Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1464/11.2TBEPS.G1
Relator: ESTELITA MENDONÇA
Descritores: DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
IMPULSO PROCESSUAL DAS PARTES
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/16/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1. Nos termos do disposto no art. 281 n.º 1 do CPC “considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontra a aguardar impulso processual há mais de seis meses”.
2. O envio de um email pelo A. directamente ao Agente de Execução, dentro desse período de seis meses, em que se pergunta o estado da citação de um dos RR, email não comunicado ao tribunal, não corresponde à prática de um acto donde decorra qualquer impulso processual, mas somente de informação acerca do estado do processo.
Decisão Texto Integral: Acordam na 1ª Secção Civil do Tribunal da Relação de Guimarães:
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Com data de 17/10/2014 foi proferido o seguinte despacho:
“Nos termos dos art.´s 277º, c), e 281, nº 1, do NCPC, julgo deserta a instância por ausência de impulso processual por parte do Autor há mais de seis meses e, em consequência, declaro-a extinta.
Custas pelo Autor”.

Inconformado com o assim decidido veio o BANCO AA., Sociedade Aberta interpor Recurso apresentando para tal as seguintes CONCLUSÕES:
A. O Agente de Execução exerce funções públicas e está na dependência funcional do Juiz de execução.
B. Ao Agente de Execução cabe a realização de uma função que incumbe ao estado por força do artº 20º nº 1 da CRP, ou seja, fazer com que a defesa de interesses legítimos seja defendida.
C. Toda a actividade exercida pelo Agente de Execução pode, em alternativa, ser efectuada por Oficial de Justiça, cfr. nº 4 do artº 808º do CC, funcionário público por excelência.
D. O Agente de Execução, na dependência funcional do juiz, é equiparado a um funcionário judicial, estando sujeito, entre outros, aos seguintes deveres:
◾Cumprir todos os deveres a que está sujeito por estar inscrito como solicitador ou como advogado (123.º/1/proémio do ECS);
◾Praticar diligentemente os actos processuais de que seja incumbido, com observância escrupulosa dos prazos legais ou judicialmente fixados e dos deveres deontológicos que sobre si impendem; (123.º/ 1/a) ECS);
◾Submeter a decisão do juiz os actos que dependam de despacho ou autorização judicial e cumpri-los nos precisos termos fixados; (123.º/1/b) do ECS);
◾Prestar às partes os esclarecimentos que lhe forem solicitados sobre o andamento das diligências de que seja incumbido; (123.º/1/c) do ECS);
◾Prestar ao tribunal os esclarecimentos que lhe forem solicitados sobre o andamento das diligências de que seja incumbido; (123.º/1/d) do ECS);
◾Arquivar e conservar durante 10 anos todos os documentos relativos às execuções ou outros actos por si praticados no âmbito da sua função nos termos de regulamento a aprovar pelo Conselho Geral; (123.º/1/f) do ECS);
E. Nestes autos de Acção Pauliana, a plataforma Citius não permite que o Autor contacte o Agente de Execução, por via de “Comunicações a Agente de Execução” – que ficam logo documentadas nos Autos.
F. Alternativa não havendo que não a de utilizar os meios electrónicos disponíveis, ou seja, a utilização do endereço electrónico do Agente de Execução (como, aliás, vem prevista na lei: ◾Utilizar meios de comunicação electrónicos nas relações com outras entidade públicas e privadas, designadamente com o tribunal; (123.º/1/l) do ECS); e ◾Ter um endereço electrónico nos termos regulamentados pela Câmara; (123.º/1/m) do ECS); ]).
G. O Tribunal, nos termos da lei, confiou a citação pessoal a Agente de Execução, que nomeou para o exercício de funções públicas (citação).
H. O Autor diligenciou, por via de contactos formais (via e-mail) e informais (via telefone), directamente, junto do Agente de Execução, no sentido não só deste proceder à citação pessoal pretendida, como também de informar os próprios autos das diligências que tenha realizado nesse sentido.
I. O Agente de Execução nomeado é considerado, também pelo aqui Autor (Banco AA, SA), como muito competente e diligente, sendo assim, por ele, indicado em imensos processos por si instaurados.
