) - Da nulidade da sentença com fundamento na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC;
ii) – Do conteúdo da obrigação de indemnização, mais concretamente:
a) pagamento aos pais do menor I. G. de uma indemnização pelos danos, patrimoniais e não patrimoniais, por si sofridos;
b) pagamento ao Autor I. G. de uma indemnização por danos não patrimoniais superior à que foi arbitrada na sentença impugnada;
c) pagamento ao mesmo Autor I. G., desde já ou em liquidação, de uma indemnização pelos danos permanentes de carácter patrimonial.
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III. Fundamentos

IV. Fundamentação de facto.

A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:
1. Os autores J. M. e I. M. são entre si casados segundo o regime supletivo da comunhão de adquiridos e estão registados como pais do autor I. G., nascido no dia -/04/2006.
2. Encontram-se registados a favor da Ré X dois prédios urbanos no Lugar …, atual Rua …, da freguesia de …, deste concelho, inscritos na matriz urbana da referida freguesia sob o artigo … e … e descritos, respetivamente, na Conservatória do Registo Predial de …. sob o n.º …/20040209 e …/19971230, com servidão de passagem a pé e de veículos automóveis, a favor do prédio 1620 através do 1049.
3. Por contrato datado de 13 de março de 2014 e em vI. G. até março de 2018, a 1.ª Ré cedeu à 2.ª Ré Y, o prédio urbano descrito sob o n.º … e inscrito sob o artigo …, afeto a supermercado e estacionamento, mediante o pagamento da renda mensal de 9.000 €, com início a 1 de abril de 2014, junto como doc. 2 da contestação da 2.ª Ré e que aqui se dá como reproduzido.
4. Por força deste contrato, a arrendatária ficou autorizada a realizar no locado todas as obras não estruturais necessárias ao exercício da sua atividade.
5. Por contrato datado de 23 de março de 2015, a 1.ª Ré cedeu o prédio urbano descrito sob o n.º … e inscrito sob o artigo …, à sociedade V. e C., Lda., destinada a atividade de restauração, tendo aí sido instalado o Take Away Pevidém, ficando ali ressalvado que o estacionamento do locado não pode ser vedado por ser também estacionamento do Y Group.
6. O logradouro dos dois prédios era utilizado como parque de estacionamento comum aos clientes dos dois estabelecimentos, encontrando-se murado como um prédio único.
7. Na parte que confronta a Rua ..., o referido muro tinha uma altura de cerca de 40 cm, medidos do lado da rua e de cerca de 4 m medidos do interior do prédio, ficando num plano inferior em relação ao da rua.
8. Sobre esse muro, no confronto com a rua ..., o então proprietário, em 2008 e de acordo com alvará de autorização de construção 313/08, instalou uma rede, com a altura de cerca de 2 metros e meio, que ficou presa a colunas verticais de ferro, implantadas no topo do muro, ao alto, distando entre si cerca de dois metros.
9. No referido muro, junto à rede, estava ainda implementado um poste com um sinal de paragem de autocarro dos ..., onde os passageiros esperavam os autocarros.
10. No dia - de maio de 2015, a 2.ª Ré Y avisou a 1.ª Ré de que deu os dados desta à GNR, que se tinha deslocado ao local em virtude de uma queda de um adolescente da via pública para o parque de estacionamento, aparentemente por a rede se ter soltado numa das extremidades, juntando duas fotografias do local.
11.No dia 15 de dezembro de 2016, o Autor I. G., quando eram cerca de 16:30 horas, encontrava-se na Rua ..., junto da referida paragem, aguardando a chegada do autocarro que pretendia tomar para se dirigir para casa.
12.Nessa altura, o Autor I. G. encostou-se à rede de vedação e, sem que nada o fizesse prever, a rede cedeu, por se ter soltado dos suportes de ligação que a prendiam à barra de ferro vertical mais junto à paragem e que se encontravam degradados.
13.Por este facto, o Autor I. G. deixou de ter apoio nas suas costas, e caiu de costas desamparado, batendo com a cabeça no solo, da zona de estacionamento situada em frente ao Take Away.
14.Em sequência da queda, foi transportado para os serviços de urgência do Hospital da Nossa Senhora da Oliveira, onde deu entrada com traumatismo occipital, sem aparente perda de consciência, sem vómitos, com queixa de cefaleias, dor cervical e gonalgia direita. À admissão registava Glasgow 14, sonolência, mas facilmente despertável; reconhece a mãe; diz a idade e onde mora; amnésia para o sucedido.
15.Foi observado em Ortopedia, sem necessidade de cuidados e realizou TC-CE que revelou extensa hemorragia subaracnoideia traumática e pequena diástase da sutura lambdóide direita. Durante a permanência no Serviço de Urgência manteve ECG 15, sem défices neurológicos e sem vómitos, mantendo queixas de cefaleias e dor cervical que aliviou com morfina.
16.No mesmo dia, pelas 23 horas, foi transferido para a urgência pediátrica para vigilância por traumatismo crânio-encefálico e profilaxia de convulsões, e depois ficou internado no Serviço de Neurocirurgia, Cuidados Intermédios de Pediatria do Hospital de Braga.
17. Durante o internamento evoluiu sempre favoravelmente, sem intercorrências, mantendo Glasgow 15 e sem défices neurológicos.
18.Repetiu TC-CE em 29-12-2016 que revelou reabsorção da hemorragia, tendo alta do internamento em 30-12-2016, altura em que regressou a casa.
19.Foi orientado para consulta externa de Neurocirurgia, onde manteve boa evolução do estado neurológico, com queixas de irritabilidade e dificuldade em manter atenção nas tarefas diárias. Sem défices neurológicos motores. Teve alta desta consulta em 27-10-2017, data em que se consideram consolidadas as lesões.
20.Observado em consulta isolada de Neuropediatria no Hospital de Braga em 06-04-2018, que não relatou alterações. Foi pedida avaliação por psicologia, tendo alta da consulta.
21.Em virtude do acidente, houve repercussão temporária na sua atividade, durante 16 dias, de forma total, e parcial até 27/10/2017 (num total de 301 dias).
22.Em virtude das lesões sofridas, o Autor I. G. ficou com sequelas permanentes tendo-lhe sido fixado como Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais, em 3 pontos (Na0310 - labilidade da atenção, lentificação ideativa, dificuldades de memorização, fatigabilidade intelectual, intolerância ao ruído, instabilidade do humor, persistindo para além de 2 anos; fixável de 1 a 10 pontos).
23. Estas sequelas não afetam o Autor I. G. em termos de autonomia e independência, sendo causa de sofrimento físico.
24. Na atual situação, não é de perspetivar a existência do agravamento das sequelas.
25. O Autor I. G., em virtude das lesões e tratamentos, sofreu dores, teve consultas médicas durante 2 anos e meio, ficou privado do convívio com os seus colegas e familiares, sofreu perturbações na vida escolar, quer pela falta de frequência das aulas, quer pela redução da atenção à aprendizagem.
26. Foi-lhe fixada em perícia um Quantum Doloris de 4 pontos numa escala crescente de 7.
27. Os pais do I. G., aqui também autores, acompanharam toda a evolução clínica do I. G., sofreram com ele e por causa dele, desgosto que os acompanharam meses a fio, que lhes causou também insónias e transtornos e profunda tristeza e apreensão.
28.A autora, mãe do I. G., acompanhou-o dia e noite, no Hospital, na primeira semana após o acidente, enquanto o autor, pai do I. G., passou quatro noites no Hospital, e a partir daí ambos os progenitores alternaram as respetivas noites para não deixarem o filho só, com os inerentes incómodos na sua vida pessoal e profissional.
29. Os autores, pais do I. G., procuraram rodeá-lo do melhor apoio e assistência clínica, levando-o a consultas e comprando medicamentos, suportando os respetivos custos, bem como com as deslocações ao Hospital.
30. A W - Companhia de Seguros, S. A. (à data denominada A – Companhia de Seguros, S.A.) celebrou com a ré X Imobiliária, Lda. um contrato de seguro Multirrisco Empresas, titulado pela apólice n.º ………, pelo qual assumiu o pagamento das indemnizações legalmente exigíveis à segurada por danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes de lesões corporais e materiais causados a terceiros, com fundamento na responsabilidade civil extracontratual da segurada, enquanto proprietária, inquilina ou ocupante do edifício sito na Rua …, até € 25.000,00 e sujeita a uma franquia de 5% do valor dos danos resultantes de lesões materiais.
31. A Interveniente K celebrou com a Ré Y um contrato de seguro mediante o qual garante “a responsabilidade civil extracontratual que, ao abrigo da lei civil, seja imputável ao Segurado, no exercício da atividade” de “Supermercados”, nos termos e condições constantes da apólice ……., com cobertura até 50.000 € por sinistro e 2.000 € de danos corporais, com franquia de 250 € por sinistro, no caso de danos materiais.
*
E deu como não provados:
1. «Com interesse para a boa decisão da causa não se provaram quaisquer outros factos acima não descritos ou com estes em contradição, com exclusão sobre considerações jurídicas, conclusões ou juízos de valor e factos não essenciais à decisão da causa.
Designadamente não resultou provado que a 2.ª Ré Y estava obrigada, por força do contrato à manutenção da vedação em bom estado de conservação; que a rede estava enferrujada; que no local existia uma paragem com estrutura metálica autónoma, destinada a albergar passageiros; que o Autor I. G. deu à rede uma utilização que não corresponde à sua utilização normal, empreendendo contra a estrutura peso e força que não seria apta a suportar; que o Autor I. G. se sentou na plataforma superior do muro e que depois a rede foi colocada mais a meio do muro; que o I. G. perdeu a consciência, que tinha frequentes dores de cabeça depois da alta; que não é possível considerá-lo, do ponto de vista médico, totalmente curado ou que tenha sequelas futuras e que o diagnóstico futuro das sequelas seja incerto; que a morte era apontada geralmente e à sua volta como consequência própria das lesões sofridas; não provadas as despesas concretamente suportadas ou faltas ao trabalho; que a Ré X realizava inspeções trimestrais desde a colocação da rede em 2008 e que a última antes do acidente tenha sido realizada em outubro de 2016; que a rede não estava, em condições normais, apta a suportar o peso do Autor I. G.».
*
V. Fundamentação de direito

1. Nulidade da sentença recorrida com fundamento na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC.
1.1. Como é consabido, é através da sentença, conhecendo das pretensões das partes – pedido e causa de pedir –, que o juiz diz o direito do caso concreto (arts. 152º, n.º 2 e 607º, ambos do CPC).
Pode, porém, a sentença estar viciada em termos que obstem à eficácia ou validade do pretendido dizer do direito.
Assim, por um lado, nos casos em que ocorra erro no julgamento dos factos e do direito, do que decorrerá como consequência a sua revogação, e, por outro, enquanto ato jurisdicional que é, se atentar contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou ainda contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada, caso este em que se torna, então sim, passível do vício da nulidade nos termos do art. 615.º do CPC (1).
As nulidades de decisão são, pois, vícios intrínsecos (quanto à estrutura, limites e inteligibilidade) da peça processual que é a própria decisão (trata-se, pois, de um error in procedendo), nada tendo a ver com os erros de julgamento (error in iudicando), seja em matéria de facto, seja em matéria de direito (2).
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão (art. 613º, n.º 3 do CPC) são as que vêm taxativamente enumeradas no n.º 1 do art. 615º do CPC.

