Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
158/14.1TBVLP.G1
Relator: ISABEL ROCHA
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
INDEFERIMENTO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
TAXA DE JUSTIÇA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/28/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: Enquanto estiver pendente a impugnação judicial do indeferimento, pela segurança social, não se verifica a excepção inominada por falta de pagamento da taxa de justiça.
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da 1.ª secção cível do tribunal da relação de Guimarães.

RELATÓRIO

Manuel … requereu a insolvência de Carlos ….

Para tanto, requereu também á segurança social o beneficio do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça (cf. fls. 24 e 25). Na sequência de tal requerimento a Segurança Social proferiu decisão no sentido de indeferir o requerimento de protecção jurídico solicitado (cf. fls 178 e 179).

Inconformado, o recorrente impugnou judicialmente a decisão da Segurança Social (cf. fls. 195 a 204)

A fls. 333 e 334, foi proferido despacho que determinou que o requerente Manuel Lopes deveria proceder ao pagamento da taxa de justiça e junção aos autos do respectivocomprovativo, em 10 dias, sob pena de não o fazendo, os autos aguardem tal junção.

Tal decisão teve como fundamento o facto de ainda não existir uma decisão definitiva da impugnação judicial da decisão de indeferimento da segurança social, uma vez que, tal impugnação, não tem efeito suspensivo. Assim, porque a segurança social indeferiu o apoio judiciário o requerente terá de pagar a taxa de justiça, sem prejuízo do seu reembolso caso proceda a impugnação judicial.

Na sequência da impugnação judicial, a segurança social no dia 23/10/2014, reanalisou a sua decisão de indeferimento, propondo o indeferimento da protecção jurídica (fls. 355 e 356).

Foi então proferido o despacho recorrido, que tem o seguinte teor:

O requerente juntou ao requerimento inicial comprovativo do pedido de concessão de apoio judiciário. A segurança social indeferiu o pedido de apoio judiciário formulado pelo requerente, este tem de proceder ao pagamento da taxa de justiça no prazo de 10 dias após notificação dessa decisão.

O requerente formulou novo requerimento aos autos requerendo a dispensa do pagamento de taxa de justiça, questão essa que foi apreciada por despacho de 09/10/2014 indeferindo o requerido (cfr. Fls. 3333 e seguintes).

No requerimento em apreciação o requerente renova aquele pedido.

Uma vez que tal questão foi oportunamente decidida, como resulta do exposto, nada mais há a acrescentar.

“Conforme ficou dito o requerente foi notificado para juntar aos autos comprovativo do pagamento de taxa de justiça, notificação esta que não satisfez.

O artigo 1.º do Regulamento das Custas Processuais estabelece que todos os processos estão sujeitos a custas, considerando-se como processo autónomo, para efeitos do Regulamento, cada acção, execução, incidente, procedimento cautelar ou recurso, corram ou não por apenso, desde que o mesmo possa dar origem a uma tributação própria.

Por sua vez, o artigo 530º, n.º 1 do Código de Processo Civil, na redacção introduzida pela Lei 41/2013 de 26.06, dispõe que “a taxa de justiça é paga pela parte que demande na qualidade de autor ou réu, exequente ou executado, requerente ou requerido, recorrente e recorrido, nos termos do disposto no Regulamento das Custas Processuais”.

Dispõe o n.º 1 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela i-A, que faz parte integrante do referido Regulamento.

Nos presentes autos, em que o valor da acção é de €319.300,00.

Nos termos do n.º 3 do artigo 552.º do Código de Processo Civil o Autor deverá juntar à petição inicial, o documento comprovativo da taxa de justiça inicial, o qual deverá ser anexado à peça processual e apresentado por transmissão electrónica de dados (cfr. artigo 8.º, n.º1 da Portaria 114/2008, de 6 de Fevereiro).

Efectivamente, não obstante o A. ter requerido apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos do processo o referido pedido foi indeferido pelo ISS e notificado subsequentemente para liquidar a taxa de justiça o A. não o fez, tendo requerido por duas vezes a sua dispensa.

