Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1428/12.9TBBCL-B.G1
Relator: MARIA LUÍSA RAMOS
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
DECISÃO FINAL
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/12/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: Nos termos do disposto no artº 26º-nº1 e 2 da Lei nº 34/2004, a decisão final sobre o pedido de protecção jurídica é notificada ao requerente e tal decisão não admite reclamação nem recurso hierárquico ou tutelar, sendo susceptível de impugnação judicial nos termos dos artº 27º e 28º, e, havendo lugar a esta, só, em caso de manutenção da decisão de indeferimento, caberá ao Tribunal conhecer e decidir a impugnação, enviando aquele serviço de segurança social cópia autenticada do processo administrativo ao Tribunal competente.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

C…, Réu nos autos de processo sumário n.º 1428/12.9TBBCL, do 4º Juízo Cível, do Tribunal Judicial de Barcelos, veio interpor recurso de apelação da decisão proferida nos autos, em 18/3/2013, que indeferiu o requerimento de fls. 114/115 apresentado nos autos pelo Réu, nos termos seguintes: “ Fls. 114/115: Pelas razões que constam do ofício da Segurança Social que antecede (e cujo teor deve ser dado conhecimento ao requerente), indefere-se o requerido pelo réu C….”

O recurso foi recebido, como recurso de apelação, com subida imediata, em separado e com efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresenta, o apelante formula as seguintes conclusões:
5.1- O douto despacho recorrido ancorou os seus fundamentos nas razões contantes do ofício da segurança social de fls 118;
5.2- O que significa que o tribunal a quo decidiu sem ter dado prévio conhecimento ao réu ora requerente do teor da dita informação da segurança social;
5.3- E consubstancia uma nulidade processual que inquina letalmente a decisão ora recorrida e, por isso, serve de fundamento ao presente recurso;
5.4- E cuja procedência implica a anulação do despacho recorrido, com todas as legais consequência;
- sem prescindir-
5.4- A informação de fls 118 não corresponde á verdade;
5.5- Porquanto, como resulta do respectivo ofício que vai em anexo sob o doc.1 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, a notificação efectuada ao ora requerente foi feita nos termos seguintes: «fica notificada/o para no prazo de dez dias úteis se poder pronunciar, por escrito, sobre a proposta de decisão na modalidade de pagamento faseado que se anexa sob pena deste serviço indeferir o pedido de apoio judiciário formulado»;
5.6- Sendo certo que a dita proposta («anexa») de decisão nas modalidades do pagamento faseado de taxa de justiça e demais encargos com o processo e da nomeação e pagamento faseado da compensação de patrono consistia no pagamento da quantia mensal de € 80,00;
5.7- O que foi obviamente interpretado pelo ora recorrente no sentido de que se o requerente nada dissesse a dita proposta de decisão de indeferimento da protecção jurídica nas modalidades requeridas e do seu deferimento na modalidade de pagamento faseado se converteria em definitiva;
5.8- Tanto mais que na dita notificação não é feita qualquer expressa advertência ao ora recorrente no sentido de que o mesmo teria de se pronunciar expressamente sobre a proposta de decisão da modalidade de pagamento faseado sob pena de total indeferimento do seu pedido;
5.9- Ora, os «actos processuais que hajam de reduzir-se a escrito devem ser (…) redigidos de maneira a tornar claro o seu conteúdo …» vd artº 138º, nº3 do CPC;
5.10- E se «os erros e omissões dos actos praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes» -vd artº161º, nº6 do CPC;
5.11- Por maioria da razão também não poderão prejudica-las os erros e omissões praticados por entidades exteriores ao tribunal mas com relevância processual;
5.12- Pelo que, ao ter decidido como decidiu, o douto despacho recorrido violou o princípio do contraditório e, entre outras, as normas constantes dos artºs 3º, nº3, 138º, nº3 e 161º, nº 6 do CPC.
5.13- Ademais que, a não ser dessa forma, ou seja, a manter-se a interpretação que delas é feita no douto despacho recorrido, então as ditas normas serão materialmente inconstitucionais por violação o princípio do acesso ao direito e o direito a um processo equitativo e justo consagrados no artº 20º, nº1 e 4 da CRP;
Termos em que, dando-se integral provimento ao presente recurso, deverá a decisão recorrida ser revogada e substituída que defira o requerido a fls 114/115 ou que, pelo menos, mande notificar o réu ora requerente para se pronunciar querendo sobre a informação da segurança social de fls 118, com todas as legais consequências.

Não foram proferidas contra – alegações.
O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Questão a decidir: reapreciação da decisão recorrida que indeferiu o requerimento de fls. 114/115 apresentado nos autos pelo Réu,