Nos termos da al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC, a sentença é nula, entre o mais, quando:

- “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Como vício de limites, a nulidade de sentença/decisão enunciada no citado normativo divide-se em dois segmentos, sendo o primeiro atinente à omissão de pronúncia (o que está em causa nos autos) e o segundo relativo ao excesso de pronúncia ou de pronúncia indevida. O juiz conhece de menos na primeira hipótese e conhece de mais do que lhe era permitido na segunda.
Esta causa de nulidade decorre da exigência prescrita na 1ª parte do n.º 2 do art. 608.º do CPC, nos termos do qual o “juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”.
Verifica-se a omissão de pronúncia quando o juiz deixe de conhecer, sem prejudicialidade, de todas as questões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada (3).
Questões, para o efeito do disposto na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC, são, “em primeiro lugar, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que requerem decisão do juiz, qualquer que seja a forma como são deduzidas (pedidos, excepções, reconvenção)”, podendo ser ainda considerados para esse efeito “os pressupostos processuais de ordem geral e os pressupostos específicos de qualquer acto (processual) especial, quando realmente debatidos (controvertidos ou questionados) entre as partes” (4).
Doutrinária (5) e jurisprudencialmente (6) tem sido entendido de que só há nulidade quando o juiz não se pronuncia sobre verdadeiras questões não prejudicadas invocadas pelas partes, e não perante a argumentação invocada pelas partes. Por questões não se devem considerar as razões ou argumentos apresentados pelas partes, mas sim as pretensões (pedidos), causa de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer. O que “não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito, as partes tenham deduzido (…)” (7).
O juiz não tem, por isso, que esgotar a análise da argumentação das partes, mas apenas que apreciar todas as questões que devam ser conhecidas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente (8).
No caso em apreço, os recorrentes invocaram a nulidade da sentença por omissão de pronúncia “quanto à fixação de uma indemnização por danos patrimoniais do I. G., em execução posterior”.
Para tanto fundam a sua argumentação no facto de «o Autor I. G. ter pedido, na inicial, a condenação dos Réus a pagarem-lhe “a importância que se liquidar em execução de sentença, em correspondência com o valor que vier a resultar do apuramento concreto e definitivo da sua situação clínica consequente do acidente sofrido”, ao que se seguiu um arbitramento por exame médico, em consequência do qual, a sentença considerou provado (facto 22) que “em virtude das lesões sofridas, o Autor I. G. ficou com sequelas permanentes, tendo-lhe sido fixado como Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais em 3 pontos (Na0310 – labilidade da atenção, lentificação ideativa, dificuldades de memorização, fatigabilidade intelectual, intolerância ao ruído, instabilidade do humor, persistindo para além de dois anos)”, e daí que ou o tribunal se considerava logo em condições de fixar uma indemnização ante esses elementos e fixava-a, ou, se não estivesse nessas condições, deveria fixar a indemnização que viesse a ser liquidada, conforme se pedia, mas não fez uma nem outra coisa, decidindo genericamente que “improcederá o pedido de qualquer indemnização a liquidar ulteriormente”, o que significa que, ao decidir assim, incorreu a sentença em nulidade por omissão de pronúncia, a que se refere o artigo 615.º, n.º1 al. d) do Código de Processo Civil (ou em erro de julgamento), de que deve conhecer-se com a consequência de ou se relegar para momento ulterior a liquidação da indemnização devida ou fixá-la imediatamente, com os elementos disponíveis» (9).
Analisada a sentença impugnada constata-se que, depois de julgar preenchidas as condições que a lei exige para a existência de responsabilidade civil extracontratual e de concluir que recaía sobre a 1ª Ré a obrigação de indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação culposa e ilícita do direito deste, a Mmª Juíza “a quo” procedeu à densificação do conteúdo da obrigação de indemnizar e, no que concerne aos danos sofridos pelo menor (10), entendeu serem valorizáveis diversos factos tidos como provados, tais como:
- o quantum doloris fixado em 4 (numa escala crescente de 7 graus);
- défice funcional temporário total, com repercussão na sua atividade, fixável em 16 dias, e parcial num total de 301 dias;
- défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, fixável em 3 pontos;
- as sequelas não afetam o Autor I. G. em termos de autonomia e independência, sendo causa de sofrimento físico.
Mais decidiu que, não obstante a idade do lesado, tais sequelas não implicariam danos futuros.
E acrescentou que, «por não resultar provada qualquer necessidade futura de acompanhamento médico, improcederá o pedido de outra qualquer indemnização a liquidar ulteriormente».
Assim, em função dos danos apurados sofridos pelo menor, fixou a respetiva indemnização no montante de 8.000,00 €, julgando improcedente o demais peticionado, motivo por que nessa parte absolveu as Rés do (demais) pedido.
Bem ou mal, acertadamente ou não (isso será questão a apreciar ulteriormente, quando se analisar o mérito da causa), a verdade é que a Mm.ª Juíza “a quo” não deixou de se pronunciar sobre a pretensão formulada sob a al. b) do petitório, julgando-a improcedente.
Aliás, se bem atentarmos no teor das alegações (e conclusões) de recurso, depreende-se, claramente, que o verdadeiro motivo do vício apontado à sentença não consubstancia a apontada nulidade, tendo antes a ver com um eventual erro de julgamento da matéria de direito (11). Isto porque, no entender dos recorrentes, na sentença recorrida foi feita uma errada subsunção jurídica dos factos ao direito, bem como uma errada interpretação e aplicação das normas jurídicas que constituem fundamento jurídico da decisão, o que é impugnável nos termos do disposto no art. 639º do CPC.
Por conseguinte, poder-se-á estar perante um erro de julgamento (error in judicando), mas não é possível surpreender e, consequentemente, reconhecer nessa sede a comissão de qualquer vício gerador de nulidade da sentença (error in procedendo).
Trata-se de circunstâncias, de vícios e de regime completamente diversos do da nulidade da sentença.
Em suma, não se verificando qualquer omissão de pronúncia sobre questões de que o Tribunal tivesse de apreciar [no caso, o pedido formulado sob a al. b)], resta concluir pela improcedência da invocada nulidade da sentença com fundamento na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC).
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2. - Do conteúdo da obrigação de indemnização.

2.1. (Breves) Considerações gerais.

A responsabilidade civil extracontratual (delitual ou aquiliana) divide-se em três modalidades: responsabilidade por factos ilícitos (por culpa), pelo risco ou objetiva e por facto lícito.
O regime regra é o da primeira (responsabilidade subjetiva ou por culpa), só se afirmando as outras duas quando haja disposição legal nesse sentido (art. 483º, n.º 2, do CC).
Na presente ação está em causa a responsabilidade civil extracontratual da 1ª ré, emergente da queda de uma rede, nos termos e para os fins do disposto no art. 492º do Código Civil (doravante, abreviadamente, designado por CC), da qual resultaram danos no menor I. G..
A sentença recorrida considerou verificados os pressupostos de que depende o dever de indemnizar a cargo da 1ª demandada, estabelecidos no art. 492º, n.º 1, do CC, por ter sido provado que a queda da rede resultou da falta da sua manutenção, sem que aquela tenha logrado ilidir a presunção de culpa estabelecida naquele normativo, concluindo pelo preenchimento dos pressupostos para a mesma ser responsabilizada pelos danos daí resultantes.
No recurso não está em causa a verificação, no caso «sub judice», de tais pressupostos da responsabilidade civil aquiliana ou extracontratual, mas tão só o apuramento e fixação dos danos resultantes do acidente, de que se arrogam titulares quer o menor lesado, quer os seus progenitores.
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2.2. Danos patrimoniais sofridos pelos autores J. M. e I. M., pais do menor I. G..
Segundo os recorrentes, o valor correspondente aos danos patrimoniais sofridos pelos Autores, pais do I. G., que a sentença considerou (450,00€), é muito escasso, propugnando que tais danos deverão ser quantificados precisamente no valor pedido (931,32€).
Vejamos se lhes assiste razão.
Por dano patrimonial ou material entendem-se todos aqueles prejuízos que, sendo suscetíveis de avaliação pecuniária, podem ser reparados ou indemnizados, senão diretamente (mediante restauração natural ou reconstituição específica da situação anterior à lesão) pelo menos indiretamente (por meio de equivalente ou de uma indemnização pecuniária) (12).
O princípio geral no que se refere à reparação do dano é o estabelecido no art. 562º do CC, nos termos do qual «[q]uem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação».
Como resulta do critério legal, acolhido pelo art. 566º, n.ºs 2 e 3 do CC, a indemnização em dinheiro, a atribuir sempre que seja impossível a reconstituição natural, tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem os danos; se não puder ser averiguado o valor exato dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.

No tocante ao cálculo da indemnização prescreve o art. 564.º do mesmo diploma legal:

«1. O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão.
(…)».
Em matéria de responsabilidade civil extra-contratual, delitual, ou aquiliana, como é o caso presente, a regra geral é a de que a indemnização pelos danos causados cabe apenas ao titular do direito violado ou do interesse imediatamente lesado com a violação de disposição legal destinada a protegê-lo, não o terceiro, que só mediata, indirecta ou reflexamente seja prejudicado (art. 483.º do CC).
Em princípio, titular do direito a indemnização é apenas o sujeito directa ou imediatamente lesado pelos danos resultantes da violação, o titular dos bens imediatamente afectados pelo facto danoso.
O terceiro, que só reflexa, ou indirectamente, seja prejudicado com a violação do direito do lesado directo, está, em princípio, fora do círculo dos titulares do direito à indemnização.
Excepcionalmente, o direito a indemnização, “jure próprio”, no que se reporta aos danos patrimoniais e não patrimoniais, pode caber também, no caso de lesão corporal, ou no caso de morte da vítima, apenas, a terceiros, que não constituindo o principal ofendido pelo facto lesivo, são pelo mesmo atingidos de forma mediata.
O art. 495.º (no que se reporta a certos danos patrimoniais que terceiros sofram em caso de morte ou lesão corporal de outrem) e o art. 496.º, n.ºs 2, 3 e 4 (versando sobre danos não patrimoniais suportados por alguém em consequência – ou reflexo – de lesão directamente sofrida por outrem), ambos do CC estabelecem e regulam justamente esses casos excepcionais (13) (14).
Como refere Almeida Costa (15), a “titularidade do direito à reparação cabe, em princípio, à pessoa ou pessoas a quem pertence o direito ou interesse juridicamente protegido que a conduta ilícita violou”, admitindo-se, nalgumas situações excepcionais, que “outras pessoas, além do ofendido, tenham direito a exigir indemnização, ou que esta se alargue a terceiros só mediata ou reflexamente prejudicados”.

