Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
156200/12.0YIPRT.G1
Relator: ANA CRISTINA DUARTE
Descritores: AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
SENTENÇA
NOTIFICAÇÃO
ACTA DE JULGAMENTO
CITIUS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/17/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1 - Quando proferida oralmente a sentença, em sede de audiência de discussão e julgamento, no qual a parte esteve presente ou para a mesma foi notificada para comparecer, vale como efectiva notificação a leitura/comunicação oral efectuada, começando a correr o prazo para o recurso nessa mesma data.
2 - As decisões ou sentenças quando verbalmente proferidas, carecem de ser documentadas em acta.
3 – Estando a correr o prazo de recurso, cabe à parte o ónus de solicitar (requerendo-o) que a acta respetiva seja disponibilizada se, entretanto, decorreu já o prazo de cinco dias para a prática de actos pela secretaria.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO
“T…, SA” deduziu requerimento de injunção contra “A…, Lda.”, pedindo que esta lhe pague a quantia de € 9023,60, relativa ao fornecimento de bens, não pagos na data do vencimento da respetiva fatura.
A requerida deduziu oposição, alegando não lhe terem sido prestados quaisquer serviços ou fornecido quaisquer bens e excecionou a ineptidão da petição inicial.
Remetidos os autos à distribuição, foi designado dia para realização da audiência de discussão e julgamento, que teve lugar, após o que foi proferida sentença que julgou a ação totalmente procedente, condenado a ré a pagar à autora a quantia de € 8801,99, acrescida de juros de mora, à taxa devida para os juros comerciais, contados desde o vencimento da fatura, até efetivo e integral pagamento.

