Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ANTERO VEIGA | ||
Descritores: | DEVER DE NÃO CONCORRÊNCIA DEVER DE LEALDADE PODER DISCIPLINAR PODERES DE REPRESENTAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 10/18/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | SECÇÃO SOCIAL | ||
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Sumário: | I - O código do trabalho não contém qualquer norma exigindo que a entidade empregadora comunique ao trabalhador a nomeação de instrutor, nem norma sob o modo de delegação do exercício do poder disciplinar. II - Se ao trabalhador se colocarem dúvidas sobre a existência ou latitude dos poderes do representante do empregador que subscreve a nota de culpa, deve nos termos do artigo 260º do CC, solicitar a comprovação dos mesmos. III - Durante a execução do contrato de trabalho, ainda que o trabalhador esteja suspenso no âmbito de um processo disciplinar, vigora a obrigação de não concorrência, corolário do dever de lealdade. IV - Para que se verifique a violação do dever, basta o exercício e atividade concorrencial potencialmente desviante da clientela, não sendo necessária a demonstração de um prejuízo efetivo. V - Viola tal dever o trabalhador que nesses condições vai prestar trabalho numa carpintaria, ramo de atividade da sua empregadora, situada a cerca de 9 Km do estabelecimento desta. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães. José … intentou a presente ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra António…, mediante formulário legal, alegando ter sido despedido em 19/6/2017 e juntando comunicação escrita da decisão de despedimento. Foi designada e teve lugar uma audiência de partes, frustrando-se a conciliação das partes. O R. empregador deduziu o seu articulado de motivação do despedimento individual, com fundamento em facto imputável ao trabalhador, discriminado os factos que em seu entender integram a prática pelo trabalhador de várias infrações disciplinares e constituem justa causa de despedimento (fls. 14 a 17) e que se traduzem, em síntese, na execução de trabalhos particulares no tempo e local de trabalho, utilizando recursos do empregador sem autorização para tal e no exercício de atividade profissional para empresa concorrente durante o período de suspensão preventiva. Foi junto aos autos o procedimento disciplinar. O trabalhador contestou conforme fls. 74 a 87, invocando a invalidade do procedimento disciplinar com base na falta de decisão de despedimento proferida pelo empregador, pois a que lhe foi notificada foi proferida pelo Senhor Instrutor do processo; mais invocou a ilicitude do despedimento por falta de motivo justificativo, impugnando no essencial, os factos alegados pelo R. empregador e alegando que apenas efetuou um pequeno trabalho para si próprio, num curto período em que nada tinha para fazer, com a prévia autorização do R. e que durante a suspensão, a conselho médico e para evitar uma eminente depressão, passou a ajudar um amigo, de forma gratuita. Mais alegou que o procedimento disciplinar não passou de um expediente infundado do empregador para o despedir, concretizando uma intenção que já havia manifestado junto de terceiros. Defende por fim que a existir responsabilidade disciplinar do A., o despedimento não se mostra adequado, proporcional e justificado. Em reconvenção, pede a condenação do R.: “a. Na reintegração do Autor no seu posto de trabalho, sem qualquer prejuízo da sua categoria e antiguidade, nos termos do artº 389º, 1, al. b), CT, salvo no caso previsto no art.º 392º, nº 1, CT, com as consequências a que alude o respetivo nº 3. b. Pagar ao Autor as retribuições mensais que deixou de auferir desde a data do despedimento (19-06-2017) e até ao trânsito em julgado da decisão judicial que a declare, bem como os respetivos subsídios de férias e de Natal, sendo devidas nesta data, por já vencidas, as retribuições correspondentes a 11 dias do mês de junho, meses de julho, agosto, setembro e 10 dias de outubro de 2017, num total de 2.090,00 €, bem como a quantia de 395,00 e a título de duodécimos de subsídio de férias e de natal. c. Pagar ao Autor a quantia de 890,00 € a título de dias uteis de férias vencidas até esta data e não gozadas (férias vencidas em 1-1-2017 e proporcionais correspondentes ao trabalho prestado no ano de 2017). d. Pagar juros de mora sobe tais quantias, liquidados á taxa legal, desde o momento da constituição em mora e até integral e efetivo pagamento.” O R. não respondeu. Realizado o julgamento foi proferida a seguinte decisão: 1) Julgar totalmente improcedente, por não provada, a presente ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento e, em consequência, absolver o R. empregador … do pedido contra si formulado pelo A. trabalhador José … 2) Julgar parcialmente procedente, por em igual medida provada a reconvenção e, em consequência, condenar o R. empregador … a pagar ao A. trabalhador José … a quantia total de €816,42 (oitocentos e dezasseis euros e quarenta e dois cêntimos) a título de retribuição de férias não gozadas vencidas em 1/1/2017 e de retribuição de um período de férias proporcional ao tempo de trabalho prestado no ano da cessação…” *** - Inconformado autor interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões:1ª. Salvo o devido respeito, o Autor, ora recorrente, não se conforma com a douta decisão recorrida, que julgou improcedente a ação e parcialmente procedente a reconvenção, condenando o Réu a pagar apenas a quantia de 816,42 € a título de retribuição de férias não gozadas e vencidas em 1/1/2017 e de retribuição de um período de férias proporcional ao tempo de trabalho prestado o ano da cessação, sendo fundamentos: 2ª. A douta sentença deu como provado sob o ponto 2 – cfr. fls 4 – que “2- Por carta datada de 16/6/2017, assinada pelo Exmo. Instrutor do processo disciplinar, Sr. Dr. A…, Advogado, e remetida ao trabalhador por correio registado com aviso de receção, por este recebida em 19/06/2017, cuja cópia consta de fls. 62, foi o A. notificado da decisão de despedimento, carta essa que é do seguinte teor …”. 3ª. Em consequência considerou que – cfr. fls 11, parte final a 13, ponto 2.1 - tal facto não era suscetível de tornar ilícito o despedimento por invalidade do procedimento disciplinar, com o fundamento de que “A decisão de despedimento foi emitida pelo representante do R., pelo que, nos termos do já citado art. 258º do Código Civil, produziu os seus efeitos na esfera jurídica do R., sendo igualmente eficaz relativamente ao A.” 4ª. O recorrente não se conforma com tal douto entendimento, considerando que, se a instauração e prossecução do processo disciplinar constitui ato de mera administração e deve ser considerado com ato de gestão normal, nos termos previstos no artº 356º, nº 1, do Código do Trabalho, já não pode ser assim considerado para efeitos de prolação da decisão final de despedimento, sendo tal o que decorre do disposto nos artºs 98ºº, 328º, nº 1, 329º, nº 4, 357º, nº 1 e 382º, nº 2, al. d), do CT, que atribuem a titularidade do poder disciplinar em exclusivo ao empregador. 5ª. Donde decorre que do facto da decisão de despedimento ter sido formulada pelo Senhor Instrutor do processo disciplinar resulta uma evidente falta de decisão do empregador, que acarreta a ilicitude do despedimento por invalidade do procedimento disciplinar nos termos do 382º, nº 2, al. d), do CT, o que deverá reconduzir á revogação da douta sentença, que respeitosamente se requer. ACRESCE QUE: 6ª. Relativamente aos factos ocorridos em 20-02-2017 e com relevância para os mesmos, dados como provados sob os nºs 3, 10, 11, 14, 16 e 17, a douta sentença considerou, acertadamente, que tais factos não eram suscetíveis de, por si, reconduzir ao despedimento do Autor, impondo outra medida sancionatória que preservasse o vínculo laboral – cfr. fls. 16. 7ª. TODAVIA, no que diz respeito aos factos dados como provados sob os nºs 12, 13 e 15, relativos á atividade que o recorrente prestou na carpintaria de M… durante o período de suspensão preventiva, a douta sentença considerou que – cfr. fls 16 - Tal facto “comporta uma grave violação do dever guardar lealdade ao empregador, pelo facto do A., aproveitando a suspensão preventiva decretada pelo empregador, ter prestado trabalho a um concorrente deste“, referindo ainda, a este propósito a fls 15 que “Quanto à necessidade de se manter ocupado, sempre poderia o A. ter optado por outro tipo de atividade, que não implicasse concorrência direta com o seu empregador.”. 8ª. Donde concluiu que “Tal factualidade revela que o A. violou elementares deveres impostos ao trabalhador pela relação laboral” – cfr. fls 14 – e que “Conclui-se, assim, pelo preenchimento de todos os requisitos do conceito de justa causa e, logo, pela licitude do despedimento promovido pelo R., cuja decisão está devidamente fundamentada.” – cfr. fls. 17. 9ª. Salvo o devido respeito, o Autor não se conforma com tal douto entendimento, considerando totalmente infundamentada e indevida a afirmação, conclusão e presunção de que, durante o tempo em que esteve suspenso preventivamente, o Autor exerceu qualquer atividade diretamente concorrente com a do empregador, Réu nos autos. 10ª. Tal falta de fundamento de tal presunção resulta notoriamente de: . Como consta nos autos, a sede e local da carpintaria do Réu se situar em … aldeia do Concelho de Bragança e, por sua vez, o local onde o Autor prestou tal atividade ter ocorrido na carpintaria de M... , sita na Av. …, em Bragança – cfr. facto 12. Da motivação da matéria de facto – cfr. fls 6 a 9 / ponto 1.4 -, donde resulta que nenhuma das testemunhas alude minimamente a que o Autor exercesse atividade diretamente concorrente com a do Autor. 