Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
132117/13.0YIPRT.G1
Relator: ANTÓNIO SOBRINHO
Descritores: INJUNÇÃO
OPOSIÇÃO
TAXA DE JUSTIÇA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/20/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: JULGADA PROCEDENTE
Sumário: 1. O disposto no art.º 20.º do Anexo ao Dec. Lei n.º 269/98, na redação dada pelo Dec. Lei nº 34/2008, é aplicável ao procedimento de injunção antes de seguir como ação.
2. Seguindo o procedimento de injunção como ação, nomeadamente por ter sido deduzida oposição, a tramitação legal adequada, quanto à falta do documento comprovativo da taxa de justiça, é a previstas nas disposições conjugadas dos artºs 7º, nº6, do RCP, e dos art.s 145º, nº3 e 570º, nº3, ambos do CPC.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães


I – Relatório;

Recorrente: E…, LDª (requerida);
Recorrida: S…, LDª(requerente);

*****


No procedimento de injunção que S…, LDª intentou contra E…, LDª, esta deduziu oposição, o que determinou que os autos fossem apresentados à distribuição.
A ré não pagou a taxa de justiça devida, tendo sido decidido determinar o desentranhamento da oposição que a ré deduziu, assim com conferir força executiva à petição inicial.

Não se conformando com tal, interpôs a ré recurso.

O recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresenta, a apelante formula, em súmula, as seguintes conclusões:
I- A sanção de desentranhamento prevista pelo artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 269/98 de 1 de Setembro cinge-se ao procedimento de injunção e não à acção declarativa em que a mesma se haja transmutado.
II- A sanção de desentranhamento decidida pelo Tribunal a quo resulta de uma incorrecta aplicação da lei.
III- A falta de apresentação, por parte do Autor, dos comprovativos de liquidação e pagamento de taxa de justiça a que se refere o n.º 5 do artigo 7.º do RCP só determina a prolação de despacho de desentranhamento do requerimento injuntivo transmutado em petição inicial se tiver sido precedido da notificação daquele para, em 10 dias, praticar o acto omitido.
IV- A prolação de despacho de desentranhamento vertido na decisão de que ora se recorre, com preterição da notificação referida no ponto anterior configura uma violação da mens legis da reforma do Processo Civil de 1995-1996 e do princípio estruturante da Lei Processual Civil que é o da igualdade das partes (artigo 3.º-A CPC).
V- Os comprovativos de liquidação e pagamento da taxa de justiça devida pela Autora, ora Recorrente, nos termos do n.º 5 do artigo 7.º RCP, no caso sub judice, embora juntos posteriormente ao decurso do prazo de 10 dias, devem configurar o preenchimento das obrigações tributárias da Autora nesta fase processual.”

Pede a revogação da revogação da decisão recorrida, devendo ordenar-se o prosseguimento dos autos.

Houve contra alegações, pugnando-se pela confirmação do julgado.

O recurso veio a ser admitido neste Tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Delimitação do objecto do recurso: Questão a decidir.
Atentas as conclusões do recurso de apelação deduzidas e supra descritas, é a seguinte a questão a apreciar:
- falta de pagamento da taxa de justiça devida pela dedução de oposição no procedimento de injunção - efeitos.

Fundamentação.
I) Os factos a atender com interesse à decisão do presente recurso, são os expostos no relatório supra e ainda os seguintes:
II) Em 30.01.2014, após a interposição do recurso de apelação, foi proferido despacho judicial a determinar que a secretaria aplique à ré a multa prevista no art. 642º nº1 do Cód. de Proc. Civil, a qual veio a ser paga por esta.


II) O DIREITO APLICÁVEL

a) Questões prévias:

Na sua contra alegação, a recorrida suscita, como questões prévias, a extemporaneidade do recurso da ré, o regime da sua tramitação e ainda o seu efeito de subida.
No que concerne à tempestividade do recurso interposto e ao seu efeito de subida, fica prejudicado a sua pertinência e conhecimento, atentos os fundamentos invocados, uma vez que, por um lado, a recorrente pagou a multa a que alude o artº 642º, nº1, do Cód. de Proc. Civil (doravante CPC), e, por outro, ao recurso interposto foi atribuído o efeito devolutivo pelo tribunal recorrido.
No que tange, à tramitação processual da presente apelação, visto o disposto nos artºs 5º e 8º da Lei nº 41/2013, de 26.06, é-lhe aplicável o regime legal previsto neste diploma.

b) Da falta de pagamento da taxa de justiça devida pela dedução de oposição no procedimento de injunção - efeitos.

O objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões da respectiva alegação, nos termos do artº 639º, do CPC.