Quanto às consequências da não apresentação do comprovativo rege o artigo 558.º alínea f) do Código de Processo Civil que a secretaria deverá recusar, por escrito e fundamentadamente, o recebimento da petição inicial, o que não aconteceu liminarmente em face do que se expôs.

Assim, constata-se que o A. não juntou comprovativo do pagamento da taxa de justiça, cuja omissão equivale à falta de um requisito externo do próprio requerimento inicial, pelo que, nos termos do artigo 207.º, n.º 1 do Código de Processo Civil “nenhum acto processual é admitido à distribuição sem que contenha todos os requisitos externos exigidos por lei”, considerando-se a falta de requisitos externos da petição inicial uma excepção dilatória inominada (cfr. artigo 577.º do Código de Processo Civil).

Nos termos do artigo 27º nº 1 do CIRE “No próprio dia da distribuição, ou, não sendo tal viável, até ao 3.º dia útil subsequente, o juiz: a) Indefere liminarmente o pedido de declaração de insolvência quando seja manifestamente improcedente, ou ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias insupríveis de que deva conhecer oficiosamente”

Pelo exposto, e uma vez que no caso vertente estamos perante uma excepção dilatória inominada insuprível, de conhecimento oficioso, indefiro liminarmente o requerimento inicial, tudo nos termos do disposto no artigo 27º nº1 do CIRE, 207º e 577º do NCPC.

Inconformado, o Requerente apelou de tal despacho juntando alegações de onde se extraem as seguintes conclusões:

A. Para efeitos de instauração da presente acção de insolvência e por não dispor dos meios para suportar os custos emergentes da mesma, o Apelante requereu junto d Segurança Social apoi judiciário, na modalidade de dispensa de pagamento d taxa de justiça e demais encargos com o processo.

B. Tal pedido foi indeferido por notificação datada do dia 18 de Setembro de 2014.

C. Nessa sequência e nos termos legais, o Apelante, não se conformando com a referida decisão da Segurança Social, deduziu impugnação judicial da decisão dindeferimento do requerimento de protecção jurídica por si apresentado, proferidapela Segurança Social, o que fez em 1 de Outubro de 2014.

D. O Apelante informou o Tribunal a quo da dedução da referida impugnação judicialatravés de requerimento remetido via postal em 2 de Outubro de 2014 que deu entrada no dia imediatamente seguinte, nos termos do qual, em suma, requereu dispensa do pagamento da taxa de justiça inicial e da junção do respectivo comprovativo até que fosse decidida a impugnação judicial ou, caso assim não sentendesse, lhe fosse concedido um prazo de 10 (dez) dias para o efeito.

E. Subsequentemente, o Tribunal a quo proferiu um despacho datado de 9 deOutubro de 2014, ordenando ao Requerente, ora Apelante, que, em face da decisão de indeferimento do pedido de apoio judiciário proferida pela Segurança Socialprocedesse ao pagamento da taxa de justiça, no prazo de 10 dias, sem prejuízo de reembolso no caso de vencimento da impugnação judicial, sob pena dos autoficarem a aguardar tal junção.

F. Sucede que, na sequência da impugnação judicial que o Apelante deduzira, a própria Segurança Social veio revogar a referida decisão dindeferimento do pedido de apoio judiciário, substituindo-a por outra proposta de decisão, o que fez através de outra decisão de 23 de Outubro de 2014.

G. Face a tal revogação, a decisão de indeferimento extinguiu-se, deixando d produzir efeitos, máxime o de obrigar a parte a proceder ao pagamento da taxa juntar tal comprovativo (pelo menos até que o pedido de apoio judiciário venha ser definitivamente decidido pela Segurança Social).

H. Através de requerimento datado de 27 de Outubro de 2014, ou seja, antes ddecurso do prazo de 10 dias que lhe tinha sido conferido para o efeitoo Apelante deu conhecimento ao Tribunal a quo de que a decisão de indeferimento havia sido revogada pela Segurança Social.

