Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
693/05.2TBCMN.G2
Relator: PURIFICAÇÃO CARVALHO
Descritores: QUESTÃO NOVA
RECURSO
INDEMNIZAÇÃO
ARRENDAMENTO
IMÓVEL
EXPROPRIAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/24/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO/AGRAVO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE A APELAÇÃO/NÃO PROVIDO O AGRAVO
Sumário: 1 - O recurso da decisão arbitral inicia a fase judicial do processo expropriativo.
2. Esta fase processual assume a estrutura de um processo especial não previsto no Código de Processo Civil, cuja particularidade consiste em a dinâmica do recurso do acórdão do tribunal arbitral funcionar, de algum modo, em termos similares a uma petição inicial de um acção e a resposta ao recurso funcionar em termos similares a uma contestação.
2 - Deve evitar-se a introdução de alterações na decisão da matéria de facto quando, fazendo actuar o princípio da livre apreciação da prova, não seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de erro de apreciação, relativamente aos concretos pontos de facto impugnados.
3- Mesmo quando legitimamente se admite o recurso a presunções judiciais, como elementos de formação da convicção, por forma a revelar a verdade judiciária, não é através da mera elaboração teórica que tal deve ser alcançado, mas da integração nas regras da experiência de factos instrumentais, indiciários, probatórios ou circunstanciais.
4- Não sendo cumprido o ónus da prova a quem compete não fica demonstrada a realidade que se pretendia provar (art.º 341º do citado Código Civil).
5- Visando os recursos apenas a modificação das decisões relativas a questões apreciadas pelo tribunal recorrido (confirmando-as, revogando-as ou anulando-as) e não criar decisões sobre matéria nova, salvo em sede de matéria indisponível, a novidade de uma questão, relativamente à anteriormente proposta e apreciada pelo tribunal recorrido, tem inerente a consequência de encontrar vedada a respectiva apreciação pelo Tribunal ad quem
Decisão Texto Integral: RELATÓRIO
Por despacho do Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas de …, com o n° … publicado do Diário de … de Janeiro de 2004, foi declarada a utilidade publica e a urgência da expropriação da parcela n° … sita no lugar de …, freguesia de Vila Praia de, concelho de Caminha, inserida em prédio com a área total de 3.151,00 m2, inscrito na matriz predial rústica da mencionada freguesia sob o artigo …° e com a descrição omissa na respectiva Conservatória do Registo Predial.
Em 26 de Junho de 2004 foi realizada a vistoria ad perpetuam rei memoriam.
A entidade expropriante tomou posse administrativa da parcela expropriada no dia 20 de Julho de 2004.
Não tendo sido possível obter o acordo quanto ao montante indemnizatório, procedeu-se a arbitragem, tendo os senhores árbitros, unanimemente, classificado a parcela como “solo apto para construção fixando o valor da indemnização a pagar aos expropriados em €27.375,95 e o valor da depreciação da parcela sobrante de € 12.738,00.
Por despacho proferido a fls. 59 e 60 dos autos foi adjudicada a parcela à expropriante.
Notificada a decisão arbitral, nos termos do artigo 51º, nº 5, do Código das Expropriações (aprovado pela Lei nº 168/99, de 18 de Setembro), dela vieram a recorrer os expropriados e …. de acordo com os artigos 52º e 58º do referido Código. Os primeiros, para além de requererem a expropriação da parcela sobrante a norte, concluíram pela indemnização líquida total de €120.623,50; a segunda, arrogando-se arrendatária do prédio e juntando um escrito denominado “contrato de arrendamento”, sustentou ser credora da indemnização liquida de €75.551,43. 3. Esta recorrente arrolou três testemunhas com vista a prova dos factos que alegou, e requereu uma perícia á respectiva escrita comercial para comprovação dos prejuízos que invocou.
A …, S. A. (doravante designada entidade expropriante) deduziu oposição ao pedido de expropriação da dita parcela sobrante, e concluiu pela improcedência do recurso.
Alegou, entre o mais, que o contrato de arrendamento foi celebrado com o único propósito de criar um direito a uma indemnização autónoma.
Segue-se despacho (fls. 156 e SS) que determinou que o contrato de arrendamento não seria tornado em consideração sem qualquer diligência probatória e a indeferir a perícia requerida.
Com o assim decidido ficou a … Lda. inconformada tendo apresentado recurso de agravo que foi admitido (fls. 337) com subida diferida.
Procedeu-se à avaliação, tendo os peritos respondido aos quesitos formulados pelas partes e apresentado por unanimidade laudo no qual entenderam unanimemente que o prejuízo que para os expropriados decorria da expropriação era de €88.318,16 (sem embargo da eventual dedução ao abrigo do n° 4 do art. 23° do CE), e que o prejuízo que, na dita perspectiva, para a interessada … Lda. resultava era de €25.224,96.
Foram inquiridas duas das testemunhas arroladas pelos expropriados por iniciativa do Tribunal.
No final foi proferida sentença que julgou procedente o pedido de expropriação total deduzido pelos expropriados, e parcialmente procedente o recurso, sendo fixadas nos montantes de € 88.318,16 e de €25.224,96 as respectivas indemnizações.
Por não concordarem com esta decisão, dela apelaram a entidade expropriante, os expropriados e a … Lda.
Foi proferido acórdão que julgou procedente em parte o agravo competindo ao tribunal recorrido facultar o contraditório á agravante quanto a afirmação da contraparte de que o contrato de arrendamento foi criado com o propósito de justificar uma indemnização autónoma; após ordenar a produção da prova testemunhal oferecida e produzida esta decidir o que tiver a decidir quanto à atendibilidade do alegado arrendamento e em função do decidido assim manterá a perícia efectuada ou mandá-la ampliar de forma a ser apurado o prejuízo que resulta para a interessada.
Em consequência determinou a anulação do decidido na sentença recorrida na parte que se reporta à matéria objecto do agravo.
Mais negou provimento ao agravo na parte em que indeferiu a perícia requerida pela agravante e declarou prejudicado o conhecimento das apelações.
Foi cumprido o determinado no Acordão supra aludido e proferida decisão que determinou que o contrato de arrendamento cuja cópia está junta aos autos não será considerado para efeitos da fixação da justa indemnização… ficando prejudicada a necessidade de proceder à ampliação da perícia realizada.
Inconformada com esta decisão, dela apelou a …. l Lda., recurso que foi admitido como de agravo, com subida diferida a final.
A seguir o Tribunal considerou ser de manter a fundamentação da sentença final e por tal entendeu não ser de proferir outra sentença, determinando a remessa dos autos a este Tribunal.
No referente ao recurso de agravo a recorrente, terminou a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
1) A prova produzida, emergente do depoimento da testemunha ouvida (e também, complementarmente, de documentos juntos aos autos referidos na decisão recorrida) justifica que Este Tribunal, alterando a decisão proferida também em sede de matéria de facto, considere provados os seguintes factos, alegados pela recorrente na resposta ao pedido da expropriante:
Já antes da criação da Ancormat, o expropriado Agostinho exercia no imóvel a mesma actividade comercial que aquela passou a exercer.
A A… foi criada por razões de natureza fiscal, decidindo o expropriado A… cessar a actividade que lá exercia em nome individual e criar uma sociedade unipessoal, para a exercer, pensando daí auferir de vantagens fiscais inerentes a uma sociedade comercial.
