Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
610/07.5TCGMR.G3
Relator: CARVALHO GUERRA
Descritores: DIREITO DE PREFERÊNCIA
CADUCIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/09/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I - A caducidade de um direito constitui causa de extinção do mesmo, competindo a respetiva prova àquele contra quem o direito é exercido.
II - No caso de o direito exercido ser o direito de preferência atribuído pelo artigo 1410º, a prova da caducidade do direito, quer porque foi comunicado o projeto de venda e as cláusulas do respetivo contrato e o direito não foi exercido dentro do prazo, quer porque o direito foi exercido decorridos mais de seis meses depois do conhecimento dos elementos essenciais da alienação, compete ao réu.
III - São pressupostos do direito de preferência conferido pelo artigo 1380º, para além do mais, que o prédio vendido ou dado em cumprimento tenha área inferior à unidade de cultura e que o prédio do proprietário que se apresenta a preferir tenha também área inferior à unidade de cultura.
IV – Não estando provados tais pressupostos, improcede a ação de preferência.
Decisão Texto Integral: Acordam na 1ª Secção Civil do Tribunal da Relação de Guimarães:
*
A… intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo comum e forma ordinária contra M…, A… e mulher, E… na qual pede que seja reconhecido e declarado judicialmente o direito de preferência do Autor e, em conformidade, determinar-se que o mesmo passe a ocupar a posição de adquirente no contrato de compra e venda de que o prédio em causa na acção foi objecto, com o consequente cancelamento de todos os registos efectuados pelos segundos Réus relativamente a tal prédio e os segundos Réus condenados a entregar-lhe tal prédio livre de pessoas e bens.
Alega para tanto e em síntese que é dono e legítimo possuidor do prédio rústico denominado “Campo das Leiras”, sito no lugar de Seara, freguesia de Brito, de cultura, com árvores nas bordaduras, com a área de 2.640m2, bem como de um prédio rústico, denominado Campo de Lagares, de pastagem, cultura e videiras de enforcado, com a área de cerca de 4.000m2, confrontando do Norte e Nascente com J… e A…, Sul e Poente com proprietário, sito no lugar de Seara, freguesia de Brito, Guimarães.
Os referidos prédios advieram à sua posse e propriedade por os ter recebido por herança aberta por óbito de seus pais, A… e S… , sendo certo que o Autor, por si e antepossuidores, está na posse dos citados prédios há mais de 30, 40 e 50 anos, de forma ininterrupta, pacífica, pública e de boa fé, pelo que sempre os teria adquirido por usucapião.
Por escritura pública de compra e venda celebrada em 13 de Janeiro de 2006, no Cartório do Notário Carlos Manuel Forte Ribeiro Tavares, a primeira Ré, representada por S…, vendeu ao segundo Réu e este comprou àquela, além de um prédio urbano, o prédio rústico composto de terreno de lameiro, pastagem e videiras de enforcado, situado no Lugar de Seara, freguesia de Brito, Guimarães, descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o n.º 1482-Brito, registado a favor da vendedora pela inscrição G-dois, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 205, com o valor patrimonial de euros 6.038,21.
O preço estipulado para a referida venda foi de euros 25.000,00.
Os prédios rústicos do Autor confinam com o prédio rústico vendido pela 1.ª Ré, não existindo nem se interpondo entre os referidos prédios terrenos de outrem, caminhos ou outra forma de separação, sendo que o prédio rústico vendido tem uma área real de cerca de 11,00 m2, a qual é inferior à unidade de cultura, sendo certo que qualquer dos prédios do Autor tem uma área igualmente inferior àquela unidade de cultura.
Contestaram os Réus A… e E…, impugnando parcialmente a matéria alegada na petição inicial, mais alegando que, pela escritura pública lavrada em 13.01.2006, o Réu marido comprou dois imóveis que, apesar de possuírem inscrição matricial e descrição próprias, devem considerar-se indissociáveis, sendo certo que a vendedora sempre colocou como condição essencial para a realização do negócio a venda conjunta de ambos.
O Autor sempre esteve a par das negociações e intenções da Ré vendedora, conhecimento que abrangia não só a venda efectuada ao Réu como as realizadas a outros adquirentes.
O Réu não é agricultor nem se dedica ao cultivo da terra, pelo que não adquiriu o terreno com vista ao seu aproveitamento agrícola mas sim porque tem duas filhas e pretende deixar-lhes em herança os prédios que já foram dos seus antepassados para que aí construam as suas habitações.