A ré interpôs recurso, cujas alegações finaliza com as seguintes
Conclusões:
1.ª- O Ex.mo Tribunal a quo, na prolação da douta decisão em crise, efetuou uma incorreta apreciação, aplicação e interpretação da lei, nomeadamente das normas legais que disciplinam a forma de prolação da sentença e, bem assim, uma incorreta apreciação da prova, documental e testemunhal, produzida nos autos;
2.ª- Salvo o devido respeito por distinta e melhor opinião, a douta sentença proferida verbalmente nos presentes autos está ferida de nulidade;
3ª- Mais acresce que, atendendo toda a prova produzida nos autos, documental e testemunhal, o Ex.mo Tribunal recorrido não poderia ter - como fez - condenado a Recorrente;
4.ª- E, não obstante não concordar com o mérito daquela decisão condenatória prolatada nestes autos, em estrita violação dos direitos constitucionalmente consagrados do acesso ao direito e aos tribunais e do recurso, a Recorrente está impedida de se pronunciar especificadamente quanto àquela decisão e recorrer quanto à matéria de facto como julgada e ao direito aplicado, por não conhecer dos fundamentos concretos, de facto e de direito, que conduziram à sua condenação;
5.ª- Em evidente violação dos citados preceitos legais, o Ex.mo Tribunal a quo
na sentença proferida oralmente, limitou-se a indicar os factos que julgou como provados e a condenar a Recorrente no pagamento de uma determinada quantia, acrescida dos juros e custas, remetendo os respetivos fundamentos, de facto e de direito, para a ata resultante da diligência realizada no passado dia 04 de Julho;
6.ª- A douta sentença recorrida foi completamente omissa no que concerne ao
exame crítico da prova produzida e à legalmente exigível fundamentação, quer de facto quer de direito, através do elenco os factos provados e não provados, da apreciação crítica da toda a prova produzida nos autos e do tratamento jurídico do litígio, através da identificação, interpretação e da determinação dos efeitos jurídicos das normas aplicáveis in casu que estão na origem da condenação da Recorrente;
7.ª- Mais acresce que a sentença em crise também não continha qualquer apreciação das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância e, ainda, das exceções alegadas em sede de oposição à injunção de ilegitimidade e de ineptidão da petição inicial;
8.ª- Tudo o que determina a nulidade insuprível, por via das alíneas b) e a) do
Nº 1 do artigo 668º do CPC.
9.ª- Nulidades insupríveis – por falta de fundamentação - que expressamente se invocam com as legais consequências delas decorrentes, nomeadamente anulação do julgamento e a sua repetição.
10.ª- Mesmo que assim se não entenda, o que se não concede e por dever de
oficio se acautela, a sentença nos termos em que foi proferida nestes autos viola o direito ao recurso, legal e constitucionalmente consagrado, da Recorrente, porquanto:
11.ª- Com efeito, a Recorrente dispõe do prazo de quinze dias a contar da data de prolação da sentença (04/06/2013) para interpor recurso da decisão em apreço e apresentar as respetivas alegações;
12.ª- Sendo que, na fase de recurso, a Recorrente deveria poder colocar em crise quer a decisão relativa à matéria de facto, quer a referente à matéria de direito no aresto decisório em causa:
13.ª- Com efeito, de acordo com a prova produzida nos presentes autos, quer
documentalmente quer através das testemunhas apresentadas pelas partes, o Ex.mo Tribunal a quo não poderia – nem deveria – ter condenado a Requerida no pagamento de quaisquer quantias, juros de mora ou em custas.
14.ª- Contudo, desconhecendo a fundamentação da douta sentença em crise no que concerne ao percurso lógico e à convicção do Ex.mo Tribunal recorrido quanto à prova produzida e, ainda, no que toca às normas que foram aplicadas para a resolução judicial do presente litígio, a Recorrente está impossibilitada de recorrer daquela decisão, nomeadamente no que toca à matéria de facto e/ou quanto à respetiva matéria de direito e, ainda, de cumprir os requisitos legais decorrentes da interposição do recurso;
15.ª- Assim sendo, como respeitosamente se entende ser, a douta Decisão recorrida, entre outros, violou os artigos 158.º; 659.º, Ns. 1, 2, 3 e 5; 660.º, Ns. 1 e 2; 668.º, Nº 1 alíneas a) a b); 676.º, Ns. 1 e 2; 678.º, N.º 1; 680.º, Ns. 1 e 2; 684.º, Ns. 1, 2 e 3; 684.º-B, Ns. 1 e 2; 685.º, Ns. 1, 3 e 4; 685.º-A, Ns. 1 e 2, e 685.º-B, Ns. 1 e 2 e 691.º do Código de Processo Civil e, ainda, 205º da Constituição da República Portuguesa.
Termina pedindo que seja dado provimento ao recurso e, em consequência, declarar-se a nulidade insuprível – por falta de fundamentação – nestes autos e, por via dela, ser declarada a nulidade do julgamento, com a sua consequente repetição.

A autora contra alegou, pugnando pela improcedência do recurso.

A Sra. Juíza indeferiu a invocada nulidade em despacho com o seguinte teor:
«Em 4 de Julho de 2013, a sentença foi proferida oralmente, remetendo-se quanto à fundamentação de facto e de direito para a acta da audiência de julgamento.
A acta foi assinada no dia 17 de Julho de 2013, 7 dias úteis após a última sessão da audiência de julgamento.
Tendo em conta a quantidade de serviço agendado e realizado, como resulta da informação supra, parece-nos que a acta ficou disponível para consulta pelos mandatários das partes num período de tempo muito razoável.
Tendo em conta ainda o prazo legal de recurso e a sua suspensão durante as férias judiciais, em nada ficaram diminuídas as garantias de defesa da R., nomeadamente o seu direito de recorrer da sentença, prazo, que, aliás, tem sido entendido neste Tribunal, que apenas se inicia a partir do momento em que a acta fica disponível para consulta pelos mandatários.
Assim, a postura assumida pela R. no seu requerimento de interposição de recurso, com a invocada nulidade, com o devido respeito, só pode ser entendida como forma de obter a repetição do julgamento, que lhe foi desfavorável, e adiar a execução da sentença.
Assim, indefiro a invocada nulidade».

O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.

A única questão a resolver traduz-se em saber se a sentença é nula por falta de fundamentação e por ter sido proferida verbalmente em audiência, não tendo sido imediatamente disponibilizada a acta respetiva no programa informático “citius”.