Desde o momento em que a A… foi constituída, o seu sócio tinha decidido que a mesma iria pagar renda a partir do segundo ano de actividade, na medida em que, no primeiro ano, em fase de arranque, a mesma não libertaria meios ou, pelo menos, não viria propiciar lucros que, por razões fiscais, interessasse reduzir através daquele encargo.
2)
Obviamente que provados esses factos, o “incidente” deduzido pela expropriante, ao abrigo do disposto no art. 23,nº 3 do C das Expropriações terá de improceder, na medida em que desses factos resultaria que o contrato de arrendamento nada teve a ver com o eventual propósito de aumentar o valor da indemnização.
Subsidiariamente
3)
Mesma na hipótese de não proceder a impugnação da matéria de facto, nem assim a decisão proferida se poderia manter, na medida em que não era ao expropriado que competia provar que o arrendamento não tinha sido criado com o propósito de aumentar o valor da indemnização.
4)
Sem prejuízo do princípio da aquisição processual e do conhecimento ex officio, pelo tribunal, estando em causa uma matéria de excepção que obstaculiza ao funcionamento e aplicação da regra geral de que o contrato de arrendamento deve ser tido em conta para o cálculo da justa indemnização, incumbia ao expropriante alegar e provar a respectiva factualidade.
5)
Por isso, o non liquet implica que o tribunal não considere provada essa excepção e aplique a regra geral, ou seja, mande atender a esse factor para o cálculo da indemnização!
6)
Os factos provados e constantes do douto despacho em crise não sustentam a conclusão que nele se extraiu de que o contrato de arrendamento foi celebrado com o intuito de aumentar a indemnização pela expropriação.
7)
O tribunal “a quo” lavrou num claro vício de fundamentação, considerando, ainda que implicitamente, que incumbia à expropriada provar que a “sociedade tenha equacionado a celebração do referido contrato alegadamente em inícios de 2003 e apenas o tenha vindo a celebrar volvido quase um ano logo após os expropriados A… e mulher … foram notificados da intenção da entidade expropriante de proceder à expropriação do referido prédio”, ou seja, que incumbiria à expropriada provar que o contrato não fora celebrado com intuito de sobrevalorizar a indemnização!
8)
A circunstância de o contrato ter sido celebrado em 28/12/2003 para entrar em vigor em 1/1/2004, dias após terem os expropriados recebido (em 9/12) a carta de fls. 6, não permite extrair a conclusão de que o contrato foi celebrado com o intuito de aumentar a indemnização devida pela expropriação!
9)
Na pior das hipóteses para os interesses da expropriada, a escassez de factos provados não permite ao tribunal ainda que apoiado em quaisquer presunções judiciais, obter semelhante conclusão.
10)
Desde logo porque a notificação então recebida não foi, por exemplo, a de que tivesse já sido obtida a DUP para o empreendimento em causa (o que só chegou ao poder dos expropriados em 28/1/2004), antes e apenas que a de que a E… S A (uma empresa privada) tinha deliberado requerer (a quem de direito) a declaração de utilidade pública.
11)
Em face dessa comunicação nem sequer se pode concluir que a partir dela os expropriados soubessem que seria certa a obtenção da DUP
12)
E mesmo que o soubessem, dela não decorria sem mais que a DUP seria obtida a curto prazo, por forma a que até lá se não justificasse a vigência do contrato de arrendamento
13)
Como não decorre também dos factos provados que os expropriados soubessem, nessa data, que a existência de um contrato de arrendamento valorizava a indemnização, até porque não é questão que seja do conhecimento da generalidade dos cidadãos
14)
E a A… não foi “à pressa” para as instalações em causa na sequência do conhecimento da futura expropriação, já que com ou sem contrato de arrendamento, já lá estava a laborar há um ano!
15)
E nesse pressuposto tal qual o comum dos cidadãos, também os expropriados A… e esposa não sabiam que, estando a A… (sociedade unipessoal detida, pois, a 100% pelo expropriado marido) a ocupar gratuitamente o terreno, não receberia indemnização ou receberia menos da que lhe caberia se fosse titular do contrato de arrendamento
16)
Finalmente, se fosse essa a intenção dos expropriados, aconselhados como estavam por um TOC, facilmente teriam feito retroagir o contrato a 1/1/2002 pois que a contabilidade da Ancoramat não estava fechada e sem rastos se encaixaria o arrendamento com data de 1/1/2002 e com documentação comprovativa do pagamento
de cada uma das rendas!
17)
A tudo isto acresce que a explicação da ora recorrente tem toda a consistência e lógica que não foi infirmada, a partir dela se tornando compreensível que o contrato de arrendamento apenas passasse a vigorar a partir do segundo ano de actividade da mesma.
18)
Não tendo ela sido afastada, as dúvidas daí decorrentes nunca poderiam reverter contra a expropriada
19)
Decidindo de modo diferente, o Tribunal “a quo” violou o disposto no art. 23, nº 3 do C das Expropriações e no art. 342, nº 2 do C Civil
Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso, substituindo-se o despacho recorrido por outro que determine que os peritos tenham em conta, na avaliação a realizar, para o cálculo da indemnização devida à recorrente, o contrato de arrendamento cuja cópia se encontra a fls. 14 dos autos
Assim decidindo se fará Justiça

A expropriante contra alegou

Corridos os vistos cumpre apreciar e decidir
Ter-se-á em conta que o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões dos recorrentes não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº 3, 660º, nº 2 e 690º do CPC).

Como se dispõe no art.º 710º, nº1, CPC, havendo apelação e agravo que com ela tenha subido, o seu julgamento é feito “pela ordem da sua interposição” - in casu, portanto, deve ser julgado em primeiro lugar o agravo.
Por outro lado, o agravo deve ser apreciado atento o nº 2 do mesmo normativo legal.
Temos pois de começar pelo agravo ( art.º 710 nº1 1ª parte do CPC).
Questões a conhecer
. alteração da matéria de facto provada
. ónus de prova


Na decisão recorrida foi considerada apurada a seguinte factualidade
Os expropriados A… e mulher C… foram notificados por missiva datada de 04/12/2003, da deliberação tomada pela entidade expropriante de requerer a declaração de utilidade pública com carácter de urgência da parcela…, com a área de 1051 m2, a destacar do prédio sito na freguesia na freguesia de Vila Praia de Ancora, concelho de Caminha, inscrito na matriz predial rústica sob o art.º …, e omisso na Conservatória do Registo Predial de Caminha (fls. 5).
Os expropriados receberam a referida missiva em 09/12/2003 (fls. 6).
Por missiva datada de 28/01/2004, recebida em 29/01/2004, foram os expropriados notificados pela entidade expropriante de que por despacho do Secretário de Estado das Obras Publicas, de 21/11/2003, publicado no Diário da República n° 22, 2ª serie de 27/01/2004, foi declarada a utilidade publica com carácter de urgência e autorizada a posse administrativa da parcela de terreno n° … (fls. 7 e 8).
Em data posterior, os expropriados fizeram chegar aos autos que então corriam na entidade expropriante a missiva junta a fls. 13 acompanhada de um contrato de arrendamento datado de 28/12/2003 celebrado entre a expropriada C… e a A…, Lda..
A sociedade A… Lda., foi constituída em27/12/2002, sendo seu sócio único e gerente A…(fls. 111).


De direito
Delimitado o objecto do recurso nos termos já definidos comecemos por analisar a primeira questão levantada, que se prende com a decisão sobre a matéria de facto.
