Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2344/09.7TAGMR.G1
Relator: ISABEL ROCHA
Descritores: COMPETÊNCIA
EXECUÇÃO POR CUSTAS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/16/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: O Juízo de Execução de Guimarães é competente, em razão da matéria, para tramitar processos de execução por custas relativas a processos dos Juízos Cíveis da comarca, quer as condenações tenham sido proferidas em acções cíveis, propriamente ditas, quer em processos de insolvência.
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes que constituem a 1.ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

O Digno Magistrado do Ministério Público intentou a presente acção executiva nos Juízos de Execução de Guimarães contra “F… ,LDA, com vista ao pagamento da quantia de € 31.759,20, relativamente a custas aplicadas ao exequente no âmbito do processo de insolvência em que era insolvente, que correu termos no 3.º juízo cível do Tribunal Judicial de Guimarães com o n.º 1190/08.0TBGMR.
Por despacho datado de 23/02/2011, o Mm.º Juiz dos Juízos de Execução de Guimarães, julgou este tribunal materialmente competente para tramitar a proposta execução, indeferindo liminarmente o requerimento executivo e absolvendo a Ré da instância.

Inconformado, o Digno Magistrado do Ministério Público interpôs recurso deste despacho, que foi recebido, apresentando alegações que conclui do seguinte modo:

1-Os Juízos de Execução foram criados pelo Decreto – Lei n.º 148/2004, de 22/01 tendo o Juízo de Execução de Guimarães sido instalado pela Portaria n.º 262/2006, de 16/03, com efeitos a partir de 20 de Março de 2006.
2 — De acordo com o disposto no artigo único do Decreto-Lei no. 35/2006, de 20/2 as acções executivas instauradas ao abrigo do regime introduzido pelo Decreto-Lei no 38/2003, de 8 de Março, que se encontrem pendentes nos Tribunais das Comarcas de Guimarães, nos termos da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, e sejam da competência dos juízos de execução transitam para o juízo de execução.
3. De acordo com o disposto no artigo 102°-A da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais - Lei no 3/99, de 13/1 e alterações posteriores - compete aos juízos de execução exercer, no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no CPC.
4 — Os Tribunais de Comércio têm a competência fixada nos números 1, 2 e 3 do art. 89 da mesma Lei.
5 - Porém, na comarca de Guimarães não existe tribunal de comércio, pelo que, de acordo com o disposto nos artigos 94° tal competência é exercida pelos juízos cíveis.
6 — Esta execução não está conexionada com qualquer execução de decisão proferida no âmbito de processo cível de insolvência, sendo certo que o título executivo emerge de liquidação (conta) efectuada pela secretaria, cujo montante não foi pago voluntariamente.
7 — Acresce que o facto de o 3° Juízo Cível deste Tribunal Judicial, onde correu termos o processo de insolvência mencionado, ter a categoria de Tribunal de categoria específica, e ser o competente em razão da matéria, não o converte em juízo de competência especializada para execução por dívidas de custas.
8 - Salvo melhor opinião, não faz qualquer sentido que as execuções por custas e multa aplicadas em processos dos juízos cíveis (foro cível), sejam da competência do juízo de execução e que, por não existir na comarca Tribunal de Comércio, sejam aqueles juízos cíveis os competentes para estas execuções.

Não foram apresentadas contra alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II FUNDAMENTAÇÃO/OBJECTO DO RECURSO
Tendo em conta o objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, a questão a decidir é a de saber qual o tribunal competente para conhecer da presente acção executiva: se o juízo de execução de Guimarães, se os juízos cíveis da mesma comarca.

O circunstancialismo fáctico e processual a ter em conta é o descrito supra no relatório.