II. FUNDAMENTAÇÃO
A matéria de facto relevante é a que resulta do relatório que antecede, dando-se por assentes as datas constantes do despacho que conheceu da nulidade, relativas à audiência em que a sentença foi proferida oralmente e à assinatura da acta respetiva e sua disponibilização via “citius”.

Vejamos, então, o que dizer, considerando que a apelante entende que a sentença é nula porque, quando foi ditada não estava fundamentada de facto e de direito (tendo tal fundamentação sido remetida para a acta respetiva) e que, até ao momento em que a apelante apresentou o seu recurso, não tinha tal acta sido disponibilizada via “citius”, o que lhe coartou a sua possibilidade de recurso, em face do desconhecimento daquela fundamentação.

Como resulta claro do disposto nos nº s 1 e 3, do art.º 685º do CPC, e, bem assim, do preceituado no artº 260º, do mesmo diploma legal, quando proferida oralmente a sentença, em sede de audiência de discussão e julgamento, no qual a parte esteve presente ou para a mesma foi notificada para comparecer, vale como efectiva notificação a leitura/comunicação oral efectuada - “tratando-se de despachos ou sentenças orais, reproduzidos no processo, o prazo corre do dia em que foram proferidos, se a parte esteve presente ou foi notificada para assistir ao acto”.
Tal equivale a dizer que, como de resto decidiu já o Tribunal da Relação de Lisboa, in Ac. de 9/11/2006, disponível in www.dgsi.pt, que, sendo a decisão proferida oralmente e exarada em acta, as partes interessadas presentes devem ter-se por notificadas sem exigência de qualquer outra diligência ou formalidade. A notificação torna-se perfeita e, por conseguinte, eficaz logo que a decisão é ditada para a acta e chega desse modo ao conhecimento das partes presentes.
No mesmo sentido se pronunciaram outras decisões do mesmo Tribunal da Relação de Lisboa, de 6/7/2009 e de 4/3/2010, ambos citados no Acórdão da Relação de Guimarães n.º 276792/11.3YIPRT.G1, de 07/05/2013, em que a ora relatora foi adjunta e que vimos seguindo de perto, todos acessíveis in www.dgsi.pt, sendo este último Ac. (proferido em sede de proc. nº 66/08.5TBPSTJ.L1-2 ) bastante incisivo quando a dado passo refere, bem a propósito, que “(…) o legislador pressupõe que a parte presente, ou quem a representa, tendo sempre que equacionar a possibilidade de ter de recorrer de despacho ou sentença oral, se deve habilitar a fazê-lo transcrevendo por sua conta e risco o teor daquelas decisões, não podendo vir a invocar não ter conhecimento dos fundamentos de facto e/ou de direito que estiveram na sua base, e tão pouco podendo esperar que a acta do julgamento esteja feita para “conhecer” aqueles fundamentos“.
E, ainda e bem a propósito do disposto no nº 3, do artº 685º do CPC (após a reforma do CPC de 1995/1996 e atual artigo 638.º, n.º 3, exatamente com a mesma redação), por diversas vezes, foi já o Tribunal Constitucional chamado a pronunciar-se, tendo de uma forma uniforme considerado sempre que não violam nenhum preceito legal ou princípio constitucional as normas do CPC (maxime a supra referida) quando interpretadas no sentido de que, a notificação das partes, ordenada pelo juiz em plena audiência, relativamente ao teor de uma sentença proferida oralmente e reproduzida em acta devidamente assinada pelo juiz, sem oposição das partes, é plenamente válida, dispensando qualquer ulterior notificação escrita (Cfr. Ac. nº 183/98, de 11/02/1998).
E, esclarece ainda o Tribunal Constitucional no Ac. nº 228/99, de 28/4/1999 que, “É o interesse público que aqui sobreleva, a necessidade de não atrasar o prosseguimento dos autos com o decurso dos prazos de notificação às partes das decisões proferidas oralmente, em diligências em que estiveram presentes (ficando desde logo cientes do seu conteúdo) ou para as quais foram notificadas (tendo nesse caso o ónus de se informar sobre o respectivo conteúdo).”