Alega a recorrente que A prova produzida, emergente do depoimento da testemunha ouvida (e também, complementarmente, de documentos juntos aos autos referidos na decisão recorrida) justifica que Este Tribunal, alterando a decisão proferida também em sede de matéria de facto, considere provados os seguintes factos, alegados pela recorrente na resposta ao pedido da expropriante:
Já antes da criação da A…, o expropriado Agostinho exercia no imóvel a mesma actividade comercial que aquela passou a exercer.
A A…t foi criada por razões de natureza fiscal, decidindo o expropriado Agostinho cessar a actividade que lá exercia em nome individual e criar uma sociedade unipessoal, para a exercer, pensando daí auferir de vantagens fiscais inerentes a uma sociedade comercial.
Desde o momento em que a A… foi constituída, o seu sócio tinha decidido que a mesma iria pagar renda a partir do segundo ano de actividade, na medida em que, no primeiro ano, em fase de arranque, a mesma não libertaria meios ou, pelo menos, não viria propiciar lucros que, por razões fiscais, interessasse reduzir através daquele encargo.
Em nosso entender a recorrente não tem razão.
De facto estamos perante um processo de expropriação no qual caso , a entidade expropriante ou expropriado não estejam de acordo com o montante da indemnização fixado no acórdão arbitral têm a possibilidade de interpor um recurso para o Tribunal do lugar da situação dos bens.
Este recurso inicia a fase judicial do processo expropriativo.
Esta fase processual assume a estrutura de um processo especial não previsto no Código de Processo Civil, cuja particularidade consiste em a dinâmica do recurso do acórdão do tribunal arbitral funcionar, de algum modo, em termos similares a uma petição inicial de um acção e a resposta ao recurso funcionar em termos similares a uma contestação.
Por isso embora se trate de um processo especial regulado por um específico Código, sem norma genérica de remissão para o Código de Processo Civil, face ao disposto no art.º 463º nº1 daquele código deve considerar a sua aplicação subsidiária .
E assim no recurso interposto e na resposta devem ser alegada a factualidade relevante à procedência /improcedência da pretensão e pedidas provas ( arts 58º e 60º do C. das Expropriações).
Provas essas que terão por objecto demonstrar a realidade factual alegada no requerimento de interposição de recurso e na resposta, factos estes que delimitam e definem com os pedidos formulados o prosseguimento do processo.
Findas as diligências de prova (na qual se incluiu obrigatoriamente uma avaliação) são as partes notificadas para alegarem. Estas alegações abrangem as vertentes de facto e de direito, ou sejam as partes podem dar a conhecer o seu entendimento no que se refere aos factos que consideram assentes, o direito aplicável e a indemnização que o tribunal deve fixar. Certos que os factos a considerar assentes terão de ser os alegados nos momentos já citados e os que resultaram da prova produzida.
A tramitação do recurso da arbitragem tem a configuração prevista nos artigos 58.º e segs do Código das Expropriações (CE), ou seja, entre o mais, “no requerimento de interposição do recurso (…) o recorrente deve expor logo as razões da sua discordância (…)”.
Significa isto que o tema (ou temas) a decidir se fixam, como é normal (artigos 685.º-A e B do CPC), nesse requerimento
Após estes considerandos verifica-se que, os factos que se pretendem considerar provados não foram alegados no requerimento de interposição do recurso ( ver fls. 72 a 84) e sobre eles não incidiu a prova produzida nos autos até à fase da sentença, antes foram alegados numa audição a uma possível condenação como litigantes de má fé ( fls. 196) e na resposta às alegações do recurso interposto pela expropriante ( ver fls. 577 a 585 ).
Pelo que, e de forma correcta não foi proferida decisão sobre tais factos (quer os considerandos provados ou não provados) assim como não é possível nesta fase considerar tais factos (como provados ou não provados) porque não alegados no tempo e modo devido e assim não objecto de prova.
Inútil portanto a reapreciação da prova produzida.
A resolução do demais questionado no recurso em apreciação será efectuada com a invocação e aplicação das regras sobre o ónus da prova.
Estipula a lei que Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita- art.º 342º do CPC.
A respeito da prova escreve Miguel Teixeira de Sousa A prova é a actividade realizada em processo tendente à formação da convicção do Tribunal, sobre a realidade dos factos controvertidos, isto é, a actividade que permite formar na mente do julgador a convicção que resolve as dúvidas sobre os factos carecidos de prova.
E escreve o Prof. que se chamam meios de prova aos elementos portadores da informação que permite a formação da convicção do tribunal sobre esses factos.
Também o ónus da prova deve ser entendido como a “…necessidade de observância de um certo comportamento, não por imposição da lei, mas como meio de obtenção ou de manutenção de uma vantagem para o próprio onerado...” .
O ónus de prova é portanto dirigido às partes, tendo estas uma obrigação de natureza potestativa, sendo que as partes são livres de as realizar ou não, assumindo as consequências daí resultantes. Indirectamente, o ónus de prova vai igualmente relevar para a actuação do Juiz. No momento da repartição da prova, o Juiz deve facultar à parte a quem a prova aproveita, a possibilidade de fazer a respectiva prova. No momento da avaliação da prova, não tendo a parte possuidora do ónus feito a devida prova, o Juiz vai decidir contra ela.
Já a contraprova consiste na obtenção processual de qualquer outro elementos probatório de sinal oposto, que não o que obriga em sede de ónus de prova e que deixe o Juiz na dúvida sobre a existência do facto a demonstrar .
Dispõe o art. 346º do C. Civil, sob a epígrafe de «Contraprova», que “…Salvo o disposto no artigo seguinte, à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos; se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova…”.
Acresce referir que, depois de afirmar, no seu artigo 341º, que “As provas têm por função a demonstração da verdade dos factos”, o Código Civil procede, nos artigos seguintes, ao estabelecimento da distribuição do ónus de prova pelas partes intervenientes num litígio (conforme já assinalado); mas ao impor a cada uma das partes o encargo de provar determinados factos, não proíbe que eles o sejam pela outra ou pelo próprio tribunal: com efeito, o ónus da prova em relação a determinados factos traduz-se, para a parte a quem compete, no dever de fornecer a prova desses factos, sob pena de sofrer as consequências desvantajosas da sua falta e não na proibição da prova pela parte contrária.
Tendo a recorrente invocado o seu direito à indemnização prevista no art.º 30 do C. das Expropriações competia-lhe o ónus da prova da existência do arrendamento, ou seja, a existência do arrendamento como encargo autónomo a valorar na indemnização.
Por sua vez tendo a recorrida pretendido invocar facto impeditivo de tal pedido (o propósito de com a celebração do contrato de arrendamento criar um direito a uma indemnização autónoma) e assim matéria de excepção (excepção peremptória) àquela competia a alegação e prova, da excepção nos termos previstos no art.º 342º mencionado e também salientado no anterior Acórdão desta Relação já proferido neste processo a fls. 595 a 602.
Alega a este respeito a recorrida que apesar de a A… ter sido constituída em 27.12.2002 os recorrentes só celebraram com ela contrato de arrendamento depois de serem notificados da resolução de expropriar.
Tanto basta para que se conclua que tal contrato foi celebrado com o único propósito de criar um direito a uma indemnização autónoma. Para justificar esta alegação cita o nº3 do art.º 23 do C.E.
Desde já cumpre referir que, o facto impeditivo da consideração do arrendamento invocado é nos termos do artigo citado a verificação de que o arrendamento foi celebrado com o propósito de aumentar o valor da indemnização .