FUNDAMENTAÇÃO – DE FACTO E DE DIREITO
I. factualidade a atender e que resulta dos autos ):
a) O Réu/apelante apresentou nos autos o requerimento de fls 114/115, com o seguinte teor:
“ O réu aqui requerente foi citado para os termos da presente acção em 14/05/2012.
E por carta registada em 4/6/2012, o réu juntou aos autos o respectivo comprovativo da apresentação do seu pedido de protecção jurídica nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos do processo e nomeação e pagamento da compensação de patrono;
Em 6/6/2012 foi proferido o despacho com o seguinte teor:
«Uma vez que o réu C… pediu apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, fica interrompido o prazo da contestação.»
Por carta registada em 2/08/2012, o réu foi notificado pelo instituto da segurança social da proposta de indeferimento do seu pedido de protecção jurídica nas modalidades requeridas e da proposta de decisão de pagamento faseado da taxa de justiça e demais encargos com o processo e da nomeação e pagamento faseado da compensação de patrono;
E de que na falta de resposta, tal proposta se convertia em decisão definitva, não havendo lugar a nova notificação.
O aqui requerente não respondeu e, por isso, ficou a aguardar a nomeação do respectivo patrono.
Acontece que, até á presente data, o aqui requerente ainda não foi notificado da nomeação do respectivo patrono.
Pelo que, requer a Vª Exª se digne ordenar seja nomeado ao ora requerente o respectivo advogado a que tem direito.»
B) Por decisão proferida nos autos, em 18/3/2013, foi indeferido o requerimento de fls. 114/115 apresentado nos autos pelo Réu, nos termos seguintes: “ Fls. 114/115: Pelas razões que constam do ofício da Segurança Social que antecede (e cujo teor deve ser dado conhecimento ao requerente), indefere-se o requerido pelo réu C….”
II. Nos termos do art.º 1º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, o sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se a assegurar que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício ou a defesa dos seus direitos.
A protecção jurídica pode ser requerida pelo interessado na sua concessão ( art.º 19º-alínea. a) da citada Lei ), e, a decisão sobre a concessão de protecção jurídica compete ao dirigente máximo dos serviços de segurança social da área da residência ou sede do requerente ( art.º 20º ).
Dispõe o art.º 24º-n.º1, da Lei n.º 34/2004, que o procedimento de protecção jurídica na modalidade de apoio judiciário é autónomo relativamente à causa a que respeite, não tendo qualquer repercussão sobre o andamento desta.
Nos termos dos n.º 4 e 5 – alíneas., do citado artigo, quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo, e, tal prazo, assim interrompido, inicia-se, conforme os casos: a partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação ( nº5-alínea.a)), ou, a partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono.
Relativamente à notificação e impugnação da decisão final sobre o pedido de protecção jurídica regem as normas dos artº 26º a 28º da citada lei.
O Réu, no uso da legal faculdade que lhe é conferida por lei, no âmbito da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, que prevê e regulamenta as normas de acesso ao direito e aos tribunais, requereu e viu-lhe indeferida pela entidade competente - Instituto de Solidariedade e Segurança Social - Centro Distrital de Segurança Social de Braga, a protecção jurídica requerida a tal entidade.
Nos termos do disposto no artº 26º-nº1 e 2 da Lei nº 34/2004, a decisão final sobre o pedido de protecção jurídica é notificada ao requerente e tal decisão não admite reclamação nem recurso hierárquico ou tutelar, sendo susceptível de impugnação judicial nos termos dos artº 27º e 28º, nos termos dos quais a impugnação judicial pode ser intentada directamente pelo interessado, devendo ser entregue no serviço de segurança social que apreciou o pedido de protecção jurídica e recebida a impugnação o serviço de segurança social decidirá no prazo de 1o dias, ou revogando a decisão e proferindo uma nova, ou, mantendo-a enviando, neste caso, cópia autenticada do processo administrativo ao Tribunal competente para conhecer e decidir a impugnação, sendo este, caso o pedido haja sido formulado na pendência da acção, como no caso concreto se verifica, o Tribunal em que a causa se encontra pendente, in casu, o Tribunal “ a quo “. ( artº 27º-nº3 e 28º, in fine, da citada Lei ).
No caso em apreço, tendo o Réu legitimidade para proceder à impugnação judicial da decisão final sobre o pedido de protecção jurídica, nos termos legais acima indicados, deverá a petição de impugnação ser previamente entregue e decidida pelo serviço de segurança social que apreciou o pedido de protecção jurídica, se se mostrarem verificados os requisitos legais previstos, e, só, em fase posterior, em caso de manutenção da decisão, caberá ao Tribunal “ a quo “conhecer e decidir a impugnação, enviando aquele serviço de segurança social cópia autenticada do processo administrativo ao tribunal competente.
Conclui-se, nos termos expostos, dever revogar-se a decisão recorrida de indeferimento do requerimento de fls. 114/115 apresentado nos autos pelo Réu, pois que, previamente, é da competência dos serviços de segurança social a reapreciação da decisão final do pedido de protecção jurídica, se se mostrarem verificados os requisitos legais previstos, e, só em caso de manutenção da decisão, caberá ao Tribunal “ a quo “conhecer e decidir a impugnação, e, assim, consequentemente, deve o tribunal “ a quo “, nesta fase, ao invés de proferir decisão sobre o requerimento de impugnação apresentado pelo Requerente/Réu, ordenar o envio da petição aos serviços competentes da segurança social para os indicados efeitos, com menção da data de apresentação em juízo do requerimento de impugnação de fls. 114/115, só posteriormente podendo o tribunal pronunciar-se sobre a impugnação, se assim for o caso, e, nestes termos, e por estes fundamentos, procedendo a apelação.


DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal em revogar a decisão recorrida de indeferimento do requerimento de fls. 114/115 apresentado nos autos pelo Réu, que deverá ser substituída por uma outra pela qual o Tribunal “ a quo “ ordene o envio da petição aos serviços competentes da segurança social para os legais efeitos dos artº 26º-nº2 e 27º- da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, com menção da data de apresentação em juízo do requerimento de impugnação de fls. 114/115, nestes termos, e por estes fundamentos, procedendo a apelação.
Sem custas.

Guimarães, 12 de Setembro de 2013
Maria Luísa Ramos
Raquel Rego
António Sobrinho