Mais pedem a condenação do Autor, como litigante de má fé, no pagamento de multa e indemnização a favor dos Réus em montante nunca inferior a euros 5.000,00.
Replicou o Autor, impugnando a matéria relativa à defesa por excepção, mais alegando que o terreno vendido se integra na área de Reserva Agrícola Nacional e Ecológica, sem aptidão construtiva.
Procedeu-se a julgamento com observância do formalismo legal e foi proferida sentença (folhas 334 a 346), a qual foi anulada pela decisão do Tribunal da Relação de Guimarães (404 a 407), a qual determinou a repetição do julgamento para apreciação da matéria de facto aditada.
Procedeu-se à repetição da audiência de discussão e julgamento, nos termos legais, tendo sido proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência,
a) declarou que ao Autor assiste o direito de preferência na alienação do prédio rústico composto de terreno de lameiro, pastagem e videiras de enforcado, situado no Lugar de Seara, freguesia de Brito, Guimarães, descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob n.º 1482-Brito, registado a favor da vendedora e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 205º feita pela Ré M… aos Réus A… e E… e formalizada por escritura pública celebrada no dia 13 de Janeiro de 2006, no Cartório Notarial do Notário Carlos Manuel Forte Ribeiro Tavares;
b) determinou que o Autor passe a ocupar a posição de adquirente do prédio referido na alínea a) na compra e venda também aí aludida, em substituição dos Réus A… e E… e, em consequência, invistiu-o na propriedade do citado prédio e atribuiu aos Réus A… e E… a quantia de euros 25.000,00 correspondente ao preço depositado nos autos;
c) condenou os Réus A… e E… a entregarem ao Autor o identificado prédio rústico, livre de pessoas e bens;
d) absolveu os Réus do restante peticionado.
Desta sentença apelaram os Réus, que concluem a sua alegação da seguinte forma:
- o tribunal a quo julgou a ação procedente e reconheceu o direito de preferência do A/Apelado por considerar verificados os pressupostos enunciados nos artigos 1380º e 1410º do Código Civil;
- assim, admitiu que foi vendido um prédio com área inferior à unidade de cultura; que o preferente é dono de prédios confinantes com o prédio alienado; que os prédios do preferente têm área inferior à unidade de cultura; e que o adquirente do prédio não é proprietário confinante;
- todavia, não atentou devidamente no facto invocado pelo Apelado em 32º da petição inicial, onde alega que “teve conhecimento da venda nos finais de Setembro de 2007”;
- sucede que o Apelado não logrou a prova desta matéria de facto, como lhe competia, o que conduz à improcedência da ação por caducidade do direito que pretendia exercer – artigo 1410º do Código Civil;
- igualmente não foi alegado nem consta do elenco dos factos provados que a vendedora do prédio omitiu ao preferente quer a venda quer os elementos essenciais do negócio;
- ora, uma vez que a ação se funda no exercício do direito após o conhecimento da venda, ocorrido em finais de Setembro de 2007, não está verificado o requisito para o exercício do direito de preferência – interposição da ação dentro do prazo de 6 meses, a contar da data em que tomou conhecimento dos elementos essenciais da alienação;
- acresce que, da escritura de venda e da certidão predial do prédio, juntas aos autos, consta que o imóvel se encontra inscrito na matriz e descrito na Conservatória do Registo Predial com a área de 32.780 m2;
- para além da medição “a olho” dos terrenos em causa nos autos, não existem outros meios de prova com credibilidade e fiabilidade, nem com rigor técnico que permitam dar por assente uma área diversa da constante dos documentos mencionados;
- designadamente no que respeita à área de 11.000 m2 atribuída ao prédio alienado e bem assim, também, quanto às áreas dos prédios do preferente;
- a testemunha A…, cujo depoimento se encontra gravado na audiência de 1/6/2009, de 10.36.48 a 11.24.02, demonstrou conhecer o prédio vendido, por ter agricultado um terreno confinante, tendo sido claro ao afirmar que o terreno do Sr. A… tem mais de 20.000 m2;
- decorre da conjugação dos meios de prova indicados – documentos e prova testemunhal gravada – que se impunha uma resposta diversa ao número 25 da base instrutória;
- com efeito, a factualidade inserta no indicado quesito e vertida no ponto 12 dos factos provados da sentença recorrida foi incorretamente julgada, devendo ser alterada para não provado;
- constam do processo os elementos de prova que serviram de base à decisão, nomeadamente inspeção judicial, documentos e depoimento gravado, sendo evidente a falta de suporte para o apuramento da matéria visada;