Apurou-se com base em documentos juntos aos autos que
Os expropriados A… e mulher C… foram notificados por missiva datada de 04/12/2003, da deliberação tomada pela entidade expropriante de requerer a declaração de utilidade pública com carácter de urgência da parcela …, com a área de 1051 m2, a destacar do prédio sito na freguesia na freguesia de Vila Praia de Ancora, concelho de Caminha, inscrito na matriz predial rústica sob o art.º …, e omisso na Conservatória do Registo Predial de Caminha (fls. 5).
Os expropriados receberam a referida missiva em 09/12/2003 (fls. 6).
Por missiva datada de 28/01/2004, recebida em 29/01/2004, foram os expropriados notificados pela entidade expropriante de que por despacho do Secretário de Estado das Obras Publicas, de 21/11/2003, publicado no Diário da República n° 22, 2ª serie de 27/01/2004, foi declarada a utilidade publica com carácter de urgência e autorizada a posse administrativa da parcela de terreno n° … (fls. 7 e 8).
Em data posterior, os expropriados fizeram chegar aos autos que então corriam na entidade expropriante a missiva junta a fls. 13 acompanhada de um contrato de arrendamento datado de 28/12/2003 celebrado entre a expropriada C… e a A …, Lda..
A sociedade A…, Lda., foi constituída em 27/12/2002, sendo seu sócio único e gerente A\... (fls. 111).
Olhando para estes factos (apenas e só) retiramos a realidade factual que documentam, ou seja, a missiva recebida na data respectiva e seu conteúdo, a celebração do contrato de arrendamento na data apurada e a data de constituição da sociedade recorrente, nada mais.
Permitem-nos estes factos presumir e concluir que o contrato de arrendamento foi celebrado com o intuito de aumentar a indemnização pela expropriação, como parece ter feito a 1ª instância?
No que se refere à prova por presunção esta encontra-se regulada nos artigos 349º e SS. CC.
Nos termos do artigo 349º CC, presunções são ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido; nos termos do Art. 351º CC as presunções judiciais só são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal.
Como diz VAZ SERRA, as presunções judiciais são “ meios lógicos ou mentais ou operações firmadas nas regras da experiência” ou como diz ANTUNES VARELA, operação de elaboração das provas alcançadas por outros meios “ são “ prova da primeira aparência”, baseada em juízos de probabilidade.
A estrutura jurídica da presunção é constituída pelo facto ou factos provados através de outros meios de prova; a actividade lógico-experencial de indução, que os tem por objecto; e o facto ou factos presumidos mediante estas operações intelectuais (acórdão do STJ, de 25.03.04, . Este acórdão refere a exigência de que a base da presunção esteja provada, que os factos dela integradores sejam conhecidos, possuindo o julgador acerca deles o grau de certeza que as provas devem proporcionar, de modo que não se transforme em livre arbítrio.
No mesmo sentido o Ac. Rel. Lisboa de 03.12.16, diz que «As decisões judiciais não podem assentar em meras especulações, antes devem encontrar raízes na realidade objectivada por factos.
Mesmo quando legitimamente se admite o recurso a presunções judiciais, como elementos de formação da convicção, por forma a revelar a verdade judiciária, não é através da mera elaboração teórica que tal deve ser alcançado, mas da integração nas regras da experiência de factos instrumentais, indiciários, probatórios ou circunstanciais».
Tendo em conta estes consideramos, e olhando para os factos apurados concluímos que a decisão da 1ª instância tirou a ilação certa, ou seja, o contrato de arrendamento foi celebrado com o propósito de aumentar o valor da indemnização a receber pela recorrente.
Esta conclusão retira-se dos factos apurados apreciados de acordo com as regras da experiência e da lógica.
De facto é das regras da experiencia e do conhecimento do comum dos cidadãos que a expropriação determina a perda do prédio e como contrapartida desta perda o recebimento de uma indemnização.
Conhecedor desta realidade o dito proprietário e único sócio gerente, sabendo portanto que o imóvel seria expropriado e portanto que deixaria de ser sua propriedade celebra na qualidade de sócio único e gerente e com a outra proprietário um contrato de arrendamento.
O objectivo deste contrato celebrado nesta data e nestas condições é apelando às regras da lógica o de obter uma indemnização correspondente a um direito de arrendamento a qual não receberia se não tivesse tal contrato.
A outra conclusão não é possível chegar perante a realidade de alguém que sabe que poderá ficar sem o prédio e mesmo assim celebra - “ à pressa” no dizer da recorrente/sociedade ,um contrato de arrendamento que tem o prédio como objecto, conclusão esta que é permitida pelos factos provados que para tal são bastantes.
Seguimos portanto a orientação de Elias da Costa segundo o qual É de presumir que essa foi a intenção do proprietário se os factores, circunstâncias ou situações foram criadas após a tomada de conhecimento de que o seu bem ia ser expropriado.
Orientação esta que foi a seguida pela 1ª Instância, conclusão a que chegamos pela valoração da factualidade que foi feita. Certo é que não encontramos na decisão o fundamento da mesma, porém a recorrente não requereu que esta Relação ordenasse a fundamentação da matéria de facto, pelo que a questão se dá por encerrada.
A respeito da valoração da prova cita-se o Prof. Alberto dos Reis segundo o qual Analisadas as provas à luz das regras de experiência e da lógica, gerou-se no juiz o convencimento - fundado, não arbitrário - sobre a probabilidade séria da conformação dos factos a uma determinada realidade. A prova idónea a alcançar um tal resultado, é a prova suficiente, que é aquela que conduz a um juízo de certeza.
A apreciação das provas resolve-se, assim, em formação de juízos, em elaboração de raciocínios, juízos e raciocínios estes que surgem no espírito do julgador, segundo as aquisições que a experiência tenha acumulado na mentalidade do juiz segundo os processos psicológicos que presidem ao exercício da actividade intelectual, e portanto segundo as máximas de experiência e as regras da lógica... A prova não visa, adverte o Prof. Antunes Varela, ...a certeza absoluta, (a irrefragável exclusão da possibilidade de o facto não ter ocorrido ou ter ocorrido de modo diferente)..., mas tão só, ...de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto.
A certeza a que conduz a prova suficiente é, assim, uma certeza jurídica e não uma certeza material, absoluta.
Concluímos assim que por verificação do preceituado no art.º 23 nº3 do C. das Expropriações na fixação da indemnização não será considerado o contrato de arrendamento junto aos autos.
Como escreve Salvador da Costa este artigo está inserido num contexto que se reporta essencialmente aos critérios básicos da determinação da justa indemnização contrapartida da expropriação que será devida a quem por ela for afectado, seja proprietário ou outro titular de direito a indemnizar… .
Mas tendo em atenção que a recorrente produziu prova terá conseguido trazer ao processo qualquer outro elementos probatório de sinal oposto, que não a que obriga em sede de ónus de prova e que deixe o Juiz na dúvida sobre a existência do facto a demonstrar (a já identificada contraprova).
Tal não foi feito porque a prova produzida foi no sentido de que o contrato foi celebrado “ por razões de poupança fiscal”, na sequência de um projecto “desenhado” em finais de 2002 aquando da discussão com vista á constituição da sociedade/recorrente. Todavia esta contraprova não foi valorada por este Tribunal, porque não credível. É que mesmo a existir traçado um plano que englobava ao fim de um ano de actividade celebrar um contrato de arrendamento por razões de poupança fiscal, a verdade é que antes da concretização do contrato o legal representante da dita sociedade porque proprietário do imóvel teve conhecimento da intenção de expropriar o imóvel.