J. Nos inúmeros processos que este Agente de Execução acompanha (nomeado por indicação do Banco AA), nunca ocorreu, junto de qualquer Tribunal e do próprio Banco AA, qualquer silêncio anómalo ou pedido não correspondido.
L. O escritório do Agente de Execução nomeado informou o Banco Autor que desenvolveu diligências para se inteirar deste processo complexo (herdado em contornos poucos habituais), nomeadamente, compulsando os autos na secretaria.
M. Não desconfiando o Autor que nenhuma notícia tivesse sido, entretanto, veiculada ao Tribunal - cfr. este solicitou e era dever daquele observar.
N. O Autor, não obstante não terem sido documentados nos autos pelo Agente de Execução (a quem tal competia, em 1ª linha), nem pelo próprio Autor, praticou actos tendentes ao impulso e prosseguimento destes autos (cfr. resulta do supra exposto dos pts. 11 e 13), junto do Agente de Execução – entidade competente e nomeada pelo Tribunal para a prática do acto processual pretendido (citação).
O. Actos que bem demonstram o interesse e o impulso atempado pelo Autor dos actos processuais ao seu alcance, junto do Agente de Execução - designado para exercer as funções públicas, que antes podiam apenas ser desempenhadas por Oficial de Justiça.
P. Não sendo verdade que o Autor não tenha dado impulso processual devido.
Q. O Banco Autor não foi negligente e o impulso processual aqui em causa foi a própria propositura desta acção, que está na fase de citação – e que o Tribunal, ao abrigo do disposto nos arts. 231º (com a epígrafe “citação por agente de execução ou funcionário judicial”) e o art. 226º (com a epígrafe “Regra da oficiosidade das diligências destinadas à citação), confiou a Agente de Execução.
R. Que o próprio Tribunal, em Novembro de 2012, ao abrigo do art. 808º do CPC (art. 720º do NCPC), e constatados vários incumprimentos dos deveres a que os Agentes de Execução estão obrigados, substituiu, nomeando ou outro Agente de Execução
S. E sendo descabido que o Autor veja o seu direito prejudicado pelo facto de uma outra entidade (Agente de Execução), quer exerce funções públicas, competente para o efeito, e que foi nomeada pelo Tribunal para proceder à citação pessoa, nos termos da lei, não tenha observado os deveres que lhe competiam.
O Despacho recorrido, ao julgar deserta a instância por ausência de impulso processual por parte do Autor há mais de seis meses e, em consequência, a declarar extinta, faz inadequada interpretação e aplicação, para além do mais, dos arts. 277º, c), 281º/ nº 1 e arts. 231º e 226º do NCPC, bem como da disciplina jurídica à atinente à figura do Agente de Execução (funções e competências: art. 20º/ nº 1 da CRP, Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março e Dec.-Lei n.º 88/2003, de 26.04 [Estatuto da Câmara dos Solicitadores]) e aos princípios basilares da justiça, da divisão de competências, certeza, segurança e confiança jurídicas entre sujeitos processuais e entidades que exercem funções públicas, que subjazem, sempre, às relações jurídicas processuais.
Pelo que deve ser revogada!
TERMOS EM QUE, E NOS MAIS DE DIREITO, DEVE O PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO SER JULGADO PROCEDENTE E, CONSEQUENTEMENTE, SER REVOGADA A DECISÃO DO TRIBUNAL A QUO QUE EXTINGUIU ESTES AUTOS DE ACÇÃO PAULIANA, E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE, TOMANDO CONHECIMENTO DOS ACTOS PROCESSUAIS ORA DOCUMENTADOS (e-mails enviados directamente ao Agente de Execução) DECLARE ESTES AUTOS EM CURSO, CONCEDENDO 15 DIAS AO AGENTE DE EXECUÇÃO, PARA JUNTAR AOS AUTOS COMPROVATIVOS DE DILIGÊNCIAS EFECTUADAS TENDENTES À
CITAÇÃO PESSOAL DO RÉU CC.
Assim decidindo, farão V. Exas. JUSTIÇA!

