Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3636/12.3TBBCL .G1
Relator: HELENA MELO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
RESPONSABILIDADE OBJECTIVA
DONO DA OBRA
EMPREGADOR
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/09/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: No domínio dos acidentes de trabalho há responsabilidade objectiva (ou responsabilidade pelo risco). Não está porém tal responsabilidade prevista no Código Civil, sendo regulada em lei especial.
.E nos termos do artº 4º do Decreto nº 360/71, de 21/08, em conjugação com o disposto na Base II da L 2127 de 03.06.85, são responsáveis pela reparação e mais encargos previstos na lei as pessoas singulares ou colectivas de direito privado e de direito público não abrangidas por legislação especial, relativamente aos trabalhadores ao seu serviço, sendo pois os empregadores e não os donos da obra que respondem pela reparação do acidente.
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório
AA, intentou acção, com processo comum sob a forma ordinária, contra BB Lda” e CC, pedindo que estes sejam condenados a pagarem-lhe a quantia global de €139.975,30, posteriormente reduzida a €70.026,18, por a tanto ascender a indemnização que teve de pagar a um trabalhador que sofreu um acidente quando se encontrava ao seu serviço e porque o sinistro, imputável à inobservância das regras de segurança, ocorreu numa obra que lhe foi parcialmente adjudicada pela demandada sociedade em regime de subempreitada e esta assumira contratualmente a responsabilidade pela implementação dos dispositivos de segurança legalmente exigidos, acrescida de juros de mora, contados à taxa legal, desde 12 de Fevereiro de 2004 até efectivo e integral pagamento, bem como as quantias, a liquidar ulteriormente, que tiver de continuar a pagar àquele seu trabalhador enquanto vivo for.
Regularmente citados, os RR contestaram, invocando a ilegitimidade do Réu CC, a excepção de caso julgado formado pela sentença proferida na acção de acidente de trabalho e a prescrição do hipotético direito de regresso do A. e impugnando ainda a factualidade alegada por este. Pugnaram ainda pela condenação do A., como litigante de má-fé, em multa e indemnização a seu favor, esta de valor não inferior a €2.500,00.
O A. replicou pela forma constante de fls. 178 a 181, pugnando pela improcedência de todas as excepções deduzidas. Em sede de audiência prévia e porque se frustrou a conciliação das partes, foi proferido despacho saneador, no qual se relegou para final a apreciação da excepção de prescrição e se julgou procedente a excepção de ilegitimidade do Réu CC - que, como tal, foi absolvido da instância - e improcedente a excepção de caso julgado, seguido da enunciação dos temas da prova.
Procedeu-se a audiência de julgamento e a final foi proferida sentença que absolveu a R. do pedido.
O A. não se conformou e interpôs o presente recurso, onde formulou as seguintes conclusões:

A) Impugnação da matéria de facto, que considera incorretamente julgada, devendo ser reapreciada a prova gravada:
1. quer relativamente a parte do facto provado n.º 3, pois foi dado como provado no ponto 3 da matéria de facto da sentença recorrida, a data do contrato de execução de empreitada celebrado entre A. e R., para assentamento de tijolo na Quinta da Espinheira, em Barcelos, “4 de Maio de 1994”, quando da prova gravada resulta que deveria ter sido dado como provado 4 de Maio de 1997.
2. quer relativamente a parte do facto provado n.º 9, pois foi dado como provado no ponto 9 da matéria de facto da sentença recorrida, “O A. pagou à “Mapfre”, na sequência de um acordo de pagamento em prestações que com ela celebrou, a quantia em que foi condenado, recorrendo, para o efeito, a um empréstimo que lhe foi concedido, a título pessoal, pelo legal representante da ora R. “BB”, quando deveria ter sido dado como provado que o legal representante da R. pagou à Mafre através de um acordo de pagamento em prestações subscrito pelo mandatário da R. a quantia em que o A. foi condenado.