Conhecedor pois, assim resulta das regras da experiência, de que ficará sem o prédio celebra contrato para arrendamento por razões de ordem fiscal. Todavia tais razões deixam de existir pois ficará sem o prédio. Portanto não se verifica qualquer lógica nesta versão que a torne credível.
Também não convenceu a versão da testemunha ao dizer que na altura em que celebrou o contrato o Sr. A… não lhe falou na expropriação. É que o contrato de arrendamento tinha por objecto o imóvel que o proprietário iria perder, pelo que, seria normal dar conhecimento dessa situação à pessoa que exercia as funções de técnico oficial de contas da sociedade que representava e procurar saber o que fazer. É lógico este raciocínio, lógica esta que não encontramos na versão relatada.
Claro que se existisse alguma dúvida sobre a factualidade a apurar a mesma não podia reverter, contra a recorrente, mas antes deve reverter contra a parte onerada com a prova dessa realidade. E não sendo cumprido tal ónus não ficaria demonstrada a realidade que se pretendia provar (art.º 341º do citado Código Civil).
Todavia não existe qualquer dúvida a valorar nos termos assinalados.
E não se diga como faz a recorrente de que objecta a esta conclusão a circunstância de a notificação recebida revelar não uma certeza mas uma deliberação de requerer a quem de direito a declaração de utilidade pública, e portanto não resultava certa a obtenção da DUP nem se essa obtenção seria a curto prazo e portanto não estava a recorrente impedida de continuar os seus projectos.
Este argumento a lei não prevê e antes preceitua que a partir do conhecimento de que iria ser expropriado ( seja por notificação ou conhecimento ocasional, por ex no caso de contacto dos técnicos que se encontravam a realizar o cadastro da área) qualquer situação ou circunstância realizada pelo titular da indemnização com o intuito de aumentar a indemnização não será valorada.
E no caso em apreço a DUP ocorreu a curto prazo, não prejudicando assim os titulares do direito a indemnização nos seus projectos futuros.
Improcedem assim as conclusões da agravante e também o agravo improcede, mantendo-se o despacho recorrido.


Apreciado o recurso de agrava temos as apelações para apreciar.
E fazendo-o transcreve-se as conclusões das recorrentes.
Da recorrente A… Lda.
1)
Como emerge das alegações de recurso da decisão arbitral, que não lhe fixou qualquer indemnização, a ora recorrente, inconformada com tal omissão, pediu que lhe fosse atribuída a indemnização total de 75.551,43 €, actualizável.
2)
Uma vez que tal pedido foi feito no pressuposto – alegado e que se propunha demonstrar em audiência – da sua qualidade de arrendatária do imóvel que ocupava pagando como contrapartida uma renda mensal de 400,00 €, o despacho de 11/2/2006, de que se encontra pendente recurso, inviabilizou que à recorrente fosse atribuída qualquer indemnização pelos custos de adaptação à nova renda, subsequente à extinção do arrendamento por causa da DUP.
3)
De facto, o Tribunal não disse que não existia o contrato, antes determinou apenas que ele não fosse tido em conta por ter sido celebrado com o objectivo de ampliar o valor indemnizatório
A esse título, a recorrente tinha pedido que lhe fosse fixada uma indemnização de 36.000,00 € que, pelos motivos expostos, não foi tida em conta nem no laudo arbitral, aliás, unânime, nem também na decisão final ora em recurso.
4)
Por isso, no pressuposto de que irá ser revogado o despacho em causa, concedendo-se provimento ao recurso já interposto, a decisão final também não poderá manter-se nesta parte
5)
Pois que viola o disposto no art. 23, nº 1 do C Expropriações e nos artºs 13 e 62, nº 2 da C R P.
Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso, anulando-se a decisão recorrida, mas apenas na parte em que, não reconhecendo à recorrente a qualidade de arrendatária, lhe denegou qualquer compensação pelos diferenciais de renda que, enquanto arrendatária de futuras instalações irá pagar e determinando-se que os autos prossigam para realização de nova avaliação apenas visando o cálculo dessa indemnização .
Da recorrente E…
1ª. Apesar de, mediante douto despacho proferido a 11.02.2006 se ter decidido que a sociedade A… não era arrendatária da parcela dos autos, a douta sentença atribuiu-lhe uma indemnização “tendo por pano de fundo a utilização gratuita”.
2ª. A tese segundo a qual o ocupante do imóvel, a título gratuito e precário, tem direito a indemnização em caso de expropriação não é, salvo melhor opinião, a que melhor se coaduna com a natureza e regime do comodato e do instituto das expropriações por utilidade pública.
3ª. O comodatário dispõe apenas de tutela possessória contra actos que perturbem o uso da coisa, não sendo titular de indemnização a considerar por efeito de acto expropriativo, tanto mais que o caso dos autos configuraria, quando muito, um comodato precário, legitimador de desocupação a todo o tempo, a pedido do respectivo dono.
4ª. Assim, adjudicada a propriedade à entidade expropriante, extinguiu-se a relação de comodato, por ser a expropriação incompatível com a subsistência desse contrato, sem direito a indemnização.
5ª. Face ao que se deixou exposto, a A… não tem direito a qualquer indemnização pela expropriação dos autos.
6ª. Também não teriam os proprietários direito a uma indemnização em virtude da «suspensão da mesma actividade e a necessidade de mudança de instalações», ao abrigo do disposto no art. 31º do Código das Expropriações, ainda que essa actividade fosse desenvolvida por eles mesmos, ao contrário do que sustentaram no respectivo recurso da decisão arbitral.
7ª. Isto porque o normativo em causa prevê esse acréscimo de indemnização para o caso de os próprios titulares do bem expropriado exercerem nele actividade económica, o que nada tem a ver com a situação dos autos, já que a utilização da parcela de terreno terá sido realizada por entidade diferente que não se confunde com os donos da mesma.
8ª. De resto, ainda que a sociedade A… fosse considerada arrendatária - sem prescindir - nunca faria qualquer sentido atribuir-lhe uma indemnização em virtude do alegado aumento da renda relativo às novas instalações:
- em primeiro lugar porque, mesmo nessa hipótese, não deixaria de reconhecer-se que a renda fixada no contrato tanto poderia ser de 400 € mensais como qualquer outra que o expropriado (ou a sociedade de que é único sócio) considerasse mais conveniente – seja em atenção à anunciada expropriação, seja em virtude de outros factores (nomeadamente fiscais) alheios ao mercado.
- por outro lado, sabendo-se que a "justa indemnização" se destina a fazer reintegrar no património dos expropriados um valor equivalente ao que lhe era proporcionado pelo bem expropriado (princípio da reparação integral ou "full composition"), tal indemnização permitirá a reposição da situação existente à data da expropriação também quanto à renda “de favor” que os expropriados, alegadamente, praticavam à sociedade A….
9ª. Deve ser indeferido o pedido de expropriação total uma vez que não se verificam as circunstâncias alegadas no respectivo pedido, a saber, a falta de acesso à via pública e a perda de utilidade para os expropriados.
10ª. Relativamente a esta última, é irrelevante a invocação de circunstâncias particulares que apenas aos expropriados dizem respeito, sendo que a alegação de que a parcela deixa de reunir condições para ser usada para a finalidade a que os expropriados a afectavam - para além de não corresponder à realidade - é inócua, não podendo conduzir ao deferimento do pedido de expropriação total.
11ª. No que toca ao outro fundamento invocado - a perda de acesso - importa que se diga que foi feita uma expropriação adicional para a construção do acesso a esta sobrante (Declaração de Utilidade Pública publicada na DR nº 179, II Série de 16/09/2005), acesso que se encontra concluído.