A tal respeito, o art. 495.º do CC, sob a epígrafe “Indemnização a terceiros em caso de morte ou lesão corporal”, estabelece:

«1. No caso de lesão de que proveio a morte, é o responsável obrigado a indemnizar as despesas feitas para salvar o lesado e todas as demais, sem exceptuar as do funeral.
2. Neste caso, como em todos os outros de lesão corporal, têm direito a indemnização aqueles que socorreram o lesado, bem como os estabelecimentos hospitalares, médicos ou outras pessoas ou entidades que tenham contribuído para o tratamento ou assistência da vítima.
3. Têm igualmente direito a indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado ou aqueles a quem o lesado os prestava no cumprimento de uma obrigação natural».
O citado normativo reporta-se a danos próprios sofridos por pessoas atingidas, pelo evento lesivo, de forma reflexa, em consequência da lesão do principal ofendido, concedendo-lhes o direito de peticionarem, por si, a indemnização emergente dos indicados danos patrimoniais (16).
Versa, pois, sobre a indemnização devida a determinados terceiros por certos danos patrimoniais que sofram em caso de morte ou de lesão corporal de outrem e não sobre a indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela vítima imediata, o próprio lesado ou o "lesado direto".
Na interpretação do preceito a jurisprudência tem divergido quanto ao tipo de despesas resultantes de assistência à vítima abrangidas pelo n.º 2 do art. 495.º: as despesas resultantes da assistência imediata à vítima, prestada na sequência do facto lesivo e destinada a salvá-la ou a curar as lesões sofridas, ou também as despesas emergentes da prestação de assistência ao lesado que, em casos de lesões geradoras de elevadas incapacidades, passou a necessitar do auxílio de terceira pessoa (17).
Na falta de previsão expressa do art. 495º, tem sido também controvertida a questão de saber se os familiares do lesado têm direito a indemnização pelos lucros cessantes de que ficaram privados por deixarem de exercer a atividade que até então desenvolviam, pela necessidade de cuidarem da vítima, designadamente perante uma situação de incapacidade ou de dependência funcional ou psíquica.
A resposta afirmativa tem sido alicerçada não apenas no cumprimento dos deveres legais que, por exemplo, recaem mutuamente sobre os cônjuges (arts. 1672º e 1674º do CC) ou sobre os pais quanto aos filhos menores no âmbito das responsabilidades parentais, de natureza irrenunciável (arts. 1874º, 1877º, 1878º, n.º 1, 1879º, 1880º, 1882º, 1885º, 1901º, n.º 1, todos do CC), mas também na constatação de que essa intervenção de auxílio do familiar vem suprir, na prática, aquela que poderia ser realizada por terceiro e cujos custos sempre seriam imputáveis ao responsável (18). Tais danos estão, aliás, abrangidos pelo escopo da norma, que é o de facilitar e estimular – ou pelo menos não desincentivar – a assistência e o tratamento a que o lesado tem direito (19).
No caso, com vista a fundamentar o peticionado montante de 931,32€ a título de danos patrimoniais, alegaram os Autores que, em consequência direta e necessária das lesões sofridas pelo menor I. G., despenderam (enquanto pais) quantias com deslocações ao Hospital de Braga, com estacionamento no respetivo parque (353,46€), acompanhamento do processo na GNR e respetivas cópias (2,28€), pagamento de portagens (39,45€), refeições no Hospital de Braga (59,35€), medicação adquirida na farmácia (15,78€), conserto da mochila do I. G., danificada na queda (1€), 23 dias de suspensão do trabalho da mãe, para acompanhar o filho (460€) (20).
Sucede, porém, que a referida facticidade não resultou apurada.

Demonstrou-se, sim, que:
- A autora, mãe do I. G., acompanhou-o dia e noite, no Hospital, na primeira semana após o acidente, enquanto o autor, pai do I. G., passou quatro noites no Hospital, e a partir daí ambos os progenitores alternaram as respetivas noites para não deixarem o filho só, com os inerentes incómodos na sua vida pessoal e profissional (ponto 28 dos factos provados);
- Os autores, pais do I. G., procuraram rodeá-lo do melhor apoio e assistência clínica, levando-o a consultas e comprando medicamentos, suportando os respetivos custos, bem como com as deslocações ao Hospital (ponto 29 dos factos provados).
Nessa decorrência, valorou a Mmª Juíza “a quo” o facto de, atendendo à menoridade do I. G., os pais é que tiveram que suportar as despesas para acompanhamento no Hospital e aos médicos, para medicamentos, ainda que não tenham resultado provadas as quantias efetivamente despendidas, sendo certo que não resultaram provados lucros cessantes, nem outros danos advindos do acidente, pelo que, importando ressarcir os referidos reflexos negativos no património, computou-os, equitativamente, em 450,00 €.
Ora, diversamente do aduzido pelos recorrentes, não resulta provado que, por força do acompanhamento do filho, a mãe tenha deixado de auferir a quantia de 460€ correspondente a 23 dias de suspensão do trabalho. Sequer resultou provado que a mãe do menor tinha uma atividade profissional e que ficou privada de tais rendimentos em virtude da assistência prestada ao filho menor.
Segundo se depreende, a fixação do referido montante indemnizatório visou indemnizar os danos patrimoniais apurados resultantes das despesas com o transporte e deslocações do menor a consultas e ao hospital, bem como com a aquisição de medicamentos, cujo montante, apesar de concretamente não apurado, foi, com apelo à equidade, fixado em 450,00 €.
Concorda-se com o referido juízo, visto se considerar indemnizáveis as despesas de deslocação dos pais para visita ao filho internado em estabelecimento hospitalar, bem como com deslocações a consultas no âmbito da sua recuperação física, o mesmo se concluindo com a aquisição de medicamentos.
Contudo, não sendo apontados na apelação quaisquer elementos que infirmem o referido juízo decisório, nem se evidenciando dos autos que o montante arbitrado se mostre aquém ou desconforme dos parcos elementos apurados, resta confirmar o valor atribuído a esse título.
Não podemos deixar de ter presente que, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 342º do CC, era aos autores que incumbia demonstrar os danos suportados com os tratamentos ou a assistência do lesado (quer os danos emergentes, quer os lucros cessantes), pelo que não o tendo feito integralmente – ou, melhor dizendo, fazendo-o insuficientemente –, resta-nos secundar o juízo equitativo formulado na sentença recorrida.
Improcede, por isso, este fundamento da apelação.
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2.3. Danos não patrimoniais sofridos pelos autores, J. M. e I. M., pais do lesado.

Na sentença recorrida, no tocante ao direito dos progenitores do menor a receberem uma indemnização por danos não patrimoniais, depois de se explicitar que a lei limita, em regra, os beneficiários de indemnização aos que diretamente sofreram danos (os lesados), não deixou de se reconhecer que, excecionalmente, estão previstos casos de reparação a favor de quem só reflexa ou indiretamente foi prejudicado, designados de “terceiros” (como seja os estabelecidos nos arts. 495.º, n.º 2 e 496º do CC), se bem que essa aplicação extensiva às situações de lesões corporais apenas é admitida em situações particulares, o que, no caso concreto, não foi dado como verificado.
Do assim decidido divergem os recorrentes aduzindo para o efeito não só que os danos não patrimoniais sofridos por terceiros são sempre ressarcíveis, além de que a ressarcibilidade desses danos não depende da sua excecional gravidade (sem prejuízo de, no caso concreto, os danos deverem ser considerados extremamente graves).
Defendem por isso que, enquanto pais do I. G., lhes deveria ser fixada, a cada um deles, uma indemnização por danos não patrimoniais (no valor de 10.000,00€ para cada um), uma vez que os por eles sofridos merecem a tutela do direito por relevantes.
Cumpre, assim, averiguar se os pais do menor lesado têm, ou não, direito ao ressarcimento por danos não patrimoniais.
Retomando o que já anteriormente se explicitou, beneficiário da indemnização é, em regra, apenas o titular do direito violado ou do interesse imediatamente lesado o que exclui o terceiro que só mediata, reflexa ou indiretamente foi prejudicado.
Contudo, como então se assinalou, ao lado do titular do interesse lesado diretamente, a nossa lei considera também com direito a indemnização certas pessoas que só mediatamente são afetadas pelo facto lesivo.
Nessa decorrência, se o dano produzido tem natureza patrimonial, essa ressarcibilidade de terceiros mostra-se prevista no art. 495º do CC (já analisado no ponto antecedente).
Se a indemnização se reportar a um dano não patrimonial (como é o ponto em análise) importa ter presente o estatuído no art. 496º, n.ºs 2, 3 e 4 do CC.