11ª. Ficando por isso por demonstrar ou indiciar minimamente que as duas carpintarias são diretamente concorrenciais, o que contraria aquela conclusão vertida na douta sentença, de que o Autor exerceu durante a suspensão preventiva uma atividade diretamente concorrente com a do Réu. 12ª. Neste pressuposto, tendo em conta os factos dados como provados nos pontos 1, 12, 13 e 15 da resposta á matéria de facto, bem como a respetiva fundamentação constante do ponto 1.4, não pode senão concluir-se que, tendo sido suspenso preventivamente em 21-2-2017 (cfr. facto 1); o Autor ficou muito nervoso e com perturbações de sono e irritabilidade, o que o levou a recorrer a consulta médica, tendo sido aconselhado pelo médico a manter alguma ocupação e não permanecer em casa (facto 15); após o que, a partir de 21-3-2017 o levou a prestar atividade na carpintaria de M... , situada em Bragança (factos 12 e 13), em comportamento que não pode deixar de se considerar justificado e não lesivo de qualquer interesse do Réu / empregador. 13ª. Tendo em conta tais factos provados e o depoimento prestado pelo próprio dono da carpintaria, M... (conforme consta de fls 8, ponto 1.4 /fundamentação da resposta à matéria de facto), também resulta inequívoco que o Autor não auferiu qualquer retribuição por tal atividade. 14ª. Em consequência e reiterando-se que (facto 3) o Autor foi admitido ao serviço do R. no mês de fevereiro do ano de 2004, contando á data do despedimento com mais de treze anos de antiguidade; que (facto 16), em final de 2014 o Réu manifestou perante terceiro que andava com vontade de despedir o Autor; e que (facto 17) o Autor não tem qualquer antecedente disciplinar, CONSIDERA-SE: . QUE os comportamentos dados como provados não assumem gravidade, nem tiveram consequências tais, que tivessem tornado imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho (de onde decorre que a douta sentença deveria ter concluído da mesma forma que a fls 16, ou seja, que tal facto é insuscetível de poder reconduzir à formulação de um juízo de impossibilidade prática da manutenção do vínculo laboral); e, . QUE o Réu não atendeu, no quadro de gestão da empresa, nem ao grau de lesão dos interesses do empregador, nem ao caráter das relações entre as partes, nem às circunstâncias atenuantes, designadamente a antiguidade do trabalhador e a ausência de antecedentes disciplinares. 15ª. Donde resulta que o despedimento do Autor não foi adequado, razoável, proporcional e justificado à sua culpabilidade e ignorou a existência de um quadro de sanções disciplinares a determinar em função da gravidade da violação de deveres aborais por parte do trabalhador, nos termos do artº 328º, CT. 16ª. O que deverá reconduzir ao reconhecimento da ilicitude do despedimento por falta de motivo justificativo, nos termos dos artºs 381º, al. b), CT, por violação do disposto nos artºs 351º, nºs 1 e 3 e 357º, nº 4, CT, com as legais consequências que implicam a procedência total da reconvenção. Sem contra-alegações. Neste tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência no que se refere à prova e improcedência quanto ao mais. Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos há que conhecer do recurso. *** Factualidade:1.1 Factos provados por confissão ou admitidos por acordo nos articulados ou por documento: 1- Por carta datada de 21/2/2017, assinada pelo Réu, cuja cópia consta de fls. 23, foi o trabalhador informado de que se encontrava suspenso da sua atividade laboral a partir daquela data, carta essa que é do seguinte teor: Ex.mo Senhor: José … Rua … … Bragança Assunto: Processo prévio de inquérito Ex.mo Senhor: Na sequência dos factos ocorridos no dia 20-02-2017 e do que lhe foi comunicado verbalmente na manhã do dia de hoje 21-02-2017, informo e reitero que se encontra suspenso da atividade laboral. A saber, os factos são os seguintes: a-) Ontem, segunda feira dia 20 foi-lhe distribuído o trabalho da uma cliente. b-) Não obstante andou a fazer trabalho pessoal para si durante o horário de trabalho. c-) Gastou material, equipamentos e energia da entidade patronal. do) O trabalho da cliente não foi concluído e estava danificado. e-) Tudo isto causou prejuízo considerável. Assim e como já referido, decidiu esta entidade empregadora mandar proceder a um inquérito para apuramento integral dos factos e instauração de um eventual processo disciplinar. Informa-se ainda que foi nomeado como instrutor do processo o senhor Dr. A..., advogado com escritório na Av. … em Bragança. Não sendo ainda possível elaborar a nota de culpa, dada a gravidade dos factos e para uma correta investigação dos mesmos, é inconveniente que se mantenha ao serviço enquanto decorrer a instrução do processo, pelo que fica suspenso preventivamente de toda a atividade laboral e não deverá apresentar-se ao serviço até ordem em contrário, contudo sem perda de retribuição, pois continuará a ter direito ao salário. Com os melhores cumprimentos. Bragança, 21 de fevereiro de 2017.” 