12ª. Para fixarem a desvalorização das partes sobrantes, os Srs. Peritos partiram do valor encontrado para a parcela expropriada – de 34,16 €/m2 – valor que resultou da simulação da construção que seria possível implantar no terreno da parcela expropriada.
13ª. Sabendo-se que a área máxima de implantação da construção utilizada nesse cálculo foi de 50%, ao avaliarem o terreno, os Srs. Peritos consideraram que em 50% da sua área seria possível implantar construções.
13ª. Esta metodologia implica, necessariamente, que a área em causa esteja completamente desocupada de construções, pelo que a situação não é directamente transponível para a parte sobrante onde estão implantadas construções.
14ª. Na verdade, se nos 1.500 m2 da parte sobrante Sul estão implantadas construções, isso significa que a área de implantação estimada para a sobrante não é, apenas, de 50% - ela será de 50% (750 m2) mais a área correspondente às construções já existentes.
15ª. Assim, sempre salvo melhor opinião, sempre haverá que corrigir o valor fixado no laudo em função da ocupação existente.
16ª. A douta sentença em crise, salvo melhor opinião, violou os arts. 13º e 62º da CRP, bem como os arts. 1º, 3º, 9º, 23º e 29º do CE/99.
TERMOS EM QUE julgando procedente o recurso interposto, V. Exas. farão, como habitualmente, Justiça.

Questões a conhecer
. o direito a indemnização da sociedade A…;
- o deferimento do pedido de expropriação total;
- o montante fixado a título de depreciação da sobrante.

Os factos provados a considerar são os seguintes:

a) Por despacho do Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas, de …, com o nº …2004, publicado do Diário da República nº …, 2ª Série, de … de Janeiro de 2004, foi declarada a utilidade pública e a urgência da expropriação da parcela nº … sita no lugar de Feital, freguesia de Vila Praia de Âncora, concelho de Caminha, inserida em prédio com a área total de 3.151,00 m2, inscrito na matriz predial rústica da mencionada freguesia sob o artigo … e com a descrição omissa na respectiva Conservatória do Registo Predial;
b) O prédio de onde é destacada a parcela a expropriar tem a área total de 3.151,00 m2, a área expropriada tem 1.051,00 m2, a área sobrante a norte tem 600,00 m2 e a área sobrante a sul tem 1.500,00 m2;
c) O caminho público que confrontava com o prédio de onde a parcela expropriada foi destacada era pavimentado e dotado de redes públicas de abastecimento de água, de distribuição de energia eléctrica e telefónica;
d) De acordo com o regulamento do PDM do concelho de Caminha, a parcela em causa está inserida em mancha classificada como espaços para indústrias e armazéns ;
e) O prédio estava a ser utilizado pela sociedade A… como armazém e depósito de materiais de construção que no mesmo exercia a sua actividade comercial;
f) Os diversos materiais existentes preenchiam na íntegra todo o prédio de onde a parcela expropriada foi destacada, com excepção das áreas destinadas a circulação de pessoas e empilhadores destinados a cargas e descargas, para além do escritório pré-fabricado;
g) A sociedade Â… possuía seis camiões de diferentes capacidades e empregava cinco pessoas;
h) Na parcela expropriada existiam as seguintes infra-estruturas:
• Furo artesiano para abastecimento de água com 80 metros de profundidade;
• Muro de vedação em alvenaria de granito, em mau estado de conservação, com 50 metros de comprimento, 1,50 metros de altura (incluindo fundações) e 0,40 metros de espessura;
• Muro de vedação em blocos de cimento com 30 metros de comprimento e 1,20 metros de altura;
i) A interessada Â… facturou no ano de 2004 o montante de € 817.216,05;
j) Em consequência da expropriação a sociedade Â… esteve paralisada durante um mês;
k) Durante esse mês suportou custos relacionados com seguros, contencioso e notariado, amortizações, conservação e reparação, material de escritório, publicidade, trabalhos especializados, rendas de leasings, pessoal, telefones, correio, fax, gasóleo e outros fluidos;
l) Durante esse mês perdeu e viu deteriorar-se parte do material armazenado;
m) A parte sobrante a norte fica depreciada pelos seguintes motivos:
• Tem uma área reduzida (600,00 m2), a qual é significativamente inferior à do prédio de onde foi destacada (3.151,00 m2);
• Fica separada da outra parte sobrante (sul) e sem acesso directo à mesma, sendo necessário ir dar uma volta significativa por estrada e caminhos públicos para aceder de uma à outra;
• O acesso a esta parte sobrante norte é feito por um caminho em terra, o qual tem uma largura, sensivelmente, entre 2,50 metros no local mais apertado e 4,50 metros no mais largo. Ora, o prédio antes da expropriação tinha acesso por caminho público pavimentado, o qual permitia o fácil acesso de camiões. Verifica-se assim que a acessibilidade a esta parte sobrante ficou parcialmente prejudicada;
• Esta parte sobrante fica abrangida, na sua maior parte pela servidão non aedificandi de protecção à via que motivou a presente expropriação e, assim, sem possibilidades construtivas, pese embora inserida no PDM de Caminha em zona com aptidão construtiva;
n) A parte sobrante a sul fica depreciada pelos seguintes motivos:
• Tem uma área de 1.500,00 m2, a qual é de cerca de 48% da área do prédio de onde foi destacada (3.151,00 m2);
• Esta parte sobrante fica abrangida, na sua maior parte pela servidão non aedificandi de protecção à via que motivou a presente expropriação e, assim, sem possibilidades construtivas, pese embora inserida no PDM de Caminha em zona com aptidão construtiva.

O recurso de apelação interposto pela sociedade A… Lda. foi apresentado no pressuposto da revogação do despacho que não considerou o contrato de arrendamento junto aos autos.
Ora como tal despacho se manteve fica prejudicada a apreciação de tal recurso, o que se declara.
Fica para apreciação o recurso da expropriante, sendo a primeira questão a apreciar a de saber se se verifica o direito a indemnização da sociedade A….
Com referência á dita sociedade apurou-se que
O prédio estava a ser utilizado pela sociedade Â… como armazém e depósito de materiais de construção que no mesmo exercia a sua actividade comercial;
Os diversos materiais existentes preenchiam na íntegra todo o prédio de onde a parcela expropriada foi destacada, com excepção das áreas destinadas a circulação de pessoas e empilhadores destinados a cargas e descargas, para além do escritório pré-fabricado;
A sociedade Â… possuía seis camiões de diferentes capacidades e empregava cinco pessoas;
Perante esta factualidade e conhecendo as orientações da doutrina e da jurisprudência- citadas nas alegações em apreciação, seguimos a orientação que entende que falha à dita sociedade argumentação bastante para lhe ser reconhecido o direito a ser indemnizada pela expropriação da aludida parcela de terreno.
É que dos factos apurados resulta, em nosso entender, a existência de uma situação de mera detenção do espaço pela sociedade recorrente uma vez que ocupa o terreno com autorização dos proprietários. Mas esta situação dá lugar a posse por existir simples tolerância e também não se confunde com o comodato pois não existe contrato.
Neste sentido ver António Menezes Cordeiro, José de Oliveira Ascenção e A. Santos Justo

O art.º 30º do CE fixa o regime da indemnização respeitante ao arrendamento.
Este preceito estipula expressamente que a indemnização dos arrendatários deve ser, por reporte ao dono do prédio expropriado, autónoma e especificamente considerada, com ressarcimento adequado dos direitos, interesses e prejuízos para aqueles oriundos do fenómeno expropriativo.