A este recurso responderam os RR BB e outros, terminando do seguinte modo:
1. A recorrida foi notificada do douto despacho judicial que julgou deserta a instância por ausência de impulso processual do autor há mais de seis meses e que a declarou extinta.
2. A deserção da instância está regulada pela norma do artigo 281.º, n.º 1, do novo Código de Processo Civil que preceitua que: "Sem prejuízo do disposto no n.º 5, considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses."
3. Atento o alegado pelo recorrente, a data relevante para iniciar a contagem do prazo de 6 meses para se verificar a deserção é a da notificação do douto despacho judicial com a referência 3339403, em que foi decidido o seguinte: "Aguardem os autos o impulso processual da Autora, sem prejuízo dos prazos de interrupção e deserção da instância do novo CPC".
4. Este douto despacho judicial foi notificado ao agora recorrente, segundo este próprio alegou, no dia 14-01-2014 [cfr. artigo13.º das doutas alegações de recurso do recorrente].
5. Porém, a data relevante para início da contagem do prazo é a da notificação de 21-10-2013 com a referência 3292447 com o seguinte teor: "Fica deste modo V. Exa. notificado, relativamente ao processo supra identificado para, no prazo de 10 dias, requerer o que tiver por conveniente, uma vez que o agente de execução XX, apesar de notificado para o efeito, não informa os autos sobre a requerida citação do réu CC."
6. E, se assim se não entendesse, seria a de 14-11-2013, através do douto despacho judicial com a referência 3316004, em que o Meritíssimo Juiz a quo decidiu o seguinte: "Uma vez que o novo AE Fernando Iglésias ainda não demonstrou ter procedido à citação do réu CC, notifique a autora para, face ao exposto, requerer o que tiver por conveniente em dez dias."
7. Porém, ainda que se considere como o recorrente que a data relevante é a de 14-01-2014, nos termos que foram acima expostos, é necessário considerar o seguinte.
8. Analisado o douto requerimento de recurso, verifica-se que o recorrente alega que desenvolveu novos contactos com o Agente de Execução, sendo que o único que releva no decurso cronológico é o que consta do documento 2 que juntou ao requerimento que antecedeu o de interposição do presente recurso e referido no artigo 14.º das douta alegações de recurso.
E deste retira-se que: - é um email enviado em 07-08-2014;
- o seu conteúdo é o seguinte: "(…) Tendo presente o assunto epigrafado, bem como as notificações anexas, solicitamos nos informe se já foram citados todos os Réus, nomeadamente o Réu CC. Muito obrigado.
Na expectativa das V/ notícias,
(…)."
9. Ora, por um lado, o envio deste email ocorre mais de 6 meses após a data de notificação do douto despacho judicial (deste e dos anteriores).
10. Por outro lado, o envio de um email ao AE, cujo conteúdo se reproduz, não corresponde à prática de um acto donde decorra qualquer impulso processual, mas somente de informação acerca do "estado do processo", o que, por si, demonstra que não foi impulsionado o processo, mas apenas perguntado acerca do seu estado.
11. Assim, pelo menos desde 14-01-2014 até à presente data não foi praticado qualquer acto donde decorra a existência de um impulso processual.
12. Nestes termos, a douta sentença recorrido não deve ser objecto de qualquer censura, pois julgou os factos e aplicou devidamente o direito, sem que se encontre violada qualquer norma jurídica.
TERMOS EM QUE, mantendo a douta sentença recorrida, farão Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, a tão esperada e sempre habitual J U S T I Ç A.

Colhidos os vistos legais, cumpre agora decidir.
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Objecto do recurso
Considerando que:
- o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes (artigos 635 do Código de Processo Civil), estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e,
- os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
Delimitado como está o objecto do recurso pelas conclusões das alegações, das formuladas pela Apelante resulta que a questão que é colocada à nossa apreciação é a de saber se deve ser mantido o despacho que julgou extinta a instância por deserção, ou se esse despacho deve ser revogado e os autos prosseguirem.