Sob a epígrafe “Danos não patrimoniais”, o citado preceito dispõe:

«1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
2 - Por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado de pessoas e bens e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes; e, por último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem.
3 - Se a vítima vivia em união de facto, o direito de indemnização previsto no número anterior cabe, em primeiro lugar, em conjunto, à pessoa que vivia com ela e aos filhos ou outros descendentes.
4 - O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos dos números anteriores».
Ressalvando a hipótese do n.º 4 (no segmento “danos não patrimoniais sofridos pela vítima”), também aqui os titulares ao direito à indemnização não são o próprio lesado, mas sim as categorias de pessoas que sucessivamente são chamadas à titularidade do direito à indemnização pelo dano não patrimonial causado pela morte do lesado.
Como já anteriormente demos conta, tal ampliação do círculo de titulares do direito à indemnização encontra-se limitada às situações previstas nos arts. 495º e 496º.
Discute-se, porém, se a indemnização aos familiares é devida apenas em caso de morte da vítima – posto os n.ºs 2 a 4 do art. 496.º limitarem aos casos de morte da vítima a indemnizabilidade dos danos não patrimoniais sofridos – ou se é também atendível em casos em que o lesado sofreu lesão corporal mas em que não sobreveio a morte.
De facto, situações há em que as graves lesões corporais sofridas pela vítima que sobreviveu, e respetivas sequelas, podem afetar profundamente as pessoas indicadas nos n.ºs 2 e 3 do art. 496º do CC, causando-lhes desgosto e sofrimento tão intensos como aqueles que resultariam da sua morte, bem como alterações relevantes à respetiva rotina e ao projeto de vida que idealizaram.
É inegável, como proficientemente salienta Ana Margarida Leite (21), que “situações de graves lesões sofridas pela vítima, geradoras de relevantes sequelas físicas e psíquicas, com duração prolongada ou de natureza permanente, são suscetíveis de causar um profundo sofrimento aos seus familiares próximos, ou companheiro de facto, e alterações da respetiva forma de vida, atenta a necessidade de prestar auxílio ao lesado”.
A controvérsia jurisprudencial que se gerou em torno da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais sofridos por outrem, nos casos em que a vítima sobrevive, conduziu à prolação, pelo Supremo Tribunal de Justiça, do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência (AUJ) n.º 6/2014, datado de 09-01-2014 – publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 98 (22/05/2014) –, que fixou a seguinte jurisprudência:
Os artigos 483.º, n.º 1 e 496.º, n.º 1 do Código Civil devem ser interpretados no sentido de abrangerem os danos não patrimoniais, particularmente graves, sofridos por cônjuge de vítima sobrevivente, atingida de modo particularmente grave”.
Estava em causa saber em que medida podia ou não ser indemnizada o cônjuge da vítima sobrevivente, que tinha sofrido, na sequência de um acidente de viação, graves lesões, pelo sofrimento experimentado, porquanto, após a alta a alta hospitalar, passou a cuidar dele e a viver exclusivamente em função do mesmo, sentindo-se triste, confrangida e amargurada por ver o que acontecera ao seu cônjuge, que era pessoa alegre e bem disposta, dinâmica e trabalhadora.
Considerando que se impõe uma interpretação atualista dos preceitos do Código Civil, o Supremo Tribunal de Justiça veio defender que, independentemente da qualificação dos danos como reflexos ou diretos, eles devem ser indemnizados em determinadas circunstâncias, impondo-se uma delimitação subjetiva e objetiva.
No tocante à sua delimitação subjetiva (quem pode ser indemnizado), extrai-se da fundamentação do citado AUJ que não pode "abrir-se" a compensabilidade a todos os que, chegados ao lesado, sofram com o que aconteceu a este.
Esclarece-se para o efeito que, para além do cônjuge, outros podem e devem beneficiar da tutela deste tipo de danos, não podendo a referência ao cônjuge ser interpretada no sentido de excluir outros, considerando que, face ao objeto do processo, não compete determinar quais, dos chegados ao lesado, podem pedir compensação pelo sofrimento próprio.
Acresce que, no tocante à sua delimitação objetiva (danos incluídos na indemnização), a interpretação assumida tem «como pressuposto que os danos do lesado sejam particularmente graves e que tenham determinado no outro sofrimento muito relevante». O mesmo é dizer que pressupõe que a vítima sobrevivente foi atingida de modo particularmente grave e que o seu cônjuge (ou a pessoa do círculo de proximidade do lesado) sofreu danos não patrimoniais particularmente graves.
Como ali se refere, para além de não se poder abrir a compensabilidade a todo um "coro de chorosos", também não se pode abrir a todo o dano não patrimonial que, no caso do lesado, justificaria a tutela do direito.
Essa justificação não existe «no caso em que as lesões não são graves e ou o chegado ao lesado não tem sofrimento intenso. Repare-se que lesões ligeiras, demandando, por regra, compensação por danos não patrimoniais, demandam também, principalmente no caso de crianças ou outros dependentes, danos não patrimoniais aos ligados afetivamente àqueles. Por isso, não podemos interpretar o artigo 496.º, n.º 1 equiparando a vítima ao que lhe está afetivamente ligado. Passaria a ser regra a "pulverização" indemnizatória, em dissintonia com o princípio-base de que é àquela que assiste o direito à compensação.
Temos de ter sempre presente que estamos a abrir uma brecha na dogmática geral de que é a vítima, se sobreviver, a pessoa a indemnizar. Não podemos interpretar o preceito acabado de referir como se dissesse "Na fixação das indemnizações ...".
Por isso, entendemos dever reservar a extensão compensatória apenas para os casos de particular gravidade.
(…)
O que cremos dever ser precisada é a exigência de particular gravidade em duas vertentes: uma, quanto aos ferimentos da vítima sobrevivente e outra quanto ao sofrimento do cônjuge».
Feitos estes considerandos é altura de retomarmos o caso concreto.

Dos autos mostra-se (com relevância) provado que:
- O I. G. nasceu no dia -/04/2006 e é filho dos autores J. M. e I. M.;
-No dia - de dezembro de 2016, pelas 16:30 horas, o I. G. encontrava-se na Rua ..., junto da referida paragem, aguardando a chegada do autocarro que pretendia tomar para se dirigir para casa.
-Nessa altura, o I. G. encostou-se à rede de vedação e, sem que nada o fizesse prever, a rede cedeu, por se ter soltado dos suportes de ligação que a prendiam à barra de ferro vertical mais junto à paragem e que se encontravam degradados.
- Por este facto, o I. G. deixou de ter apoio nas suas costas, e caiu de costas desamparado, batendo com a cabeça no solo, da zona de estacionamento.
- Em sequência da queda, foi transportado para os serviços de urgência do Hospital da Nossa Senhora da Oliveira, onde deu entrada com traumatismo occipital, sem aparente perda de consciência, sem vómitos, com queixa de cefaleias, dor cervical e gonalgia direita, sendo que à admissão registava Glasgow 14, sonolência, mas facilmente despertável, reconhecendo a mãe, dizendo a idade e onde mora; amnésia para o sucedido.
- Foi observado em Ortopedia, sem necessidade de cuidados e realizou TC-CE que revelou extensa hemorragia subaracnoideia traumática e pequena diástase da sutura lambdóide direita. Durante a permanência no Serviço de Urgência manteve ECG 15, sem défices neurológicos e sem vómitos, mantendo queixas de cefaleias e dor cervical que aliviou com morfina.
- No mesmo dia, pelas 23 horas, foi transferido para a urgência pediátrica para vigilância por traumatismo crânio-encefálico e profilaxia de convulsões, e depois ficou internado no Serviço de Neurocirurgia, Cuidados Intermédios de Pediatria do Hospital de Braga.
- Durante o internamento evoluiu sempre favoravelmente, sem intercorrências, mantendo Glasgow 15 e sem défices neurológicos.
- Repetiu TC-CE em 29-12-2016 que revelou reabsorção da hemorragia, tendo alta do internamento em 30-12-2016, altura em que regressou a casa.
- Foi orientado para consulta externa de Neurocirurgia, onde manteve boa evolução do estado neurológico, com queixas de irritabilidade e dificuldade em manter atenção nas tarefas diárias. Sem défices neurológicos motores. Teve alta desta consulta em 27-10-2017, data em que se consideram consolidadas as lesões.
- Em virtude do acidente, houve repercussão temporária na sua atividade, de forma total durante 16 dias e parcial até 27/10/2017 (num total de 301 dias).
- Em virtude das lesões sofridas, o I. G. ficou com sequelas permanentes tendo-lhe sido fixado como Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais, em 3 pontos;
- Estas sequelas não afetam o Autor I. G. em termos de autonomia e independência, sendo causa de sofrimento físico;
- Na atual situação, não é de perspetivar a existência do agravamento das sequelas;
- O I. G., em virtude das lesões e tratamentos, sofreu dores, teve consultas médicas durante 2 anos e meio, ficou privado do convívio com os seus colegas e familiares, sofreu perturbações na vida escolar, quer pela falta de frequência das aulas, quer pela redução da atenção à aprendizagem;
- Foi-lhe fixada em perícia um Quantum Doloris de 4 pontos numa escala crescente de 7.
- Os pais do I. G. acompanharam toda a evolução clínica do I. G., sofreram com ele e por causa dele, desgosto que os acompanharam meses a fio, que lhes causou também insónias e transtornos e profunda tristeza e apreensão.
- A autora, mãe do I. G., acompanhou-o dia e noite, no Hospital, na primeira semana após o acidente, enquanto o autor, pai do I. G., passou quatro noites no Hospital, e a partir daí ambos os progenitores alternaram as respetivas noites para não deixarem o filho só, com os inerentes incómodos na sua vida pessoal e profissional.
Sendo este o quadro fáctico apurado e tendo presente os pressupostos restritivos supra enunciados que devem presidir à compensabilidade a terceiros por danos não patrimoniais em caso de lesão corporal da qual não sobreveio a morte do lesado, é nosso entendimento que a sentença recorrida deverá, também nesta parte, ser confirmada.
Com efeito, secundando o afirmado pela recorrida, não só os danos corporais sofridos pelo menor I. G. não são particularmente graves, como igualmente não resulta apurado que tais danos tenham causado nos pais do I. G. um sofrimento tão intenso ou de tal forma relevante merecedor de uma tutela excecional do direito.
Como explicitou a Mmª Juíza “a quo”, não “se afiguram como de excecional gravidade os sofrimentos sofridos pelos Autores, pais do I. G., que sofreram mais por causa do filho, do que com danos próprios, uma vez que, apesar de tudo, as lesões não importaram a privação de uma vida normal, com a fruição plena do filho, depois de ter saído do internamento”.
Sem menosprezar a ansiedade, angústia e os receios vivenciados pelos pais do I. G. em resultado do acidente e das lesões corporais por este sofridas, certo é que o evento lesivo (no tocante às lesões sofridas pelo I. G.) não se pode qualificar como particularmente grave, além de que o mesmo não comprometeu gravemente – nem é apto a comprometer – a vida pessoal e familiar dos pais do I. G..
Na verdade, não só o menor I. G. não ficou irreversivelmente afectado por um severo grau de incapacidade, envolvendo perda da autonomia pessoal, como os seus pais, vinculados a um dever de auxílio e assistência, não viram drasticamente comprometidas as suas normais possibilidades de realização pessoal.
No presente caso, não se pode concluir que as lesões que sofreu o sinistrado foram gravíssimas, nem que gravíssimo foi – e é – o sofrimento que determinaram relativamente aos pais/autores. Não estamos perante uma situação em que os danos directamente suportados pelo menor I. G. se assumem como particularmente graves ao ponto de, pela sua particular gravidade, se autonomizarem dentro do património moral desse lesado, de modo a justificar a atribuição de uma indemnização pelos danos não patrimoniais «reflexos» suportados pelos seus pais.
A entender-se da forma oposta, sufragando-se o entendimento propugnado pelos recorrentes – dispensabilidade da excecional gravidade dos danos sofridos pelo lesado e da não intensidade do sofrimento do chegado ao lesado –, estar-se-ia a contrariar toda a linha argumentativa que presidiu à elaboração do referido acórdão uniformizador de jurisprudência – nos termos da qual se deve reservar a extensão compensatória apenas para os casos de particular gravidade –, o que, naturalmente, é de rejeitar.
Nesta conformidade, no caso concreto, não se apurando que os autores J. M. e I. M., como pais do lesado, tivessem sofrido danos não patrimoniais («reflexos») particularmente graves, que mereçam ser indemnizados, por via da interpretação extensiva dos arts. 483, n.º 1, e 496º do CC, impõe-se concluir pela improcedência deste fundamento da apelação.
*
2.4. – Adequação/justeza do valor compensatório arbitrado ao Autor I. G. para ressarcimento dos danos não patrimoniais.