E distingue muito claramente entre as indemnizações a atribuir ao inquilino habitacional; ao inquilino comercial, industrial, e profissional liberal e ao arrendatário rural.
Fixando os direitos a cada uma de tais espécies tutelados e certos critérios que devem subjazer á determinação das respectivas indemnizações.
Daqui decorre que existe plasmada na lei uma efectiva e real destrinça entre os direitos dos inquilinos consoante a sua qualidade – habitacional, comercial, ou rural.
Direitos aqueles que, ex vi desta qualidade, são especificamente tutelados em função de requisitos legalmente determinados, posto que não taxativa ou exaustivamente.
Tanto assim que o simples ocupante de prédio que não tenha firmado tal contrato, não tem direito a ser indemnizado pela expropriação. Neste sentido Pedro Paes, Ana Pacheco e Luís Barbosa in Código das Expropriações, Almedina, 2003, p.193.
Destarte, se se quiser efectivar e acautelar tal tutela terá de celebrar-se contrato autónomo, Pois que só assim este uso ganha certeza, premência, relevância e dignidade tais que permitam a sua tutela autónoma e diferenciada, ou, pelo menos, complementar, relativamente ao objecto fulcral do contrato.
Ora nada disto se verifica no caso em apreciação.
Apenas se apurou que existe uma ocupação do imóvel por parte da sociedade recorrente, sem qualquer título que a legitime.
E diga-se nem mesmo é possível qualificar essa ocupação como um comodato por falta de factos que nos permitam concluir pela existência da entrega à outra certa coisa, móvel ou imóvel, para que se sirva dela, com a obrigação de a restituir (art.º 1129º, do CC), nos termos já mencionados.
Mas mesmo que tal factualidade tivesse sido apurada, seguimos a orientação do Ac da Relação do Porto citado pela expropriante segundo o qual “ o comodatário dispõe apenas de tutela possessória contra actos que perturbem o uso da coisa (art. 1333 do CC), sendo duvidoso que seja titular de indemnização a considerar por efeito de acto expropriativo, tanto mais que, na situação invocada, estar-se-ia, quando muito, diante de um comodato precário, legitimador de desocupação a todo o tempo, a pedido do respectivo dono.
Encarada nesta perspectiva a questão em referência e admitindo mesmo que a sociedade recorrente dispõe de legitimidade para intervir nos presentes autos de expropriação, quer do ponto de vista processual, quer por poder considerar-se interessada para os termos, entre o mais, dos arts. 9 e 40 do CE, nem por isso lograria a mesma, na situação descrita, obter ganho de causa, no sentido de lhe ser reconhecido o direito a indemnização autónoma.
Corresponde este entendimento à correcta interpretação da lei em conjugação com a noção de ocupação e comodato e consequências jurídicas destas situações de facto, daí seja de citar e seguir esta orientação.
E no citado acórdão se encontra a resposta à questão equacionada pela sociedade recorrente da possível violação do principio da igualdade consagrado no art.º 13 da CRP no caso da interpretação do art.º 31 nº1 do C. das Expropriações ser a dele excluir ( ou não incluir) os casos em que o proprietário exerce uma actividade através de uma sociedade unipessoal de que é o titular exclusivo do capital( e gerente).
Com efeito, o normativo em causa prevê esse acréscimo de indemnização para o caso de os próprios titulares do bem expropriado exercerem nele actividade económica, o que nada tem a ver com a situação descrita nos autos, já que a invocada utilização da dita parcela de terreno terá sido realizada por entidade diferente que não se confunde com o dono da mesma – os expropriado – pelo que se mostra desajustado chamar à colação o aludido normativo, por forma a considerar o falado acréscimo indemnizatório ( ver acórdão citado).
De salientar, que a sociedade recorrente ora entende num sentido, ora noutro, conforme o resultado que se pretende alcançar e aquilo que é mais favorável à posição defendida! De facto, tanto refere que o expropriado passou a exercer a actividade através da sociedade como refere que em ambos os casos é o proprietário do imóvel quem exerce a actividade. A verdade porém é que tendo criado a sociedade para auferir das vantagens fiscais também está criada para auferir das “ desvantagens” que a situação acarreta nesta situação.
Decidir nos termos pretendidos pela sociedade/recorrente seria contrário á lei.
Desde logo no sentido de que não pode reportar-se a prejuízos que a lei – e a própria natureza das coisas – apenas admite para outras realidades ou negócios jurídicos.
Aliás e já numa outra vertente – a quantitativa, isto é, a necessária para a determinação do quantum indemnizatório – esta pretendida tutela implicaria decisões aleatórias e injustas porque desfasadas da objectividade dos critérios legais consagrados para o efeito – arts 30º e 31º do C. das Expropriações.
Parece, também descabida a invocação do (nº 2 do) art. 62º da Constituição, não podendo, sob pena de evidente petição de princípio, deixar de entender-se que o princípio constitucional da justa indemnização necessariamente (pres)supõe que, de acordo com o juízo de valor legal, haja efectivamente lugar a indemnização
A segunda questão a decidir consiste em saber se ocorrem os requisitos exigidos para a procedência do deduzido pedido de expropriação total referente à parte sobrante a norte.
Vejamos
Segundo o art.º 3 do C. Das Expropriações “ A expropriação deve limitar-se ao necessário para a realização do seu fim (...)” o que constitui uma manifestação do princípio da proporcionalidade, segundo o qual o dano causado ao expropriado deve apenas corresponder ao necessário para satisfazer o fim de utilidade pública.
Porém o expropriado pode requerer a expropriação da totalidade da área sobrante do prédio objecto de expropriação (artigo 3.°, n.º 2) ou de apenas parte desta .
Para que proceda esse pedido, basta que se verifique qualquer um dos dois primeiros requisitos, a seguir indicados, cumulativamente com o requisito mencionado em terceiro lugar:
A) A parte restante não assegurar, proporcionalmente, os mesmos cómodos que oferecia todo o prédio;
B) Os cómodos assegurados pela parte restante não terem, para o expropriado, um interesse económico objectivo;
C) A entidade expropriante não pretender realizar obras na parte do prédio não expropriada, de forma a evitar a verificação das situações previstas nas alíneas anteriores.
A estatuição deste preceito visa evitar uma lesão excessiva do expropriado e, na protecção do interesse deste, impõe à expropriante uma expropriação superior à sua necessidade a fim de satisfazer o interesse daquele. Isto é, a lei tempera a regra da necessidade e suficiência com imperativos de justiça e faz funcionar o princípio da proporcionalidade ajustando-o a situações que se enquadram nas situações aludidas no nº2 do normativo citado .
Sabemos que uma diminuição dos cómodos justifica sempre a contabilização da depreciação daí resultante e a sua inscrição no montante da indemnização referente á parcela expropriada, de acordo com o disposto no art.º 29 nº2 do C. Exp que dispõe que Quando a parte não expropriada ficar depreciada pela divisão do prédio ou desta resultarem outros prejuízos ou encargos, incluindo a diminuição da área total edificável ou a construção de vedações idênticas às demolidas ou ás subsistentes, especificam-se também os encargos que acrescem ao valor da parte expropriada”.
