Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
7620/15.7T8GM.G1
Relator: JORGE TEIXEIRA
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DO RECORRENTE
SERVIDÃO PREDIAL
OBRAS NO PRÉDIO SERVIENTE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/19/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (do relator):

I- Deverá ser rejeitado o recurso genérico da decisão da matéria de facto apresentado pelo Recorrente quando, para além de não se delimitar com precisão os concretos pontos que se pretendem questionar, não se deixa expressa a decisão que, no entender do mesmo, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

II- Nesta situação, não podendo o Tribunal da Relação retirar as consequências que a impugnação da matéria de facto, deve entender-se que essa omissão impõe a rejeição da impugnação do pertinente recurso, por não cumprimento dos ónus estabelecidos no art. 640º do CPC e consequente inviabilização do cumprimento do princípio do contraditório por parte do recorrido, quando a esses pontos da matéria de facto não concretizados.

III. No recurso de impugnação da decisão relativa à matéria de facto não existe a possibilidade de despacho de convite ao seu esclarecimento ou aperfeiçoamento, já que este tipo de despacho está reservado, apenas e só, para os recursos sobre matéria de direito”.

IV- Com vista à utilização normal da servidão, pode o proprietário do prédio dominante, fazer obras no prédio serviente, desde que não a torne mais onerosa, no tempo e pela forma que sejam mais convenientes para o proprietário do prédio serviente.

V- Todavia, tais obras, além da renúncia ao seu direito de propriedade em benefício do proprietário do prédio dominante legalmente prevista nos termos do n.º 4 do referido artigo 1567.º, não determinam a aquisição do direito de propriedade, nem aqui se aplicam as regras da prestação de facto ou da aquisição por acessão, nos termos dos artigos 1325.º e seguintes.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: ANTÓNIO e esposa MARIA.
Recorrido: LUIS e esposa A. R..
Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo Local Cível de Guimarães, J2.

LUIS e esposa A. R., vieram intentar a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra ANTÓNIO e esposa MARIA, pedindo, a final, a condenação dos Réus:

«a) Reconhecerem que os AA são donos e legítimos possuidores do prédio descrito em “1” a “3”;
b) reconhecerem que àquele prédio pertence todo o terreno (leito) que constitui o caminho de servidão identificado supra, em 12 e 13, entre outros, bem como toda a área de terreno abusivamente ocupada pelo muro construído pelos RR, a sul do seu prédio, em toda a sua extensão; restituírem ao AA. todo o terreno (leito) que constitui o referido caminho de servidão, bem como toda a área de terreno abusivamente ocupada pelo muro construído pelos RR, a sul do seu prédio, em toda a sua extensão;
c) desobstruírem definitivamente o caminho de servidão supra identificado, e, consequentemente, reporem o acesso dos AA, através daquele, à restante área do seu prédio;
d) destruírem e removerem, a expensas suas, completa e definitivamente, o muro construído, na extrema nascente do prédio dos AA, sobre o leito do caminho de servidão, bem como a totalidade, e em toda a sua extensão, do muro construído pelos RR, a sul do seu prédio, sobre terreno da propriedade dos AA;
e) removerem, a expensas suas, todos os tubos de condução de águas de consortes, abusivamente colocados no prédio dos AA., de modo a que possam, assim, estes fruir cabalmente do seu direito de propriedade, e da livre e plena posse, sobre a totalidade do seu prédio;
f) removerem, a expensas suas, todo o entulho e aterros efectuados pelos RR sobre o leito do caminho de servidão, pertencente ao prédio dos AA, na sua parte mais a poente, onde os RR acabaram por criar, nele, um desnível de cerca de 0,90m a 1,00m, assim repondo o leito do caminho de servidão no estado em que sempre se encontrou, ou seja, completamente plano, sem qualquer desnível;
g) absterem-se de praticar quaisquer actos susceptíveis de ofenderem todos os direitos dos AA., acima referidos e inerentes a todos os pedidos supra formulados;
h) indemnizarem os AA. pelos não patrimoniais sofridos com a conduta dos RR, em quantia não inferior a € 7.500,00, acrescida dos juros legais, contados da citação e até efectivo e integral pagamento;
i) pagarem integralmente as custas do processo.»

Para tanto alegam, em síntese, que, os Réus, sob pretexto de construírem um muro de suporte do traçado do caminho de servidão existente a sul do seu prédio, construíram um muro não autorizado e tentaram vedar o acesso na extrema poente, perpendicularmente ao caminho, com intenção de colocar um portão, apropriando-se deste trato de terreno dos Autores, impedindo-os de aceder por aí ao restante prédio. Acrescentam ainda que na realização de obras, colocaram entulho no referido caminho e desviaram tubos de água para o prédio dos Autores.
Foram citados os Réus, para contestar a presente acção, nos termos legais, o que fizeram, concluindo pela improcedência da acção e deduziram reconvenção, peticionando:

“i. Declarar-se que, na eventualidade de ser provado que o muro foi construído pelos Réus em prédio dos Autores e que alguma parcela do prédio dos Autores se encontra integrado por efeitos da construção dos muros, no prédio dos Réus, seja declarada a sua integração por acessão industrial no prédio dos Réus, cabendo aos Autores o direito a quantia correspondente ao valor do terreno incorporado, a fixar por arbitramento;
ii. E, na hipótese de se entender que o logradouro do prédio dos Réus se encontra onerado por servidão a favor dos Autores, que tal servidão seja declarada extinta não só por nunca ter sido usada, mas também por desnecessidade.
iii. E, na eventualidade de o Tribunal entender, o que se não consente, que os Réus incorporaram no seu prédio alguma porção do prédio dos Autores, para logradouro, que essa porção de terreno seja declarada integrada no prédio dos Réus por usucapião, ficando o prédio dos Réus com a área e configuração constantes da planta anexa que constitui o Documento 10, junto a esta peça processual.”

Alegam, para tanto, em síntese, que o referido trato de terreno é logradouro do prédio dos Réus por ter sido a estes vendida e por usucapião, sendo que a servidão de passagem existente era pedonal e passava por fora do muro agora construído. Este muro, cuja construção implicou o custo de 16.200 €, para ser demolido, exigiria o dispêndio de 12.500 €, muito mais que o valor do terreno, pelo que haveria lugar apenas à indemnização e não demolição, atendendo à diferença entre prejuízos provocados (que obsta à prestação do facto – artigo 829.º, n.º 2 do Código Civil) e eventual abuso de direito dos Autores.

Acrescentam que a construção do muro foi efectuada de boa fé, e era necessária à segurança do acesso ao prédio dos Réus, sendo o valor trazido ao prédio muito superior, assistindo-lhes o direito de incorporação no seu terreno, sendo que agora a utilização da servidão se tornou desnecessária por quem a utilizava, José, não sendo utilizada também pelos Autores, devendo ser declarada extinta por desnecessidade.
Foram estes factos impugnados na réplica, em que se concluiu pela improcedência dos pedidos reconvencionais.
Foi proferido despacho saneador e designado dia para a Audiência de Discussão e Julgamento, que se realizou segundo o formalismo legal.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença em que, respondendo à matéria de facto controvertida, se decidiu nos seguintes termos:

Face ao exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e a reconvenção improcedente, e, em consequência, condeno os Réus a reconhecerem que os Autores são donos e legítimos possuidores do prédio urbano destinado a habitação, composto de rés-do-chão e 1.º andar, sito no Lugar …, da freguesia de ..., do concelho de Guimarães, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial, Comercial e Automóveis sob o n.º 238/..., e que deste faz parte todo o terreno que constitui o caminho de servidão identificado em 7) dos factos provados, bem como a área de terreno ocupada pelo muro construído pelos RR, a sul do seu prédio, em toda a sua extensão, e consequentemente condeno os Réus à sua restituição aos Autores, desobstruindo o caminho de servidão, e a reporem o acesso dos AA, através daquele, à restante área do seu prédio, no estado em que sempre se encontrou.
Condeno os Réus a destruírem e removerem, a expensas suas, completa e definitivamente, o muro de 4,97 metros de comprimento construído, na extrema nascente do prédio dos AA, bem como pilares e partes que ultrapassem o leito do caminho, e em toda a sua extensão.
Condeno os Réus a removerem, a expensas suas, todos os tubos de condução de águas, o entulho e aterros efectuados pelos RR, no prédio dos Autores e a absterem-se de praticar quaisquer actos susceptíveis de ofenderem o direito dos Autores.
Condeno os Réus a indemnizarem os Autores pelos danos não patrimoniais sofridos na quantia de 700 € (setecentos euros), acrescida dos juros legais, contados da citação e até efectivo e integral pagamento”.
Inconformados com esta decisão, dela interpuseram recurso os Réus, sendo que, das respectivas alegações desses recursos extraiu, em suma, as seguintes conclusões:

1. A área de 725m2 ao prédio dos RR. foi fixada por medição “a olho” e não por levantamento topográfico;
2. Na data da escritura de compra e venda, Maio de 1984, já se encontrava construída a casa de habitação dos RR. dotada de garagem para dois carros;
3. E encontra-se murado pelo norte, nascente e poente e não pelo sul; pelo lado sul estendia-se por mais cerca de mais 3 ou 4 metros para além do lado sul da casa dos RR., abarcando, por isso, o leito do “caminho de servidão”;
4. Deste modo, o muro construído pelos RR. no sentido nascente-poente encontra-se em terreno próprio destes e não em terreno dos AA..
5. O trato de terreno e frente à casa dos RR. desde o largo da ... até sul, ao campo dos AA., sempre constituiu o único acesso desde a pé até à porta de entrada da casa de habitação dos RR., mas também de acesso com viatura automóvel, que desde 1998 ou antes sempre utilizaram e utilizam; Por esse trato de terreno, na data da compra do prédio pelos RR. só passavam pessoas a pé; e só depois de o anterior proprietário da casa de José (chapeiro) ter incorporado no seu prédio o caminho publico que a servia, é que passaram viaturas automóveis pelo prédio rústico dos AA., passando em frente ao prédio dos RR.;
6. Com a reabertura desse caminho público em Outubro e Dezembro de 2014, largo e bem alcatroado, bem como a repavimentação da rua da ..., nunca mais passou por este trato de terreno em frente à casa dos RR. qualquer viatura, nem pessoas a pé, por desnecessidade total, tanto para o actual proprietário José (cujo prédio desencravou), mas também para qualquer outra pessoa;
7. Os RR. sempre utilizaram este trato de terreno no seu interesse, de dia e de noite, sem pedir autorização a ninguém e no convencimento de exercerem um direito próprio, ininterruptamente, desde Maio de 1985, pelo que adquiriram a sua propriedade por terem decorrido mais de 20 anos;
8. Por sua vez, os AA. compraram o prédio deles em Novembro de 1989, quatro anos e meio depois, tendo perfeito conhecimento de que os RR. Utilizavam esse trato de terreno para, desde o largo da ..., entrarem e saírem de casa, a pé e na própria viatura, a qualquer hora do dia e de noite, sem lhes pedir autorização, como coisa sua, e a isso nunca se opuseram;
9. Deste modo, ainda que os AA. reclamem a posse desse trato de terreno, isso não prejudica a posse dos RR., por ser mais antiga, pelo que esta deve prevalecer sobre aquela.
10. Por isso, os RR. adquiriram a propriedade desse trato de terreno por usucapião, que é uma forma licita de aquisição originária da propriedade;
11. Assim, foi e é lícito aos RR. vedarem a sua propriedade com muro, e construírem um muro que, além de demarcação, também faz a função se de suporte das terras do talude, prevenindo o perigo de queda de viaturas no fundo do talude para o lado sul, terreno dos AA., (como ia acontecendo com a viatura do padeiro);
12. A construção do muro teve o acordo dos AA. que apenas se recusaram a comparticipar nos respectivos custos e a discordância centra-se no facto de a altura do muro não ter ficado nos 30 cm acima do solo e subir até à altura de um parapeito, parapeito este que, de resto, desempenha funções de segurança para evitar queda ao terreno de baixo, propriedade dos AA., mais fundo em mais de 2 metros.
13. Deste modo, o pedido de demolição do muro constitui abuso de direito.
14. A condenação na prestação do facto negativo (demolição) tem um custo muito superior à vantagem que os AA. obteriam com essa demolição, pelo que cessa o direito dos AA. à demolição, ainda que a construção do muro tivesse ocorrido, e não ocorreu, em terreno destes, havendo apenas lugar a indemnização.
15. Além disto, os RR. construíram o muro no convencimento de que o faziam em terreno seu, pelo que, não sendo possível a restituição sem destruição total do muro, haveria, se o terreno pertencesse aos AA., apenas lugar a indemnização.
16. Assim, a sentença em questão ao decidir em contrário fez errado julgamento dos factos, o que conduz à nulidade da sentença, devendo, por isso, ser substituída por outra que reconheça aos RR. o direito de propriedade do terreno que constitui o “caminho de servidão” desde o muro junto à casa dos RR. até ao muro novo que construíram, em toda a sua extensão nascente/poente, reconhecendo ainda que este muro foi construído com autorização dos AA. dado o perigo que esse caminho revestia para quem lá passava de carro, pelo que constitui abuso de direito o pedido de demolição, reconhecendo-se ainda aos RR. o direito a murarem o seu prédio.
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Os Apelados apresentaram contra alegações concluindo pela improcedência da apelação interposta.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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II- Do objecto do recurso.

Sabendo-se que o objecto do recurso é definido pelas conclusões no mesmo formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso, a questão decidenda é, no caso, a seguinte:

- Apreciar a decisão da matéria de facto, apurando se ela deve ou não ser alterada e, como consequência, se deve ou não ser mantida a decisão recorrida.

- Analisar se, na hipótese de procedência da impugnação da matéria de facto, a demolição do muro configura uma situação de abuso de direito.

- Analisar se a eventual demolição do muro se afigura excessivamente onerosa e se se verificam os pressupostos da acessão imobiliária industrial.
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III- FUNDAMENTAÇÃO.

Fundamentação de facto.
Factos provados.