No caso, o autor I. G. reclamou, a esse título, o valor de € 20.000,00; a sentença, a título de danos não patrimoniais, fixou-os no valor de € 8.000,00; em sede de apelação, o apelante (autor) sustenta que tais danos deverão ser fixados no montante peticionado na petição inicial, ou seja, € 20.000,00.
Cumpre, pois, averiguar se estão, ou não, corretamente fixados os questionados danos não patrimoniais sofridos pelo autor I. G..
Na sua vertente não patrimonial, o dano abrange os prejuízos (como, por exemplo, as dores físicas, os desgostos morais ou por perda de capacidades físicas ou intelectuais, os vexames, sentimentos de vergonha, estados de angústia, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética) que, sendo insuscetíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização (22).
A nossa lei, no art. 496º do CC, não determina quais os danos não patrimoniais que são compensáveis, limitando-se a fixar um critério geral que é o da gravidade desses danos.
Segundo o n.º 1 do citado normativo, «[n]a fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito».
Como escrevem Pires de Lima e Antunes Varela (23), «a gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objetivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjetivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada)». O mesmo é dizer que a gravidade deve ser apreciada em termos objetivos, evitando estados de especial sensibilidade (24).
Já os simples incómodos ou as meras contrariedades não serão, em regra, suficientes para justificar uma indemnização.
Por conseguinte, para serem indemnizáveis exige-se que os danos não patrimoniais sejam graves e que mereçam, por essa gravidade, a tutela do direito.
A doutrina e a jurisprudência têm teorizado sobre os modos de expressão do dano não patrimonial, nele distinguindo, como mais significativos e importantes, o chamado “quantum doloris”, que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária, o “dano estético”, que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima, o “prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado, designadamente na vertente familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica, o prejuízo da “saúde geral e da longevidade” (aqui avultando o dano da dor e o défice de bem estar), que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem estar da vítima e o encurtamento na expectativa de vida, o “pretium juventutis”, que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a primavera da vida (25).
«As dores e sequelas que, do ponto de vista da perda da qualidade de vida, irão prolongar-se no tempo, são padecimentos subsumíveis à categoria dos prejuízos não patrimoniais» (26).
O mesmo facto pode produzir simultânea e cumulativamente danos patrimoniais e não patrimoniais (27). Bastará tomar em devida consideração que a distinção entre danos patrimoniais e danos não patrimoniais não tem a ver com a natureza do bem afetado, mas antes com o tipo de utilidades que esse bem proporcionava e que se vieram a frustrar com a lesão, sendo certo que o direito ou interesse legalmente protegido pode integrar no seu âmbito interesses/situações vantajosas de tipo patrimonial, moral e espiritual. Assim, se alguém causa uma lesão no corpo de outrem este sofre danos não patrimoniais, correspondentes à dor e sofrimento suportados, mas também pode sofrer danos patrimoniais, correspondentes à redução do valor da sua força de trabalho (28).
Também neste campo, reconhece-se não ser fácil avaliar na prática os danos não patrimoniais. Na maioria das vezes não existe uma evidência física dos prejuízos e, mesmo quando ela exista, torna-se difícil conhecer as suas reais consequências.
Segundo o n.º 4 do art. 496º do CC, o cálculo do montante da compensação monetária por danos não patrimoniais deve obedecer a um juízo equitativo – não podendo, por definição, ser feita através da fórmula ou da teoria da diferença (29) –, tendo em atenção a natureza e intensidade dos danos causados, o grau de culpabilidade do lesante, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias atendíveis, nomeadamente, as lesões sofridas e os correspondentes sofrimentos, as flutuações do valor da moeda, não devendo perder-se de vista os padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, de modo a procurar alcançar, até por uma questão de justiça relativa, uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como aliás impõe o n.º 3 do artigo 8.º do CC (30). Para tal efeito, são relevantes, além do mais, a natureza, multiplicidade e diversidade das lesões sofridas; as intervenções cirúrgicas e tratamentos médicos e medicamentosos a que o lesado teve de se submeter; os dias de internamento e o período de doença; a natureza e extensão das sequelas consolidadas, o quantum doloris, o dano estético, se o houver.
Como ensinam Pires de Lima e Antunes Varela (31), e como vem sendo seguido pela jurisprudência dos nossos tribunais, o juízo de equidade requer do julgador que tome «em conta todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida», sem esquecer que a sobredita “indemnização” tem natureza mista, já que visa não só compensar o dano sofrido, mas também reprovar, de algum modo, a conduta lesiva (32).
Daí que se entenda que, sem embargo da função punitiva que outrossim reveste, a compensação por danos não patrimoniais “tem por fim facultar ao lesado meios económicos que, de alguma sorte, o compensem da lesão sofrida, por tal via reparando, indirectamente, os preditos danos, por serem hábeis a proporcionar-lhe alegrias e satisfações, porventura de ordem puramente espiritual, que consubstanciam um lenitivo com a virtualidade de o fazer esquecer ou, pelo menos, mitigar o havido sofrimento moral” (33).
Em suma, firmado o critério da gravidade (art. 496º, n.º 1 do CC), são essencialmente três os princípios relativos à indemnização dos danos não patrimoniais (34):
1º - A compensação dos danos não patrimoniais deve fazer-se em espécie (arts. 70º, n.º 2 e 566º, n.º 1, do CC);
2º - A compensação em dinheiro dos danos não patrimoniais será fixada equitativamente pelo tribunal (art. 496º, n.º 4 do Cód. Civil);
3º - A compensação em dinheiro dos danos não patrimoniais será fixada equitativamente pelo tribunal, “tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º” (art. 496º, n.º 4 do Cód. Civil).
Para responder atualizadamente ao comando do art. 496.º do CC e constituir uma efetiva possibilidade compensatória, deverá ter-se ainda presente que a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores em matéria de danos não patrimoniais tem evoluído no sentido de considerar que a compensação tem de ser significativa, e não miserabilista ou meramente simbólica, de modo a viabilizar um lenitivo para os danos suportados e, porventura, a suportar (35); o que não significa, em contraponto, que deva ser uma indemnização arbitrária. Na verdade, a atividade do juiz no domínio do julgamento à luz da equidade, não obstante se veja enformada por uma importante componente subjetiva, não se pode reconduzir ao puro arbítrio (36).
Diga-se, por fim, que o juízo de equidade da 1ª instância, essencial à determinação do montante indemnizatório por danos não patrimoniais, assente numa ponderação, prudencial e casuística, das circunstâncias do caso – e não na aplicação de critérios normativos – deverá ser mantido sempre que, situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida, se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que, numa perspetiva actualística, generalizadamente vêm sendo adotados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade (37).

Ponderando, no caso concreto os seguintes elementos fundamentais:

- À data do acidente, o A. I. G. contava 9 anos de idade, pois nasceu no dia -/04/2006;
- o quantum doloris fixado em 4 (numa escala crescente de 7 graus), sofreu dores, teve consultas médicas durante 2 anos e meio, ficou privado do convívio com os seus colegas e familiares, sofreu perturbações na vida escolar, quer pela falta de frequência das aulas, quer pela redução da atenção à aprendizagem;
- défice funcional temporário, com repercussão na sua atividade de forma total entre 15/12/2016 e 30/12/2016 (16 dias) e parcial entre 31/12/2016 e 27/10/2017 (num total de 301 dias), situando-se nesta data a consolidação médico-legal das lesões;
- sequelas permanentes em virtude das lesões sofridas, tendo-lhe sido fixado como défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais, em 3 pontos (Na0310 - labilidade da atenção, lentificação ideativa, dificuldades de memorização, fatigabilidade intelectual, intolerância ao ruído, instabilidade do humor, persistindo para além de 2 anos);
- tais sequelas não afetam o Autor I. G. em termos de autonomia e independência, sendo causa de sofrimento físico.
Os factos enunciados são demonstrativos das consequências irreversíveis advindas para o Autor I. G. em resultado do facto ilícito do qual foi vítima e para o qual em nada contribuiu. Estando no pleno gozo das suas capacidades físicas, ainda na fase da infância e prestes a alcançar a adolescência, viu-se de repente desapossado de parte dessas aptidões, já que das lesões físicas sofridas advieram sequelas com que ficou a padecer após a cura clínica daquelas, que lhe determinam um défice funcional permanente da integridade física-psíquica de 3%, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais. Embora tais sequelas não atinjam o grau de muito graves, também não são de menosprezar.
O carácter irreversível dessas sequelas é outro dos elementos a ter em devida conta, porquanto será uma situação com a qual terá de arcar até ao fim da sua vida, com as referidas repercussões, o que antes não sucedia.
Há a destacar também as dores (físicas e psíquicas) sofridas pelo autor desde o acidente até à data da consolidação das lesões, cujo quantum doloris foi mensurado no grau 4, de uma escala crescente de 7 valores. A este factor acresce o tempo que exigiu o completo restabelecimento físico, tendo sido considerado clinicamente curado em 27/10/2017 (num total de 317 dias).
Além disso, há também que ter em conta o facto de a produção do acidente ser imputável a culpa da 1ª ré, posto que a queda da rede, da qual advieram os danos sofridos pelo menor I. G., resultou da falta da sua manutenção.
Por fim, e sem especiais preocupações de exaustividade, enunciamos algumas decisões, proferidas pelo Supremo Tribunal de Justiça, acerca da fixação dos danos não patrimoniais:
- Acórdão do STJ de 12/11/2020 (relator Nuno Pinto Oliveira): Autor que, em consequência do acidente, ficou afetado com um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica em 3 pontos, tendo também ficado afetado psicologicamente, com frequentes recordações do episódio e, quando conduz, fica nervoso sempre que presencia alguma manobra mais brusca, foi confirmado o decidido nas instâncias de fixar a compensação de 5.000,00 euros para os danos não patrimoniais.
- Acórdão do STJ de 28/02/2018 (relatora Fátima Gomes): (i) à data do acidente, o autor tinha 10 anos de idade e era (e é) estudante; (ii) em consequência do acidente, ficou a padecer de um défice permanente da integridade físico-psíquica fixável em 3 pontos, que demanda maiores esforços no exercício da actividade habitual e demandará perda de capacidade de ganho quando ingressar no mercado de trabalho (iii) sofreu dores aquando do acidente e da convalescença, sendo o quantum doloris de grau 4 (numa escala progressiva de 7); (iv) a repercussão permanente das sequelas nas actividades desportivas e de lazer corresponde ao grau 3 (numa escala progressiva de 7); (v) padeceu de incómodos e de tristeza por força do acidente, das lesões e das sequelas dele decorrentes; (vi) antes do acidente, era uma pessoa saudável, alegre e confiante, foi mantida a indemnização de € 8.000,00, fixada pela Relação, a título de dano não patrimonial.
Tudo ponderado e tendo presentes os valores habitualmente atribuídos pela jurisprudência e em especial os atribuídos a situações próximas da ora em apreço, não vemos razões para considerar desajustada ou proporcional (por defeito, como entende o autor) a compensação fixada pela 1ª instância a título de danos não patrimoniais. Na verdade, não apresentam os danos a excessiva gravidade com que o Autor os cataloga no recurso, ao ponto de justificar a desproporcionada compensação por este reclamada (que, a ser concedida, estaria totalmente desfasada quer das circunstâncias fácticas ponderadas, bem como do padrão jurisprudencial supra enunciado).
Pelo exposto, também nesta parte improcede este fundamento do recurso.
*
2.5. Do arbitramento ao Autor I. G., desde já ou em liquidação, de uma indemnização pelos danos permanentes de carácter patrimonial.
O recorrente I. G. questiona a não atribuição de uma indemnização em consequência do défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de que ficou a padecer, na vertente de dano patrimonial, pois que, “atendendo à circunstância de (…) ter sofrido danos patrimoniais irreversíveis e permanentes, nem o tribunal pode considerar que tais danos não tem relevância, nem pode supor, como supôs, que não há lugar a fixação de qualquer indemnização que, pelo contrário, e conforme se requereu, deve ser relegada para liquidação posterior, muito menos podendo, como fez, sustentar que não resultou provada qualquer necessidade futura de acompanhamento, uma vez que do exame médico a que o I. G. foi sujeito apenas resulta que “não é de perspetivar a existência de dano futuro”.
Na sentença recorrida, depois de feita a valoração dos factos com relevância para a determinação dos danos não patrimoniais, afirmou-se que as sequelas não implicariam danos futuros e, mais adiante, acrescentou-se que, por não resultar provada qualquer necessidade futura de acompanhamento médico, improcederia o pedido de outra qualquer indemnização a liquidar ulteriormente.
Tendo em conta o objeto da apelação, cumpre averiguar se estão, ou não, apurados danos patrimoniais futuros sofridos pelo autor I. G. que justifiquem a atribuição da respetiva indemnização.

No tocante ao cálculo da indemnização – e para além dos normativos já anteriormente enunciados – prescreve o art. 564.º do mesmo diploma legal:

«1. O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão.
2. Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior».
Extrai-se deste preceito legal que os danos futuros, para serem passíveis de indemnização, têm que ser previsíveis.
Um dos casos mais frequentes em que o tribunal tem de atender aos danos futuros é aquele em que o lesado, em consequência do facto lesivo, perde ou vê diminuída a sua capacidade laboral (38).
Como vem sendo entendido pelo Supremo Tribunal de Justiça (39), a lesão corporal sofrida em consequência de um evento lesivo constitui em si um dano real ou dano-evento, designado por dano biológico, na medida em que afeta a integridade físico-psíquica do lesado, traduzindo-se em ofensa do seu bem “saúde”. Trata-se de um “dano primário”, do qual podem derivar, além das incidências negativas não suscetíveis de avaliação pecuniária, a perda ou diminuição da capacidade do lesado para o exercício de atividades económicas, como tais suscetíveis de avaliação pecuniária. Trata-se, assim, neste âmbito, de ressarcir danos que ainda não se concretizaram, mas que, de acordo com o curso normal das coisas, de acordo com o que é previsível em face das circunstâncias, sempre virão a concretizar-se no futuro.
Tal dano consiste numa “incapacidade funcional ou fisiológica que se centra, em primeira linha, na diminuição da condição física, resistência e capacidade de esforços, por parte do lesado, o que se traduz numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo, no desenvolvimento das atividades pessoais, em geral, e numa consequente e, igualmente, previsível maior penosidade, dispêndio e desgaste físico na execução das tarefas que, no antecedente, vinha desempenhando, com regularidade” (40).
É questão controversa a natureza do dano biológico [patrimonial, não patrimonial, mista ou tertium genus] (41).
A afetação da integridade físico-psíquica, designada como dano biológico, pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e de natureza não patrimonial (42).
Na primeira categoria não se compreende apenas a perda de rendimentos pela incapacidade laboral para a profissão habitual, mas também as consequências da afetação, em maior ou menor grau, da capacidade para o exercício de outras atividades profissionais ou económicas, suscetíveis de ganhos materiais.
Na sua dimensão patrimonial o dano biológico tem sido perspetivado na vertente de lucros cessantes, enquanto perda de capacidade de ganho ou, como hoje se designa, défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, na medida em que respeita a incapacidade funcional (43).
Afirma-se, repetidamente, que esta incapacidade funcional, mesmo que não impeça o lesado de continuar trabalhar e que dela não resulte perda ou diminuição de vencimento, importa necessariamente dano patrimonial (futuro), que deve ser indemnizado, já que a força do trabalho do homem, porque lhe propicia fonte de rendimentos, é um bem patrimonial, sendo certo que essa incapacidade obriga o lesado a um maior esforço para manter o nível de rendimentos auferidos antes da lesão (44). Com efeito, nos termos explicitados pelo Ac. do STJ de 7/06/2011 (relator Manuel Granja da Fonseca), in www.dgsi.pt., «a incapacidade funcional, afectando o corpo humano ou um seu órgão (no sentido médico-legal deste termo), representa uma alteração da pessoa, que afecta a sua integridade física, impedindo-a de exercer determinada actividade corporal ou sujeitando-a a exercitá-la de modo deficiente ou doloroso.
Realmente, a incapacidade funcional de que o lesado tenha ficado a padecer pode traduzir-se numa incapacidade para a generalidade das profissões, numa incapacidade genérica para utilizar o corpo enquanto prestador de trabalho e produtor de rendimento ou numa possibilidade de o utilizar em termos correspondentemente deficientes ou penosos.
Por isso, a incapacidade funcional, na medida em que a precede e consome, tem, em princípio, uma maior abrangência do que a perda da capacidade de ganho, podendo não coincidir com esta, tudo dependendo do tipo ou espécie de trabalho efectivamente exercido profissionalmente.
É que, em alguns casos, uma elevada incapacidade funcional pode não ter repercussão na retribuição (o que não é raro em profissões de incidência intelectual), ao passo que, noutras situações, uma pequena incapacidade funcional geral pode ocasionar uma enorme incapacidade profissional».

No desenvolvimento desse entendimento, o acórdão do STJ de 10/10/2012 (relator Lopes do Rego), in www.dgsi.pt., considerou que:

“(…) a compensação do dano biológico [dentro das consequências patrimoniais da lesão físico-psíquica] tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou conversão de emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar; quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.
Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável – e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição –, erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais …”
(…)
Nesta perspectiva, deverá aditar-se ao lucro cessante, decorrente da previsível perda de remunerações, calculada estritamente em função do grau de incapacidade permanente fixado, uma quantia que constitua justa compensação do referido dano biológico, consubstanciado na privação de futuras oportunidades profissionais, precludidas irremediavelmente pela capitis deminutio de que passou a padecer (o lesado), bem como pelo esforço acrescido que o já relevante grau de incapacidade fixado irá envolver para o exercício de quaisquer tarefas da vida profissional ou pessoal (…)”.
Assim sendo, “considera-se que, ao avaliar e quantificar o dano patrimonial futuro, pode e deve o tribunal reflectir também na indemnização arbitrada a perda de oportunidades profissionais futuras que decorra do grau de incapacidade fixado ao lesado, ponderando e reflectindo por esta via na indemnização, não apenas as perdas salariais prováveis, mas também o dano patrimonial decorrente da inevitável perda de chance ou oportunidades profissionais por parte do lesado” (45).
Daí que se conclua que à atribuição do dano biológico na sua vertente patrimonial é suficiente, em princípio, que exista uma incapacidade ou diminuição da capacidade funcional do lesado; esta afetará o lesado para o resto da vida, criando-lhe diversos constrangimentos no exercício da sua atividade profissional corrente e na consideração de oportunidades profissionais futuras; assim, mesmo quando o lesado não fica impedido de trabalhar e, por isso, não se regista uma perda automática de rendimentos, existe uma perda que se reflete economicamente e que deve ser indemnizada como dano biológico patrimonial/dano patrimonial futuro.
Em suma, o dano biológico abrange um leque alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, compreendendo igualmente a perda ou diminuição de capacidades funcionais que, mesmo não importando uma repercussão negativa no salário ou na atividade profissional do lesado, impliquem ainda assim esforços suplementares no exercício dessa atividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expetável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual (46).
Assim, o facto de não se ter provado que o demandante teve uma efetiva perda de rendimentos pois que, sendo menor, não está ainda integrado no mercado de trabalho, nem aufere proventos , não constituiu qualquer excludente da atribuição do dano biológico, na vertente patrimonial.
No caso, antes propriamente de entrarmos no campo do cálculo do valor indemnizatório do dano biológico, na vertente do dano patrimonial futuro, urge determinar como antecedente lógico se deve dar-se como demonstrado o referido dano, na medida em que a sentença impugnada concluiu pela sua inverificação.
Considerando pois que, na situação em apreço nos autos, ficou provado que, em consequência das lesões sofridas, o Autor I. G. apresenta sequelas permanentes, ficando a padecer de um défice funcional permanente da integridade física-psíquica em 3 pontos, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais, (correspondendo as sequelas ao Código da tabela Na0310 labilidade da atenção, lentificação ideativa, dificuldades de memorização, fatigabilidade intelectual, intolerância ao ruído, instabilidade do humor, persistindo para além de 2 anos), temos como apurado que o autor sofreu uma incapacidade funcional, que afecta a sua integridade física-psíquica (dano-evento), impedindo-o de exercer determinada actividade corporal ou sujeitando-a a exercitá-la de modo deficiente ou doloroso, dano esse que pode gerar danos-consequência, os quais têm de ser juridicamente protegidos e quantificados (47).
Até porque se considera que o lesado que fica a padecer de determinada incapacidade parcial geral (IPG) – sendo a força de trabalho um bem patrimonial, uma vez que propicia rendimentos, a incapacidade parcial geral é, consequentemente, um dano patrimonial – tem direito a indemnização por danos futuros, desde que sejam previsíveis, quer acarrete uma diminuição efectiva do ganho laboral, quer implique apenas um esforço acrescido para manter os mesmos níveis dos seus proventos profissionais, exigindo tal incapacidade um esforço suplementar, físico ou/e psíquico, para obter o mesmo resultado (48).
Apurado pois o dano biológico, na vertente de dano patrimonial futuro, deparamo-nos, porém, com um obstáculo processual à imediata quantificação do respetivo valor indemnizatório.
Isto porque, tendo sido formulado pedido genérico (ilíquido), para obter a condenação em indemnização fixa (poderá ocorrer condenação no que se vier a liquidar), haverá que previamente proceder-se à liquidação. É isso que resulta do n.º 2 do art. 556º do CPC, donde decorre que a determinação do objeto a que o pedido respeita, nos casos de universalidade e da indemnização por facto ilícito, faz-se mediante o incidente de liquidação, a deduzir na ação declarativa até ao momento do início da discussão da causa (art. 358º, n.º 1, do CPC).
Assim, se, na pendência da ação de condenação, o autor não deduzir o incidente de liquidação até ao início da discussão da causa, ou não forem apurados os elementos que permitiriam a determinação, o tribunal condenará, também genericamente, no que vier a ser liquidado (art. 609º, n.º 2, do CPC), assim remetendo para momento ulterior a determinação a efetuar (49).