3. quer quanto ao facto, não provado, relativo à exclusiva responsabilidade da R. na decorrência do acordo corporizado no escrito no item 3 do elenco dos factos provados, a R. através dos seus representantes legais, pela segurança, vedação, colocação de andaimes e demais dispositivos de segurança da obra onde ocorreu o sinistro que vitimou o malogrado João … (…).
4. Quer quanto aos factos alegados pelo Recorrente nos arts. 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º e 18.º da P.I., que apesar de não constarem quer da matéria de facto provada quer da matéria de facto não provada na sentença recorrida, deveriam ter sido dado como provados, pois sendo instrumentais e relevantes, e tendo resultado da instrução e discussão da causa, deveriam ter sido valorados, para efeitos de apuramento da responsabilidade da ora Recorrida, da ilicitude da sua conduta e do montante da indemnização devida, devendo, em consequência, ser aditados à matéria provada e considerados para efeitos de fundamentação da decisão a proferir. Com efeito, é do conhecimento público e, em particular do conhecimento do Tribunal de 1.ª instância, e ficou provado que a Recorrida é dona da obra da Urbanização da Espinheira onde se deu o sinistro.
B) Invocação de erro de interpretação e aplicação de direito, relativamente aos pontos seguintes:
1. Interpretação e aplicação dos arts. 3.º, e), 5.º, n.º1 e 2, 6.º do Decreto- lei n.º 155/95 de 1 de Julho, respeitante à verificação da inobservância das disposições legais ou regulamentares aplicáveis e respeitante à verificação dos requisitos da responsabilidade da R. enquanto dono de obra em conjugação com a interpretação e aplicação do art.º 1207.º do Código Civil, respeitante ao contrato de empreitada, no sentido da violação lei, porquanto as obrigações de segurança e saúde em sentido técnico e respetiva imputação ao dono de obra, decorrentes da execução de contrato de empreitada, provêm da lei, nomeadamente do Decreto-Lei n.º 155/95 de 1 de Julho, pertencem à R. enquanto dono de obra e não ao A., por falta de prova de um acordo de imputação de responsabilidades à R., conforme foi julgado na sentença recorrida.
2. O contrato de empreitada regulado pelo art.º 1207.º do Código Civil, como aquele que “Empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço”, tem capacidade para abranger, no seu incumprimento, o incumprimento da obrigação de protecção e segurança em obra, inerente, às empreitadas em geral, no sentido de dever principal ou de obrigação acessória.
3. Bem como pelas disposições dos arts.º 499.º e ss do código Civil:
a. Nos termos do art.º 499.º “ São extensivas aos casos de responsabilidade pelo risco, na parte aplicável e na falta de preceitos legais em contário, as disposições que regula a responsabilidade por factos ilícitos.
4. No campo contratual pode verificar-se responsabilidade civil objectiva, tanto em consequência de cláusula sobre o risco, designadamente as chamadas obrigações de garantis, como derivada da própria lei; exs: 909.º e 921.º, n.º1 (A. Pinto Monteiro, Cláusulas limitativas, 1985, 65. citando Almeida Costa)
5. Nos termos do art.º 500.º do Código Civil:
a. “1. Aquele que, encarrega outrem de qualquer comissão responde, independentemente da culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar.”
6. Ora, a R. enquanto dono de obra e comitente que encarregou o A. comissário da execução de empreitada responde até independentemente de culpa pelos danos, que o A. causou ao sinistrado João, uma vez que sobre o A. recaiu a obrigação de indemnizar.
7. Nos termos do supra citado dispositivo legal, no “n.º2. A responsabilidade do comitente só existe se o facto danoso for praticado pelo comissário, ainda que intencionalmente ou contra as instruções daquele, no exercício da função que lhe foi confiada.”
8. Resulta do caso julgado do Tribunal de Trabalho que o facto danoso, sinistro do trabalhador João do A. se verificou no exercício da função que foi confiada ao A. pela R. de execução do contrato de empreitada.
A parte contrária contra-alegou, tendo oferecido as seguintes conclusões:
1º - Resulta das alegações do recorrente que o mesmo impugna matéria de facto nos presentes autos, sendo que, a lei processual civil impõe ónus para esse efeito, e os mesmos previstos no artigo 640º do C.P.C.