1. O terreno onde se encontra hoje construída a casa dos Autores e a dos Réus e respectivos logradouros era pertença do irmão do Réu, A. M..
2. Por escritura outorgada 15 de Maio de 1984, o referido A. M. vendeu aos Réus “o prédio urbano de rés-do-chão e andar, destinado a habitação, com área coberta de 108 m2 e terreno de quintal com a área de 617m2, situado no Lugar da ..., freguesia de ..., a confrontar do norte com caminho público, do sul com caminho de servidão, do nascente com João e do poente com S. G.”.
3. Encontra-se registado a favor dos Réus (Ap. 18 de 1985/11/12), o prédio de rés-do-chão e andar, destinado a habitação, composto por uma área coberta de 110 m2, e descoberta com 615 m2, a confrontar a Norte com caminho público, a Sul com caminho de servidão, a Nascente com João e a Poente com S. G., sito no referido Lugar da ..., da referida freguesia de ..., inscrito na matriz respectiva sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial, Comercial e Automóveis sob o n.º 34/....
4. Por escritura outorgada a 08 de Novembro de 1988, o referido A. M. vendeu aos Autores, “prédio rústico constituído por um terreno de mato situado no Lugar ... (…), freguesia de ..., com a área de 6.000 m2, a confrontar do norte com J. F., sul com caminho público, nascente com D. G., caminho público e A. O. e do Poente com J. P.”. 5. Encontra-se registado a favor dos Autores (Ap. 19 de 1992/01/20), o prédio urbano destinado a habitação, composto de rés-do-chão e 1.º andar, com uma área coberta de 154 m2, dependência com 30 m2 e logradouro com 5.816 m2, confrontando a Norte com J. F., a Sul e Nascente com caminho público e a Poente com Jorge, sito no Lugar da .., da freguesia de ..., do concelho de Guimarães, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial, Comercial e Automóveis sob o n.º 238/....
6. Os prédios de Autores e Réus são confinantes, entre si, localizando-se o prédio dos Autores, a poente e a sul do prédio dos Réus.
7. Antes das referidas vendas, pelo menos desde 1980, já existia no local onde ainda hoje se encontra, um caminho de passagem para peões e veículos ligeiros, nomeadamente agrícolas, com cerca de 2,00 a 2,10 metros de largura, que atravessava o prédio de A. M., no sentido nascente-poente, desde a actual rua da ... (parte inicial) em direcção e a favor do prédio actualmente de propriedade de José, localizado a poente, e de um outro prédio localizado ainda mais a poente deste.
8. Nele sempre existiram sinais de passagem, circulando livremente por aí pessoas que quisessem aceder aos diferentes prédios.
9. O referido caminho foi sendo ainda utilizado, na sua parte inicial, a nascente, pelos Réus, para acesso – a pé e de carro - ao seu prédio urbano, neste fazendo entrada pelo seu lado sul.
10. Os Réus, quando construíram a sua habitação antes da outorga da escritura em 1984, separaram-na deste caminho em toda a confrontação sul, cerca de 2,50 metros afastado da habitação no sentido do alçado sul, delimitando-a com dois muros: o primeiro deles, mais a nascente, de vedação, em blocos e encimado por gradeamento, com uma entrada para peões; o segundo deles, mais à frente, divisório e de suporte, também em blocos, ambos intervalados por um espaço aberto, de entrada para a garagem do prédio.
11. Os referidos muros foram sendo alterados e aumentados, sobretudo em altura, e revestidos a granito, por volta de 2011.
12. Os Réus solicitaram autorização aos Autores para fazerem um muro de suporte das terras do traçado sul do caminho referido em 7), a fim de lhes conferir maior consistência e segurança para entrada na garagem, o que os Autores acederam.
13. Os Réus, em Setembro de 2014, estando os Autores em França, onde são emigrantes, deram início a trabalhos de desaterro e escavações, com uma máquina, na parte inferior do referido valado, a todo o comprimento deste.
14. Os Réus, ao contrário do inicialmente combinado, construíram um muro de 31,66 metros de comprimento, e entre os 3,07 e 3,85 metros de altura, ultrapassando a altura daquele valado, e do caminho.
15. Ao mesmo tempo, os Réus procederam à demolição de grande parte dos muros que haviam construído na extrema sul, confrontantes com o caminho, mantendo apenas a sua parte inicial, mais a nascente.
16. A seguir, iniciaram a abertura de vala para construção de um novo muro em blocos, a todo o comprimento da extrema poente do seu prédio, incluindo, e atravessando, também o terreno correspondente a toda a largura do caminho, impedindo a sua utilização.
17. De tal forma que José, morador a poente do prédio dos Autores, denunciou aos serviços de Fiscalização da Câmara Municipal, logo em 06 de Outubro de 2014, as referidas obras, por lhe ter sido, através do muro construído, cortado o acesso, de carro e a pé, à sua habitação através do dito caminho; na sequência, veio a ser efectuado, em 30 de Outubro de 2014, o embargo administrativo de tais obras de construção.
18. Entretanto, a Junta de Freguesia de ..., numa tentativa de resolver o impasse, alargou e melhorou o caminho público, a sul, constituído pela Rua da ..., fazendo derivar o seu percurso, junto à entrada do prédio daquele José, em direcção a norte, facultando, assim, um novo acesso, de carro, ao prédio daquele José, bem como ao vizinho deste, a poente, deixando de ter necessidade de passar pelo referido caminho.
19. Os Réus prosseguiram com as obras, acrescentando ao muro construído, longitudinalmente à margem esquerda do caminho, no seu sentido nascente poente, um muro em betão, mais baixo, no seu extremo nascente, com cerca 4,97 metros de comprimento (a decrescer entre os 2,37 e 1,5 metros de altura) e dois pilares, para suporte de um portão, a instalar perpendicularmente sobre o leito do caminho de servidão, no início do seu curso, com o propósito de naquele local vedar a entrada e estreitando o acesso à garagem existente no prédio dos Autores.
20. Na extrema poente, inclusive sobre o leito do caminho, ficou construído um muro em blocos, com cerca de 4 metros de largura (contando com o pilar do lado direito) e cerca de 2,20m de altura.
21. Os Réus, enquanto realizavam estas obras, cortaram, pelo menos, cinco tubos que atravessavam, no subsolo, o seu prédio, para abastecimento de água consortes localizados a sul dos prédios dos Réus e Autores, e desviaram-nos para uma vala aberta, junto à extrema nascente do prédio dos Autores, e já no interior deste, fazendo-os passar para o prédio dos Autores.
22. A área do prédio dos Réus com o leito do caminho delimitado pelo novo muro, na zona em que é paralelo e contigua àquele (98 m2), perfaz a área total de 800 m2.
23. Os Autores recorreram a providência cautelar de restituição de posse, declarada procedente a 15 de Julho de 2015, determinando-se que os requeridos procedessem, no prazo de 20 dias, à demolição, a expensas próprias, do muro em blocos na extrema poente do prédio dos requeridos e à desobstrução da passagem por essa faixa de terreno; os requeridos demoliram o muro referido a 24 de Abril de 2016, depois de instaurada execução para prestação de facto.
24. A construção do muro, a sul, implicou o desaterro de alguns de metros cúbicos de terras, sua remoção e transporte, ocupando o total de 9,16 m2 de terreno, tendo importado um custo total de cerca de 6.600 € (seis mil e seiscentos euros).
25. Com o muro construído eliminou-se qualquer possibilidade de deslizamento de terras para a plataforma inferior, sendo útil para acesso de veículo à garagem dos Réus.
26. O terreno ocupado é um terreno agrícola e sem aptidão construtiva com valor não superior a 4,00€/m2.
27. Os Autores não costumavam utilizar regularmente o caminho, sendo o acesso, a pé e de carro, efectuado através da Rua da ..., encontrando-se o restante do terreno a norte do caminho delimitado por uma rede.
28. Sempre os Réus cuidaram e conservaram o troço de caminho à frente de sua casa, conservando o piso, por aí acedendo à garagem no rés-do-chão da habitação, onde guardam o automóvel.

Factos não provados

Com interesse para a boa decisão da causa não se provaram quaisquer outros factos acima não descritos ou com estes em contradição, com exclusão sobre considerações jurídicas, conclusões ou juízos de valor e factos não essenciais à decisão da causa, designadamente, não resultou provado que:

- Os Réus compraram o espaço de terreno aqui em causa ao seu irmão e cunhado, como fazendo parte do seu prédio, tendo acordado que o logradouro da casa que aquele iria construir ficaria com a largura de 7,50m de largura no sentido nascente-poente;
- Por efeito da construção da garagem no terreno dos Autores, a largura do logradouro do prédio dos Réus apenas ficou com cerca de 5,50m; que o acesso construído pela junta já teria existido, tendo sido fechado quando o então proprietário, Jorge, decidiu, abusivamente, construir um anexo em cima do leito desta via pública; nessa altura, o irmão dos Réus, de nome A. M., proprietário do terreno que agora pertence aos Autores, e os próprios Réus, permitiram por favor, que o Mário fizesse passagem de carro pela leira do A. M., passando também pelo logradouro do prédio dos Réus;
- A servidão de passagem existente é de conteúdo pedonal sobre o prédio dos Autores e fica a sul do prédio dos Réus, no sentido nascente-poente e que dá acesso ao caminho da ..., passando por fora do muro construído; os Réus fizeram o muro de boa-fé, convencidos de que construíam sobre terreno seu, sendo reconhecidos pela generalidade das pessoas como seus únicos donos;
- Os Réus pagaram 16.200,00€ pelo muro;
- Tal muro era necessário à segurança do logradouro do prédio dos Réus;
- O terreno dos Autores ficou com maior valor do que tinha antes.

Fundamentação de direito.

Apreciaremos desde já a impugnação da matéria de facto pretendida pelo Apelante, pois sem a fixação definitiva dos factos provados e não provados não é possível extrair as pertinentes consequências à luz do direito.
Nas contra alegações que apresentaram pronunciam-se os Recorridos no sentido da rejeição do recurso apresentado alegando como fundamento que os Recorrentes não cumpriram, desde logo e de forma mais evidente e clara, os deveres que lhe são impostos pelas alíneas a) a c), do nº 1, do artigo 640, do C.P.Civil.

Na verdade, em seu entender, os Recorrentes não especificaram com clareza qualquer ponto de facto, de entre os elencados na sentença recorrida, sob os itens 1. a 28. dos “Factos Provados” ou entre os factos ali julgados como “Factos Não Provados”, que consideram incorrectamente julgados.
Acresce que, mesmo que o tivessem feito – que não fizeram – não especificaram também a decisão que, no seu entender, deveria ser, então, proferida sobre as questões de facto impugnadas, o que, aliás, seria até absolutamente impossível, pois que se não especificaram os concretos pontos de facto que consideram incorrectamente julgados, também não poderiam especificar a decisão (inversa e em que termos) que cada um deles, no seu entender mereceria.

E mais alegam que, pese embora, ao longo das alegações de recurso, os Recorrentes tenham procedido à transcrição de alguns excertos de depoimentos testemunhais prestados em audiência de julgamento, assim indicando alguns meios probatórios, constantes da gravação realizada em audiência de julgamento (que no seu entender imporiam, porventura, decisão sobre a matéria de facto diversa da recorrida), também nunca especificaram quais os concretos, e específicos, pontos da matéria de facto que, por via de tais concretos meios probatórios, mereceriam, no seu entender, decisão diversa da recorrida.

Por último, alegam ainda que o incumprimento de qualquer um dos referidos ónus, por parte dos Recorrentes, é também claramente patente, para além das alegações, nas Conclusões de recurso, que delimitam o objecto e âmbito do recurso, na medida em que, também elas são totalmente omissas no que concerne a qualquer uma das especificações previstas e impostas pelas alíneas a), b) e c), do n.º 1, do art. 640º, do CPC.

Isto considerado, como resulta do disposto nos artigos 640 e 662º do C.P.C., o recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto deve não só identificar os pontos de facto que considera incorrectamente como também especificar concreta e individualizadamente o sentido da resposta diversa que, em seu entender, a prova produzida permite relativamente a cada um dos factos impugnados.