***
Importa reter os seguintes pontos:
- A presente acção (impugnação Pauliana) foi intentada pelo Banco AA em 23 de Dezembro de 2011 (fls. 74) sendo RR. BB e Outros;
- Não tendo sido possível a citação postal de CC e de DD (fls. 83 e 84) foi nomeada a agente de execução YY para proceder à mesma que a aceitou (fls. 86);
- Em 18/01/2012 veio o A. Banco AA informar que DD e EE são menores, requerendo a citação deles nas pessoas dos representantes legais, que identifica (fls. 87 a 90);
- Em 30/01/2012 foi proferido despacho judicial a notificar a srª A.E. para informar se já deu cumprimento ao solicitado e foi ordenado o cumprimento do disposto no art. 15.º do C.P. Civil (fls. 91);
- Em 25 de Janeiro de 2012 veio o A. informar que já tinha procedido ao registo da acção, juntando os documentos respectivos (fls. 92 a 125);
- Sendo devolvida a carta de notificação da A.E. YY (fls. 127) foi proferido despacho judicial, em 11/04/2012 a insistir, com a cominação de multa processual caso nada seja dito pela mesma no prazo de 10 dias (fls. 128);
- Por despacho de 25/05/2012 foi a mesma condenada em 2 UC`s de multa e comunicado ao órgão com competência disciplinar respectivo (fls. 129);
- Atenta a informação de que a A.E. tinha sido declarada insolvente, por despacho de 25/10/2012 foi ordenada a nomeação de outro A.E. em substituição (fls. 135);
- Em 6/11/2012 o A. veio pedir a nomeação de XX como Agente de Execução (fls. 136 e 137);
- Em 7/01/2013 o Conselho geral da Câmara dos Solicitadores veio pedir que o escritório da A.E. YY estava em liquidação, pedindo que o tribunal aguardasse o termo da liquidação antes de proceder á substituição da mesma (fls. 143 e 144);
- Com data de 7/02/2013 o tribunal perguntou ao Conselho geral da C.S. se era possível substituir a A.E. YY (fls. 145);
- Em 27/02/2013 o Conselho geral da Câmara dos Solicitadores veio informar que tinha sido nomeado Agente de Execução XX em substituição da YY (fls. 146);
- Com data de 14/11/2013 por despacho judicial foi ordenada a notificação da A. para requerer o que tiver por conveniente em 10 dias, uma vez que o A.E. XX ainda não demonstrou ter procedido á citação do R. CC (fls. 147);
- Com data de 13/01/2014 foi proferido despacho a determinar que os autos aguardem o impulso processual da A., sem prejuízo dos prazos de interrupção e deserção da instância do novo C.P.C. (fls. 148);
- Em 8/01/2014, a Ré EE veio juntar procuração a favor dos Dr.s A, B e C, requerendo a sua associação ao CITIUS (fls. 149 e 150).
- Em 17/10/2014 foi proferido o seguinte despacho “Nos termos dos art.´s 277º, c), e 281, nº 1, do NCPC, julgo deserta a instância por ausência de impulso processual por parte do Autor há mais de seis meses e, em consequência, declaro-a extinta”, ou seja, o despacho recorrido (fls. 151).
- Em 29/10/2014 veio o A. requerer “que o tribunal tomasse conhecimento dos actos processuais documentados”, que revogasse o antecedente despacho” e que “concedesse ao agente de execução XX 15 dias para juntar aos autos comprovativos de diligência efectuadas tendentes à citação do Réu CC” (fls. 152 a 163) o que a Ré EE veio opor-se por entender não ter sido praticado qualquer acto processual pelo A., pelo menos desde 14/01/2014 (fls. 164 a 167).
- Com data de 18/11/2014 foi proferido o seguinte despacho “Mantém-se o despacho de fls. 151”.
***
Decidindo.
Como é sabido, um dos princípios basilares do processo civil é o princípio do dispositivo.
O processo só se inicia sob o impulso da parte (o Autor). Ele encontra consagração no art.259 n.º 1 do C. P. Civil.
Tal como para a instauração do processo se exige o pedido da parte (impulso processual inicial) também o seu andamento ulterior depende de solicitação das partes (impulso processual subsequente). O desenvolvimento do processo tem de ser continuamente estimulado pelas partes (Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1976, pág. 371).