Porém, a lei fixa casos especiais em que a afectação dos cómodos se reveste de uma gravidade a que o disposto no art.º 29 nº2 do citado diploma legal não dá resposta satisfatória e, então, quando se verifique que a parte restante não assegura, proporcionalmente, os mesmos cómodos que oferecia todo o prédio ou que os cómodos assegurados pela parte restante não têm interesse económico para o expropriado, determinado objectivamente, permite ao expropriado que solicite a expropriação total.
Expostos estes princípios, cumpre referir que em termos estritamente objectivos a prova certifica que
A parte sobrante a norte fica depreciada pelos seguintes motivos:
Tem uma área reduzida (600,00 m2), a qual é significativamente inferior à do prédio de onde foi destacada (3.151,00 m2);
Fica separada da outra parte sobrante (sul) e sem acesso directo à mesma, sendo necessário ir dar uma volta significativa por estrada e caminhos públicos para aceder de uma à outra;
O acesso a esta parte sobrante norte é feito por um caminho em terra, o qual tem uma largura, sensivelmente, entre 2,50 metros no local mais apertado e 4,50 metros no mais largo. Ora, o prédio antes da expropriação tinha acesso por caminho público pavimentado, o qual permitia o fácil acesso de camiões. Verifica-se assim que a acessibilidade a esta parte sobrante ficou parcialmente prejudicada;
Esta parte sobrante fica abrangida, na sua maior parte pela servidão non aedificandi de protecção à via que motivou a presente expropriação e, assim, sem possibilidades construtivas, pese embora inserida no PDM de Caminha em zona com aptidão construtiva;
Da leitura desta factualidade concluímos sem dúvida nos mesmos termos que o fizeram os expropriados e a sociedade A… na resposta às alegações que apresentarem. De facto, uma parcela de 600 m2 se isolada ou com acessos difíceis não tem a mesma rentabilidade e valor se integrada num imóvel de maiores dimensões com acessos por via pública pavimentada. Também uma parcela de terreno com 600 m2 integrada numa área classifica pelo PDM como se destinando a construção industrial ou armazéns e encontrando-se em grande parte abrangida por servidão non aedificandi não tem interesse económico para quem quer que seja .
Por verificação do requisito exigido pelo art.º 3 nº2 al. a) e nº3 do C. das Expropriações bem andou o Sr. Juiz da 1ª Instância ao determinar a expropriação total da parte sobrante a norte.
Quanto ao acesso que está concluído e para o qual foi feita expropriação adicional, cumpre referir o seguinte; este Tribunal está impedido de apreciar tal factualidade, por se tratar de factos novos e que não foram oportunamente alegados nos autos, nos termos já referidos, nem resultam dos factos apurados em sede de julgamento e indicados na sentença nem existe acordo das partes acerca de tal factualidade.
O recurso, como refere Professor Castro Mendes, consiste no pedido de reponderação sobre certa decisão judicial, apresentada a um órgão judiciariamente superior ou por razões especiais que a lei permite fazer valer .
O recurso ordinário (que nos importa analisar para a situação presente) não é uma nova instância, mas uma mera fase (eventualmente) daquela em que a decisão foi proferida.
O recurso é uma mera fase do mesmo processo e reporta-se à mesma relação jurídica processual ou instância .
A respeito do objecto do recurso têm surgido na doutrina duas posições:
- o objecto do recurso é a questão sobre que incidiu a decisão recorrida; e
- o objecto do recurso é a decisão recorrida, que se vai ver se foi aquela que “ex lege” devia ter sido proferida.
O Professor Castro Mendes escreve a este respeito que: “o nosso sistema de recursos inclina-se para a segunda solução – o objecto do recurso é a decisão. Dentro desta orientação tem a nossa jurisprudência repetidamente afirmado que os recursos visam modificar decisões e não criar soluções sobre matéria nova. (…) o tribunal de recurso vai reponderar a decisão tal como foi proferida. Em regra deve aplicar a lei vigente ao tempo da decisão e cingir-se aos factos sobre que esta incidiu. Mas esta regra sofre pelo menos duas atenuações:
- a parte pode apresentar ao tribunal de segunda instância e de revisão documentos supervenientes (art. 712º/1/c), 749º, 771º/c));
- as partes podem alterar, ainda em segunda instância, o pedido, de comum acordo (art. 272º CPC )”. ob cit., pag. 25-26).
A respeito da alegação de factos novos refere expressamente o ilustre professor: “A invocação de factos novos parece só ser possível até ao encerramento da discussão em primeira instância (art. 506º/1, 663º/1 CPC).
Na jurisprudência entre outros sobre esta questão, podem ler-se: os Ac. STJ 07.07.2009, Ac. STJ 20.05.2009, Ac. STJ 28.05.2009, Ac. STJ 11.11.2003 merecendo-nos particular relevo o Ac. STJ 28.05.2009 onde se refere:
“E, do específico ponto de vista da instância recursiva, tem-se por certo que, como é jurisprudência uniforme, sendo os recursos meios de impugnação das decisões judiciais, destinados à reapreciação ou reponderação das matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal a quo e não meios de renovação da causa através da apresentação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada) ou formulação de pedidos diferentes (não antes formulados), ou seja, visando os recursos apenas a modificação das decisões relativas a questões apreciadas pelo tribunal recorrido (confirmando-as, revogando-as ou anulando-as) e não criar decisões sobre matéria nova, salvo em sede de matéria indisponível, a novidade de uma questão, relativamente à anteriormente proposta e apreciada pelo tribunal recorrido, tem inerente a consequência de encontrar vedada a respectiva apreciação pelo Tribunal ad quem (art. 676º CPC).”
Ponderando o exposto a respeito do objecto do recurso, verifica-se que os factos que a recorrente vem introduzir na motivação do recurso não podem ser considerados, pois constituem factos novos.
Se os novos factos resultaram da discussão da causa, recaia sobre as partes ao abrigo do art. 264º/3 CPC, suscitar junto do tribunal “a quo”, a sua consideração em sede de decisão, o que também não ocorreu.
Conclui-se, assim, nos termos do art. 676º CPC, que nenhuma relevância merece, nesta sede, os factos “novos” que a recorrente alega na motivação das alegações de recurso, pois os mesmos não foram considerados na decisão objecto de recurso e ao tribunal de recurso apenas cumpre reapreciar as matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal “a quo” ficando por isso vedado a apreciação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada).
Por fim temos de apreciar a questão da depreciação das sobrantes.
Importa referir previamente à apreciação desta questão que o laudo unânime ou maioritário dos peritos deve em princípio, porque envolve questões técnicas, ser considerado um indicador seguro do que seja a justa indemnização, devendo por regra ser acatado, a menos que ocorra violação de lei, ou não forneça nem contenha todos os elementos necessários à fixação da indemnização. .
São na verdade os peritos que com os seus conhecimentos técnicos designadamente quanto às características do solo e subsolo, experiência no campo da avaliação e conhecimento do mercado e das variáveis que neste são susceptíveis de interferir no preço, e mediante observação do bem expropriado, sua inserção, configuração, acesso, infra-estruturas disponíveis, culturas, clima, e constatando quer in loco quer por outras vias os prejuízos, em melhor posição se encontram para dizer da justa indemnização. Tais circunstâncias justificam o crédito que os laudos unânimes vêm colhendo na jurisprudência.
Ora no caso em apreço, e na parte da indemnização das parcelas sobrantes não se encontra no laudo dos Srs Peritos violação da lei, antes os critérios usados são claros, equilibrados e legais nos termos que constam dos esclarecimentos pelos Srs Peritos prestados e constantes de fls. 374 a 376 destes autos, sendo portanto de manter a avaliação que foi seguida na sentença da 1ª Instância.