Ao recorrente que impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto exige-se, assim, que:

- Especifique os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mencionando o diverso sentido em que se impõe decidir quanto a cada um dos factos impugnados, por referência ao que foi julgado provado na decisão recorrida (ou seja, que indique o sentido ou sentidos das respostas a dar, em substituição das consideradas);
- Fundamente as razões da discordância, especificando os concretos meios probatórios em que funda a impugnação;
- Quando se baseie em depoimentos testemunhais, que efectue a localização, por referência ao assinalado em acta, da parte dos depoimentos que considera sustentarem a sua versão. (1)

Assim, e como resulta da análise do aludido preceito, e seguindo a lição de Abrantes Geraldes, quando o recurso verse a impugnação da decisão da matéria de facto deve o recorrente observar as seguintes regras:

a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; (negrito nosso)
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;(…)
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente; (2).

Estas exigências impostas ao recorrente que impugne a matéria de facto são decorrência dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa fé processuais, visando-se com elas assegurar a seriedade do próprio recurso.

Mas elas não são alheias também ao princípio do contraditório – elas destinam-se a possibilitar que a parte contrária possa identificar, de forma precisa, os fundamentos do recurso, podendo assim discretear sobre eles, rebatendo-os especificadamente.

A impugnação da matéria de facto não gera a realização dum novo julgamento integral em segunda instância, constituindo antes um meio de sindicar a decisão da primeira instância quanto à decisão da matéria de facto (3) – não envolve a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida, incidindo sobre pontos determinados da matéria, que ao recorrente compete identificar, aduzindo em complemento os concretos meios probatórios que, em seu entender, justificam uma diversa decisão.

A primeira exigência consiste na identificação precisa dos pontos da matéria de facto impugnados e na indicação do sentido ou sentidos das respostas a dar, em substituição das respostas dadas pela decisão recorrida.

Não bastará, para o cumprimento desta exigência, que o recorrente se limite a manifestar a sua discordância quanto ao decidido pelo tribunal recorrido quanto a determinado ponto, impondo-se ainda que se pronuncie expressamente sobre o sentido em que deverá ser julgado tal facto (provado ou não provado, o concreto sentido de resposta restritiva ou explicativa).

Na verdade, só dessa forma se conseguirá o recorrente especificar os concretos pontos de facto incorrectamente julgados.

Assim, em ordem ao cumprimento dos ónus estabelecidos no artigo 640, do C.P.C., deve o recorrente indicar, circunstanciadamente, os concretos pontos de prova relevantes em relação a cada um dos factos impugnados – tal indicação tem de ser feita individualmente para cada um dos pontos da matéria de facto impugnada (4).

Nos casos em que a impugnação se baseia em depoimentos prestados em audiência, exige-se que o recorrente mencione as concretas passagens do depoimento testemunhal em questão que considera relevantes para a análise, indicando o início e termo da gravação que contém essas concretas passagens dos depoimentos.

Deve, assim, o recorrente, sob cominação de rejeição do recurso, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, motivar o seu recurso através da indicação das passagens da gravação que reproduzam os meios de prova que, no seu entendimento, determinam decisão dissemelhante da que foi proferida sobre a matéria de facto.

O não cumprimento de tais ónus é cominado com a rejeição do recurso, sendo certo que esta apenas poderá abarcar o segmento relativo à impugnação da matéria de facto e, dentro deste segmento, apenas pode abranger os pontos relativamente aos quais tenham sido desrespeitadas as referidas regras (5).

Na verdade, com a reforma introduzida ao Código de Processo Civil pelos Decretos-Leis n.ºs 39/95, de 15/02 e 329-A/95, de 12/12, o tribunal de segunda instância passou a fazer um novo julgamento da matéria impugnada, assegurando um efectivo duplo grau de jurisdição, sendo isto que resulta do estatuído no art. 662º, n.º 1 do CPC, quando nele se expressa que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento supervenientes impuserem decisão diversa.

O duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto pressupõe novo julgamento quanto à matéria de facto impugnada e “somente será alcançado se a Relação, perante o exame e análise crítica das provas produzidas, a respeito dos pontos de facto impugnados, puder formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das prova, sem estar limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida, em função do princípio da imediação da prova, princípio este que tido por absoluto transformaria este duplo grau de jurisdição em matéria de facto, numa garantia praticamente inútil” (6).

Tendo o recurso por objecto a impugnação da matéria de facto, a Relação deve proceder a um novo julgamento, limitado à matéria de facto impugnada, procedendo à efectiva reapreciação da prova produzida, devendo nessa tarefa considerar os meios de prova indicados no recurso, assim como, ao abrigo do princípio do inquisitório, outros que entenda relevantes, apreciando livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto impugnado, excepto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidades especiais ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documento, acordo ou confissão (art. 607º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil).

Contudo, o legislador, ao impor ao recorrente o cumprimento das referidas regras, visou afastar soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição dos julgamentos, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências pelo recorrente. (7)

Não se consagra a possibilidade de repetição do julgamento e de reapreciação de todos os pontos de facto, mas, apenas e só, a reapreciação pelo tribunal superior e, consequente, formação da sua própria convicção (à luz das mesmas regras de direito probatório a que está sujeito o tribunal recorrido) quanto a concretos pontos de facto julgados provados e/ou não provados pelo tribunal recorrido.

A possibilidade de reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver a reapreciação global de toda a prova produzida, impondo-se, por isso, ao impugnante, no respeito dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa-fé processuais, a observância das citadas regras.

O Tribunal da Relação, sendo de 2ª instância, continua a ter competência residual em sede de reponderação ou reapreciação da matéria de facto (8), estando subtraída ao seu campo de cognição a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo que não seja alvo de impugnação.

Em suma, deve, assim, o recorrente, sob cominação de rejeição do recurso, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, deixar expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, sendo que, como refere Abrantes Geraldes, esta última exigência (plasmada na transcrita alínea c) do nº 1 do art. 640º) vem reforçar o ónus de alegação imposto ao recorrente (…) por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, devendo ser apreciada à luz de um critério de rigor enquanto decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo (9).

É entendimento doutrinal e jurisprudencial uniforme que, nas conclusões das alegações, que têm como finalidade delimitar o objecto do recurso (cfr. nº4, do art. 635º, do CPC) e fixar as questões a conhecer pelo tribunal ad quem, o recorrente tem de delimitar o objecto da impugnação de forma rigorosa, indicando os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados, sob pena de rejeição do recurso, como a lei adjectiva comina no nº1, do art. 640º.

Não obstante o NCPC proceder, como vimos, ao alargamento e reforço dos poderes da Relação no domínio da reapreciação da matéria de facto, deve ser rejeitado o recurso, no atinente a tal ponto, quando o recorrente não cumpra os ónus impostos pelos nº1 e 2, a), do art. 640º (10). E impõe-se a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto quando ocorra:

a) Falta de conclusões sobre a impugnação da matéria de facto (art. 635º, n.º 4 e 641º, n.º 2, al. b);
b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados (art. 640º, n.º 1, al. a);
c) Falta de especificação (que pode constar apenas na motivação), dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exacta, (que pode constar apenas na motivação), das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa, (que pode constar apenas na motivação), sobre o resultado pretendido a cada segmento da impugnação” (11).

O S.T.J. tem vindo a distinguir, quanto aos ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, entre:

- Ónus primário ou fundamental, que se reportam ao mérito da pretensão;
- Ónus secundários, que respeitam a requisitos formais.

Relativamente aos requisitos primários, onde inclui a obrigação do recorrente de formular conclusões e nestas especificar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e a falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados e falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação, requisitos estes sobre que versa o n.º 1 do art. 640º, do CPC, a jurisprudência tem considerado que aquele critério é de aplicar de forma rigorosa, pelo que sempre que se verifique o incumprimento de algum desses ónus por parte do recorrente se impõe rejeitar o recurso. (12)

Assim, e como se refere no Ac. do STJ de 3/5/2016:

I- “O apelante pretendendo que o Tribunal da Relação reaprecie o julgamento da matéria de facto, para dar cabal cumprimento ao preceituado na al. c) do nº1, do art. 640º, do NCPC (2013), deve ser claro e inequívoco, afirmando que os pontos da matéria de facto impugnados deveriam ter as respostas que segundo a sua apreciação deveriam ter tido, indicando-as, de harmonia com as provas que indicou.
II. Tal ónus não se satisfaz expressando o recorrente meras apreciações discordantes do julgamento e juízos de valor críticos, referidos aos depoimentos das testemunhas indicadas,
III. A mera indicação de que certos pontos da matéria de facto, que são indicados, não deveriam ter tido as respostas que tiveram, sem se dizer quais as respostas que numa correcta apreciação deviam merecer, não cumpre aquele ónus”. (13)

E assim sendo, a delimitação tem de ser concreta e específica e o recorrente têm de indicar, com clareza e precisão, os meios de prova em fundamenta a sua impugnação, bem como as concretas razões de censura.
Tal tem de ser especificado quanto a cada concreto facto, não podendo ser efectuado em termos latos, genéricos e em bloco por referência a “factos provados” ou “factos não provados”.