2º - Sucede que, o recorrente não respeita os ónus legais consagrados no artigo 640, n.º 1, al. b) e n.º 2, al. a) do C.P.C., nomeadamente, não faz a indicação exacta das passagens da gravação constantes do sistema informático em uso no tribunal “ a quo”.
3º - Perante tal situação, a jurisprudência é unânime em afirmar que:
“I – O artigo 640º do novo CPC, à semelhança do artigo 685º-B do CPC revogado, estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, prescrevendo no seu nº 2, alínea a), que no caso de ter havido gravação da prova, «incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes».
II - Decorre também da letra da lei que a mesma não comporta qualquer outra interpretação que não seja a da imposição da imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, caso não seja observado pelo recorrente algum dos ónus mencionados, não sendo defensável que se lance mão do convite ao aperfeiçoamento em tal matéria.”- Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 20-03-2014, in http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/0e5df9db3ae
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4º - Por tudo o supra exposto e ao abrigo do art. 640º N.º 1 al. b) e n.º 2 al. a) do C.P.C., deve o recurso apresentado pelo recorrentes ser imediatamente rejeitado no que se refere à matéria de facto impugnada.
5º - Dos documentos juntos aos autos resulta, sem margem para dúvidas, que a ré era dona da obra e contratou o autor para a execução dos trabalhos de assentamento de tijolo.
6º - Conforme alegado na petição inicial e constituiu tema de prova, não logrou o autor provar a existência de um acordo verbal entre autor e ré sobre a responsabilidade de execução do plano de segurança em obra, como resulta dos factos não provados:
“Não se provou que, na decorrência do acordo corporizado no escrito referido no item 3 do elenco dos factos provados, a Ré, através dos seus representantes legais, tivesse assumido verbalmente perante o Autor que a segurança, vedação, colocação de andaimes e demais dispositivos de segurança da obra onde ocorreu o sinistro que vitimou o malogrado João … seriam da sua exclusiva responsabilidade.”
7º - Compete a cada empreiteiro, no caso concreto ao autor, a execução do plano de segurança em obra referente aos seus trabalhadores!
8º - Não existe nenhum fundamento para a alteração das respostas dadas à matéria de facto, que foram correctamente avaliadas.
9º - Da mesma forma, não se entende a pretendida alegada omissão na matéria de facto dada como provada, da assunção de divida à MAFRE pelo legal representante da ré, matéria que não constituiu objecto desta acção.
10º - O contrato celebrado entre as partes, que foi reduzido a escrito, era um contrato de empreitada, uma vez que a ré era dona da obra como ficou demonstrado.
11º - A. não logrou provar, como era do seu ónus, a convenção adicional ao ajuizado contrato, atinente à responsabilidade pela implementação em obra dos dispositivos de segurança.
12º - Mesmo admitindo que tivesse existido semelhante convenção, nunca o A. poderia eximir-se, ao menos integralmente, à responsabilidade pela produção do sinistro, visto que, como lucidamente se expendeu na sentença proferida no âmbito da acção emergente de acidente de trabalho, certificada a fls. 213 a 224, “independentemente do acordado no âmbito do contrato de empreitada, sobre o R. AA (ora A.) impedia a obrigação de zelar pelo cumprimento das regras de segurança a fim se prevenir a ocorrência de sinistros laborais com os seus trabalhadores que prestassem serviço na obra em causa e, eventualmente, recusar a prestação de serviços, caso essas regras não fossem efectivamente asseguradas pelo empreiteiro ou dono da obra”.
13º - Não obstante o disposto na Base XXXVII da LAT, em vigor à data do sinistro (Lei 2.127, de 3 de Agosto de 1965), cuja disciplina coincide, grosso modo, com a consagrada no artigo 17º da Lei 98/2009, de 4 de Setembro, a responsabilidade imputada à Ré funda-se no incumprimento de um contrato pretensamente celebrado com o A., pelo que jamais poderia enquadrar-se naquele normativo, que regula a responsabilidade, civil ou criminal, de terceiros pela produção do sinistro, atribuindo ao sinistrado o direito de demandar directamente esses terceiros com base na lei geral e à entidade empregadora o direito de regresso do que tiver pago ao seu trabalhador contra os responsáveis, se aquele não exigir a estes a indemnização no prazo de um ano a contar da data do acidente.