O Direito aplicável
A competência, em razão da matéria, dos tribunais de competência específica, é determinada pelas leis da organização judiciária ( cf. art.º 67 do CPC ).
Assim, estabelece o art.º 18.º n.º 2 da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (LOFTJ), Lei 3/99 de 13 de Janeiro, com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei 38/2003 de 8 de Março, pela Lei 42/2005 de 29 de Agosto, e pela Lei 303/2007 de 24/08.
vigente à data da instauração da presente acção, que tal diploma determina a competência em razão da matéria entre os tribunais judiciais, estabelecendo as causas que competem aos tribunais de competência específica.
Como decorre dos artigos 64.º, n.º 2, in fine, e 96.º, n.º 1, alínea g) da mesma Lei, os Juízos de Execução são precisamente tribunais de competência específica.
A competência fixa-se, em princípio, no momento em que a acção se propõe, sendo irrelevantes as modificações de facto que ocorram posteriormente, conforme decorre do artº 22º da mesma Lei.
Sobre a competência, em razão da matéria, dos juízos de execução, rege o art.º 102.º-A da LOFTJ na redacção que lhe foi introduzida pela Lei n.º 42/2005, de 29 de Agosto).
Dispõe esta norma:
“Art.º 102.º -A- Juízos de execução
1 – Compete aos juízos de execução exercer, no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no Código Processo Civil.
2 – Estão excluídos do número anterior os processos atribuídos aos tribunais de família e menores, aos tribunais do trabalho, aos tribunais de comércio e aos tribunais marítimos e as execuções de sentenças proferidas por tribunal criminal que, nos termos da lei processual penal, não devam correr perante o tribunal civil.
3 – Compete também aos juízos de execução exercer, no âmbito dos processos de execução por dívidas de custas cíveis e multas aplicadas em processo cível, as competências previstas no Código de Processo Civil não atribuídas aos tribunais de competência especializada referidos no número anterior”.

Dispõe ainda o art.º 103.º na redacção da mesma Lei:
Art.º 103.º - Competência
“Sem prejuízo da competência dos juízos de execução, os tribunais de competência especializada e de competência específica são competentes para executar as respectivas decisões”.

Sendo estas as normas aplicáveis, tudo aponta para que naquele n.º 3 do artigo 102.º-A “esteja a chave do nosso problema” Cf. acórdão desta Relação de em 13/01/2011, relatado pelo Desembargador Canelas Brás, publicado em www.dgsi.pt., a propósito de execução de custas devidas num processo de regulação do poder paternal mas cuja argumentação se aplica inteiramente ao caso dos autos: se a execução por dívidas de custas cíveis aplicadas em processos dos Juízos Cíveis cabe aos Juízos de Execução, quando os haja, também lhes caberá a presente, que é ainda uma dívida de custas aplicadas nos Juízos Cíveis de Guimarães (pois que não há, na comarca, Tribunal de Comércio e se não trata agora de executar a sentença que declarou a insolvência, propriamente dita), sendo este um processo cível como outro qualquer, quer dizer, prescinde-se da natureza do processo que lhe deu origem, sendo apenas uma execução por custas aplicadas numa acção dos Juízos Cíveis.
A tal não obsta, por outro lado, a regra geral em matéria de competência para a execução fundada em sentença, estabelecida no artigo 90.º do Código de Processo Civil, qual seja a de que a mesma corre por apenso ao processo em que a sentença foi proferida, pois que a alínea b) do n.º 3 desse preceito prevê precisamente que assim não ocorra nas comarcas em que haja um tribunal com competência executiva específica (vide o Dr. Lopes do Rego, in “Comentários ao Código de Processo Civil”, 2004, Almedina, Volume I, 2ª Edição, págs. 118, onde deixou exarado que “a alteração introduzida no n.º 3 visa quebrar a regra rígida de competência por conexão entre o processo declaratório em que foi proferida a sentença exequenda e a respectiva execução – adequando a regra da apensação à existência – e possível implementação – de juízos de execução. Assim – alínea b) – nas comarcas em que não haja tribunal com competência executiva exclusiva, a execução continua a correr por apenso ao processo em que a decisão exequenda foi proferida. Onde estejam implementados juízos de execução, este processo passa a correr autonomamente no traslado…”).

Na comarca de Guimarães foi criado, pelo art.º 3.º n.º 1 do Decreto Lei n.º 148/2004 de 21/06, um Juízo de Execução, com competência executiva específica, instalado, a partir de 20 de Março de 2006, pelo artigo 1.º da Portaria do Ministério da Justiça n.º 262/2006, de 16 de Março.
Assim sendo, a competência, em razão da matéria, para conhecer da presente causa, deve ser atribuída ao Juízo de Execução de Guimarães.
Procede pois o recurso, devendo revogar-se em conformidade o despacho recorrido.

III – DECISÃO
Por tudo o exposto, acordam os Juízes desta secção cível em julgar procedente o recurso e, em consequência revogam a decisão recorrida, que deve ser substituída por outra que, reconhecendo a competência do Juízo de Execução de Guimarães para apreciar a presente acção, mande prosseguir os autos, sem prejuízo do conhecimento de outras questões que a tal obstem.

Sem custas.
Notifique.
Guimarães, 16 de Junho de 2011
Isabel Rocha
Manuel Bargado
Helena Melo