Ora, no caso concreto, temos que, no tocante aos peticionados danos patrimoniais futuros, o pedido formulado pelo recorrente I. G. é um pedido genérico ou ilíquido (a condenação das Rés no pagamento ao Autor da “importância que se liquidar em execução de sentença em correspondência com o valor que vier a resultar do apuramento concreto e definitivo da sua situação clínica consequente do acidente sofrido”). Em momento algum do processo se vê que tenha sido requerida a liquidação quanto ao pedido ilíquido, o que a ocorrer teria que ser feito nos termos do art. 358º do CPC.
Sem um pedido concreto/liquidado o tribunal não conhece o seu limite para condenar (não sabe se está a respeitar ou não o princípio do pedido).
Assim, não tendo o dano patrimonial futuro sido objecto de liquidação, está vedado a este tribunal substituir-se ao próprio autor e fixar, sem qualquer base de referência líquida (pelos interessados), o valor da respectiva compensação.
Efectivamente, conforme resulta do disposto no n.º 2 do art. 609º do CPC, tendo o autor formulado um pedido genérico (pedindo que o seu quantum seja relegado para liquidação “em execução de sentença”), e inexistindo liquidação de tal pedido genérico em momento prévio à prolação da sentença na acção declarativa (liquidação esta a cargo do lesado/credor/interessado), o tribunal, por desconhecer os concretos limites da pretensão do autor (aos quais terá que se sujeitar, nos termos do n.º 1 do mesmo artigo), tem de remeter para posterior liquidação o valor de tal pedido (50).
Nesta conformidade, mostrando-se apurado o reclamado direito objeto de apreciação, além de se revogar nesta parte a sentença, impõe-se também relegar a respectiva indemnização para liquidação em incidente de liquidação posterior ou subsequente à condenação, nos termos do art. 358º, n.º 2, do CPC.
Por conseguinte, procede nesta parte a sentença.
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2.6. Das custas

De acordo com o disposto no art. 527º, n.º 1, do CPC, a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito, acrescentando o n.º 2 que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
Como a apelação foi julgada parcialmente procedente, no tocante ao pedido genérico formulado, pelo autor I. G., sob a al. b), julgado procedente em termos de condenação genérica, as custas, nessa parte, ficam a cargo das Rés vencidas (X Imobiliária, Lda e W, Companhia de Seguros de Vida, S.A.).
Quanto ao mais, na parte em que a apelação improcedeu, as custas ficam a cargo dos apelantes.
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Síntese conclusiva:

I - Em matéria de responsabilidade civil extra-contratual, a regra geral que decorre do princípio geral enunciado no art. 483.º, n.º 1, do Código Civil é a de que beneficiário da indemnização é, em regra, apenas o titular do direito violado ou do interesse imediatamente lesado, o que exclui o terceiro, que só mediata, reflexa ou indiretamente foi prejudicado.
II - Excepcionalmente, a lei considera também com direito a indemnização certas pessoas que só mediatamente são afetadas pelo facto lesivo, como seja nos casos previstos e regulados nos arts. 495.º (no que se reporta a certos danos patrimoniais que terceiros sofram em caso de morte ou lesão corporal de outrem) e 496.º, n.ºs 2, 3 e 4 (versando sobre danos não patrimoniais suportados por alguém em consequência - ou reflexo - de lesão directamente sofrida por outrem), ambos do Cód. Civil.
III - A interpretação fixada pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 6/2014, de 09-01-2014 para os arts. 483.º, n.º1 e 496.º, n.º 1 do Código Civil, no tocante à sua delimitação objetiva (danos incluídos na indemnização), tem «como pressuposto que os danos do lesado sejam particularmente graves e que tenham determinado no outro sofrimento muito relevante».
IV - Não se apurando que as lesões que sofreu o sinistrado foram gravíssimas, nem que tais danos tenham causado nos seus pais um sofrimento intenso ou particularmente relevante, não têm estes direito ao ressarcimento por danos não patrimoniais («reflexos»).
V - O facto de o lesado ser estudante e não exercer, à data do facto lesivo, qualquer profissão remunerada não afasta a existência de dano patrimonial pela incapacidade funcional de que o mesmo ficou a padecer em consequência da lesão, pois que esta afetará o lesado para o resto da vida, podendo criar-lhe diversos constrangimentos na consideração de oportunidades profissionais futuras.
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VI. Decisão

Perante o exposto acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação, e, em consequência, decidem:
Revogar a sentença na parte em que julgou improcedente o pedido formulado sob a al. b), e, em sua substituição, condenar as rés, X Imobiliária, Lda e W, Companhia de Seguros de Vida, S.A. no pagamento, solidário, ao autor I. G. da importância a título de danos patrimoniais futuros, a liquidar em incidente de liquidação subsequente à condenação, nos termos do art. 609º, n.º 2, do CPC.
Quanto ao mais, manter e confirmar a sentença recorrida.
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Custas da acção [no tocante ao pedido ilíquido formulado sob a al. b)] e da apelação (também quanto a esse fundamento atinente ao pedido ilíquido) a cargo das Rés, X Imobiliária, Lda e W, Companhia de Seguros de Vida, S.A.;
Quanto ao mais, na parte em que a apelação improcede as custas ficam a cargo dos apelantes/autores.
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Guimarães, 7 de abril de 2022

Alcides Rodrigues (relator)
Joaquim Boavida (1º adjunto)
Paulo Reis (2º adjunto)