Ora, analisadas as alegações do Apelante constata-se que elas não observaram todos os pressupostos estabelecidos pelo artigo 640, do C.P.C., para a impugnação da decisão da matéria de facto, pois que, que nas alegações, quer nas conclusões, não fazem referência aos concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados indicando, justificadamente, os elementos probatórios que conduziriam à alteração de cada concreto ponto e a decisão que devia ter sido proferida quanto a cada concreto facto, procedendo a uma análise critica das provas e indicando a decisão que devia ser proferida sobre as concretas questões de facto impugnadas.

Na verdade, se das conclusões supra transcritas isso assim resulta evidente, o mesmo sucede com as alegações que relativamente à impugnação da matéria de facto têm o seguinte teor:
(…)
CONCRETOS PONTOS DE FACTO QUE OS RR. COSIDERAM INCORRECTAMENTE JULGADOS

Quanto ao “… terreno que constitui o caminho de servidão identificado em 7) dos factos provados…” e que AA. e RR. reclamam como sendo sua propriedade, mas que o Tribunal decidiu pertencer aos Autores, e, em consequência, julgou improcedente o pedido reconvencional de propriedade a favor dos reconvintes e, subsidiariamente, de usucapião a favor destes, caminho este que fica a sul do prédio dos AA. e da casa de habitação dos RR., único acesso à garagem e à casa destes.

B - CONCRETOS PONTOS PROBATORIOS QUE IMPUNHAM DECISÃO DIVERSA

B.1 - QUANTO À PROPRIEDADE
POR DOCUMENTOS
No dia 15 de Maio de 1984, os RR. compraram a A. M., irmão do Réu marido, um prédio urbano de rés-do-chão e andar, destinado a habitação, com a área coberta de 108m2 e terreno de quintal com a área de 617m2, (total 725m2) sito no Lugar da ..., da freguesia de ..., Guimarães, fazendo parte do prédio descrito na CRP sob o n.º …, omisso na mat6riz, mas participado para inscrição. V. Doc. 5 junto com a petição inicial.
Na escritura os outorgantes fizeram consignar as seguintes confrontações: Norte com caminho público; sul com caminho de servidão; nascente com João e Poente com S. G..
Mais, tarde, no dia 8 de Novembro de 1988, os AA., através do procurador C. R., compraram ao mesmo A. M., o prédio rústico sito no Lugar ..., da freguesia de ..., com a área de 6.000m2, fazendo parte do descrito na CRP sob o n.º 71 de ..., inscrito na matriz sob o artº ….
Na escritura, os outorgantes fizeram consignar as seguintes confrontações: Norte com J. F.; sul com caminho público; nascente com D. G. S. G., caminho público e A. O.; e Poente com J. P.. V. Doc. 5 junto com a petição inicial.
Em consequência destas vendas, o prédio rústico dos AA. (onde posteriormente construíram uma habitação) e o prédio urbano dos RR. confrontam um com o outro pelo sul e poente, sendo que o pomo da discórdia se limita ao terreno do “caminho de servidão” a sul do prédio de ambos, que é uma língua de terreno no sentido nascente-poente, desde o caminho público agora denominado Rua da ... que constitui o limite nascente (na escritura de compra e venda identificado por “João ”).
E encontra-se representado no “esquema 4” dos “Anexos” ao Relatório de Perícia, com a área de 75m2.
E o prédio dos RR. com 725m2 também se encontra representado nesse mesmo “esquema 4”. (Refere-se, por ser verdade, que, de acordo com os textos legais juntos pelos AA. aos autos, o prédio deles tem a área de 6.000m2). Posto isto,
Os RR. aceitam, por ser verdade, que por essa língua de terreno denominado “caminho de servidão” havia passagem para o prédio que agora é de José (chapeiro) e, antes deste, pertença da testemunha A. C., e para outros mais a noroeste, sendo que estes há já mais de 20 anos que por deixaram de passar por terem mudado de terra.
E também é certo e ninguém pôs em causa os limites do prédio dos RR. a nascente, norte e poente. Assim, a questão cinge-se ao limite sul do prédio dos RR..
Antes de mais e porque os textos referem que o prédio dos RR. tem a área de 725m2, estes requereram a realização de prova pericial para prova dos artigos 40º a 55ºda Contestação, tendo sido formulado os seguintes quesitos:


De acordo com o registo predial, o lote de terreno do prédio dos Réus onde construíram a sua casa tem a área de 725m2 – V. Doc. 3 junto com a contestação), pelo que
10º
Os Senhores Peritos que marquem no terreno os seus limites a Sul, no sentido Nascente-Poente, elaborando o respectivo “croquis”.
11º
No caso de a área do prédio dos Réus não abrangem toda a área do logradouro até ao muro recente construído em 2014, os Senhores Peritos que assinalem esse muro e o terreno que eventualmente exceda a área de 725m2, indicando a área e demarcando-a no “croquis” acima referido.
Na resposta, disseram os Senhores Peritos, por unanimidade:
“Face aos levantamentos topográficos efectuados por técnicos credenciados para o efeito e que constam do processo, e para a área registada a favor dos RR., a delimitação do terreno, a sul, admitindo como principio que a linha limite será paralela ao prédio edificado sobre o terreno, serão os que se apresentam no esquema 3 e 4”.

Ora, analisando o esquema 4 juntos em anexo ao Relatório Pericial elaborado a partir do levantamento efectuado pelos AA. neles se encontra exarado com clareza que a área do terreno que constitui o leito do caminho de servidão é de 75m2. o que coincide com a medição efectuado através do levantamento efectuado pelos Réus.

Parcela esta de terreno que o RR. entendem pertencer-lhes não só pelo facto de assim o terem negociado aquando da compra que o R. marido fez a seu irmão A. M. em 15 de Maio de 1984, mas também, ainda que assim não fosse, já o terem adquirido por usucapião.

Com efeito,
Conforme resulta dos textos documentais juntos e acima referidos, o prédio dos RR. confronta a sul com “caminho de servidão”. No entendimento dos RR. esta confrontação não significa que esse terreno não lhes pertence, mas apenas uma referência genérica de localização a sul, tal como a confrontação a nascente vem referida como sendo a casa de João , sendo certo que esta casa fica do lado de lá do Largo da ... e não encostada ao terreno dos RR..

Por isso, seria essencial à interpretação do âmbito do contrato de compra e venda que o vendedor depusesse, esclarecendo o negócio.

E, assim, foi inquirida em audiência de julgamento, a testemunha A. M., irmão do R. marido, que prestou depoimento sob juramento advertido pela Mma Juiz de que tinha o dever de dizer a verdade sob pena de prática de acto criminalmente punível, dever este que a testemunha sempre reconheceu e afirmou.

POR TESTEMUNHAS

A. M.
Este depoimento, tem o código de gravação 20170202155154, com o tempo de gravação de 00.00.01 até 01.25.37.
Instado pela Mma Juiz sobre o modo como foi efectuado o negócio do prédio do R. marido, a testemunha respondeu “Juíza – E então como é que foi?” (00.07.45), ao que respondeu A. M. – “Calculamos aquilo na ocasião, e depois foi os 700 metros, setecentos e tal metros. Não fizemos o levantamento” (00.007.45). Juíza “Pronto, mas e então o caminho ficou dentro ou fora?”; A. M. “O caminho ficou fora, mas ficou dentro do terreno de meu irmão” (00.07.58). Juíza “Não percebi”. A. M. – “O carreiro ficou dentro do terreno de meu irmão”(00.08.06). Juíza “Porque?” A. M. “Porque o meu irmão, na ocasião, não o vedou e o pessoal continuou a passar sempre lá” (00.08.11). Juíza “Então vendeu a seu irmão um bocado de terreno que servia de caminho?” A. M. “Não servia de caminho. Era carreiro da ...” (00.08.27” . Juíza “Pronto, mas servia. Era a mesma coisa. Passava lá gente (00.08.31). A. M. “Passava lá gente, mas não passavam carros, porque o terreno era do meu monte, desse monte todo…”