Por isso é que as partes podem pôr termo ao processo através da desistência da instância, ou determinar o conteúdo da sentença de mérito, através da confissão, da desistência do pedido ou da transacção (Loc. Cit. Pág. 372).
Nos termos do disposto no art. 277 do C. P. Civil (anterior 287 do C.P.C. revogado) são as seguintes as causas de extinção da instância:
O julgamento;
O compromisso arbitral;
A deserção;
A desistência, confissão ou transacção;
A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide.
Nos termos do disposto no art. 281 n.º 1 do CPC, “Sem prejuízo do disposto no n.º 5 (que se refere ao processo de execução acrescentamos nós) considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontra a aguardar impulso processual há mais de seis meses”.
Compulsados os autos e vistos os elementos acima transcritos, verifica-se que
- Com data de 14/11/2013 por despacho judicial foi ordenada a notificação da A. para requerer o que tiver por conveniente em 10 dias, uma vez que o A.E. XX ainda não demonstrou ter procedido á citação do R. CC (fls. 147);
- Com data de 13/01/2014 foi proferido despacho a determinar que os autos aguardem o impulso processual da A., sem prejuízo dos prazos de interrupção e deserção da instância do novo C.P.C. (fls. 148);
- Em 17/10/2014 foi proferido o seguinte despacho “Nos termos dos art.´s 277º, c), e 281, nº 1, do NCPC, julgo deserta a instância por ausência de impulso processual por parte do Autor há mais de seis meses e, em consequência, declaro-a extinta”, ou seja, o despacho recorrido (fls. 151).
Vemos assim que, entre 13/01/2014, data em que o A. foi notificado via CItius de que os autos ficavam a aguardar o respectivo impulso processual, e 17/10/2014, data em que foi determinada a extinção da instância por deserção, decorreram cerca de 8 meses sem que o A. tenha dado conta ao tribunal seja do que fosse, nomeadamente de qualquer contacto que tenha efectuado com o agente de execução.
Vem agora o A. dizer que “O Agente de Execução exerce funções públicas e está na dependência funcional do Juiz de execução” e que “Ao Agente de Execução cabe a realização de uma função que incumbe ao estado por força do artº 20º nº 1 da CRP, ou seja, fazer com que a defesa de interesses legítimos seja defendida”, e ainda que “O Agente de Execução, na dependência funcional do juiz, é equiparado a um funcionário judicial, estando sujeito, entre outros, aos seguintes deveres: (…)”
Ora, em primeiro lugar tal não é rigorosamente verdade, não estando o agente de execução na dependência funcional do juiz.
O agente de execução é um profissional liberal sendo uma entidade externa ao tribunal.
Efectivamente, nos Termos da lei nº 23/2002 de 21 de agosto, a partir de 15 de Setembro de 2003 foi confiada aos Solicitadores uma nova especialidade, designada "Solicitador de Execução (SE)". Posteriormente, com a aprovação do Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro, esta denominação muda para “Agente de Execução”.
O Agente de Execução é um profissional liberal que exerce funções públicas.
Por essa razão, encontra-se estatutariamente sujeito a um regime específico, nomeadamente, em matéria de acesso à profissão e respectiva formação, incompatibilidades e impedimentos, direitos e deveres, remuneração dos seus serviços, controlo e disciplina.
O Agente de Execução não atua como mandatário das partes e está sujeito a um tarifário pelos honorários. Tramita todo o processo executivo, procedendo à citações em processos declarativos (quando frustradas por via postal).
O agente de execução é um profissional com poderes públicos para praticar os actos próprios dos processos executivos.
Cabe ao agente de execução dirigir o processo executivo e realizar todas as diligências de execução, incluindo as citações, notificações e publicações, as penhoras e vendas e a liquidação dos créditos. Embora não seja representante ou mandatário do exequente, o agente de execução é escolhido por ele de entre uma lista fornecida pela Câmara dos Solicitadores. O exequente pode substituir livremente o agente escolhido.