14º - O Decreto-Lei 155/95 de 1 de Julho, cujas sanções são de natureza contraordenacional, não tem aplicação ao caso concreto.
15º - A sentença em crise não violou nenhuma disposição legal.

II – Objecto do recurso
Considerando que:

. o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e,

. os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido,

as questões a decidir são as seguintes:

. se a matéria de facto deve ser alterada;

. se a R. responde pela falta de cumprimento das regras de segurança na obra.

III – Fundamentação
Na 1ª instância foram considerados provados e não provados os seguintes factos:
Factos provados:
1 - O A. dedica-se, com escopo lucrativo, à actividade de construção civil, designadamente ao assentamento de tijolo;
2 - Em Maio de 1992 o A. admitiu ao seu serviço João … para, sob a sua autoridade, direcção e fiscalização, exercer as funções de operário da construção civil;
3 - Por escrito datado de 4 de Maio de 1994, denominado “Contrato de Execução de Empreitada”, a Ré adjudicou ao A. a execução dos trabalhos de assentamento de tijolo num prédio, de sua propriedade, sito na Urbanização da Quinta da Espinheira, em Barcelos, mediante uma contrapartida pecuniária de 400$00 por metro quadrado, acrescida de IVA à taxa legal em vigor;
4 - No dia 27 de Maio de 1998, pelas 10 horas e 30 minutos, no interior da referida obra, onde se encontrava a trabalhar por conta do A., o João … agarrou-se a uma escora de madeira quando puxava para si o guincho de uma grua e, porque a escora tivesse cedido com o seu peso e ele estivesse junto de uma abertura, desequilibrou-se e caiu da placa do terceiro piso, situada a cerca de sete metros de altura, estatelando-se no solo;
5 - Em consequência da queda sofreu fractura cominutiva do fémur esquerdo, lesão essa que lhe determinou incapacidade temporária absoluta até 6 de Março de 1999, altura em que foi convertida em incapacidade permanente, tendo-lhe sido fixada IPP de 60% em 24 de Abril de 2001 e sido então considerado incapaz para a sua profissão habitual e profissões afins;
6 - No momento do sinistro ainda estavam abertos os espaços entre os pisos e não se encontravam instalados na obra, ao nível da placa do terceiro piso, uma plataforma, redes de protecção, guarda-corpos, guarda-cabeças ou andaimes; na extremidade da placa existiam apenas escoras de madeira com barrotes transversais, com excepção do local por onde o malogrado João Reina caiu, visto que aí haviam sido retiradas três ou quatro escoras e os respectivos barrotes transversais de forma a permitir içar o guincho da grua;
7 - Por sentença, transitada em julgado, proferida em 26 de Junho de 2001 na acção emergente de acidente de trabalho que correu termos pelo Tribunal do Trabalho do Círculo de Barcelos sob o n.º 176/99, o ora A. foi condenado a pagar ao sinistrado as quantias de 1.146.926$00 e 1.647.343$00 e bem ainda, em duodécimos, a pensão anual e vitalícia de 714.765$00, acrescida de um duodécimo no mês de Dezembro de cada ano, a título de subsídio de Natal, com início no dia 25 de Abril desse ano, sendo as vencidas acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos à taxa de 7% desde 11 de Abril de 2000;
8 - Por sentença, transitada em julgado, proferida em 15 de Novembro de 2005 na acção que sob o n.º 908/04.4TVLSB correu termos pela 9ª Vara Cível de Lisboa, o ora A. foi condenado a reembolsar a “Mapfre – Seguros Gerais, S.A.” dos montantes pagos por esta, na qualidade de seguradora para a qual o mesmo transferira a sua responsabilidade infortunística laboral, ao malogrado João Reina, que totalizavam €69.949,12;
9 - O A. pagou à “Mapfre”, na sequência de um acordo de pagamento em prestações que com ela celebrou, a quantia em que foi condenado, recorrendo, para o efeito, a um empréstimo que lhe foi concedido, a título pessoal, pelo legal representante da ora Ré “Fersil”;
10 - Pagou ainda ao sinistrado, nos anos de 2003 a 2012, as quantias de €29.557,94, €3.215,00, €4.338,75, €4.438,59, €2.095,68, €1.420,00, €4.725,76, €4.784,00, €4.048,00 e 4.048,00, respectivamente.