2- Por carta datada de 16/6/2017, assinada pelo Exmo. Instrutor do processo disciplinar, Sr. Dr. A..., Advogado, e remetida ao trabalhador por correio registado com aviso de receção, por este recebida em 19/06/2017, cuja cópia consta de fls. 62, foi o A. notificado da decisão de despedimento, carta essa que é do seguinte teor: Ex.mo Senhor: José... Rua … … Bragança António…, sua entidade patronal, vem comunicar a V.ª Ex,ª que, findo que se encontra o processo disciplinar contra si instaurado, decidiu despedi-lo com justa causa. Tal decisão implica a cessação do contrato de trabalho existente, com efeitos a partir da receção da presente comunicação tudo como melhor consta da decisão que se junta em anexo e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos. Após a receção desta carta pode passar pela contabilidade da empresa a fim de se proceder ao acerto de contas e receber as importâncias que lhe são devidas. Sem mais de momento, com os nossos melhores cumprimentos. Bragança, 16 de junho de 2017 3- O A. foi admitido ao serviço do R. no mês de fevereiro do ano de 2004. 4- Tem a categoria profissional de carpinteiro lixador de 2.ª. 5- Cumpre o horário laboral da empresa. 6- O R. apresentou queixa-crime contra o A., pelos factos descritos na nota de culpa sob os nºs 3 a 5, tendo o respetivo inquérito sido arquivado. 7- Como sempre ocorreu na empresa, as férias dos trabalhadores eram gozadas invariavelmente entre os períodos de 15 a 31 de agosto e de 15 a 31 de dezembro de cada ano. 8- O Autor não gozou qualquer dos 22 dias uteis de férias vencidas em 1-1-2017, como não gozou qualquer dos proporcionais correspondentes ao ano de 2017. 1.2 Factos provados da matéria de facto controvertida: 9- O A. auferia o vencimento base de 557,00 €. 10- No dia 20-02-2017, encontrando-se o patrão ausente da carpintaria, o trabalhador tinha a incumbência, além do mais, de pintar uns degraus em madeira, que não concluiu e dois deles ficaram danificados por terem tombado. 11- Nesse dia, o trabalhador ocupou parte da tarde a executar trabalho próprio, usando máquinas da empresa, gastando verniz e energia elétrica, sem autorização para tal. 12- O trabalhador encontrava-se suspenso de funções, mas trabalhava na carpintaria de M..., sita na Av. ..., em Bragança. 13- O que aconteceu pelo menos durante o mês de março, após o dia 21/3/2017, durante o mês de abril e durante a primeira quinzena de maio de 2017. 14- O Autor envernizou um tampo de madeira da sua propriedade, com cerca de 20 cm de diâmetro. 15- Após ter sido suspenso da sua atividade em 21-2-2017, o Autor ficou muito nervoso e com perturbações de sono e irritabilidade, o que o levou a recorrer a consulta médica, tendo sido aconselhado pelo médico a manter alguma ocupação e não permanecer em casa. 16- Em final de 2014 o Réu manifestou perante terceiro que andava com vontade de despedir o A. 17- O Autor não tem qualquer antecedente disciplinar. *** Conhecendo do recurso:Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente. Questões colocadas: - Falta de decisão de despedimento por parte do empregador – falta de poderes do instrutor do procedimento disciplinar. - Verificação da justa causa – inexistência de concorrência desleal. - Matéria de facto – invocação de que o Autor não auferiu qualquer retribuição por tal atividade. *** Vejamos quanto ao erro julgamento quanto à falta de decisão de despedimento por parte do empregador. O recorrente invoca que do facto de a decisão de despedimento ter sido formulada pelo Instrutor do processo disciplinar resulta uma evidente falta de decisão do empregador, o que torna o despedimento inválido nos termos do artigo 382º, 2, d) do CT. O artigo 98º do CT refere que o poder disciplinar pertence ao empregador. Já o artigo 329.º refere no seu nº 4: 4 - O poder disciplinar pode ser exercido diretamente pelo empregador, ou por superior hierárquico do trabalhador, nos termos estabelecidos por aquele. O recorrente refere o acórdão da RE de 6/9/2011, processo nº 412/10.1 TTSTB.E 1, onde se retira que “a responsabilidade da decisão cabe ao empregador; não se vê que este, no caso em apreciação, tenha transferido tal responsabilidade para o instrutor do processo; não tem esta virtualidade o documento de fls. 130 – cópia de e-mail contendo comunicação remetida pelo Sr. …, na qualidade de gerente da ré, ao Sr. … (dando-lhe conta do propósito de instaurar procedimentos disciplinares a dois trabalhadores, um deles o autor na presente ação, e convidando-o a ser instrutor de ambos os processos) e respetiva resposta, com a aceitação da nomeação de instrutor nos aludidos processos.” Mas os casos podem ser diferentes. A questão dos poderes concedidos ao instrutor é questão de interpretação da vontade da entidade patronal, plasmado no ato de nomeação, pelo que só caso a caso pode verificar-se da existência ou não de poderes e da falta ou não de decisão por parte da empregadora. Consta da primeira missiva enviada ao autor, “Assim e como já referido, decidiu esta entidade empregadora mandar proceder a um inquérito para apuramento integral dos factos e instauração de um eventual