- incumbia ao Apelado, no âmbito da repartição do ónus de prova, alegar e provar que a área dos terrenos, quer o vendido quer os confinantes, são inferiores à unidade de cultura fixada para a região;
- e qual a unidade de cultura aplicável aos terrenos em causa, por referência à utilização que lhes é dada e pelas suas características físicas e químicas, que determinam a aptidão de que são dotados, nos termos da Portaria nº 202/70 de 21/04;
- da sentença não constam quaisquer factos reveladores das culturas praticadas nos prédios nem das respetivas aptidões, sendo ainda incerta a área dos terrenos;
- pelo que também aqui estão em causa e não verificados os requisitos para o exercício do direito de preferência;
- o tribunal a quo proferiu ainda errada decisão sobre a matéria de facto relativa aos quesitos 1, 2, 3 e 4, mencionados na ata de 25 de fevereiro de 2013;
- impõe-se dar por assente a matéria dos quesitos 1, 2 e 3 e não provado o quesito 4 a que corresponde o ponto 21 dos Factos Provados;
- são os documentos juntos aos autos – escritura de compra de 1975 e certidão da Câmara Municipal de Guimarães de 15/3/2012 – conjugados com os depoimentos prestados na audiência de julgamento de 18/2/2013, da testemunha J… , gravado de 16.01.39 a 16.23.44 e da testemunha F… , gravado de 16.36.04 a 16.51.44, que determinam a alteração das respostas dadas;
- a certidão da Câmara contém uma planta topográfica do local onde se situa o prédio, mas não delimita claramente a Zona de Construção de Transição, a RAN e a REN, nem assinala a exata localização e delimitação do terreno dos Recorrentes;
- a falta de coordenadas e limites do terreno torna impossível determinar em que Zona se encontra, podendo até ocupar parcialmente todas as áreas assinaladas;
- de qualquer modo, não está totalmente vedada a edificação em áreas da RAN ou da REN, sendo certo que o art. 22º do DL 73/2009 de 31/3 permite a utilização de terrenos da RAN para outros fins, designadamente para a construção ou ampliação da casa de habitação do proprietário;
- nada impede, assim, que os Recorrentes tenham adquirido o prédio para fins diferentes do seu aproveitamento agrícola, como invocam e resulta provado do depoimento das testemunhas relevadas;
- a douta decisão violou ou fez errada aplicação das normas legais citadas e deve ser revogada.
Não foram oferecidas contra alegações.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
*
Delimitado como se encontra o objecto do recurso pelas conclusões da alegação – artigos 635º, n.º 4 e 640º do Código de Processo Civil – das apresentadas pela Apelante resulta que as seguintes as questões que nos são colocadas:
I. saber se, face aos factos alegados e prova produzida, diversa deveria ter sido a decisão da 1ª instância acerca da matéria de facto;
II. verificar se estão provados todos os pressupostos de facto que atribuem ao Autor o direito de preferência que.
*
(…)
Em face disso, são os seguintes os factos provados
1. por escritura pública de compra e venda celebrada no dia 13 de Janeiro de 2006 no Cartório Notarial do Notário Carlos Manuel Forte Ribeiro Tavares, a primeira Ré, representada por S…, vendeu ao segundo Réu e este comprou, além de um prédio urbano, o prédio rústico composto de terreno de lameiro, pastagem e videiras de enforcado, situado no Lugar de Seara, freguesia de Brito, Guimarães, descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob n.º 1482-Brito, registado a favor da vendedora e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 205º;
2. o preço estipulado para a venda, quanto ao prédio rústico, foi de euros 25.000,00;
3. por decisão transitada em julgado proferida nos autos de processo n.º 4523/07.2TBGMR, que correram termos no 1.º Juízo Cível da Comarca de Guimarães, foi ordenada a restituição provisória da posse do caminho que dá acesso aos prédios do Autor denominados “Campo das Leiras”, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 201º da freguesia de Brito e “Campo de Lagares”, rústico, situado na mesma freguesia e a remoção de todos os obstáculos nele colocados pelos Réus, de forma a permitir o acesso aos ditos prédios;
4. o Autor, por si e antepossuidores, há mais de 20 anos, ininterruptamente, está na posse dos prédios referidos em 3, pagando os impostos devidos, dando-os de arrendamentos e recebendo rendas, cultivando-os e colhendo frutos, apascentando o gado, podando árvores e vinha e colhendo vinho, à vista e com conhecimento de toda gente, sem oposição de quem quer que seja e na convicção de ser seu dono;
5. os prédios rústicos descritos em 3 são autónomos entre si;
6. e confinam com o prédio rústico referido em 1; – Cfr., resposta ao quesito 13.º da Base Instrutória.