Não se olvida que, podendo é certo as decisões ou sentenças ser verbalmente proferidas, carecem todavia elas de ser documentadas em acta - cfr. artºs 157º, nº 3 (atualmente, artigo 153.º, n.º 3, com a ressalva de que, agora, toda a audiência é sempre gravada, incluindo a decisão), 159º e 163º, todos do CPC (atualmente, n.ºs 7 a 9 do artigo 155.º e artigo 159.º) -, ou seja, serem reproduzidas no processo (cfr. artº 685º, nº3, do CPC), estando de resto a Secção/funcionário judicial obrigado a diligenciar pela elaboração da competente acta pelo menos no prazo de cinco dias (cfr. artº 166º, nº1, do CPC, atualmente, artigo 162, n.º 1).
“Sucede que, estando em causa o decurso de um prazo de recurso, que se conta (como resulta expressamente de especifico preceito legal do CPC) a partir da data em que a sentença foi proferida/lida, e não da data em que foi documentada nos autos ou registada (Cfr. José João Baptista, in Dos Recursos, 1988, pág. 56), tem a parte o ónus de, necessitando eventualmente de uma cópia da acta para melhor poder alegar em sede de instância recursória, solicitar (requerendo-o) nos autos a entrega de cópia de acta onde a mesma se integra (“obrigando” assim o funcionário judicial, se tal se justificar e com celeridade, a elaborá-la, e podendo ainda, ao abrigo do disposto no artº 266º, nº 4, do CPC, dirigir-se inclusive ao Juiz do processo, solicitando a remoção de um qualquer obstáculo existente no que à sua elaboração diz respeito), que não aguardar que a acta esteja acessível através do programa do citius” – Acórdão da Relação de Guimarães que vimos seguindo de perto e já supra citado.
É que, sabendo - como tem a obrigação de saber - estar a decorrer o prazo para o cumprimento de um dever processual, sobre si recai a responsabilidade - está em causa o princípio da auto-responsabilidade das partes, cfr. Manuel A. Domingues de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, pág. 378 - de não ser negligente, aguardando, sem fundamento legal, e sem qualquer reacção, a disponibilidade de acesso a um determinado programa informático (citius) para melhor poder conhecer os fundamentos de uma decisão judicial.
Não deve esquecer-se, aliás, que assiste aos mandatários das partes o direito de examinarem e poderem consultar os autos nas secretarias judiciais e de nela obterem as cópias de quaisquer peças de processo que considerem necessárias para a melhor elaboração de um qualquer requerimento processual (artigo 167.º do CPC).
No caso dos autos, mais se afigura a sem razão da apelante, pois que, quando interpôs o recurso – a 15/07/2013 – estava ainda longe o fim do prazo para o mesmo, em virtude das férias judiciais que, nesse dia se iniciaram sendo que, como é sabido, o prazo processual se suspende durante as férias judiciais – artigo 144.º, n.º 1 do CPC (atual 138.º).
Improcedem, assim, as conclusões da alegação da apelante, sendo de confirmar a sentença recorrida.

Sumário:
1 - Quando proferida oralmente a sentença, em sede de audiência de discussão e julgamento, no qual a parte esteve presente ou para a mesma foi notificada para comparecer, vale como efectiva notificação a leitura/comunicação oral efectuada, começando a correr o prazo para o recurso nessa mesma data.
2 - As decisões ou sentenças quando verbalmente proferidas, carecem de ser documentadas em acta.
3 – Estando a correr o prazo de recurso, cabe à parte o ónus de solicitar (requerendo-o) que a acta respetiva seja disponibilizada se, entretanto, decorreu já o prazo de cinco dias para a prática de actos pela secretaria.

III. DECISÃO
Em face do exposto, decide-se julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela apelante.
Guimarães, 17 de dezembro de 2013
Ana Cristina Duarte
Purificação Carvalho
Espinheira Baltar