Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1922/09.9TBGMR-A.G1
Relator: CONCEIÇÃO BUCHO
Descritores: EXECUÇÃO PARA ENTREGA DE COISA CERTA
OPOSIÇÃO
SUSPENÇÃO DA EXECUÇÃO
CIRE
INSOLVÊNCIA
EFEITO DEVOLUTIVO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/27/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1. Na execução para entrega de coisa certa fundada em sentença, o recebimento da oposição apenas suspende a execução se: a) o executado prestar caução (artigo 818º, nº 1); b) a oposição tiver por fundamento benfeitorias a que o executado tenha direito (artigo 929º, nºs 1, 2 e 3).
2. Baseando-se a execução em sentença da qual foi interposto recurso com efeito meramente devolutivo não se aplica o disposto no n.º 3 do artigo 47º do Código de Processo Civil, uma vez que se a sentença for revogada o executado pode pedir a respectiva restituição.
Decisão Texto Integral: Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.



I - Na presente oposição à execução intentada por António contra o exequente Paulo, veio o oponente alegar, em síntese, que:
1.º- Existe manifesta contradição entre a causa de pedir e o pedido, uma vez que é pedida a entrega de um imóvel por força de um Acórdão da Relação, confirmado por Acórdão do Supremo, ambos transitados em julgado, quando apenas há uma sentença, produzida pelo tribunal da 1.ªinstãncia e que não transitou em julgado;
2.º- Sendo o título dado à execução um Acórdão do Tribunal da Relação, tal título é inexistente;
3.º- A sentença a que o exequente alude ainda não transitou em julgado, pelo que o exequente não pode obter a entrega da coisa enquanto não prestar caução (artigo 818.º, n.º 4 do CPC).
O exequente apresentou contestação, pugnando pela improcedência da oposição e pedindo a condenação do exequente como litigante de má-fé, invocando que a oposição é infundada, inverídica e ilegal.
Foi concedida a possibilidade do exequente responder ao pedido de
condenação como litigante de má-fé. Nesta sequência o exequente veio dizer que a oposição resultou do que o exequente fez constar do requerimento executivo, bem como do que consta da lei. Termina concluindo pela improcedência do pedido.

Foi então proferida decisão nos seguintes termos:
Destarte, decido:
a) julgar improcedente a presente oposição à execução; e,
b) absolver o oponente do pedido de condenação como litigante de má-fé.

Inconformado o executado interpôs recurso, cujas alegações de fls. 51 a 55 terminam com as seguintes conclusões:

1º No presente processo o exequente veio requerer execução para entrega de um prédio, com base em sentença não transitada em julgado, por dela ter sido interposto recurso, recebido, no entanto, com efeito meramente devolutivo.
2º No entanto o exequente não requereu a prestação de caução, conforme lhe imposto pelo artigo 47º n.º3 do Código de Processo Civil, aplicável a todas as formas de processo executivo e não apenas ao processo executivo para pagamento de quantia certa, como decidiu, entre outros o acórdão da Relação do Porto de 23 de Novembro de 1993, in B.M.J. 431,554.
3º Assim sendo, deveria, na procedência da oposição deduzida pelo executado, a sentença recorrida ter ordenado a suspensão da execução até que o exequente prestasse caução idónea, que deveria, aliás, ter requerido, logo no requerimento executivo, sob pena de violar, como violou o disposto nos artigos 818º, 930 n.º1 e 47º n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil
Termos em que, na procedência do recurso, deve revogar-se a decisão recorrida, julgando-se procedente a oposição, e, em consequência, determinando-se a suspensão da execução até que o exequente preste caução, para se fazer JUSTIÇA!


O recorrido apresentou contra-alegações, nas quais pugna pela manutenção do decidido.


Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II – É pelas conclusões do recurso que se refere e delimita o objecto do mesmo, ressalvadas aquelas questões que sejam do conhecimento oficioso – artigos 684º e 685-A Código de Processo Civil -.