I. E nessa conformidade requereu a dispensa de pagamento da taxa de justiça e dposterior junção aos autos do respectivo comprovativo pois entendia, e entendeque o pressuposto com fundamento no qual havia sido proferido o referiddespacho – o indeferimento do pedido de apoio judiciário – havia desaparecido com a decisão posterior de revogação.

J. Neste sentido, quando o Tribunal a quo afirma no despacho recorrido que Segurança Socia indeferiu o pedido de apoio judiciário formulado pelo Apelante que este, na sequência de despacho de 9 de Outubro de 2014 ordenando-lhe quprocedesse ao pagamento da taxa de justiça e à posterior junção do respectivo comprovativo, não o fez, renovando o pedido de dispensa de pagamento dreferida taxa, não está a ser rigoroso (para dizer o mínimo).

K. Pois, em primeiro lugar, se é verdade que, num primeiro momento, por decisão proferida em 1 de Setembro de 2014, a Segurança Social indeferiu o pedido dapoio judiciário, facto que constituiu o único fundamento para que o Tribunaordenasse ao Apelante que procedesse ao pagamento da taxa de justiça inicial juntasse o respectivo comprovativo aos autos no prazo de 10 dias (vd. despacho de9 de Outubro de 2014), não é menos verdade que, posteriormente, em 23 de Outubro de 2014, ou seja, ainda antes de decorrido o prazo de 10 dias fixado pelo Tribunal para pagar tal taxa e juntar o comprovativo, a mesma Segurança Sociarevogou aquela sua primeira decisão.

L. Pelo que, na realidade e em rigor, presentemente o pedido de apoiojudiciário não se encontra indeferido.

M. Logo e até que tal indeferimento seja declarado por decisão definitiva da SegurançaSocial, não existe também obrigação para que o Apelante pague a taxa de justiça e a junção do respectivo comprovativo, ao invés do que entendeo Tribunal a quo.

N. O facto de o Apelante ter transmitido ao Tribunal a quo o que consta supra, nãoconsubstancia a renovação do pedido de dispensa do pagamento da taxa de justiçamas antes que, uma vez que o pressuposto com base no qual o Tribunal a quo tinha ordenado que tal pagamento se efectuasse havia desaparecido, tal pagamento deixava de ser imposto à luz da lei, estando assim o Apelante dispensado de o fazer (por ora e até prolação de decisão definitiva da Segurança Social nesse sentido).

O. E sendo assim, como é, o facto de o Apelante não ter procedido ao dito pagamento não constitui excepção dilatória insuprível, pelo que o Tribunal a quo errou a entender diversamente e consequentemente, indeferir liminarmente o requerimento inicial.

P. Mas ainda que assim não se entendesse, o que se admite por mera cautela depatrocínio, sem conceder, então, no limite, a cominação a que o Apelante ficaria sujeito seria aquela que oTribunal a quo determinou no referido despacho de 9 deOutubro de 2014, isto é, os autos ficariam aaguardar tal pagamento de taxa e junção de comprovativo para que pudessem prosseguir os seus ulteriores termos não o indeferimento liminar da petição de insolvência como viria a ser depois (mal) decidido pelo Tribunal a quo na decisão impugnada.

Q. Até porque ao invés do que o Tribunal a quo entende, tal situação, atentos ocontornos supra descritos, nunca configuraria uma excepção dilatória insuprível antes poderia ser suprareiterando-se a decisão no sentido de que tal pagamento seria devido e que deveria ser efectuado em novo prazo concedido para o efeitosob pena de a cominação não ser aquela anteriormente fixada no despacho de 9 dOutubro de 2010 – os autos quedarem-se a aguardar o pagamento da taxa e junção do comprovativo – mas antes o indeferimento liminar da petição de insolvência.

R. Decidindo nos termos em que o fez, o Tribunal a quo violou, por todas as razões acima expostas, o direito de acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seudireitos e interesses legalmente protegidos, previsto no art.º 20º da Constituição da República Portuguesa.