Prosseguindo a instância, a Mma Juiz perguntou “Pronto, então o senhor está-me a dizer que aquele bocado de caminho vendeu ao seu irmão?” (00.09.40). A. M. “Vendi” (00.09.44). Juíza “… mas não tinha este caminho para as pessoas irem para casa?” (00.12.19); A. M. - “A pé” (00.12.24) Juíza “A pé não, de carro, toda a gente passava lá de Sr. A. M.” (00.12.26); A. M. “A pé” (00.12.29; Juíza “Passavam de carro” (00.12.29); A. M. “Não passavam nada” (00.12.30) “Antes não havia carros nenhuns lá em cima” (00.12.38); “Mas não havia ninguém que passasse lá com carros, Sra Dra. Na ocasião não havia ninguém que passasse lá com carros” (00.12.45). Juíza “Iam a pé?” A. M. – “A pé”. A. M. - “O meu irmão, na ocasião, não tinha dinheiro para fechar isso e deixou ficar assim aberto” (00.16.20) “era o caminho que o meu irmão tinha para casa” (00.15.56).
Efectivamente, o R. António só passou a ter carro em 1995/1996 o que é corroborado pelo depoimento do irmão da A. mulher que refere que os RR. tinham viatura automóvel desde 98/99 ou até antes – V. depoimento de C. R., cunhado do A. marido, gravação 20161212104320, ao minuto 00.46.51 a 00.47.05.
A testemunha, referindo-se à extensão do parcela vendida ao irmão e referindo-se ao modo simplista como demarcaram a, disse que “A coisa foi para 3 a 4 metros para baixo do esteio, o ponto de referência que pusemos para medir, 3, 4, metros para baixo do esteio é que era…” (00.39.26). Mandatário dos RR.: “Ocupava o caminho todo?”. A. M. – “Claro.” (00.39.39).
Este trato de terreno constituía e constitui a única entrada para casa e para a garagem do prédio dos RR., como se conclui pela instância da senhora Juiz. Juíza “Então ele precisava de ter um acesso, não é, para legalizar a casa e tudo?” (00.42.52) “Não tinha que ter?” (00.42.57); A. M. “… tinha que ter”. Juíza “tinha que ter aí uma rua, um caminho?” ; A. M. “Ele vinha ligar à Rua da ...”. Juíza “Pronto”. (00.42.52 até 00.43.10).

APRECIAÇÂO CRÍTICA

Deste interessante depoimento resulta claro que a testemunha A. M. vendeu ao irmão António e mulher um prédio que, a sul, ocupava o terreno que constituía o leito do trilho de passagem de pessoas desde o largo da ... de nascente para poente.

Mais ficou claro que na data da escritura a favor dos RR., (Maio de 1985) o “caminho de servidão” era apenas passagem a pé e não de carro e só passou a ser também passagem de carro após “… a faixa de via publica vedada e anexada à moradia do Sr. José (testemunha chapeiro) com reposição do piso repondo-se assim a via pública”- V. Doc. 9 junto com a contestação, a partir da linha 13.

Estes documentos e este depoimento de A. M., que deu uma interpretação autêntica ao negócio, indicam com clareza e segurança que o A. M. vendeu ao irmão um prédio que, a sul, incluía o trato de terreno por onde passavam pessoas, a pé, de nascente para poente.

Mais indica que por esse terreno os RR. tinham o único acesso quer à habitação quer à garagem, porque, sem esse acesso, também não seria emitida licença de ocupação.

E se o prédio se encontrava dotada de garagem, tal como resulta do projecto entregue na Câmara Municipal, é evidente que o proprietário tinha, desde sempre, o direito de entrar e sair livremente utilizando esse trato de terreno em frente à garagem, para acesso livre e continuado, na convicção de que tal terreno lhes pertencia.
Na verdade, os RR. sempre utilizaram esse acesso, desde sempre, a qualquer hora do dia a qualquer hora da noite, sem oposição de ninguém, utilizando toda a largueza para entrar na garagem e para dar a volta (A. M. - 00.44.48 a 00.45.37) e nunca qualquer testemunha dos AA., nem estes, algum depoimento ou alegação foi produzido em audiência de julgamento no sentido de os RR. tenham pedido autorização aos AA. para entrarem e saírem de casa e da garagem, livremente.

CONCLUSÂO

Pelo que a conclusão lógica seria a de julgar os RR. donos desse terreno; e assim não tendo acontecido, verifica-se erro de julgamento da matéria de facto que conduz à nulidade da sentença.

Isto mesmo resulta do depoimento das testemunhas arroladas pelos Autores.
E assim:

JOSÉ
Código de gravação -20170202102275
Tempo de gravação - do minuto 00.00.22 até 01.17.45.

Esta testemunha, arrolada pelos Autores, disse que os RR. ocupavam todo o “caminho” entravam a qualquer hora e a qualquer dia (00.37.00 a 00.37.13); entrava à vontade (00.37.15); sem pedir autorização a ninguém (00.37.19) e sem pedir autorização a ninguém (00.37.19); como se fosse coisa dele.

Esta testemunha, a instância do Ilustre mandatário dos AA., ao minuto 00.39.56, sobre se, alguma vez, pediu autorização ao Autor marido para passar através do prédio rústico deste para aceder à via pública, a nascente, respondeu, com ar surpreendido com a pergunta “Se eu lhe pedi autorização (ao A.)? Eu nunca lhe pedi autorização. Ele é que uma vez chegou à minha beira e disse-me que me deixava passar lá todas as vezes que eu quisesse”.

Ora, este depoimento nada esclarece relativamente à propriedade do trato de terreno sito à frente da casa der habitação dos RR. Pelo contrário, o que se refere é ao facto de a casa de habitação do depoente só ter acesso à via publica através do prédio dos Autores em cerca de 200m de extensão, passando, depois, em frente à casa dos RR., em cerca de 30 metros. Deste modo, a “autorização” dada ao depoente José só se refere, como é evidente, apenas ao prédio rústico do Autor.

Efectivamente, como resulta do depoimento desta testemunha ao minuto 00.20.06 em diante, a Junta de Freguesia reabriu um caminho publico que dava acesso ao prédio desta testemunha, (00.20.55, 00.21.55) que havia sido fechado pelo anterior proprietário Jorge 00.30.41 até 00.31.10 e Doc. 9 junto com a contestação) deixando de ter necessidade de passar pelo prédio dos Autores e pelo terreno em frente à casa dos RR., até porque, depois da reabertura desse caminho público, “…é evidente que não transitava ali ninguém (00.24.38), “atravessavam por ali por ser mais perto” 00.25.35). “mas é uma questão de comodidade” (00.28.48);

Esta mesma testemunha, (revelando até má vontade em relação aos RR.) e no que se refere à utilização do caminho, disse que os RR. têm “uma garagenzita” no prédio deles (00.35.03), mas, depois, admitiu que se trata de uma garagem para dois carros … (00.35.26), (o que já não é, propriamente, uma garagenzita) disse que os RR. entravam e saiam a qualquer hora e em qualquer dia, várias horas por dia, à vontade e sem pedir autorização a ninguém, como se fosse coisa dele (00.37.07 a 00.37.23).

Quanto à conservação do leito desse “caminho” a testemunha disse que “…eu muitas vezes pegava na máquina e limpava o caminho para passar (00.37.59) tendo esclarecido a instância do mandatário dos RR. que limpava “tudo até à casa dos RR. (00.38.07). Na verdade, para poente da casa dos RR. o prédio dos AA é um terreno rústico inculto onde nascem e crescem ervas e arbustos).
E questionado se viu alguma vez os RR. a cuidarem do caminho, disse que viu algumas vezes o C. R. (cunhado do Autor marido) “a limpar” (00.38.16) mas que era a “esquininha” de acesso à garagem que este C. R. construiu a sul do prédio dos RR. (00.38.20 a 00.38.40) na parte de baixo do talude (00.38.51 a 00.38.51), isto é, não limpava o caminho em questão, que era limpo e cuidado pelos RR.. Além disto, os RR. construíram o muro de suporte do terreno “porque aquilo estava muito perigoso. O padeiro foi lá e esteve para cair abaixo à horta por causa disso”. (00.43.43 e 01.04.02).

De resto, com a reabertura do caminho público pela Junta de Freguesia, deixou de ser necessário utilizar a passagem para o Largo da ... através do prédio dos AA. e alguém que o faça é só por comodidade e não por necessidade (01.05.36 a 01.05.49).

O. A.
Código de gravação – 20170202114517
Tempo de gravação – do minuto 00.00.35 a 00.41.20

É casada com a testemunha anterior.
Perguntada se os RR. sempre utilizaram esse “caminho” para entra e sair de casa a pé o de carro, respondeu “eu acho que sim, não sei, não sei…” (00.32.47 a 00.32.53). No entanto, esta testemunha disse que mora na mesma casa há 29 anos e que os RR. já moravam na actual casa, e, mesmo assim, só a custo é que respondeu que os RR. entravam e saiam de casa e da garagem pelo terreno em discussão (00.33.14 até esse terreno do “caminho” era muito declivoso e perigoso… (00.33.25 e 00.34.23).

A. G.
Código da Gravação – 20170202140511
Tempo de gravação – do minuto 00.00.14 a 00.38.13

É casado com uma irmã do Autor.

Fez um depoimento contraditório, dando factos como certos que, depois, dizia “eu acho…” e, por isso, sem convicção nem interesse probatório.