processo disciplinar. Informa-se ainda que foi nomeado como instrutor do processo o senhor Dr. A..., advogado com escritório na Av. …, em Bragança…” Na carta datada de 27/3/2017 enviada ao trabalhador, assinada pelo instrutor, consta: “ Serve a presente carta para lhe comunicar, nos temros da lei, que a sua entidade patronal, decidiu instaurar-lhe um processo disciplinar, em virtude… Assim nos temros da legislação laboral em vigor, temos a comunicar-lhe que é nossa intenção proceder ao seu despedimento…” A nota de culpa enviada, igualmente subscrita pelo instrutor, inicia-se nos seguintes temros; “ António… decidiu instaurar processo disciplinar ao seu empregado…” Por carta datada de 11/5/2017 subscrita pelo mesmo instrutor consta: “Serve a presente carta para lhe comunicar…que a sua entidade patronal …decidiu, no âmbito do processo disciplinar em curso, proceder a um aditamento à nota de culpa…” No aditamento, também subscrito pelo instrutor consta; “ Vítor Manuel Morreira… decidiu aditar nota de culpa ao processo disciplinar em curso ao seu trabalhador…” Na comunicação do despedimento, assinada pelo instrutor consta: “ António…, sua entidade patronal, vem comunicar a V.ª Ex,ª que, findo que se encontra o processo disciplinar contra si instaurado, decidiu despedi-lo com justa causa. Tal decisão implica a cessação do contrato de trabalho existente, com efeitos a partir da receção da presente comunicação tudo como melhor consta da decisão que se junta em anexo e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos. Após a receção desta carta pode passar pela contabilidade da empresa a fim de se proceder ao acerto de contas e receber as importâncias que lhe são devidas…” A decisão de despedimento, também assinada pelo instrutor, inicia-se com os seguintes termos: “ António… instaurou um processo disciplinar ao seu empregador…comunicando-lhe… a nota de culpa…” e termina com a seguinte decisão: “Pelo exposto, com os fundamentos supra referidos e nos termos dos artigos 98º e 328º nº 1, al. f) do Código do Trabalho, é de concluir pelo Despedimento com justa causa…” Em momento algum do processo o trabalhador pôs em causa os poderes do instrutor, nem questionou o facto de este agir sempre em nome do empregador, do seu mandante. Todas as missivas foram efetuadas como se a própria entidade empregadora fosse. Como já referido conquanto o poder disciplinar pertence exclusivamente ao empregador (art. 98.º), o seu exercício, pode ser delegado em terceira pessoa, sendo normal tal ocorrer num superior hierárquico, num colega, num causídico. O código do trabalho não contem qualquer norma exigindo que a entidade empregadora comunique ao trabalhador a nomeação de instrutor, nem sob o modo de delegação do exercício do poder disciplinar. A nomeação de instrutor segundo alguns não tem que ser por escrito, referindo que “a lei não exige para o contrato de mandato, em geral, a forma escrita. Para o caso de nomeação como instrutor de um advogado, Ac. RP “17.10.2012. O TRE 06.09.2011 considerou que tratando-se de sociedade comercial, a nomeação de instrutor deve ocorrer por procuração com referência específica aos atos que o instrutor pode praticar, nomeadamente, a prolação da decisão. Tratando-se de delegar poderes para despedir haverá que ter em consideração o disposto no nº 2 do artigo 262º do CC. ( Vd. Diogo Vaz Marecos, em “O despedimento por justa causa, procedimento”, referindo que o despedimento seria ineficaz, a menos que o empregador o ratifique. Ainda o mesmo em, “Despedimento por facto imputável ao trabalhador: a figura do instrutor no pós Lei n.º 23/20121”, revista Julgar, maio de 2016. Como quer que seja, o trabalhador visado pelo processo disciplinar é terceiro em relação ao mandato para execução do poder disciplinar (total ou para atos específicos) que compete à entidade patronal. Se o trabalhador tiver dúvidas quanto aos poderes de representação ou sua latitude, deve solicitar ao instrutor a comprovação dos mesmos, nos termos do artigo 260º do CC. Vd. STJ de 8/11/2006, processo nº 06S2579, disponível na net e TRP 19.12.2012, processo nº 477/11.9TTVRL-A.P1. Assim, estando-se em face de um mandato, em que a autora é terceira, não pode a mesma interpretar a declaração a seu bel prazer, sendo aplicável quanto a si, porque terceira, o disposto no artigo 260º do CC. Se dúvidas tinha quanto aos poderes do instrutor que se apresentou como mandatado e representante, agindo sempre em nome do mandante, poderia ter solicitado a comprovação dos poderes ao representante e o esclarecimento quanto à latitude do mandato. O recorrente sempre foi notificada pelo instrutor, não invocando a qualidade de instrutor, mas referido sempre a entidade patronal, agindo como se fosse esta, agindo em nome desta. Ora o recorrente nunca solicitou esclarecimento sobre a extensão do mandato, apenas invocando a questão em sede de contestação ao articulado motivador. Todos os atos praticados pelo “mandatário”, incluindo a decisão final, o foram na qualidade de representante do R., agindo em nome deste. Refere o artigo 258º do CC, que “o negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes que lhe competem, produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último.” Como se alude no Ac. RP, de 19/12/2012, processo nº 477/11.9TTVRL-A.P1, o trabalhador não pode questionar os poderes se não fez uso do disposto no artigo 260º do CC. Refere-se no acórdão: “Enquanto a titularidade do poder disciplinar pertence em exclusivo ao empregador (artº 98º), essa exclusividade já não se estende ao exercício desse mesmo poder. A lei consente, claramente, que o mencionado exercício seja levado a cabo por outrem, desde que lhe sejam conferidos poderes para o efeito pelo empregador. Isto é, poderes de representação específicos, que podem ser conferidos por procuração, entre outros, a um advogado mandatado para o efeito… Nestes casos, o representante que esteja mandatado nesses termos, atua sempre em nome alheio e tem “o dever de agir não só por conta, mas em nome do mandante, a não ser que outra coisa tenha sido estipulada” – artº 1178º nº2 do C.Civil. Já, ao invés, se o mandatário agir sem poderes de representação, atua em nome próprio e, por isso, “adquire os direitos e assume as obrigações decorrentes dos atos que celebra, embora o mandato seja conhecido dos terceiros que participem nos atos ou sejam destinatários destes” – artº 1180º do C.Civil... … É possível haver mandato sem representação (na medida em que essa relação contratual não confere, por si só, poderes de representação), tal como é possível a representação sem mandato. Basta pensar nas hipóteses de representação legal. Mas, coexistindo ambos os institutos, ou seja, se o mandatário for representante por ter recebido poderes para agir em nome do mandante, são-lhe aplicáveis, quer as regras relativas ao mandato, quer as atinentes à representação. É o que resulta do disposto no artº 1178º nº1 do Código Civil. E assim, como se assinala no Aresto já referido, “nas relações mandante-mandatário – e ante a insuficiência ou inexistência do suporte formal respetivo – pontifica a regra constante do artº 1163º, valendo o silêncio do mandante, nas previstas circunstâncias, como aprovação da conduta do mandatário, ainda que este haja excedido os limites do mandato ou desrespeitado as instruções do mandante. Nas relações com terceiros – seja, no caso, na relação do mandatário com a destinatária da veiculada declaração negocial – dispõe o artº 260º nº1 do Cód. Civil, em cujos termos “se uma pessoa dirigir em nome de outrem uma declaração a terceiro, pode este exigir que o representante, dentro de prazo razoável, faça prova dos seus poderes, sob pena de a declaração não produzir efeitos”. …Ora, do nosso ponto de vista, a haver dúvidas da parte do Apelante, o mesmo devia tê-las dissipado por via do procedimento já referido, previsto no artº 260º nº1 do C.Civil… Só neste caso, e na ausência de qualquer resposta ou de uma resposta imperfeita sob o aludido ponto de vista, é que se poderia questionar a validade e eficácia de tal decisão…” Assim e nesta parte improcede o alegado. Quanto à invocação de que o autor não auferiu qualquer retribuição por tal atividade, adiante veremos. Desde já refira-se que não resultou demonstrado nos autos, nem os depoimentos, designadamente do explorador da carpintaria, pouco convincente nesta matéria, convencem da veracidade de tal alegação, sendo de manter o decidido. *** Vejamos quanto à justa causa de despedimento.O recorrente invoca que o trabalho exercido na carpintaria não era remunerado. Ora a impugnação da matéria de facto deve o recorrente obrigatoriamente dar cumprimento ao artigo 640º do CPC, especificando os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, indicando, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso. Não tendo sido cumprido o normativo não se aprecia a questão. Entremos na questão da existência ou não de justa causa para o despedimento: Importa no essencial saber se ocorre justa causa para o despedimento e suas consequências. Nos termos do artigo 351º do Cód. do Trabalho, "1- Constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.” O nº 2 do mesmo artigo enumera alguns dos comportamentos que poderão ser tidos como justa causa de despedimento. Tal enumeração é exemplificativa, não dispensando a prova dos requisitos consagrados no nº 1 do normativo. Para a verificação da justa de despedimento importa demonstrar a existência de um comportamento culposo do trabalhador, violador dos deveres de conduta ou de valores inerentes à disciplina laboral, que seja grave em si mesmo e nas suas consequências, e um nexo de causalidade entre esse comportamento e a impossibilidade de subsistência da relação laboral. * O comportamento é culposo quando o trabalhador não procede com o cuidado a que segundo as circunstâncias estaria obrigado e seria capaz, Vd. Joana Medeiro Melo, Despedimento