Factos não provados:
Não se provou que, na decorrência do acordo corporizado no escrito referido no item 3 do elenco dos factos provados, a Ré, através dos seus representantes legais, tivesse assumido verbalmente perante o Autor que a segurança, vedação, colocação de andaimes e demais dispositivos de segurança da obra onde ocorreu o sinistro que vitimou o malogrado João Reina seriam da sua exclusiva responsabilidade.
Ficou igualmente por demonstrar que o A. tivesse pago ao sinistrado os restantes valores discriminados no artigo 18º da petição inicial.

Da pretendida alteração da matéria de facto:
Pretende o apelante a alteração da matéria de facto.
A apelada defende que a impugnação deve ser rejeitada porque o apelante não deu cumprimento aos disposto no artº 640º do CPC, não tendo indicado com exactidão as passagens da gravação em que se fundamenta.
Vejamos:
Da análise do recurso interposto pelo apelante constata-se que, relativamente a alguns pontos da matéria de facto, o apelante deu cumprimento ao disposto no artº 640º do CPC, mas não a todos.
O apelante não concorda com o facto dado como provado no ponto 3 relativamente à data do contrato que em seu entender não é 4 de Maio de 1994, mas sim 4 de Maio de 1997, com base no depoimento do legal representante da R. que transcreve em parte.
E, se atentarmos no corpo alegatório do seu recurso, o A. indica, por referência à gravação efectuada, concretamente os minutos e segundos em que são feitas determinadas declarações, nas quais se fundamenta, pelo que mostra-se cumprido relativamente a este ponto da matéria de facto, o disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 640º do CPC.
O apelante também não concorda com a circunstância de se ter dado como não provado que “na decorrência do acordo corporizado no escrito referido no item 3 do elenco dos factos provados, a Ré, através dos seus representantes legais, tivesse assumido verbalmente perante o Autor que a segurança, vedação, colocação de andaimes e demais dispositivos de segurança da obra onde ocorreu o sinistro que vitimou o malogrado João … seriam da sua exclusiva responsabilidade”, com base no depoimento do legal representante da R, que transcreve, também aqui com a indicação dos minutos e segundos, pelo que também, relativamente a este ponto da matéria de facto, o apelante indica com exactidão as passagens da gravação em que se funda.
No entanto, já quanto à impugnação dos factos constantes dos artigos 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 14º, 15º, 16º, 17º e 18º da p.i. que no entender do apelante deveriam ter sido dados como provados, o apelante não indica em que meios de prova se fundamenta, não dando cumprimento ao disposto no artº 640º do CPC. Acresce que, ainda que assim não fosse, nunca a matéria dos 15, 16, 17 poderia ser dada como provada, porque não contém factos, mas sim matéria de direito e conclusões de direito.
Relativamente à matéria de facto constante do ponto 9, o apelante entende que não se provou o que nele consta, pelo que ocorreu de julgamento, e refere quais os factos que em sua opinião se provaram, pedindo que passassem a constar do elenco de factos provados, mas também não fundamenta a sua impugnação, referindo apenas que “resulta dos documentos juntos e da prova gravada”. O apelante não indica quais os depoimentos em que se fundamenta para requerer a alteração da matéria de facto, nem sequer indica o nome da testemunha ou testemunhas em cujo depoimento se terá alicerçado, nem concretiza quais os documentos que implicam uma alteração, fazendo posteriormente uma breve alusão a e-mails da Mapfre que também não concretiza, sendo que não se encontram nos autos quaisquer e-mails da Mapfre.