1. Cfr. Ac. da RP de 24/01/2018 (relator Nélson Fernandes), in www.dgsi.pt. e Paulo Ramos Faria e Ana Luísa Loureiro, in Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, vol. I, 2ª ed., 2014, Almedina, pp. 598/601.
2. Cfr. Ac. do STJ de 17/10/2017 (relator Alexandre Reis), Acs. da RG de 4/10/2018 (relatora Eugénia Cunha) e de 5/04/2018 (relatora Eugénia Cunha), todos disponíveis in www.dgsi.pt. e Ac. do STJ de 1/4/2014 (relator Alves Velho), Processo 360/09, Sumários, Abril/2014, p. 215, https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/sumarios-civel-2014.pdf.
3. Cfr. Ac. do STJ de 28/02/2013 (relator João Bernardo), in www.dgsi.pt.
4. Cfr. Antunes Varela, R.L.J., Ano 122, p. 112.
5. Cfr., entre outros, Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, vol. II, 2015, Almedina, p. 371 e António Júlio Cunha, Direito Processual Civil Declarativo, 2ª ed., Quid Juris, p. 364.
6. Cfr. Ac. do STJ de 8/11/2016 (relator Nuno Cameira), in www.dgsi.pt.
7. Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª ed., Almedina, p, p. 713.
8. Cfr. Ac. do STJ de 30/04/2014 (relator Mário Belo Morgado), in www.dgsi.pt. e Cardona Ferreira, Guia de Recursos em Processo Civil, 6ª ed., Coimbra Editora, pp. 69/70.
9. Conclusões 4ª e 5ª.
10. Que aqui se relembra: condenação das Rés no pagamento ao Autor I. G. da importância que se liquidar em execução de sentença em correspondência com o valor que vier a resultar do apuramento concreto e definitivo da sua situação clínica consequente do acidente sofrido.
11. Essa qualificação é expressamente feita pelos recorrentes na Conclusão 5ª [«(…) o que significa que, ao decidir assim, incorreu a sentença em (…) (ou em erro de julgamento)].
12. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. 1.º, 10ª ed., Almedina, 2018, pp. 600/601.
13. Cfr., entre outros, Acs. do STJ de 8/03/2012 (relator Raul Borges) e de 3/11/2016 (relator António Piçarra), in www.dgsi.pt.; Antunes Varela, obra citada, pp 620/625, Jorge Ribeiro de Faria, Direito das Obrigações, Vol. I, 2ª ed., Atualizada e ampliada por Miguel Pestana de Vasconcelos e Rute Teixeira Pedro, Almedina, p. 498, Gabriela Páris Fernandes, Comentário ao Código Civil - Direito das Obrigações – Das Obrigações em Geral, anotação ao artigo 495º, Universidade Católica Editora, 2018, p. 343, Abrantes Geraldes, Temas de Responsabilidade Civil, II vol., Indemnização dos danos reflexos, 2ª ed., p. 15 e ss..
14. Na decorrência do enunciado princípio, não são indemnizáveis os danos vulgarmente chamados “reflexos” "indiretos" ou "por ricochete" que, fora dos casos previstos nos referidos arts. 495º e 496º do CC, sejam indirectamente causados a terceiros (cfr. Acs. do STJ de 17/09/2009 (relator João Camilo) e de 8/03/2012 (relator Raul Borges), in www.dgsi.pt. e Abrantes Geraldes, Temas de Responsabilidade Civil, II vol., Indemnização (…), p. 24. Na verdade, “o nosso sistema de responsabilidade civil não permite a ressarcibilidade delitual de danos patrimoniais puros, salvo quando exista uma disposição de protecção que tenha por objecto a tutela de interesses primariamente patrimoniais; onde esta não exista, a regra da irressarcibilidade delitual deste tipo de prejuízos deverá manter-se” (cfr. Maria João Pestana de Vasconcelos apud Ac. da RC de 25-02-2014 (relator Teles Pereira), in www.dgsi.pt.
15. Cfr. Direito das Obrigações, 6.ª ed., Almedina, 1994, p. 509.
16. Cfr. Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite, “A Equidade na Indemnização dos Danos não Patrimoniais”, Dissertação com vista à obtenção do grau de Mestre em Direito, Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, Outubro 2015, p. 26, in https://run.unl.pt/bitstream/10362/16261/1/Leite_2015.pdf.
17. Cfr., no sentido de ter legitimidade para peticionar a indemnização pelos danos patrimoniais emergentes da prestação de assistência ao sinistrado também o familiar que prestou assistência, Acs. do STJ de 2/03/2011 (relator Nuno Cameira) e de 06/12/2012 (relator Abrantes Geraldes); em sentido diverso, considerando que apenas o ofendido direto tem legitimidade para pedir tal indemnização, os Acs. do STJ de 14/10/2010 (relator Barreto Nunes) e de 11/12/2012 (relator Moreira Alves), in www.dgsi.pt.
18. Cfr. Abrantes Geraldes, Temas de Responsabilidade Civil, II vol., Indemnização (…), p. 18.
19. Cfr. Antunes Varela e Pires de Lima, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª ed., 1987, Coimbra Editora, p. 498.
20. Art. 60º da petição inicial.
21. Cfr. Estudo citado, p. 27.
22. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, (…), p. 601.
23. Cfr. Código Civil Anotado, Vol. I, (…), p. 499.
24. Cfr. Ana Mafalda Castanheira Neves de Miranda Barbosa, Lições de Responsabilidade Civil, Principia, p. 304.
25. Cfr. Ac. do STJ de 6/07/ 2000, CJSTJ, Ano VIII – T. II, 2000, pp. 145.
26. Cf. Acórdão para uniformização da jurisprudência n.º 4/2002, Diário da República, I série-A, n.º 146, de 27 de Junho de 2002 (Revista ampliada n.º 1508/2001 da 1ª Secção).
27. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, (…), p. 601 e Pedro Branquinho Ferreira Dias, O Dano Moral (na Doutrina e na Jurisprudência), Almedina, p. 23.
28. Cfr. Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. I, 2ª ed., Almedina, 2002, p. 316, Ana Mafalda Castanheira de Miranda Barbosa, Principia, 2017, p. 301 e Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, A reparação de danos emergentes de Acidentes de Trabalho, in Temas Laborais Estudos e Pareceres, Almedina, 2006, p. 33.
29. Cfr. Ac. do STJ de 16/03/2017 (relatora Maria da Graça Trigo), in www.dgsi.pt.
30. Cfr., Ac. do STJ de 13/07/2017 (relator Manuel Tomé Soares Gomes), in www.dgsi.pt.
31. Cfr. Código Civil Anotado, Vol. I, (…), p. 501; em sentido convergente, Inocêncio Galvão Teles, Direito das Obrigações, 7.ª edição, p. 387, e Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. I, 2ª ed., Almedina, 2002, p. 318.
32. Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, (…), p. 608.
33. Cfr. Ac. do STJ de 24/04/2013 (relator Pereira da Silva), in www.dgsi.pt.
34. Cfr. Nuno Manuel Pinto Oliveira Pinto, Princípios de Direito dos Contratos, Coimbra Editora, p. 6987.
35. Cf. Acórdão para uniformização da jurisprudência n.º 4/2002, Diário da República, I série-A, n.º 146, de 27 de Junho de 2002 (Revista ampliada n.º 1508/2001 da 1ª Secção).
36. Cfr. Ac. do STJ de 25/06/2002, CJSTJ, Ano XX, T. II – 2002, pp. 128/135.
37. Cfr. Acs. do STJ de 22/02/2017 (relator Lopes do Rego) e de 29/06/2017 (relator Lopes do Rego), in www.dgsi.pt.
38. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. 1, (…), p. 580.
39. Cfr., entre outros, os Acs. do STJ de 2/06/2016 (relator Manuel Tomé Soares Gomes) e de 21/03/2013 (relator Salazar Casanova), disponíveis in www.dgsi.pt.
40. Cfr. Ac. do STJ de 6/07/2004 (relator Ferreira de Almeida) e Ac. da RL de 22/11/2016 (relator Luís Filipe Pires de Sousa), in www.dgsi.pt.
41. Entre nós, existem três correntes essenciais no que concerne à categorização do dano biológico: i) uma parte da jurisprudência (maioritária) configura-o como dano patrimonial, muitas vezes reconduzido ao dano patrimonial futuro; ii) outra corrente admite que tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial tal como compensado a título de dano moral, segundo uma análise casuística, verificando se a lesão originou, no futuro, durante o período ativo do lesado ou da sua vida e, só por si, uma perda da capacidade de ganho ou se traduz, apenas, numa afetação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade, entendendo-se ainda que a mera necessidade de um maior dispêndio de esforço e de energia, mais traduz um sofrimento psicossomático do que, propriamente, um dano patrimonial [cfr. Ac. do STJ de 27/10/2009 (relator Sebastião Póvoas), in www.dgsi.pt.]; iii) uma terceira posição propugna que o dano biológico é um dano base ou dano-evento, que é sempre ressarcível, como dano autónomo, independentemente do seu específico e concreto enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial ou do dano não patrimonial [cfr. Acs. do STJ de 20/05/2010 (relator Lopes do Rego) e de 10/10/2012 (relator Lopes do Rego), ambos in www.dgsi.pt.]. Para mais desenvolvimentos, ver o Ac. da RL de 22.11.2016 (relator Luís Filipe Pires de Sousa), in www.dgsi.pt.; na doutrina, Maria da Graça Trigo, Obrigação de Indemnização e dano biológico, in Responsabilidade Civil, Temas Especiais, Universidade Católica Editora, pp. 69/86; Rita Mota Soares, in “Poderes/Deveres da Relação na Reapreciação da Matéria de Facto. O Dano Biológico Quando da Afetação Funcional não Resulte Perda da Capacidade de Ganho – O Princípio da Igualdade”, Revista Julgar, n.º 33, 2017, pp. 111-135.
42. Cfr., entre outros, Acs. do STJ de 04/06/2015 (relatora Maria dos Prazeres Beleza), de 7/04/2016 (relatora Maria da Graça Trigo), de 29/10/2020 (relator Nuno Pinto Oliveira), de 6/05/2021 (relatora Margarida Blasco) todos disponíveis in www.dgsi.pt. e Ac. do STJ de 23/04/2020 (relatora Catarina Serra), proc. n.º 1456/16.5T8VCT.G1.S1, https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:1456.16.5T8VCT.G1.S1/
43. Com exceção da corrente que defende que a ofensa à integridade física e psíquica da vítima, quando dela não resulte perda da capacidade de ganho, apenas tem expressão nos danos não patrimoniais, para as demais correntes este dano, na vertente patrimonial, deve ser calculado como se de um dano patrimonial futuro se tratasse: há uma perda de utilidade proporcionada pelo bem corpo, nisso consistindo o prejuízo a indemnizar (cfr. Rita Mota Soares, estudo e obra citados, p. 122).
44. Aliás, atualmente não oferece controvérsia que o facto de o lesado não exercer, à data do facto lesivo, qualquer profissão remunerada não afasta a existência de dano patrimonial pela incapacidade funcional de que o mesmo ficou a padecer em consequência dessa lesão, compreendendo-se neste as utilidades futuras e as simples expectativas de aquisição de bens, sendo que a força de trabalho de uma pessoa é um bem, sem dúvida, capaz de propiciar rendimentos - cfr. Acs. do STJ de 12/01/2017 (relatora Maria dos Prazeres) e de 10/11/2016 (relator Lopes do Rego), ambos in www.dgsi.pt. Como se salienta no Ac. do STJ de 25/11/2009 (relator Raúl Borges), in www.dgsi.pt., “neste leque, cingindo-nos agora à incapacitação para o trabalho, encontrar-se-ão os indivíduos lesados que se encontram fora do mercado do trabalho, da vida activa laboral, e considerando a duração cronológica de vida, seja a montante – caso das crianças e dos jovens, ainda estudantes, ou não, mas que ainda não ingressaram no mundo laboral –, seja, a juzante, com os reformados/aposentados, que dele já saíram, sem esquecer os que estando fora destes parâmetros temporais, situando-se pela sua idade no período de vida activa, estão porém fora daquele mercado, porque desempregados (…)”.
45. Cfr. Ac. do STJ de 10/11/2016 (relator Lopes do Rego), in www.dgsi.pt.
46. Cfr. Acs. do STJ de 2/06/2016 (relator Manuel Tomé Soares Gomes), de 12/01/2017 (relatora Maria dos Prazeres Beleza) e de 31/05/2012 (relatora Maria dos Prazeres Beleza), disponíveis in www.dgsi.pt.
47. Como já se assinalou, o facto de o lesado não exercer qualquer actividade da qual provenham rendimentos, não é impeditiva da ressarcibilidade deste dano, de cariz patrimonial. Esta orientação tem sido acolhida em vários arestos do Supremo Tribunal de Justiça, ao ser confrontado com casos em que os lesados eram estudantes, à data do acidente, como seja, por exemplo, os Acórdãos do STJ de 09/07/2014 (relator Alves Velho), de 08/05/2012 (relator Nuno Cameira), de 19/04/2012 (relator Serra Baptista) e de 30/09/2010 (relatora Maria Pizarro Beleza), ambos in www.dgsi.pt.
48. Cfr. Ac. do STJ de 19.04.2012 (relator Serra Baptista), in www.dgsi.pt.
49. Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª ed., Almedina, p. 510 e José Lebre de Freitas, A Acção Declarativa à luz do Código de Processo Civil de 2013, 4.ª ed., Gestlegal, p. 49.
50. Cfr., neste sentido, Ac. do STJ de 19/12/2006 (relator Sebastião Póvoas), Ac. da RG de 21.01.2016 (relator Jorge Seabra) e Ac. da RE de 13/03/2014 (relator Acácio Neves), ambos disponíveis in www.dgsi.pt.; Miguel Teixeira de Sousa, As Partes, o Objecto e a Prova na Acção Declarativa, Lex, 1995, p. 126-127.