Por Facto Imputável ao Trabalhador: Situações Típicas de Justa Causa, http://run.unl.pt/bitstream/10362/6900/1/Melo_2011.PDF.O comportamento do trabalhador deve ser analisado em concreto, tendo em conta as circunstâncias por este conhecidas, pelo entendimento de um bom pai de família e atendendo-se a critérios de razoabilidade e objetividade”, verificando-se se o comportamento tido não corresponda ao padrão do trabalhador médio normal, considerando o estatuto do “transgressor” na “empresa, designadamente o profissional. O comportamento deve assumir uma gravidada tal que seja impossível a manutenção da relação de trabalho, e é, que, segundo as regras da boa-fé, não seja exigível do empregador a manutenção da relação de trabalho, só devendo aplicar-se a pena máxima quando outra não baste para "sanar a crise contratual aberta pelo comportamento desviante do trabalhador". A impossibilidade de subsistência da relação laboral há de resultar da repercussão do comportamento do trabalhador no futuro da relação. Na apreciação da inexigibilidade da manutenção do vínculo laboral, deve atender-se ao comando do nº 3 do artigo 351º, nos termos do qual “na apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao caráter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes”. Assim deve aferir-se a gravidade do comportamento em si, a sua ilicitude, em função do grau de culpa, tendo em consideração o princípio da proporcionalidade, nos termos do artigo 330º do CT. Apenas deve optar-se pelo despedimento quando num juízo de prognose sobre a viabilidade da manutenção do vínculo, ponderando-se todas as circunstâncias envolventes e os interesses em jogo, se concluir que a permanência do contrato constitui, de um ponto de vista objetivo, uma insuportável e injusta imposição ao empregador. Tal ocorrerá quando a manutenção do vínculo fere de forma inaceitável a sensibilidade e liberdade psicológica do empregador, não considerando a especial sensibilidade do concreto empregador, mas sim a de uma pessoa normal colocada na posição deste. Consta da decisão: “ …ao executar trabalho para terceiro com atividade idêntica à do seu empregador – carpintaria – no período em que estava suspenso preventivamente, período esse em que apenas estava dispensado de dever de assiduidade e de prestar a sua atividade, mantendo-se os demais deveres e direitos das partes emergentes do contrato de trabalho, o A. violou o dever de guardar lealdade ao seu empregador… Os deveres de probidade e de lealdade constituem corolários dos princípios da mútua colaboração e da boa fé estabelecidos no art. 126º, com vista a criar um ambiente de respeito mútuo e confiança… A violação de tais deveres abala a confiança que deve vigorar entre as partes. A conduta do A. é, aliás, suscetível de se integrar nas situações de justa causa expressamente tipificadas nas alíneas a), d) e e) do nº 2 do art. 351º... O A. procurou justificar o trabalho para terceiro com o prolongamento da suspensão preventiva e a necessidade de se manter ocupado como forma de evitar uma iminente depressão. Contudo, para além de apenas se ter provado que o A. foi aconselhado a manter uma ocupação e a não permanecer em casa, também decorre dos factos provados que a prestação de atividade a terceiro, concorrente do seu empregador, se verificou ainda no mês de março, antes de decorrido o prazo de 30 dias previsto no art. 354º nº 2 do Código do Trabalho. Logo, não foi o prolongamento da suspensão preventiva que motivou a conduta do trabalhador. Quanto à necessidade de se manter ocupado, sempre poderia o A. ter optado por outro tipo de atividade, que não implicasse concorrência direta com o seu empregador. Praticou, pois, o A. atos culposos suscetíveis de constituírem infração disciplinar… Quanto ao comportamento adotado pelo A. em 20/3/2017, isoladamente considerado, poderia considerar-se infração de menor gravidade, ponderando-se, a favor do trabalhador, o seu caráter episódico…, a sua antiguidade e ausência de passado disciplinar e o caráter diminuto dos eventuais prejuízos patrimoniais que o mesmo poderia acarretar ao empregador …, Tal juízo, porém, não se estende ao comportamento posterior do trabalhador, que comporta uma grave violação do dever guardar lealdade ao empregador, pelo facto do A., aproveitando a suspensão preventiva decretada pelo empregador, ter prestado trabalho a um concorrente deste. Trata-se de uma infração grave que contende diretamente com a confiança e lisura que deve prevalecer nas relações entre empregador e trabalhador e que, somada às anteriores “pequenas infrações” importa uma quebra irremediável da confiança… “ O recorrente defende que a atividade exercida não era concorrente da exercida pelo empregador, referindo que a sede e local da carpintaria do Réu se situar em ..., aldeia do Concelho de Bragança e, por sua vez, o local onde o Autor prestou tal atividade ter ocorrido na carpintaria de M... , sita na Av. ..., em Bragança. Refere que não ficou demonstrado que as duas carpintarias são concorrentes, invoca a sua antiguidade e a inexistência de antecedentes disciplinares. Resultou provado “12- O trabalhador encontrava-se suspenso de funções, mas trabalhava na carpintaria de M... , sita na Av. ..., em Bragança. 