F. F.
Código de Gravação – 20170202144243
Tempo de gravação – 00.00.21 a 00.25.12

Disse ser prima dos Autores.
Perguntada sobre quem era o dono do “caminho” em questão, respondeu “eu acho que esse caminho era público. Era onde eles iam à agua para cozinhar, era onde eles iam lavar. Tinha que ser público”. (00.15.09).
E instada sobre era propriedade do Sr. Luís ou do Sr. António, disse ”Não sei. Não posso dizer”. (00.15.21).

De resto, trata-se de um depoimento muito pobre, pois que diz desconhecer a existência da garagem dos RR. (que lá está há 32 anos, desde Maio/1985) bem como a garagem construída há vários anos atrás pelo C. R., cunhado do A. marido, aqui também testemunha.

Com efeito, perguntada sobre se existia algum caminho entre a garagem construída pela testemunha C. R. e o talude onde está a casa do RR., respondeu “Não fui ver a garagem nem sei onde é que a garagem existe” (00.20.00). E, a seguir, confirmou “O mais de resto, a garagem, não lhe posso dizer”. (00.20.14). Esta resposta mereceu intervenção da Mma Juiz que perguntou: “Viu agora. A senhora disse que passou” (00.20.19), ao que respondeu “Eu já lhe disse que não estava aqui. Eu não estava aqui”(00.20.21); “eu já não passo lá há muitos anos, desde que minha sogra morreu”. (00.20.24).

J. F.
Código de Gravação – 20170202150802
Tempo de gravação – 00.00.43 a 00.13.01

Trata-se de um depoimento sem valor, por incapacidade mental, como resulta deste diálogo:
Mma Juiz “Sua idade?” respondeu “77 anos”; “Juíza: 77?”; J. F. – “70”.(00.01.07) E, perguntada “… lá onde começa o caminho, não há uma casa do lado direito? (que seria a casa dos RR.)” (00.12.24) respondeu “sim senhor … ou do lado esquerdo ou do lado direito, mais ou menos” (00.12.31). No entanto, a testemunha já tinha avisado que “desde que me deu aquela trombose” (00.08.00), “tanto se me lembra como esquece” (00.11.47).

MANUEL
Código de Gravação - 20170202152110
Tempo de Gravação – de 00.00.36 a 00.22.25

É irmão do Autor marido e o depoimento dele revela-se vago e impreciso, tal como resulta do seguinte: “… então o senhor tem para si que aquele terreno é do seu irmão que é o que se consta por lá, é isso?” (00.20.57), ao que respondeu “É. Agora não vou provar (00.21.09) não fui eu que fiz a escritura” (00.21.08).
Quer dizer, esta testemunha, irmão do Autor marido, desconhece o negócio entre seu irmão e os AA. e não sabe a quem pertence o terreno que constitui o “caminho” de passagem em frente à casa dos RR..

I. S.
Testemunha arrolada pelos RR.
Código de Gravação – 20170524095738
Tempo de Gravação – 00.00.01 até 00.25.33)

É a Presidente da Junta de Freguesia de ... desde 2013. (00.00.28 a 00.00.34)

Disse que a intermediou as divergências entre o A. marido, o R. marido e a testemunha José quanto à construção do muro de suporte do “caminho de servidão” (00.02.07); e “o que foi combinado foi … que o sr. António (Réu) e o Sr. José (testemunha “chapeiro, com a casa encravada) iam assumir uma parte maior (nos custos de construção) porque o terreno da casa do Sr. António até ao terreno do Sr. José o caminho era maior (mais comprido, cerca de 200m) e o sr. C. R. (cunhado do A. marido e seu procurador) concordou; o sr. C. R. não ia assumir nenhuns custos” (00.03.10); o Sr. C. R. estava em representação do Autor marido (00.04.51 a 00.04.58).

Resulta deste depoimento que na reunião na Junta de Freguesia o representante dos AA. não reclamou o terreno do caminho de servidão como propriedade do seus representados; apenas se discutiu quem suportaria o custo das obras de construção do muro de suporte de terras, por ser perigoso passar po0r lá, como se vê pelo depoimento desta testemunha: Isilda “ … mal eu entrei na Junta, o Sr. José e mesmo o Sr. António e mesmo a esposa dele falaram comigo várias vezes que o caminho estava deteriorado e pediram … como o sr. Luís é uma pessoa um bocado complicada, para eu falar com o Luís … porque “a D. O. A., esposa do Sr. José estava desesperada … ligava-me várias vezes, que tinha receio de passar com o carro no caminho, tanto que colocaram lá uma vedação nesse caminho e o caminho ficou mais estreito e aí não dava para passar com o carro”(00.12.09). E então, com nova intervenção da testemunha “O A. marido autorizou a construir o muro” (00.13.19), mas não alterou a decisão do cunhado C. R. em contribuir nos respectivos custos, apesar de beneficiar do muro que ficaria a suportar o talude com mais de 2 metros de altura (00.04.37 a 00.04.41). Quer dizer o Autor não reivindicou esse trato de terreno, apenas se limitando a permitir que fosse utilizado o seu terreno, a sul do caminho de servidão, para as obras de construção do muro.

P. A.
Filho dos RR. e construtor do muro
Código de Gravação – 1070505102238
Tempo de Gravação – 00.00.00 até 01.44.52)

E então onde está o problema? Este depoimento esclarece tudo.
Mandatário dos AA.:” … esse alegado acordo seria, como a Senhora Juiz chamou a atenção e muito bem, para o muro de suporte. E eu pergunto-lhe por que razão, então, o muro não foi feito até à altura do caminho ou 20 ou 30 cm acima do caminho e foi feito com a altura que está documentada na perícia e nas fotografias? Ou seja, uma altura muito acima?”. Resposta – “Está á altura do parapeito. A partir do momento em que você faz o muro e não faz … um parapeito e alguém cai abaixo desse muro … pode ser indicado como homicida. … “Para mim fica muito menos custoso fazer o muro sem levantar qualquer tipo de gradeamento” (00.30.13)

CONCLUINDO, o muro foi construído com autorização dos AA. nomeadamente pelo A. Luís, pelo que o pedido de demolição constitui um pedido contra um facto próprio, o que importa abuso de direito nos termos do artº 334º do Cod.Civil.

B.2 – USUCAPIÃO

Pelos depoimentos apresentados resulta provado, no entendimento dos RR., que estes utilizavam esse terreno como coisa sua.
E, ainda que assim não tivesse sido, o que se não consente, a verdade é que, mesmo assim, já o teriam adquirido por usucapião. Com efeito,
Por unanimidade, todas as testemunhas estão de acordo em que os RR. utilizavam o terreno em frente à casa e garagem como coisa sua, de dia e de noite, sem pedir autorização a ninguém, único acesso à casa e à garagem.
Isto é, que os RR. estão na posse desse terreno desde Maio de 1985.
Por sua vez, mesmo que os AA. tivessem praticado actos de posse material – e ninguém disse que praticaram, fosse qual fosse – esta só se teria sido iniciada em Novembro de 1989, ou seja, mais de quatro anos depois do inicio da posse dos RR..

Por isso, prevalece a posse mais antiga, que é a dos RR., nos termos do n.º 2 do artº 1257º e na posse continuaram e continuam.

Ora, tendo-se prolongado esta posse material por mais de 20 e 30 anos, por se ter iniciado em Maio de 1985, ininterruptamente, também se verificou a aquisição originária da propriedade deste trato de terreno, a favor dos RR. por usucapião, que invocam e de que os RR. aproveitam, mesmo que a posse tivesse sido de má fé e não foi, e invocam a seu favor, nos termos do artº 1296º do Código Civil.
(…)

Assim, aqui chegados, pode-se concluir, de uma forma inequívoca, que, como resulta da peça processual apresentada (nomeadamente, das respectivas conclusões), o Recorrente, apesar de pretender impugnar a decisão sobre a matéria de facto, não deu cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1, als. a), b) e c) do CPC (e nº 2) e que anteriormente foram referidos.

Nas verdade, o Recorrente, pretendendo impugnar a decisão sobre a matéria de facto, limitou-se a apresentar um recurso genérico que, visando reagir, de uma forma geral, contra a decisão da matéria de facto proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, não indica os concretos pontos da matéria de facto que entende terem sido mal julgados e não indica qual deveria ter sido o julgamento quanto a essa matéria de facto alegadamente mal decidida.

Assim, o Recorrente, no recurso genérico que deduz, em última análise, não cumpriu os seguintes ónus da impugnação imperativamente impostos pelo legislador no citado art. 640º do CPC:

- O Recorrente não indica os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação dos mesmos nas conclusões (qual ou quais) dos factos da matéria de facto consideram que foram indevidamente julgados);
- Nessa sequência, o Recorrente não especifica para cada um dos factos (já que não os indica) os meios de prova que, em seu entender, determinariam uma decisão diversa quanto a cada um dos pretendidos factos impugnados (que não se sabe quais são…);
- Finalmente, o Recorrente não indica no recurso genérico que apresenta qual a decisão que, no seu entender, devia ter sido proferida sobre as questões de facto impugnadas (desde logo, porque as não indica).