Ao juiz fica reservada a decisão das questões que sejam de natureza exclusivamente jurisdicional, ou seja, as que impliquem decidir em definitivo um litígio surgido durante a execução — por exemplo, a impugnação da existência da dívida ou a oposição ao bem efectivamente penhorado.
O agente de execução é, em regra, um solicitador ou um advogado, inscrito como agente na Câmara dos Solicitadores e fiscalizado e regulado por um órgão independente daquela câmara, a Comissão para a Eficácia das Execuções. Em determinados casos — como nas execuções em que o Estado seja o exequente (ou seja, o credor) —, também podem assumir funções de agente de execução os oficiais de justiça de um tribunal.
Não procede assim o argumento do A. de que “é descabido que o Autor veja o seu direito prejudicado pelo facto de uma outra entidade (Agente de Execução), quer exerce funções públicas, competente para o efeito, e que foi nomeada pelo Tribunal para proceder à citação pessoa, nos termos da lei, não tenha observado os deveres que lhe competiam”, pois que, atento o que fica dito, o impulso processual continua a caber ao A.
Por outro lado, sustenta o A. que “não obstante não terem sido documentados nos autos pelo Agente de Execução (a quem tal competia, em 1ª linha), nem pelo próprio Autor, praticou actos tendentes ao impulso e prosseguimento destes autos, junto do Agente de Execução – entidade competente e nomeada pelo Tribunal para a prática do acto processual pretendido (citação)”.
Ora, compulsados os autos nomeadamente os elementos juntos em 29/10/2014, no requerimento em que o A. veio requerer “que o tribunal tomasse conhecimento dos actos processuais documentados”, que revogasse o antecedente despacho” e que “concedesse ao agente de execução XX 15 dias para juntar aos autos comprovativos de diligência efectuadas tendentes à citação do Réu CC” (fls. 152 a 163), verifica-se que entre 13/01/2014, data em que foi proferido o despacho a determinar que os autos aguardassem o impulso processual da A., sem prejuízo dos prazos de interrupção e deserção da instância do novo C.P.C. (fls. 148), e 17/10/2014, data em que foi proferido o despacho recorrido, a única diligência que foi efectuada pelo A. foi um –mail enviado ao referido solicitador, em 7/08/2014, a pedir-lhe que informasse se já firam citados todos os RR., nomeadamente o ré CC (fls. 159).
No entanto, tal constitui correspondência trocada entre o A. e o solicitador, do que não foi informado o tribunal, pelo que nenhuma actividade, nenhum impulso processual foi trazido aos autos pelo A. entre 13/01/2014 e 17/10/2014.
Bastava ao A. vir aos autos dizer que aguardava a resposta do solicitador de execução ao ofício que lhe tinha enviado, pedindo a concessão de prazo para a junção da resposta do solicitador, para que não ocorresse a deserção da instância…
Ou então vir junto do tribunal insistir pela obtenção junto do AE de informação sobre o andamento da citação…
Optou por nada dizer.
Como bem diz a a Ré Sílvia, na sua resposta “o envio de um email ao AE, …, não corresponde à prática de um acto donde decorra qualquer impulso processual, mas somente de informação acerca do "estado do processo", o que, por si, demonstra que não foi impulsionado o processo, mas apenas perguntado acerca do seu estado. Assim, pelo menos desde 14-01-2014 até à presente data não foi praticado qualquer acto donde decorra a existência de um impulso processual”.
Tal é rigorosamente verdade.
Assim, nada há a alterar quanto ao despacho recorrido, que se mantém, improcedendo o recurso.
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Nos termos do disposto no art. 281 n.º 1 do CPC “considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontra a aguardar impulso processual há mais de seis meses”.
O envio de um email pelo A. directamente ao Agente de Execução, dentro desse período de seis meses, em que se pergunta o estado da citação de um dos RR, email não comunicado ao tribunal, não corresponde à prática de um acto donde decorra qualquer impulso processual, mas somente de informação acerca do estado do processo.
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DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente a apelação.

Custas pelo apelante.

Guimarães, 16 de Abril de 2015.
José Estelita Mendonça
Conceição Bucho
Maria Luísa Ramos