Em 1ª instância foi dada como provada a seguinte matéria de facto:
A) Do requerimento executivo consta o seguinte texto: «1- Conforme resulta da sentença dada à execução, foi o executado condenado por Acórdão da Relação de Guimarães, confirmado por Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça – ambos transitados em julgado -, a reconhecer o direito de propriedade do exequente sobre o imóvel sito (…).
2- A sentença exequenda condenou o executado a entregar de imediato ao exequente o mencionado prédio (…).
3 – O executado interpôs recurso de apelação da douta sentença, o qual foi admitido, com o efeito meramente devolutivo. (…)
Termos em que, deve o executado ser citado para proceder à entrega ao exequente do prédio supra referido (….)» (v. fls. 2 dos autos principais) (sublinhado nosso).
B) Ao referido requerimento executivo, foi junta certidão extraída do processo n.º 341/08.9 TCGMR, da 2.ª Vara Mista de Guimarães, donde consta, a petição inicial, cópia não certificada de descrição predial e sentença que condenou o réu, ora oponente «a restituir, de imediato, ao autor, o prédio (…)» (v. fls. 43 dos autos principais).
C) Foi interposto recurso pelo réu, com efeito devolutivo, da sentença referida em B), a qual ainda não transitou em julgado (v. fls. 4 e 44 dos autos principais).
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Nos termos do nº 1 do artigo 928º do Código de Processo Civil, a execução para entrega de coisa certa inicia-se com a citação do executado para, no prazo de 20 dias, fazer a entrega ou opor-se à execução.
De acordo com o disposto no artigo 929º o executado pode deduzir oposição, pelos motivos especificados nos artigos 814º, 815º e 816º, na parte aplicável, e com fundamento em benfeitorias a que tenha direito.
No caso, não foram peticionadas quaisquer benfeitorias, não podendo, por isso, haver oposição com esse fundamento.
Baseando-se a sentença em sentença, apenas podem ser invocados os fundamentos previstos no artigo 814º.

Conforme dispõe o n.º 1 do artigo 47º do Código de Processo Civil, a sentença só constitui título executivo depois do trânsito em julgado, salvo se o recurso contra ela interposto tiver efeito meramente devolutivo.
De acordo com o n.º 3 do artigo 47º enquanto a execução estiver pendente de recurso, não pode o exequente ou qualquer credor ser pago sem prestar caução.
Também e de acordo com o n.º 4 (na redacção anterior ao DL 226/08 de 20 de Novembro) do mesmo artigo quando se execute sentença da qual haja sido interposto recurso com efeito meramente devolutivo, sem que a parte vencida haja requerido a atribuição do efeito suspensivo, nos termos do n.º 3 do artigo 692º , nem a parte vencedora haja requerido a prestação de caução, nos termos do n.º 2 do artigo 693º, o executado pode obter a suspensão da execução, mediante a prestação de caução, aplicando-se, devidamente adaptado, o n.º 3 do artigo 818º.
Assim, no caso pretendendo a suspensão da execução poderia o oponente ter requerido a prestação de caução, não sendo obrigatório o exequente prestá-la uma vez que não foi efectuado qualquer pedido de indemnização por benfeitorias, nem é esse o fundamento da oposição. Só nesse caso é que para prosseguir a execução o exequente estaria obrigado a prestá-la.
Deste modo, no caso concreto, não há que obrigar o exequente a prestar qualquer caução, não se aplicando a este tipo de execuções o n.º 3 do artigo 47º.
A caução aqui prevista visa garantir o direito do comprador à restituição do preço da venda executiva, quando esta é anulada em consequência da revogação da sentença condenatória, ou o direito do executado quando a anulação não é pedida.
Com efeito, de acordo com o disposto no artigo 930º, n.º 3 “ tratando-se de imóveis, o agente de execução investe o exequente na posse, entregando-lhe os documentos e as chaves, se os houver, e notifica o executado, os arrendatários, e quaisquer detentores para que respeitem e reconheçam o direito do exequente.
Dispõe ainda o n.º 5 do citado artigo que “ efectuada a entrega da coisa, se a decisão que a decretou for revogada ou se, por qualquer outro motivo, o anterior possuidor recuperar o direito a ela, pode requerer que se proceda à respectiva restituição”.
Só no caso de conversão da execução de entrega de coisa certa em execução em pagamento de quantia certa, nos termos do disposto no artigo 931º do citado código, e a sentença ainda não tivesse transitado é que o n.º 3 do artigo 47º poderia ter aplicação, o que não é o caso dos autos – (veja-se neste sentido o Ac. do STJ de 29.10-98, in BMJ 480, pág.). 411
Assim, tem de se concluir que se a sentença for revogada o executado pode requerer a respectiva restituição, uma vez que, no caso, não se coloca a questão da venda do imóvel, nem este se desvanece.

Em síntese dir-se-á que na execução para entrega de coisa certa fundada em sentença, o recebimento da oposição apenas suspende a execução se: a) o executado prestar caução (artigo 818º, nº 1); b) a oposição tiver por fundamento benfeitorias a que o executado tenha direito (artigo 929º, nºs 1, 2 e 3).
Baseando-se a execução em sentença da qual foi interposto recurso com efeito meramente devolutivo não se aplica
o disposto no n.º 3 do artigo 47º do Código de Processo Civil, uma vez que se a sentença for revogada o executado pode pedir a respectiva restituição.
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III - Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.


Guimarães, 27 de Fevereiro de 2012.
Maria Conceição Bucho
Antero Veiga
Raquel Rego