Argumenta a recorrente que “a sanção de desentranhamento prevista pelo artº 20.º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, cinge-se ao procedimento de injunção e não à acção declarativa em que a mesma se haja transmutado” e que “a falta de apresentação, por parte do Autor, dos comprovativos de liquidação e pagamento de taxa de justiça a que se refere o n.º 5 do artigo 7.º do RCP só determina a prolação de despacho de desentranhamento do requerimento injuntivo transmutado em petição inicial se tiver sido precedido da notificação daquele para, em 10 dias, praticar o acto omitido”.
Apreciando.
Como fundamento jurídico da decisão recorrida, invocou o tribunal a quo o conteúdo do artº 20º do citado Dec.Lei nº 269/98, de 01.09, na redacção dada pelo Dec.Lei nº 34/2008, de 26.02, o qual estatui que ‘na falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça, é desentranhada a respectiva peça processual’.
Ao invés, a apelante contrapõe que tal preceito legal e efeito preclusivo nele contido se referem ao procedimento de injunção qua tale e não à acção declarativa em que se metamorfoseou, por via da oposição deduzida pelo requerido/réu.
Entende-se que assiste razão à apelante.
Em primeiro lugar, face a uma inserção sistemática do apontado normativo do artº 20º, sendo este precedido do artº 19º que se refere à entrega do requerimento de injunção, pode-se concluir com razoabilidade que o mesmo se adequa apenas ao requerimento de injunção e não à acção declarativa que se lhe seguir.
Acresce que, nas situações em que o procedimento de injunção segue como acção, preceitua o artº 7º, nº6, do Regulamento das Custas Processuais (RCP) (na redacção introduzida pelo Lei 7/2012, de 13.02) que ‘é devido o pagamento de taxa de justiça pelo autor e pelo réu, no prazo de dez dias a contar da data da distribuição, nos termos gerais do presente Regulamento (…)’.
Ou seja, além de se colocar em pé de igualdade as partes em termos de obrigação tributária, neste âmbito pretende-se a sua conformação com os trâmites da acção declarativa.
Cabe ainda aquilatar a intenção da lei em obstar a preclusões de natureza processual, em particular como consequência do incumprimento de obrigações tributárias, apenas as fazendo desencadear a partir de certos limites, considerados insustentáveis.
Ou seja, em regra, faculta-se à parte faltosa a oportunidade de, ainda que com multa, poder praticar o acto e não rejeitá-lo ab initio, constatada a falta.
A preocupação do legislador é assim, a par da eficiência, formalidade e celeridade dos actos processuais, a de fazer prevalecer a justiça material.
Noutra perspectiva, importa não descurar o princípio da igualdade, previsto no art. 4º do CPC.
A acção transmutada do procedimento de injunção, por efeito da remessa à distribuição, nos termos do citado artº 7º, nº 6 do RCP, mais não é do que uma acção declarativa.
No âmbito do processo de declaração, a falta de junção do comprovativo do pagamento da taxa de justiça, devida pela petição, não determina o imediato desentranhamento da petição, pois nos termos do artº 560º CPC, sempre o autor terá a faculdade de, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento da taxa de justiça devida.
Logo, é curial entender-se que, ante o estipulado no apontado artº 7º, nº 6, do RCP, a falta de junção do comprovativo do pagamento da taxa de justiça pelo réu, importe o cumprimento do disposto no artº 570º do CPC.
É que, no âmbito da tramitação do processo de declaração, em sede de comprovativo de pagamento de taxa de justiça, se prescreve no artº 145º, nº 3, do CPC, que, ressalvadas precisamente as disposições relativas à petição, a falta de pagamento da taxa de justiça não implica a recusa da peça processual, antes devendo a parte proceder à junção do respectivo documento comprovativo nos 10 dias subsequentes à prática do acto processual, sob pena de aplicação das cominações previstas nos artºs 570º e 642º.
E no que respeita à contestação, preceitua o dito artº 570º, nº 3, que, na falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida ou de comprovação desse pagamento, no prazo de 10 dias a contar da apresentação da contestação, a secretaria notifica o interessado para, em outros 10 dias, efectuar o pagamento omitido com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1UC nem superior a 5 UC.

No caso em apreço, é, pois, esta a tramitação que legalmente se impunha pelas razões acima expendidas.
Este entendimento tem sido perfilhado maioritariamente pela jurisprudência[1] e defendido a nível doutrinal. [2]
Assim sendo, in casu, não tendo a ré junto aos autos o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça, a tramitação a seguir deveria ter sido a contemplada naquele nº 3, do artº 570º, do CPC (pagamento ou comprovação omitida, com o acréscimo de multa de igual valor) e, no caso de omissão, seguir-se-iam subsequentemente os passos previstos nos nºs 5 e 6 do citado preceito, e não, como decidido, a rejeição do requerimento de oposição à injunção e subsequente força executiva atribuída à petição inicial.
Procede, pois, a apelação, devendo revogar-se a decisão recorrida, a qual será substituída por outra que ordene o cumprimento, pela secretaria, do disposto no n.º 3, do art.º 570º, do CPC, seguindo-se a tramitação subsequente.

Sintetizando:
1. O disposto no art.º 20.º do Anexo ao Dec. Lei n.º 269/98, de 01.09, na redacção dada pelo Dec.Lei nº 34/2008, de 26.02, é aplicável ao procedimento de injunção antes de seguir como acção.
2. Seguindo o procedimento de injunção como acção, nomeadamente por ter sido deduzida oposição, a tramitação legal adequada, quanto à falta do documento comprovativo da taxa de justiça, é a previstas nas disposições conjugadas dos artºs 7º, nº6, do RCP, e dos artºs 145º, nº3 e 570º, nº3, ambos do CPC.

DECISÃO

Nos termos expostos, acordam os Juízes desta 1ª secção cível, em julgar procedente a apelação e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, determinando-se que seja substituída por outra que ordene o cumprimento do disposto no n.º 3, do art.º 570º, do Código de Processo Civil, pela secretaria.

Custas pela parte vencida a final.
Guimarães, 20 de março de 2014
António Sobrinho
Isabel Rocha
Moisés Silva
_________________
[1] Entre outros, vide Ac. RP de 02.05.2011, proc. 154646/10.7YIPRT e Ac. RL de 11.09.2012, proc. 208905/11.4YIPRT.
[2] Salvador da Costa, A Injunção e as Conexas Acção e Execução”, Almedina, 6ª edição, 2008, pag. 294-295.