7. entre o prédio rústico denominado “Campo de Lagares” e o prédio rústico referido em 1não existem nem se interpõem terrenos de outrem, caminhos ou outra forma de separação;
8. o acesso aos prédios referidos em 3 para a via pública faz-se, há mais de 50 anos, por um caminho com a largura actual de 4 metros, bem marcado no chão, com o seu leito bem calcado e trilhado, com início na estrada, prolongando-se por uma extensão de cerca de 300 metros, bordejando o Campo das Leiras, atravessando o prédio rústico identificado em 1, até atingir o Campo de Lagares;
9. por este caminho passa o Autor e sempre passaram os seus antecessores, com carros de bois, animais, tractores e outras máquinas agrícolas para transportar sementes, adubos, colheitas, cortar e transportar erva, há mais de 50 anos, continuada e pacificamente, sem oposição de ninguém, à vista de todos e na convicção de que tinham e exerciam um direito próprio;
10. tal caminho é o único acesso dos prédios do Autor para a via pública;
11. os 2.ºs Réus não eram, à data referida em 1, nem são donos de qualquer parcela confinante com a parcela alienada;
12. o prédio rústico referido em 1 tem uma área real de cerca de 11.000 m2;
13. qualquer dos prédios referidos em 3 tem uma área inferior a 2 hectares;
14. hoje em dia, torna-se desnecessário qualquer caminho para aceder a parcelas do terreno comprado pelos 2ºs Réus;
15. o prédio urbano inscrito sob o artigo 338º, constituído por casa de habitação e dependências, foi edificado há mais de 50 anos no solo do prédio rústico actualmente inscrito sob o artigo 205º;
16. pelo que apenas possui área coberta, sendo rodeado pelo terreno do prédio rústico;
17. a casa de habitação e uma parcela de terreno do prédio rústico, com cerca de 800 m2, encontram-se arrendados a M… e mulher há cerca de 30 anos;
18. a 1ª Ré sempre colocou como condição essencial para a realização do negócio que a venda da casa e do terreno fosse conjunta
19. o preço da venda sempre foi proposto como um valor unitário para o conjunto dos prédios;
20. em 13.11.2007, o Autor efectuou o depósito da quantia de euros 25.000,00;
21. o terreno vendido aos Réus integra a área de Reserva Agrícola Nacional e Ecológica.
*
II. Passando à segunda das questões equacionadas, estamos perante acção através da qual o Autor vem exercer o direito de preferência em relação à venda, ocorrida em 13 de Janeiro de 2006, do prédio rústico composto de terreno de lameiro, pastagem e videiras de enforcado, situado no Lugar de Seara, freguesia de Brito, Guimarães, descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob n.º 1482-Brito, registado a favor da vendedora e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 205º, com base no disposto no artigo 1380º, n.º 1 do Código Civil, que estabelece:
1. Os proprietários de terrenos confinantes, de área inferior à unidade de cultura, gozam reciprocamente do direito de preferência nos casos de venda, dação em cumprimento ou aforamento de qualquer dos prédios a quem não seja proprietário confinante.
Os pressupostos do direito de preferência atribuído pelo artigo são, assim, os seguintes:
a) que tenha sido vendido ou dado em cumprimento um prédio com área inferior à unidade de cultura;
b) que o preferente seja dono de prédio confinante com o prédio alienado;
c) que o prédio do proprietário que se apresenta a preferir tenha área inferior à unidade de cultura;
d) que o adquirente do prédio não seja proprietário confinante.
Começa o Apelante por objectar que a sentença em recurso não atentou devidamente no facto invocado pelo Apelado no artigo 32º da petição inicial, em que alega que “teve conhecimento da venda nos finais de Setembro de 2007”, sendo que o Apelado não logrou a prova desse facto, como lhe competia, o que conduz à improcedência da ação por caducidade do direito que pretendia exercer – artigo 1410º do Código Civil – da mesma sorte que não foi também alegado nem consta do elenco dos factos provados que a vendedora do prédio omitiu ao preferente quer a venda quer os elementos essenciais do negócio.