13- O que aconteceu pelo menos durante o mês de março, após o dia 21/3/2017, durante o mês de abril e durante a primeira quinzena de maio de 2017. … 15- Após ter sido suspenso da sua atividade em 21-2-2017, o Autor ficou muito nervoso e com perturbações de sono e irritabilidade, o que o levou a recorrer a consulta médica, tendo sido aconselhado pelo médico a manter alguma ocupação e não permanecer em casa.” Ora o autor foi suspenso a 21/2 e logo em março trabalha numa outra carpintaria, o que nos leva a considerar, tal como na decisão recorrida, que não terá sido o prolongamento da suspensão preventiva que motivou a sua conduta. Quanto à necessidade de se manter ocupado, e como se refere na decisão, poderia e deveria ter optado por outro tipo de atividade. Refere o recorrente que não vem demonstrado que a carpintaria para onde foi trabalhar estivesse em concorrência com a do réu. Alude à localização das mesmas. Ora, é sabido que hoje com os meios de locomoção disponíveis as áreas de influência mesmo de pequenos negócios não se circunscrevem ao local onde se encontram. Refira-se que as duas carpintarias distam, por estrada cerca de 9,2 km, num percurso de 18 minutos em viatura (goolge maps), podendo afirmar-se que pelo menos parcialmente a área geográfica de influência é comum. A propósito do dever de não concorrência, seja diretamente seja exercendo funções para concorrente, a jurisprudência tem sido unânime em considerar que o dever se prende com o não aproveitamento em benefício próprio de oportunidades de negócio, de forma a abster-se de gerar conflitos de interesses com a sua entidade empregadora, não se exigindo sequer o efetivo desvio de clientela, bastando que este desvio exista em potência, bastando para a verificação da violação desta obrigação o perigo da atividade do trabalhador poder levar a um eventual prejuízo para a sua entidade patronal. Atenda-se ao constante do Ac. da Relação do Porto de 23/11/2009, ln, proc. n° 90/08.8TTMTS.Pl, www.dgsi.pt. por paradigmático, quando refere "A obrigação de não concorrência constitui corolário do dever de lealdade, decorrente da celebração do contrato de trabalho, que impõe ao trabalhador o dever de se abster de comportamentos contrários ou lesivos dos interesses da entidade empregadora. … Relativamente ao exercício de atividade concorrencial, a sua prática pressupõe que o trabalhador, seja por conta própria e/ou no interesse de outrem e à margem da organização empresarial do empregador, leve a cabo atividade ou pratique atos próprios de atividade idêntica à que é desenvolvida pelo empregador, bastando que o seu comportamento, independentemente da verificação de prejuízo efetivo do empregador, seja apto a criar a expectativa de uma atividade concorrencial. ( ... ) ... para que se verifique a atividade concorrencial por parte do trabalhador, violadora do dever de lealdade, exige-se a prossecução, por este, de uma atividade concorrencial potencialmente desviante da clientela da sua entidade empregadora, isto é, uma atividade paralela do trabalhador que tenha um objeto coincidente, ao menos de modo parcial, com o objeto social da sua atividade empregadora, sem que esta lhe tenha conferido, ao menos tacitamente, a respetiva anuência.". A esta luz, e não demonstrando o trabalhador que a atividade da empresa para que prestou funções durante a sua suspensão, com objeto idêntico ao da sua entidade patronal, não é efetivamente concorrente com a do seu empregador, mostra-se violado o dever de lealdade. Importa referir que a confiança, afetada que seja, não comporta gradações, ou se tem confiança ou não se tem. A conduta do A. praticada no âmbito e em contexto litigioso, durante a sua suspensão, torna-se ainda mais grave, já que fortalece a “desconfiança” da empregadora. Do artigo 128, 1, f) do CT. consta como dever do trabalhador: “ Guardar lealdade ao empregador, nomeadamente não negociando por conta própria ou alheia em concorrência com ele, nem divulgando informações referentes à sua organização, métodos de produção ou negócios.” No âmbito da relação laboral assumem particular relevo os deveres de mútua e leal colaboração na execução do contrato, que resultam daquele normativo e se encontram plasmados em termos gerais no art. 126.º, aludindo ao “dever” de boa-fé. Estando em conflito aberto, menos se compreendem atitudes que vão agudizar a tensão e aumentar ou estimular a desconfiança entre as partes. Assim concorda-se com o juízo efetuado, sendo de manter o decidido. * DECISÃO:Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação, mantendo-se a decisão. Custas pelo recorrente. Guimarães, 18.10.18 Antero Veiga Alda Martins Eduardo Azevedo |