Não há dúvidas, assim, que o Recorrente não cumpre no Recurso interposto, os ónus que o Legislador estabeleceu no art. 640º do CPC, no sentido de evitar que fossem admitidos recursos genéricos contra a decisão da matéria de facto- para evitar, justamente, Recursos como aquele que o Recorrente deduziu.

Como se referiu em cima, estes vícios relativos à Impugnação da decisão relativa à matéria de facto (art. 640º do CPC) não são susceptíveis de serem objecto de um despacho convite no sentido da concretização do Recurso por parte do Recorrente, já que este tipo de despacho está reservado apenas e só para os recursos sobre matéria de direito (art. 639º, nº3 do CPC).

E assim sendo, incumprindo o Apelante o ónus imposto pelo art. 640º, nºs 1 e 2, do Cód. Processo Civil, ao recorrente que impugna a matéria de facto, está o tribunal impedido de sindicar o julgamento da matéria de facto, não podendo, por decorrência, esta Relação apreciar o recurso, na vertente da impugnação da matéria de facto, nos termos do artigo 662, nº 1, do C.P.C., impondo-se, assim, a rejeição, nessa parte, do recurso interposto.

Destarte, perante a concreta inoperância dessa impugnação, nenhuma alteração se poderá introduzir nos mencionados factos, sendo certo que inexistem nos autos outros elementos probatórios que consistentemente ponham em crise a decisão recorrida.

Mas, e pese embora a inalteração da impugnação da matéria factual, por inoperância da que foi efectuada, entendem os Recorrentes que, mesmo à luz do quadro factual fixado em primeira instância, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões por dessa eventual alteração da matéria factual estarem dependentes, impõe-se apenas conhecer a questão suscitada com relação alegada excessiva onerosidade da prestação de facto negativo.

E a propósito alega o Recorrente, em síntese, que a condenação na prestação do facto negativo (demolição) tem um custo muito superior à vantagem que os AA. obteriam com essa demolição, pelo que cessa o direito dos AA. à demolição, ainda que a construção do muro tivesse ocorrido em terreno destes, havendo apenas lugar a indemnização.

Além disto, os RR. construíram o muro no convencimento de que o faziam em terreno seu, pelo que, não sendo possível a restituição sem destruição total do muro, haveria, se o terreno pertencesse aos AA., apenas lugar a indemnização.

Ora, salvo o muito e devido respeito muito pouco ou mesmo nada haverá a acrescentar ao que já conta de decisão recorrida a propósito destas questões, já que nada mais se acrescenta nos fundamentos da apelação.

Na verdade e a propósito delas aí se refere o seguinte:

“Da factualidade apurada resulta, desde logo, que estamos perante terrenos confinantes, com o mesmo vendedor, em que se discute a propriedade de uma parte de terreno, um caminho que daria acesso a vários prédios, ainda antes da venda.
Atendendo à utilização do terreno, por se tratar de um caminho, que sempre foi utilizado por todos e que todos sabiam que teria de estar livre e desimpedido, não foram provados actos concretos de posse exclusiva pelas partes, que se mantendo por um período alargado de tempo, permitisse concluir que existiu aquisição por usucapião do direito de propriedade, com exclusão dos restantes. Tanto mais que esta teria que revestir sempre duas características essenciais: ser pública e pacífica [artigos 1293.º alínea a), 1297.º e 1300.º, n.º 1].
Pelo contrário, nunca os Réus se arrogaram proprietários daquele trato de terreno, tendo-o delimitado aquando da construção da habitação desde, pelo menos 1984, com um muro e mantendo uma utilização apenas como caminho de acesso ao seu prédio.
Por outro lado, apesar de a delimitação e configuração concreta não resultar dos registos, não podemos deixar de atender que o terreno dos Réus foi vendido em primeiro lugar, tendo como confrontação a sul o denominado caminho de servidão.
Ora, se confronta com o caminho, este não integra o prédio que lhe foi transmitido, tendo sido transmitido aos Autores, quando o anterior proprietário lhes vendeu o restante terreno, nestes termos, encontra-se demonstrada a aquisição derivada translativa para os Autores.
Este caminho onerará, assim, o prédio dos Autores, em benefício do prédio dos Réus (artigo 1543.º).
Nestes termos, podemos excluir, desde logo, a invocação pelos Réus da extinção da servidão, por desnecessidade: esta causa de extinção, apenas pode ser invocada, verificando-se os restantes pressupostos, a requerimento do proprietário do prédio serviente, neste caso, os Autores – artigo 1568.º, n.º 2.
Os Réus beneficiam, assim, das utilidades de acesso à sua habitação, pelo referido caminho, tendo os inerentes direitos de conservação (artigo 1565.º, n.º1). Assim, com vista à utilização normal da servidão, pode o proprietário do prédio dominante, fazer obras no prédio serviente, desde que não a torne mais onerosa (artigo 1566.º, n.º 1), no tempo e pela forma que sejam mais convenientes para o proprietário do prédio serviente (artigo 1566.º, n.º 2).
Tais obras ocorrerão a cargo do proprietário do prédio dominante, que delas beneficie (artigo 1567.º, n.º 1), e excepcionalmente de outros proprietários, e mesmo do proprietário do prédio serviente, se também auferirem utilidades da servidão (artigo 1567.º, n.os 2 e 3).
Além da renúncia ao seu direito de propriedade em benefício do proprietário do prédio dominante legalmente prevista nos termos do n.º 4 do referido artigo 1567.º, estas obras não determinam a aquisição do direito de propriedade, nem aqui se aplicam as regras da prestação de facto ou da aquisição por acessão, nos termos dos artigos 1325.º e seguintes.
De resto, de acordo com a factualidade provada, a incorporação do muro no terreno que os Réus sabiam pertencer aos Autores, não permite a aquisição do terreno, tendo aqueles o direito de exigir que seja desfeita a obra e que o terreno seja restituído ao seu primitivo estado à custa do autor dela, ou, se o preferir, o direito de ficar com a obra, pelo valor que for fixado segundo as regras do enriquecimento sem causa (artigo 1341.º).

(…)
Não podem, obviamente, os Réus tapar o caminho, colocar-lhe um portão, ocupá-lo com entulho, veículos ou outros objectos, prejudicando as utilidades próprias do caminho e a propriedade dos Autores.

Assim, devem os Réus manter a passagem desobstruída, sem qualquer construção ou objecto no leito do caminho, nomeadamente o já destruído muro a poente, tubos e entulho da obra (na sequência do determinado em sede de providência e respectiva execução), repondo o caminho ao estado anterior às obras, ou seja, completamente plano, sem qualquer desnível.

Devem ainda destruir o muro em betão acrescentado longitudinalmente à margem esquerda do caminho, na parte nascente, identificado na perícia como tendo 4,97 metros de comprimento e os pilares que se encontrarem no caminho, e na margem esquerda, para suporte de portão, e que estreitaram o acesso à garagem existente no prédio dos Autores”.

De tudo o exposto resulta que, como se refere na decisão recorrida, e pelas razões também aí aduzidas, as regras da prestação de facto e da acessão não são aplicáveis na presente situação, uma vez que as obras em referência nos autos não podem fundamentar a aquisição do direito de propriedade.

E assim sendo, improcede a presente apelação.

IV- DECISÃO.

Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.

Custas pelos Recorrentes.
Guimarães, 19/ 04/ 2018.

Jorge Alberto Martins Teixeira
José Fernando Cardoso Amaral.
Helena Gomes de Melo.

1. Cfr. o Acórdão do S.T.J. de 7/07/2009, in www.dgsi.pt/jstj, e os Acórdãos da Relação do Porto, de 05/05/2008 e de 12/11/2008 e de 20/10/2009, in www.dgsi.pt.
2. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª Edição, pags 155-156
3. Cfr. Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, II Vol., 2ª edição pp. 263 e 264, e os Ac. R. Porto de 5/05/2003 e de 7/12/2006, ambos no sítio www.dgsi.pt.
4. Cfr. o citado Ac. S.T.J. de 7/07/2009.
5. Cfr. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2ª edição revista e actualizada, p. 147.
6. Ac. STJ. de 14/02/2012, Proc. 6823/09.3TBRG.G1.S1, in base de dados da DGSI.
7. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª Edição, 2017,pag. 153
8. Ibidem, pág. 153.
9. Ibidem, pags 155 e seg e 159
10. Ac. da Relação do Porto de 18/12/2013, Processo 7571/11.4TBMAI.P1.dgsi.Net
11. Abrantes Geraldes, idem, pags 155-156
12. Cfr. Acs. do STJ de 27/10/2016, Processo 110/08.6TTGM.P2.S1 e Processo 3176/11.8TBBCL.G1.S1, in dgsi.net.
13. Cfr. Ac. do STJ de 3/5/2016, Processo 17482/13, in Sumários, Maio/2016, pg. 2.