É certo que o artigo 1380º, n.º 4 do Código Civil prescreve que “É aplicável ao direito de preferência conferido neste artigo o disposto nos artigos 416º a 418º e 1410º, com as necessárias adaptações” e que, de acordo com a conjugação deste preceito com os mencionados artigos 416º e 1410º, querendo vender a coisa objecto da preterência, deve o vendedor comunicar ao titular do direito o projecto de venda e as cláusulas do respectivo contrato e, recebida a comunicação, deve o titular exercer o seu direito dentro do prazo de oito dias, sob pena de caducidade; por outro lado, o direito de preferência atribuído àquele a quem se não dê conhecimento da venda ou da dação em cumprimento do prédio alienado, contanto que o requeira dentro do prazo de seis meses a contar da data em que teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação e a verdade é que não está provado nem que os Réus não tenham dado conhecimento ao Autor do projecto de venda nem das cláusulas do contrato nem que o Autor tenha tomado conhecimento dos elementos essenciais da alienação menos de seis meses antes da propositura da acção.
No entanto, como decorre do n.º 1 do artigo 342º do Código Civil, ao autor incumbe apenas a alegação e prova dos factos constitutivos do direito que alega; a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado pelo autor compete àquele contra quem o direito é exercido – n.º 2 daquele artigo.
Ora, a caducidade de um direito constitui precisamente causa de extinção do mesmo, pelo que a respectiva prova compete àquele contra quem o direito é exercido.
No caso de o direito exercido ser o direito de preferência atribuído pelo citado artigo 1410º, ao autor incumbe a prova dos respectivos factos constitutivos que acima descrevemos; a prova de qualquer facto extintivo do direito invocado pelo autor, como seja a caducidade do direito, quer porque lhe foi comunicado o projecto de venda e as cláusulas do respectivo contrato e o não exerceu dentro do prazo, quer porque o fez decorridos mais de seis meses depois de ter tomado conhecimento dos elementos essenciais da alienação compete ao réu – ver neste sentido os acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/05/2010 e de 18/04/1991, em www.dgsi.pt.
Mas, continuam os Apelantes, incumbia ao Apelado, no âmbito da repartição do ónus de prova, alegar e provar que a área dos terrenos, quer o vendido quer os confinantes, são inferiores à unidade de cultura fixada para a região e qual a unidade de cultura aplicável aos terrenos em causa, por referência à utilização que lhes é dada e pelas suas características físicas e químicas, que determinam a aptidão de que são dotados, nos termos da Portaria nº 202/70 de 21/04, da sentença não constam quaisquer factos reveladores das culturas praticadas nos prédios nem das respetivas aptidões, sendo ainda incerta a área dos terrenos.
Já referimos que são pressupostos do direito de preferência conferido pelo artigo 1380º, para além do mais, que o prédio vendido ou dado em cumprimento tenha área área inferior à unidade de cultura e que o prédio do proprietário que se apresenta a preferir tenha também área inferior à unidade de cultura.
Com pertinência para a apreciação da questão provou-se:
- o prédio rústico referido em 1 (alienado) tem uma área real de cerca de 11.000 m2;
- qualquer dos prédios referidos em 3 (do Autor) têm área inferior a 2 hectares.
Foi a partir destes factos e tendo em conta que, nos termos do artigo 1º da Portaria n.º 202/70, de 21 de Abril, mantida em vigor pelo artigo 53º do Decreto-Lei n.º 103/90, de 23 de Março é, para a região de Braga, de 2 hectares, quer para terrenos de regadio arvenses, quer para terrenos de sequeiro, que se considerou como assentes aqueles pressupostos.
O que sucede, porém, é que, por um lado, não estão provados factos que permitam afirmar que os terrenos em causa sejam de regadio arvense ou de sequeiro e, por outro, a unidade de cultura estabelecida por aquele diploma para a região de Braga para terrenos de regadio hortícolas é de 0,5 hectares pelo que, face àqueles factos, não é possível concluir que cada um deles têm áreas inferiores à unidade de cultura.
E se, em relação aos prédios do Autor, este alegou os factos constantes dos artigos 25º e 26º da petição inicial susceptíveis de permitir qualificá-los quanto à sua aptidão agrícola, ainda que não tenham sido levados à base instrutória, a verdade é que a anulação da decisão tendo em vista ampliação da matéria de facto, ao abrigo do disposto no artigo 662º, n.º 2, c) do Código de Processo Civil, redundaria inútil uma vez que, em relação ao prédio alienado nada se alega quanto a essa aptidão e, por isso, nunca seria possível concluir-se ter área inferior à unidade de cultura.
Como assim, não se tendo provado aqueles pressupostos do invocado direito de preferência, a acção terá de improceder.
Termos em que se acorda em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, absolvendo-se os Réus dos pedidos.
Custas pelo Autor.
*
Guimarães, 9 de janeiro de 2014
Carlos Guerra
José Estelita de Mendonça
Conceição Bucho