Não constam dos autos qualquer resposta às alegações de recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃO

Objecto do recurso

Considerando que o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das alegações a questão a decidir é a de saber se, no caso concreto, a falta de pagamento da taxa de justiça por parte do apelante é fundamento para indeferir liminarmente o requerimento inicial nos termos dos art.ºs 27.º do CIRE, 207.ºe 577 do CPC.

A factualidade a ter em conta é a descrita no relatório.

DECIDINDO

A decisão recorrida foi proferida no pressuposto de que existia uma decisão definitiva da segurança social, no sentido do indeferimento do apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento da taxa de justiça. E, consequentemente, entendeu-se que, não tendo o ora apelante, pago a taxa de justiça no prazo determinado no despacho de 353 e 354 dos autos, havia fundamento para indeferir liminarmente o requerimento inicial, nos termos dos art,ºs 27.n.º1,207.º e 577.º do CPC.

Por sua vez, o apelante entende que, a segurança social, em face da impugnação judicial da decisão de indeferimento do solicitado apoio judiciário, revogou, em 23/10/2014, a primeira decisão, deferindo o apoio judicário(cf.fls. 355 e 356)

Salvo o devido respeito não podemos subscrever o entendimento da decisão recorrida, sendo certo que, a interpretação do apelante no que concerne ao documento datado de 23/10/2014, nos parece incorrecta.

Relevam para a decisão a proferir os art.ºs 26.º a 29.º da Lei n.º 34/2004 de 29 de Maio, que regula o acesso ao direito e aos Tribunais.

Determina tal lei que cabe á segurança social decidir do requerimento de protecção jurídica (art.º 21).

A decisão final sobre o pedido de protecção jurídica é notificada ao requerente ( art.º 26.º n.º 1). A decisão sobre o pedido não admite reclamação nem recurso hierárquico ou tutelar, sendo apenas susceptível de impugnação judicial (art.º 26.º n.º 2).

Ora, no caso concreto, em face do indeferimento por parte da segurança social, do pedido de protecção jurídica na modalidade de dispensa de pagamento da taxa de justiça, reagiu o requerente, impugnando judicialmente aquela decisão, nos termos do disposto no art.º 27.ºn.º 3.

Assim, o apelante entregou a impugnação nos serviços da segurança social que ficou com o dever de, em dez dias, revogar a decisão proferida sobre o pedido de protecção jurídica. No caso de manter tal decisão a segurança social deverá enviar a cópia autenticada do processo administrativo ao tribunal competente a fim de conhecer da impugnação judicial, pelo tribunal competente de acordo com o art.º 28.º, com vista a decidir do pedido especificando as modalidades e a concreta medida do apoio concedido.

No caso dos autos, e ao contrário da interpretação do apelante, é claro que o despacho da segurança social datado de 23/10/2014, como ali se refere “Na sequência da impugnação judicial”, cumpriu o determinado, como ali se refere no art.º 27.º n.º 3 da dita lei, mantendo a decisão de indeferimento.

Nestes termos, é evidente que ainda não se vislumbra, em face dos autos, a existência de qualquer decisão judicial definitiva relativamente ao pedido de protecção jurídica em causa pressuposto da decisão recorrida.

Assim, deve ser revogada a decisão recorrida, cumprindo-se o determinado no despacho de fls 333 e 334, até decisão judicial definitiva sobre o pedido de protecção jurídica.

Em conclusão:

Enquanto estiver pendente a impugnação judicial do indeferimento, pela segurança social, não se verifica a excepção inominada por falta de pagamento da taxa de justiça.

DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível em revogar a decisão recorrida por inexistir, por ora, qualquer fundamento para indeferir liminarmente o requerimento inicial, devendo-se cumprir o despacho de fls 333 e 334 até decisão final do pedido de protecção jurídica requerida pelo requerente.

Sem custas

G-28.05.2015

Isabel Rocha

Jorge Teixeira

Manuel Bargado