Consequentemente, rejeita-se a impugnação da matéria de facto relativa aos ponto 9 e aos factos constantes dos artigos 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 14º, 15º, 16º, 17º e 18º da p.i.
Vejamos então as alterações pretendidas quanto ao ponto 3 da matéria de facto:
O apelante fundamenta-se no depoimento do legal representante da R. e pretende quanto ao ponto 3 que se dê como provado que o contrato foi celebrado em 4 de Maio de 1997 (e não em 4 de Maio de 1994) e que a Ré, através dos seus representantes legais, assumiu verbalmente perante o Autor que a segurança, vedação, colocação de andaimes e demais dispositivos de segurança da obra onde ocorreu o sinistro que vitimou o malogrado João Reina seria da sua exclusiva responsabilidade.
Procedeu-se à audição na íntegra das declarações prestadas pelo legal representante da R.
Ora, destas declarações nada resulta em prol do defendido pelo apelante, como aliás, já resultava dos segmentos transcritos que inseriu no seu recurso.
O legal representante da R. começou por dizer que tinha sido celebrado apenas um único contrato de empreitada com o A., para todos os edifícios em que o A. prestou os seus serviços de colocação de tijolo, mas pareceu um pouco confuso quando lhe foi exibido o documento de fls 14 junto pelo A., o que não foi esclarecido, posto que o Mmo. Juiz por considerar que “era pacífica” a existência deste contrato, não insistiu em questões sobre o contrato.
No decurso das suas declarações referiu ainda que este contrato servia para todas as obras e que os contratos eram sempre reduzidos a escrito, acabando por confirmar que as cláusulas que acordou eram as que constavam do contrato junto a fls 14.
Não referiu o declarante a existência de qualquer outro acordo escrito celebrado em 1997.
Não deixa de se estranhar a posição do apelante, quando foi o apelante que juntou o contrato aos autos, doc. nº 1 junto com a p.i., alegando ter sido esse o contrato que celebrou com a R., sendo que o documento que está junto tem a data de 4 de Maio de 1994 e não 1997, como pretende o apelante que se dê como provado.
Também nunca referiu o legal representante da R. nas declarações que prestou, a celebração de qualquer acordo com o A. no sentido de que seria a R. a colocar os dispositivos de segurança. Pelo contrário, ao longo de todo o seu depoimento, sempre referiu que o que foi acordado é que incumbia a cada empreiteiro tratar da segurança dos seus trabalhadores.
Refira-se ainda como nota final, que ainda que não se tivesse rejeitado a impugnação da matéria de facto quanto ao ponto 9, sempre a pretensão do apelante com base nos denominados e-mails da Mafre, juntos na sequência de diligências efectuadas pelo tribunal, teria que improceder. Encontra-se junto aos autos um documento da Mapfre a fls 343 (mas que não é um e-mail) onde a mesma refere que acordou com o agora A. o pagamento da quantia que reclamou na acção que lhe instaurou e que correu termos no 9º Juízo Cível do Tribunal de Lisboa, em 12 prestações mensais e sucessivas no montante cada uma de 5.829,09 e juntou a referida carta em que o então mandatário do ora A. aceitou essas condições (fls 344). Ora face a estes documentos não é possível concluir nos termos pretendidos pelo A., de que teria sido o legal representante a assumir o pagamento directamente por se considerar responsável pelo sinistro.
O Mmo. Juiz a quo foi um juiz activo, e ponderou a prova produzida de acordo com as regras da experiência e da lógica, não se afigurando ter ocorrido qualquer erro de julgamento, pelo que a matéria de facto a considerar é pois aquela que a 1ª instância deu como provada.

Do Direito
Entende o apelante que a sentença recorrida violou várias disposições legais do DL 155/95 e ainda as normas do CC relativas à responsabilidade pelo risco, ao contrato de empreitada e relativa à presunção de culpa no incumprimento contratual (artº 799º do CC).
Vejamos a acção instaurada pelo A.:
O A. estrutura a sua acção, alegando que
. Era a R. que detinha a direcção e a fiscalização da obra, pelo que lhe incumbia prover a mesma de guarda corpos, sólida e devidamente fixados, ou plataformas de trabalho, com largura mínima de 0,40 m, escadas de telhador e/ou tábuas de rojo, solidamente fixadas em pontos resistentes da obra, protecções essas que pertenciam colocar ao R., por deter a direcção e fiscalização da obra, o que não fez e que o A. só ficou a saber depois de um sinistro em obra.
Mais alegou que:
. celebrou um contrato com a R. de sub empreitada para assentamento de tijolo na construção da obra em curso, pelo preço de 400 m 2 + Iva, tendo ficado acordado quando da respectiva assinatura, verbalmente, que a segurança, vedação, colocação de andaimes e tudo o mais que se prendia com o assentimento do tijolo pertencia exclusivamente à R., uma vez que ao mesmo tempo que o A. executava a referida sub empreitada decorriam na mesma construção a cargo da R. obras para as quais tinham necessariamente que ser respeitadas todas as condições de segurança.
Na parte final da sua petição inicial, destinada à fundamentação jurídica, o A. alicerçou a sua pretensão no disposto no artº 617º do CT e na responsabilidade pelo risco.
Como se sabe, o Tribunal não está adstrito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras do direito (artº 5º nº 3 do CPC).
Ora, o artº 617º do CT de 2003 não tem aqui qualquer aplicação, desde logo porque não estava em vigor à data dos factos. Depois, porque se refere a responsabilidade contra-ordenacional que também não está aqui em causa.
No domínio dos acidentes de trabalho há responsabilidade objectiva (ou responsabilidade pelo risco). Não está porém tal responsabilidade prevista no Código Civil, sendo regulada em lei especial. Aliás a responsabilidade objectiva começou por revestir especial papel precisamente nesta área dos acidentes de trabalho.
E nos termos do artº 4º do Decreto nº 360/71, de 21/08, em conjugação com o disposto na Base II da L 2127 de 03.06.85 A Lei 100/97 , de 13/9 de só veio a entrar em vigor, posteriormente à ocorrência deste acidente., são responsáveis pela reparação e mais encargos previstos na lei as pessoas singulares ou colectivas de direito privado e de direito público não abrangidas por legislação especial, relativamente aos trabalhadores ao seu serviço, sendo pois os empregadores e não os donos da obra que respondem pela reparação do acidente.
Também não vislumbramos a alegada violação do DL 155/95.
Este diploma encontrava-se em vigor à data do acidente que vitimou o trabalhador do ora A. e foi revogado pelo artº 30º do DL 273/2003. No entanto, o disposto neste diploma não exonera o empregador dos deveres a que está adstrito, em matéria de segurança. A obrigação que recai sobre o dono da obra é a de elaborar um plano de segurança e saúde e nada foi alegado nem provado de que tal plano não tivesse sido feito.
E não tendo o A. logrado provar o alegado acordo entre si e a R. que mesmo a existir não o teria desonerado de responder como entidade patronal do trabalhador sinistrado, o apelo ao artº 799º do CC, não tem qualquer aplicação, pois que pressupõe o incumprimento contratual.
Improcedem assim as conclusões da apelação.

Sumário:
.No domínio dos acidentes de trabalho há responsabilidade objectiva (ou responsabilidade pelo risco). Não está porém tal responsabilidade prevista no Código Civil, sendo regulada em lei especial.
.E nos termos do artº 4º do Decreto nº 360/71, de 21/08, em conjugação com o disposto na Base II da L 2127 de 03.06.85, são responsáveis pela reparação e mais encargos previstos na lei as pessoas singulares ou colectivas de direito privado e de direito público não abrangidas por legislação especial, relativamente aos trabalhadores ao seu serviço, sendo pois os empregadores e não os donos da obra que respondem pela reparação do acidente.

IV – Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.
Guimarães, 9 de Julho de 2015
Helena Melo
Heitor Gonçalves
Manso Rainho